1. MICHELE DE SOUZA SENRA
A INFLUÊNCIA DO SOM E DO PROCESSAMENTO SENSORIAL NA
MUSICALIZAÇÃO DE CRIANÇAS AUTISTAS
ÁREA: EDUCAÇÃO MUSICAL
LINHA: EDUCAÇÃO, CULTURA E PENSAMENTO
RIO DE JANEIRO
2014
2. A INFLUÊNCIA DO SOM E DO PROCESSAMENTO SENSORIAL NA
MUSICALIZAÇÃO DE CRIANÇAS COM AUTISMO
INTRODUÇÃO
A música está presente em todas as culturas, e como o som tem propriedades físicas
sobre nosso corpo e sobre nosso cérebro, somos estimulados por ela, mesmo que
involuntariamente. Gordon (2008) afirma que todas as crianças nascem com alguma
aptidão musical. Porém a qualidade vai depender do meio em que ela está inserida.
Estudos da neurociência mostram seus benefícios na cognição, auto regulação
emocional e motor. Poucas atividades estimulam mais o cérebro como a música.
Independente de qualquer patologia, se a criança é típica ou atípica, a
musicalização é essencial para o desenvolvimento humano. Domingos (2009, apud:
Nascimento, 2009) diz que “ouvir e produzir música implica em uma tentadora mistura
de quase todas as funções humanas cognitivas”. Muitas crianças com autismo possuem
aptidões musicais, mas a dificuldade no processamento sensorial pode atrapalhar suas
percepções, e dificultar o vínculo afetivo com o professor de música. Entender essa
forma de percepção ajuda nesta conexão com o aluno. É uma experiência enriquecedora
e nos “humaniza” muito mais.
Fonterrada (2008) fala sobre grandes educadores, como Edgard Willems, por
exemplo, recomendava na prática educacional a iniciação pelo aspecto sensorial, porém
não exclusivamente por este viés. Mas, a capacidade sensorial desperta outras áreas
humanas.
Para Berger (2000), quando a pessoa apresenta uma desordem no processamento
multidimensional altera os aspectos de coordenação auditivos e motores. Ela explica
que mesmo o ritmo estimula os músculos a reagirem com movimento, a dificuldade no
processamento do som e planejamento motor irá interferir. Pois, o processamento em
conjunto com os sistemas vestibular e proprioceptivo, tátil, auditivo e visual, não estão
organizados e integrados em um mesmo nível. Para tocar um instrumento musical
existem um envolvimento de entrada multissensorial, que inclui o feedback do
planejamento motor, proprioceptivo e tátil. A ação de bater em um tambor, por
exemplo, envolvem movimentos bilaterais do braço, o cotovelo fica flexionado, as mãos
se ocupam com as baquetas, movimentando-se ritmicamente para cima e para baixo,
3. acompanhando o pulso. Crianças com esses déficits não tem controle motor e percepção
de pulsação e andamento. O trabalho motor é fundamental, pois o córtex auditivo é
muito próximo ao córtex motor, e isso influencia o movimento por meio da estimulação
do ritmo. A autora sugere exercícios baseados em movimento e música, semelhantes as
abordagens desenvolvidas por Jaques Dalcroze e Carl Orff, na regulação e estimulação
dos sistemas sensoriais dos autistas, isso ajuda o corpo a se regular ritmicamente de
forma organizada. Todo esse processo aumenta a adaptação funcional dos sistemas
visual, motor, auditivo, proprioceptivo e vestibular. A utilização da música neste
processo tende alinhar os outros sistemas em conformidade, visto que, o córtex motor
está localizado próximo ao córtex auditivo, logo a estimulação musical influencia as
respostas físicas. No entanto, a autora alerta que a música por si só não será suficiente
para alterar os sistemas motores, pois no caso de crianças que apresentam alteração na
percepção auditiva, deve ser regulada nesta necessidade primeiramente para resolver a
integração sensorial adicional, incluindo os aspectos psicológicos e cognitivos.
PROBLEMATIZAÇÃO
Há poucas literaturas disponíveis que sejam direcionadas ao ensino de música
para crianças com necessidades especiais, incluindo autismo. Embora, existam as leis de
inclusão e cada vez mais as escolas estão recebendo alunos autistas, poucos
profissionais estão preparados para atender esta demanda. Suponho que, normalmente
eles são redirecionados para a musicoterapia, mas devo lembrar que no contexto de
inclusão, todo indivíduo tem o direito por lei à inclusão social. A inclusão não se trata
somente de ensinar de forma eficaz, mas sim de atitude do querer fazer.
Segundo McDowell (2010) desde o inicio da história da educação musical nos
Estados Unidos que a música é parte fundamento no currículo escolar, incluindo
pessoas com deficiência. Entre as atividades desenvolvidas para alunos com surdes ou
cegueira, incluía o canto, bater palmas, tocar instrumentos de percussão, e outros
instrumentos mais simples como os sinos. Para os alunos com deficiência intelectual,
eram realizados canto e ritmo. Essas atividades musicais tinham o objetivo de integrá-los
na comunidade. Na atualidade, com as novas diretrizes educacionais, cada vez mais,
professores de música encontrarão alunos especiais incluídos em classe regular e nas
turmas especiais. Apesar disso, a autora detalha em sua pesquisa que poucos
4. profissionais em seu país estão capacitados para atender esta clientela. No Brasil não é
muito diferente desta realidade.
A demanda de pessoas com deficiências incluídas nas escolas é crescente, e por
isso professores de música precisam adquirir técnicas de ensino especiais, ou pelo
menos entender sua forma de aprendizagem, para atingirem seus objetivos de
musicalização. A música é um processo multissensorial que envolve o ouvir, o
movimento, sentimento, , e para isso, no currículo deve incluir o desenvolvimento das
percepções psicomotoras e sensoriais. Vários educadores musicais como Zóltan Kodally
(1967), Émile Jaques-Dalcroze (1950), Carl Orff (1982), entre outros, já falavam do
ensino da música através da ludicidade e movimento. A ideia não é o abandono das
técnicas musicais, mas sim adaptações das mesmas para a realidade do aluno. Esta
prática é importante para a internalização dos elementos musicais, porém algumas
crianças com transtorno ou desordem do processamento sensorial, poderão apresentar
dificuldades no desenvolvimento musical. Compreender estas dificuldades poderá
contribuir para o ensino e desenvolvimento cognitivo, afetivo, coordenação motora,
auditivo, linguagem e visual, que será de extrema importância para todo o currículo
escolar em que ela estiver inserida. E por que o professor de música deve entender a
maneira como essa criança experimenta e modula suas sensações? A maioria das
experiências musicais envolve a percepção sensorial (ou seja, ouvir, ver, sentir),
combinada com o motor (ou seja, cantar, tocar, mover). Entender como respondem a
estes estímulos certamente ajudará no planejamento do currículo do aluno para que ele
estabeleça um vínculo com o professor, e esteja regulado para a atenção devida ao
aprendizado das competências musicais.
O educador musical que trabalha com alunos com necessidades especiais precisa
entender e estar preparado para alguns desafios que transcorrem das variações dentro do
espectro autista para facilitar a didática que irá aplicar com eles. Entender que algumas
dessas crianças têm uma maneira peculiar de processar o som e a linguagem, e
dificuldades no processamento motor.
5. OBJETIVO
O Objetivo deste trabalho é abordar o funcionamento sensorial ligado às competências
musicais e como podemos musicalizar crianças com autismo. Contribuir com
informações que auxiliem o professor de música na adaptação curricular e
planejamento de aula, com base nas necessidades individuais de seus alunos. Investigar
como a musica poderia nos dar as respostas para modular o sistema sensorial
eliminando as respostas de medo e rejeição a determinados sons e músicas.
JUSTIFICATIVA
A integração sensorial é a forma como nosso cérebro processa, codifica e organiza
as informações de entrada sensorial. Pessoas com desordem no processamento sensorial
(SPD), interpretam essas informações de forma errada, o que pode alterar suas
percepções sobre som, movimento e tato, por exemplo. Crianças que apresentam
sintomas sensório-motor apresentam hipotonia, dificuldade de planejamento motor.
Crianças com autismo apresentam algum tipo de desordem no processamento sensorial.
Por exemplo, se uma criança tem defensiva auditiva, determinados sons tornam-se
insuportáveis, provocando sensações de dor e comportamento agitado.
Apesar de estudos comprovarem a influência da música para acalmar, entre outros
benefícios, quando se trata de pessoas com distúrbios sensoriais segundo Berger (2002)
devemos considerar que existem alguns equívocos relacionados a elas, tais como:
- Nem sempre a música será divertida
- o conteúdo de uma melodia nem sempre será percebido da mesma forma para duas
pessoas.
- Nem todos os instrumentos poderão ser agradáveis e toleráveis ao aluno.
- A voz do professor, ou o tom nem sempre agradará o ouvinte (aluno).
- Nem sempre as letras serão compreendidas por associações, interpretação dos
significados.
6. - Nem sempre cantar junto se torna uma experiência que acrescente prazer, interação
e uma experiência cognitiva. Algumas dessas crianças quando cantam não gostam de
serem acompanhadas.
- A harmonia e a melodia podem não ser percebidas como um todo.
A relação musical é baseada no som e a capacidade funcional para receber e
perceber os sons. Cada sujeito irá interpretá-la de forma única, ou peculiar.
O autismo é uma síndrome que afeta cerca de dois milhões de brasileiros, segundo a
ONU, e cerca de setenta milhões no mundo. Crianças afetadas por este transtorno
possuem dificuldades em suas relações sociais, comunicativas e possuem padrões
comportamentais repetitivos. Seu desenvolvimento é comprometido, e dependendo do
grau, sua inclusão social pode ser de completa exclusão. Se conectar a uma criança com
sério comprometimento na interação social e atenção compartilhada, por exemplo, pode
ser um grande desafio para alguns profissionais e pais. Essa sobrecarga sensorial afeta o
comportamento do indivíduo, deixando-os agressivos e agitados.
METODOLOGIA
A metodologia prevista para esta pesquisa consiste em leitura de fontes bibliográficas
sobre autismo, processamento sensorial e processos de musicalização. Levantamento de
dados objetivos e subjetivos através de entrevistas com pais, educadores musicais,
musicoterapeutas e outros profissionais que possam colaborar com a pesquisa. coleta de
dados estatísticos comparando musicalização de crianças autistas com adaptações
sensoriais com outros que não tenham essas adaptações.
7. CRONOGRAMA
PRIMEIRO SEMESTRE
Preparo do projeto. Leitura da bibliografia; coleta dos primeiros dados; escolha das
crianças que serão observadas na pesquisa e início do acompanhamento dos mesmos;
SEGUNDO SEMESTRE
Crítica e quantificação dos dados; Entrevistas com professores de educação musical,
pais das crianças, musicoterapeutas e outros profissionais que possam contribuir com a
pesquisa. Acompanhamento das aulas de musicalização.
TERCEIRO SEMESTRE
Nova coleta de dados ao final do semestre; confronto dos resultados; crítica e
quantificação dos dados; continuidade no acompanhamento da musicalização das
crianças autistas.
QUARTO SEMESTRE
Redefinição do projeto; redação.
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Philadelphia: Jéssica Kingsley Publishers, 2002.
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