I. O documento é uma carta de religiões de matriz africana no Rio de Janeiro pedindo proteção das águas, vistas como sagradas.
II. Ele descreve a importância central da água para a vida e nas religiões africanas, e pede representação dessas religiões na gestão ambiental e das águas.
III. A carta lista dez demandas como garantir acesso a fontes sagradas e revitalizar rios e nascentes.
Plantas úteis da restinga o saber dos pescadores artesanais de arraial do ca...
Carta pelas Águas manifesto religiões matriz afro
1. CARTA
PELAS
ÁGUAS
Manifesto
coletivo
das
religiões
de
matriz
afro-‐brasileira
pelas
águas
Rio
de
Janeiro
O
processo
de
desenvolvimento
da
sociedade
moderna,
que
caminha
sem
o
necessário
respeito
à
diversidade
cultural
e
de
vida,
proporciona
um
perigoso
desequilíbrio
nas
relações
humanas
com
a
natureza,
algo
que
se
torna
letal
quando
estamos
falando
das
águas.
Convictas
da
importância
das
águas
para
a
manutenção
da
vida
no
planeta,
as
religiões
de
matriz
afro-‐brasileira
trazem
um
olhar
diferenciado
em
sua
concepção
e
formas
de
se
relacionar
com
esse
elemento
sagrado
da
natureza.
Nascemos
das
águas
e
só
vivemos
com
sua
presença.
Ela
é
o
sangue
que
circula
na
Terra,
em
nossos
corpos
e
em
todos
os
seres
vivos.
Tudo
está
interligado
por
meio
da
água
e
só
há
vida
onde
há
água,
onde
há
sua
vibração
e
isso,
por
si
só,
já
é
motivo
para
ser
considerada
sagrada.
A
água
que
existe
em
nós
está
em
sintonia
com
a
água
que
circula
pelo
planeta.
Somos
gerados
e
desenvolvidos
na
água,
no
útero
de
nossas
mães.
Mais
de
70%
de
nosso
corpo
e
do
planeta
são
formados
pela
água.
Presente
em
todos
os
ritos
de
matriz
afro-‐brasileira,
a
água
é
criação
e
representa
limpeza,
pureza,
nutrição,
cura,
transparência
e
força,
que
se
manifesta
em
suas
quedas
e
correntezas.
A
água,
dentro
das
instituições
religiosas,
não
é
um
elemento
isolado
e
sim
integrado
à
terra,
aos
animais
e
aos
vegetais,
a
todos
os
elementos
da
vida
e
aos
rituais
sagrados.
Dentre
as
divindades
cultuadas
pelas
religiões
afro-‐brasileiras,
podemos
contar
diversos
orixás
relacionados
à
água
em
suas
mais
variadas
formas:
Oxalá,
Nanã,
Oxum,
Iansã,
Iemanjá,
Logun
Edé,
Oloxá,
Obá,
Oxumaré
e
Ewá.
A
conservação
das
águas,
portanto,
enquanto
elemento
sagrado
e
essencial
à
vida
é
também
de
responsabilidade
das
religiões
de
matriz
afro-‐brasileira.
O
momento
é
de
alcançarmos
maior
consciência
da
água,
de
unir
esforços,
unir
forças
e
gerar
mobilização
em
sua
defesa.
Está
aí
o
papel
educativo
que
as
religiões
devem
ter
dentro
e
fora
de
seus
espaços
de
convivência,
assumindo
suas
responsabilidades
na
criação
de
uma
cultura
de
respeito
e
proteção
às
águas
e
florestas,
cobrando
do
poder
público
o
cumprimento
das
Leis
que
regulam
seus
usos
e
a
adoção
de
medidas
que
garantam
o
acesso
às
águas
limpas
e
preservadas.
Nesse
sentido,
como
contribuição
a
uma
gestão
democrática,
participativa
e
compartilhada
das
águas,
relacionamos
algumas
propostas
e
medidas
que
nós,
signatários
da
Carta
pelas
Águas
no
estado
do
Rio
de
Janeiro,
consideramos
como
prioritárias,
a
serem
assumidas
por
religiosos
e
governo.
2. Nós,
povos
e
comunidades
de
terreiro
do
estado
do
Rio
de
Janeiro,
reivindicamos
do
poder
público:
I. A
garantia
da
representatividade
das
religiões
nas
estruturas
de
gestão
ambiental
e
das
águas
e
das
florestas,
tais
como
comitês
de
bacias
hidrográficas
e
conselhos
gestores
de
unidades
de
conservação
da
natureza.
II. A
concessão
de
outorgas
que
respeitem
os
usos
múltiplos
das
águas,
e
seu
entendimento
como
bem
comum
e
elemento
sagrado,
e
o
rigor
na
fiscalização
das
autorizações
de
uso.
III. O
reconhecimento
de
fontes,
cachoeiras
e
nascentes
sagradas
como
patrimônio
público
e
histórico-‐cultural
de
importância
para
as
religiões
de
matrizes
da
natureza.
IV. A
revitalização
de
nascentes,
rios
e
fontes,
despoluindo-‐os
e
plantando
espécies
sagradas
em
suas
margens
que
sejam
nativas
dos
ecossistemas
locais.
V. A
garantia
de
acessibilidade
dos
religiosos
às
águas
sagradas,
o
que
envolve
medidas
de
conservação,
monitoramento,
segurança
e
limpeza
de
áreas
públicas
utilizadas
regularmente
para
práticas
culturais
religiosas.
VI. A
proteção
e
conservação
das
áreas
públicas
de
entorno
dos
rios
e
nascentes
(áreas
de
preservação
permanente
—
APP),
impedindo
a
apropriação
privada
destes.
VII. A
promoção
de
projetos
de
captação
e
utilização
de
águas
de
chuva
nas
comunidades
de
terreiro,
acompanhados
de
ações
que
ensinem
técnicas
para
a
gestão
correta
dos
equipamentos
e
no
aproveitamento
das
águas.
VIII. A
descentralização
de
recursos
para
que
cada
comunidade
de
terreiro
possa
revitalizar
seus
espaços,
fontes,
rios
e
matas.
IX. A
realização
de
projetos
de
educação
ambiental
elaborados
com
os
religiosos
que
promovam
culturas
e
saberes
tradicionais
e
práticas
sustentáveis.
X. A
divulgação
das
leis
federais
e
estaduais
que
envolvem
o
combate
à
intolerância
religiosa,
a
gestão
das
águas
e
a
conservação
da
biodiversidade.
XI. A
realização
de
eventos
públicos
em
que
se
discuta
o
sagrado
e
a
natureza
e
se
promova
o
diálogo
entre
saberes
científicos
e
tradicionais.
Nós,
povos
e
comunidades
de
terreiro
do
estado
do
Rio
de
Janeiro,
nos
comprometemos
a:
I. Trabalhar
a
importância
da
água,
sua
sacralidade
e
sua
conservação
no
cotidiano
das
religiões
e
no
momento
de
seus
rituais.
II. Orientar
as
comunidades
de
matriz
afro-‐brasileira
no
replantio,
em
seus
territórios,
de
espécies
sagradas
originárias
dos
ecossistemas
locais
e
na
adoção
de
medidas
que
protejam
rios
e
fontes.
III. Trabalhar
com
jovens
e
crianças
a
relação
da
água
com
a
ancestralidade,
fortalecendo
a
identidade
cultural,
a
tradição
e
a
autoestima.
IV. Promover
práticas
sustentáveis,
o
uso
de
materiais
não
prejudiciais
à
conservação
da
natureza
e
a
reutilização
de
materiais.
V. Mobilizar
as
comunidades
para
participarem
da
construção
de
políticas
públicas
que
conservem
a
natureza
e
promovam
os
direitos
dos
povos
tradicionais
e
das
religiões
de
matriz
afro-‐brasileira,
assim
como
para
a
ocupação
dos
espaços
públicos
de
participação
na
tomada
de
decisão
(comitês
de
bacia
hidrográfica,
conselhos
gestores
de
unidades
de
conservação,
conselhos
municipais
de
meio
ambiente
etc.).
VI. Realizar
eventos
internos
em
que
se
discuta
e
se
compreenda
a
importância
das
religiões
para
a
proteção
da
biodiversidade
e
das
águas.