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UNIVERSIDADE METODISTA DE ANGOLA
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
CURSO DE TEOLOGIA
FASCÍCULO
DE
TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Dispensado pelo Docente,
Tomás Nsunda Lelo
Contactos: 929809366 / 912187091
lelonsunda@gmail.com
2
Dispensado pelo Docente,
Tomás Nsunda Lelo
Contactos: 929809366 / 912187091
lelonsunda@gmail.com
3
I. OBJECTIVOS DA DISCIPLINA E SUA DESCRIÇÃO
Esta disciplina, de Teologia Contemporânea, tem como objectivo dedicar-se ao
estudo do pensamento dos teólogos que impactaram através das suas obras a teologia
moderna e actual. A disciplina interessa-se ao estudo da origem dos diferentes correntes
teológicos actuais, a descrição das suas evoluções assim como as reacções que elas
suscitam e ela toma em conta o conjunto de correntes teológicos modernos.
Neste contexto, realça-se que a disciplina tem como conceito a visão de Deus no
contexto que estamos inseridos tornando inteligíveis os pilares da nossa fé. Ela serve de
bússola para nos orientar no exercício da verdadeira fé cristã. Ajuda nos a visualizar a
essência da nossa fé a luz dos movimentos teológicos contemporâneos.
II. EXIGENCIAS E MODALIDADES DE AVALIAÇÃO
 Nesta cadeira requer a participação activa dos estudantes nas aulas, ler o
fasciculo ao menos 20 minutos por dia com objectivo de compreender o
pensamento teológico dos movimentos teológicos em estudo e seus personagens
 Entre os teólogos da T. contemporânea, o estudante deverá dissertar sobre um
deles.
 No entanto, o estudante deve constantemente preparar-se para as provas de
frequência.
4
INTRODUÇÃO
Sendo a Teologia, “o estudo da existência de Deus, das questões referentes ao
conhecimento da sua divindade, assim como de sua relação com o mundo e com os
homens”1
, a Teologia Contemporânea é considerada como Teologia dos tempos atuais,
é o estudo de Deus no contexto actual e a evolução dos dogmas e dos pensamentos
formados a respeito das doutrinas bíblicas no contexto que estamos inseridos. Ela
origina-se no contexto da Reforma, no séc. XVI.
Esta Teologia, recebeu influência de diversas tendências teológicas, entre elas: a
Teologia Bíblica, a Teologia Católica, a Teologia Protestante, a Teologia Natural e a
Teologia Especulativa. Conforme as direcções que vão tomando, a Teologia
Contemporânea recebe várias designações, entre elas: Teologia Modernista, Teologia
Neomodernista, Teologia da Esperança e Teologia do Evangelho Social. Nisto reside a
pertinência do seu estudo na formação teológica dos estudantes da Bíblia. Desta feita,
nos praz articular o presente fasciculo em quatro capítulos sucessivos.
1
Conf. http://www.significados.com.br/teologia/, pag. Consultada, 25/08/2015
5
I-CAPITULO: TEOLOGIA PRÉ-CONTEMPORÂNEA
1.1. Factores influentes na existência da teologia Contemporânea
A actual teologia contemporânea recebeu a influência de inúmeras
manifestações teológicas e filosóficas do passado. Para uma melhor compreensão desta
Teologia, é imprescindível conhecer as principais correntes ou tendências teológicas,
desde os dias apostólicos que a influenciam:
A) A Teologia Bíblica, procura conhecer a Deus, seus atributos e sua vontade,
através de uma reflexão a respeito dos temas presentes tanto no Antigo como no Novo
Testamento, considerados como infalível Palavra de Deus
B) A Teologia Católica, por sua vez, que corresponde às teologias moral
(orienta o comportamento humano em relação aos princípios religiosos), dogmática
(estuda os elementos da fé, ou seja, as doutrinas), bíblica (estuda o carácter de Deus,
seus atributos e sua vontade a nosso respeito, com base na Bíblia) e patrística (estuda a
religião de acordo com a interpretação dos pais da Igreja, da tradição e do magistério);
C) A Teologia Protestante, enfatiza o retorno às origens e à reinterpretação das
Escrituras, tendo Cristo como única perspectiva. Seus temas principais são: somente a
Escritura, somente Cristo, somente a fé, somente a graça;
D) A Teologia Natural ou Teodiceia, busca o conhecimento de Deus baseando-
se na razão humana;
E) A Teologia Especulativa, tem por fundamento o estudo sintético dos textos
sagrados, apoiado nos conhecimentos filosóficos do homem. Nesta categoria pode ser
classificada a teologia tomás de Aquino.
F) A Teologia Mística, fundamenta-se na experiência religiosa que permite ao
iniciado supor-se imediatamente relacionado com a divindade, sendo sinais dessa união
as visões, os êxtases, as profecias e os estigmas. Esta teologia tem as seguintes
características :
 A teologia mística não tem carácter reflexivo.
 Não da prioridade ao uso da razão.
 Evidência as experiências.
6
 Da maior importância a sentimentos, emoções, do que ao uso do intelecto.
Portanto, a Teologia Contemporânea origina-se directamente do método
especulativo, e desde a Reforma Protestante tem tomado várias direcções, conforme as
designações recebidas: Teologia modernista, teologia Neomodernista, teologia da
esperança, teologia do evangelho social, teologia do cristianismo sem religião, teologia
da morte de Deus etc, conforme veremos no decorrer desse estudo;
1.1.1.Filosofia Tomista e a sua influente nos conceitos da teologia
Contemporânea
A filosofia grega ameaçou toda a estrutura do Cristianismo, tentando helenizar as
doutrinas apostólicas, ou seja, contextualizá-las à luz da cultura grega. As doutrinas
passaram a ser examinadas a luz da razão e da lógica.
A influência da teologia filosófica de Tomas de Aquino: Com Tomás de Aquino,
no século XII, ressurge a teologia especulativa, mas com outras vestes. Esse famoso
doutor do catolicismo procurou explicar racionalmente os dogmas cristãos, e acabou
invertendo o princípio bíblico de que "pela fé entendemos", ao afirmar que “o
conhecimento conduz à fé ”. É o pai não apenas da teologia tomística, mas também da
filosofia tomística, como já vimos.
1.1.2. A influência da reforma e contra reforma na teologia
Contemporânea
Com o advento da Reforma Religiosa no século XVI, a tradição católica foi
desafiada pelos reformadores.
Os reformadores apegaram-se às Escrituras Sagradas e trouxeram à lume os
grandes fundamentos da fé cristã, como: a autoridade suprema da Bíblia, a justificação
pela fé, o verdadeiro significado dos sacramentos, o sacerdócio universal dos crentes,
etc. As divisas protestantes tornaram-se célebres: Solus Cristus, Sola Scriptura, Sola
fide, Sola gratia.
1.2. Reacção católica a Reforma
7
A Igreja Católica, ao ver-se ameaçada, organizou a sua contra reforma
principalmente através da convocação do concilio de Trento, que se reuniu durante 18
anos, de 1545 a 1563. O que aconteceu neste concílio?
Nesse célebre concílio ficaram confirmados pela Igreja Católica todos os
dogmas anteriormente aceitos. A tradição foi considerada de valor igual ao da Bíblia, e
ainda juntaram-se ao cânon do Antigo Testamento os livros e aditamentos apócrifos.
1.2.1. Galileu e a inquisição em Roma
Constatamos uma clara incapacidade da teologia católica de acompanhar e
explicar os inúmeros avanços científicos que estavam acontecendo naquele período.
Caso do Galileu, o grande físico, já com 70 anos, foi citado a comparecer perante o
Tribunal da Inquisição, em Roma, por perjurar contra os dogmas do catolicismo e
considerado herético pelos clericalistas, onde na manhã do dia 22 de Junho de 1633,
ajoelhado ante seus inimigos, Galileu abjura seus "erros e heresias" e "renega" todas as
suas pertinentes descobertas para salvar a vida, dizendo “declaramos que a afirmação
de que a terra não é o centro do mundo e de que ela se desloca com um movimento
diurno é coisa absurda, filosoficamente falsa; e errónea, quanto à fé”.
Mediante esta suposta declaração, o papa Urbano VIII, pontífice de 1632 à 1644,
assinou o seu infalível (!!!) decreto nos seguintes termos: “Em nome e pela autoridade
de Jesus Cristo, cuja plenitude reside em seu vigário, “declaramos que a afirmação de
que a terra não é o centro do mundo e de que ela se desloca com um movimento diurno
é coisa absurda, filosoficamente falsa; e errónea, quanto à fé”.
1.2.2. A Bíblia e os confrontos entre a Igreja e as novas
ideias
A Bíblia foi a grande vítima de todos os conflitos entre a Igreja e as novas ideias.
A posição medievalista da Igreja Católica nos primeiros séculos da Idade Moderna, em
relação ao desenvolvimento da cultura, trouxe males sem conta a ela mesma, Porque à
medida que a ciência começou a provar os "absurdos" condenados pela religião, esta
começou a ser contestada por eminentes escritores, secularistas e irreverentes, a cujos
olhos o romanismo não passava de um mal social e um entrave ao progresso dos povos.
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1.3. O que é alta crítica da Bíblia?
Em exegese, a Alta crítica é o nome dado aos estudos críticos da Bíblia. Sua
abordagem trata a Bíblia como literatura, utilizando-se do aparato crítico normalmente
aplicado a textos literários semelhantes. Caracteriza-se, de uma forma geral, por não
partir do dogma da inerrância bíblica para efectuar suas análises. Em contraste com a
Baixa crítica, seu foco está no estudo dos autores dos textos bíblicos, seu processo de
formação editorial, sua transmissão histórica e o contexto de formação, denominado
Sitz im Leben na teologia liberal.
1.3.1. Exemplo de actuação da alta Crítica
Os fundamentos históricos dessa tendência remontam, de acordo com a maioria
dos autores, ao ano de 1753, quando Jean Astruc (1684-1766), francês incrédulo e
professor de medicina em Paris, publicou anonimamente, em Bruxelas, em francês, o
livro Conjecturas Sobre as Memórias Originais que Parece Terem Sido Usadas por
Moisés na Composição do Gênesis. Nesse livro Astruc, que foi médico do rei da
Polônia e de Luís XV, da França, dúvida da origem mosaica dos cinco primeiros livros
do Antigo Testamento e aventa a hipótese de existirem duas fontes literárias Jeovista e
Eloísta partindo-se dos nomes usados para se referirem a Deus. Antes dessa data, muito
raramente alguém ousava criticar assim a Palavra de Deus, lançando dúvidas sobre a sua
historicidade tradicionalmente aceita.
Os mesmos métodos de desintegração aplicados ao Antigo Testamento foram
também aplicados, de maneira violenta, ao Novo, lançando descrédito sobre o seu valor
histórico e resultando, em alguns casos, no completo desaparecimento da pessoa divina
de Jesus Cristo, para instalar em seu lugar apenas um profeta destituído de todos os seus
atributos sobrenaturais.
1.4. A Teologia Social de João Calvino
O pensamento teológico social de Calvino, é despercebido para muitos, pelo facto
dos modernos manuais de teologia não fazerem tanta referência a tudo o que o
9
reformador produziu especificamente nesta área. Faremos uma síntese de tudo que
Calvino produziu nesta área. A Reforma Protestante ocorrida no século XVI não foi
somente um movimento espiritual e eclesiástico. Teve também aspectos e dimensões
políticas e sociais.
Calvino, bem como os outros reformadores, deu atenção aos problemas sociais de
sua época. Talvez pelo facto de ser da segunda geração de reformadores, Calvino podia
ter uma visão mais ampla e amadurecida sobre o assunto. Ele esforçou-se para entender
qual deveria ser o papel da Igreja cristã na reconstrução de uma sociedade justa que
reflectisse a vontade de Deus em termos de justiça social. Essa questão era
extremamente aguda para os reformadores, particularmente pelo facto de viverem numa
época e numa situação de grandes problemas sociais.
Não é de se admirar que em suas Institutas da Religião Cristã, bem como em seus
comentários, Calvino frequentemente trata de questões relacionadas com a
responsabilidade social da Igreja e do Estado. Duas considerações importantes:
Primeiro, Não devemos dissociar o pensamento social de Calvino da sua teologia.
Calvino era acima de tudo um teólogo, um homem da Igreja. Ele não era um
político, nem activista social, mas essencialmente um pastor e um estudioso das
Escrituras. Seu pensamento social desenvolveu-se dentro da estrutura de seus
pressupostos teológicos e bíblicos.
Calvino construiu a sua teologia social a partir da sua convicção de que Cristo é
Senhor de todos os aspectos da vida humana, e de que a Palavra de Deus deve regular
todas as áreas da vida.
A segunda consideração, Não devemos dissociar o pensamento social de Calvino
da época em que ele viveu. Embora sua teologia social brotasse de princípios bíblicos
válidos e atuais para todas as épocas, Calvino só poderia dar-lhes expressão dentro das
circunstâncias históricas em que viveu e labutou. Naquela época, a Igreja Católica
Romana era o grande poder económico e político. Prevalecia naquela época o sistema
económico e social medieval e a monarquia como sistema de governo.
1.4.1. Genebra na Época de Calvino
A cidade de Genebra foi o local onde Calvino passou a maior parte de sua vida,
pregando, pastoreando e ensinando. Ali passou momentos de grande popularidade e
também de rejeição. Foi ali que sua teologia social amadureceu, à medida em que
10
enfrentava os males sociais que oprimiam Genebra bem como as demais cidades da
Europa medieval.
O Governo de Genebra, antes da Reforma e da chegada de Calvino, era um
bispado, uma importante cidade. Seu comando estava nas mãos de três autoridades:
 O bispo, que era não somente o chefe espiritual da Igreja, o "príncipe de
Genebra", como teoricamente, era o soberano da cidade, com poderes para
cunhar moedas, comandar a cidade em tempo de guerra, julgar apelações, e
perdoar crimes.
 Depois vinha o magistrado, incumbido da defesa da cidade, da guarda, e
da execução de prisioneiros.
 E por fim, o Conselho de Genebra, composto de Conselheiros de entre os
moradores da cidade, que julgavam as questões criminais concernentes aos
leigos (os pecados dos sacerdotes era competência do bispo), cuidavam do
abastecimento da cidade, das finanças da cidade, e mantinham a boa ordem
durante a noite através da polícia. Este era o sistema adoptado pela maioria
das cidades europeias católicas. Quando Genebra adoptou oficialmente a
Reforma (1536), o bispo foi despojado do seu poder, e os Conselheiros
assumiram suas funções. Durante o período de bispado em Genebra, a Igreja
Católica representada pelo bispo estivera acima do Estado. Com a expulsão
do bispo, o Conselho assumiu suas funções, e agora o Estado estava acima da
Igreja (agora Reformada).
A Igreja permanecia ligada ao Estado, e estava debaixo do poder do Conselho de
Genebra (cujos Conselheiros agora eram protestantes), que tinha em suas mãos o poder
de disciplinar, designar os pastores, bem como a função de sustentá-los financeiramente.
Havia pobreza extrema, agravada por impostos pesados. Os trabalhadores eram
oprimidos por baixos salários e jornadas extensas de trabalho. Campeava o
analfabetismo, e a ignorância; havia aguda falta de assistência social por parte do
Estado; Prevalecia a embriagues e a prostituição. Destacava-se o vício do jogo de cartas,
que levava o pouco dinheiro do povo.
 As trevas espirituais eram características da Idade Média e reflectiam-se
nas condições morais e sociais das massas. Essa era a situação que prevalecia em
Genebra antes da chegada da Reforma espiritual, a qual deu lugar, em seguida, a
11
reformas sociais, económicas e políticas, mesmo antes de Calvino chegar à
Genebra.
 As Mudanças Introduzidas por Farel em Genebra Guilherme Farel foi o
grande líder destas mudanças em Genebra. Sob sua influência, o Conselho da
cidade cria o Hospital Geral no antigo Convento de Santa Clara, para dar
atendimento médico aos pobres. O Conselho também passou a regulamentar a
vida dos seus cidadãos:
 Proíbem-se as danças de ruas, a polícia é mobilizada para manter a ordem
nas ruas, são promulgadas leis que regulamentam o uso dos bares, que proíbem
jogo de cartas, blasfemar o nome de Deus, e servir bebidas durante o horário do
sermão.
 Torna-se proibido vender pão e vinho a preços acima dos estipulados; são
proibidos todos os dias santos, à excepção do domingo. Passa a ser obrigatório a
todos os cidadãos de Genebra irem ouvir o sermão de domingo, sob pena de
pesadas multas. E a instrução pública se torna obrigatória, pela primeira vez na
Europa.
 As reacções as mudanças trazidas por Farel Evidentemente, nem todos
em Genebra estavam satisfeitos com as pesadas proibições impostas pelos
Conselheiros, que por sua vez, seguiam a Farel. As leis, por demais severas, que
excedem os limites do razoável, provocam insatisfação, mesmo entre crentes
verdadeiros.
É neste momento de mudanças que Calvino chega a Genebra Foi a esta altura
que Calvino chegou a Genebra. Ele estava apenas de passagem pela cidade. Seus planos
eram de prosseguir em frente e achar um local tranqüilo onde pudesse estudar e
escrever. Tinha na época 27 anos de idade, e havia acabado de publicar a primeira
edição das Institutas. Quando Farel soube que Calvino estava na cidade foi visitá-lo, e
instou com o jovem teólogo a que ficasse ali em Genebra, para ajudá-lo no trabalho de
reforma. É conhecida a história de como Calvino, após ter apresentado toda sorte de
desculpas, finalmente rendeu-se, aterrorizado pela maldição que o velho reformador
invocou sobre ele, em caso de recusa. Assim, ele ficou, para ajudar Farel a solidificar as
reformas eclesiásticas e sociais em Genebra. Em breve, Genebra iria tornar-se o centro
espiritual e social da Reforma protestante na Europa. Foi ali em Genebra, trabalhando
como pregador, mestre e pastor na Igreja de Genebra, e lidando com as questões sociais
12
mencionadas acima, que Calvino desenvolveu sua teologia social. No que se segue,
procuraremos sintetizar seus pontos principais, concentrando-nos no que Calvino
ensinou como sendo a responsabilidade social da Igreja de Cristo.
1.4.2. O Ensino de João Calvino
A causa dos males sociais Fundamental para entendermos o pensamento de
Calvino nesta área é termos em mente que para ele as causas da pobreza, miséria e a
opressão, bem como da perversão e da corrupção da sociedade humana, estavam
enraizadas na natureza decaída do homem, que por sua vez, remonta-se à Queda no
Éden. Este princípio é crucial no entendimento de Calvino.
Para ele, o pecado do homem havia trazido toda sorte de transtorno à ordem
social: Pela queda do homem foi demolida toda ordem social, e em Adão tudo foi
amaldiçoado por Deus, como está escrito em Romanos 8.20-23, onde Paulo afirma que
a criação de Deus está em cativeiro imposto pelo pecado do homem. A queda do
homem introduziu perturbações profundas na sociedade humana, incluindo distúrbios
na vida conjugal e familiar.
Para Calvino, o caos económico é causado pela ganância dos homens, e pela
incredulidade de que Deus haverá de nos suprir as necessidades básicas, conforme
Cristo nos promete em Mateus 6. Calvino denuncia neste contexto, pecados sociais
como: Estocagem de alimentos (trigo), monopólios, e a especulação financeira, como
tendo origem no egoísmo e na avareza do homem. Ele denunciava aqueles que
preferiam deixar deteriorar-se o trigo em seus celeiros, para que ali fosse devorado por
bichos, e apodrecesse, ao invés de ser vendido, quando a necessidade do povo se fazia
sentir. Por identificar biblicamente a raiz dos transtornos sociais, Calvino estava em
posição de elaborar uma solução que atingisse o problema em seus fundamentos.
O Senhorio de Cristo é um segundo princípio que norteava a teologia social de
Calvino era que o Cristo vivo e exaltado é Senhor de todo o universo. Os milagres que
Ele exerceu sobre a ordem natural (acalmar a tempestade, por exemplo; ou tirar uma
moeda da boca do peixe) demonstram esta realidade, diz Calvino. Portanto, a obra de
restauração realizada por Cristo não se limita apenas à nova vida dada ao indivíduo, mas
abrange a restauração de todo o universo o que inclui a ordem social e económica. Desta
forma, a atenção de Calvino como pastor e mestre, se estendeu para além das questões
13
individuais e "espirituais". Se Cristo era o Senhor de toda a existência humana, era
dever da Igreja dar atenção às questões sociais e políticas.
A Restauração da Sociedade Para Calvino, a restauração inaugurada por Cristo
ocorre inicialmente no seio da Igreja. É na Igreja que a ordem primitiva da sociedade,
tal qual Deus havia estabelecido, tende a ser restaurada. Na Igreja, as diferenças
exacerbadas entre as classes sociais, económicas e raciais, bem como os preconceitos
delas procedentes, desaparecem, pois Cristo de todos faz um único povo (Gl 3.28; Ef
2.14). Calvino não concebia a total abolição das classes sociais. Ele concebia a
coexistência harmónica entre a Igreja e instituições como o Estado, a sociedade e a
família, com as suas respectivas estruturas e funcionamento.
É na Igreja, porém, que as relações sociais de trabalho sofrem profundas
alterações, ensina o reformador. Os patrões continuam patrões, mas aprendem a exercer
sua autoridade sem opressão, ao passo que os empregados (que continuam empregados)
aprendem a serem subordinados sem recriminação.
Na Igreja, diz Calvino, Jesus Cristo estabelece entre os cristãos a justa
redistribuição dos bens destinados a todos. Isto se dava através da actividade diaconal,
trazendo alívio para as necessidades dos pobres e oprimidos, com recursos vindos dos
ricos e abastados. Quando Calvino falava em restauração social, ele tinha em mente
uma sociedade civil governada por cristãos reformados, que aplicassem os princípios
bíblicos às questões sociais, políticas e económicas. Ou seja, um Estado que fosse
orientado pela Igreja no exercício de suas funções.
Para Calvino a reforma social não é perfeita, pois os efeitos do pecado não são
todos eliminados. É também importante notar que para Calvino a reforma da sociedade
não é completa nem perfeita, visto que os efeitos do pecado não são de todo eliminados
na presente época. É uma restauração parcial, portanto. Ela não consegue estabelecer
plenamente a justiça no mundo presente. Ao mesmo tempo, ela não abole determinados
aspectos da ordem social: permanece a hierarquia determinada por Deus entre o homem
e a mulher, o patrão e o empregado, os pais e seus filhos.
Quando ocorrerá então a completa reforma da sociedade? A plena abolição dos
distúrbios agora presentes da ordem social (as injustiças, a opressão, a corrupção, por
exemplo) só se efectuará plenamente no Reino de Deus, no fim dos tempos, para o qual
marcha toda a história dos homens e do universo. Sua vinda será precedida por
convulsões cósmicas. Então, Jesus Cristo regressará em glória, e o príncipe deste mundo
14
será aniquilado. Assim, será então estabelecido o novo céu e a nova terra, onde habitam
plenamente a justiça (2 Pe 3.13; cf. Is 65.17; 66.22; Ap 21.1). Portanto, para Calvino, a
Igreja é uma antecipação do reino de justiça a ser introduzido por Cristo em sua vinda.
Como tal, ela funciona no presente como uma sociedade provisória, governada pelas
leis de Cristo. Embora já foram reflectidos estes ideais, a Igreja ainda não o faz de
forma perfeita, o que ocorrerá apenas no fim dos tempos.
A Responsabilidade Social da Igreja Quais as responsabilidades da Igreja nesta
restauração provisória da sociedade? Podemos resumir o ensino de Calvino em três
aspectos fundamentais. Segundo ele, a Igreja tinha um ministério didáctico, um político,
e um social.
Ministério Didáctico Esse ministério da Igreja era para ser exercido através dos
seus pastores e mestres. Consistia na instrução pública e particular, através de sermões e
orientação individual, quanto ao ensino bíblico sobre a administração dos bens
outorgados por Deus ao Estado e ao indivíduo. Em outras palavras, Mordomia Cristã.
A ênfase do ministério didáctico: a questão do trabalho e do descanso. Tomemos
como exemplo a questão do trabalho e descanso. De acordo com Calvino, a Igreja
deveria através do ministério regular de seus pastores, instruir seus membros no ensino
das Escrituras sobre o assunto.
Em suas Institutas Calvino escreveu o que possivelmente foi o seu ensino em
Genebra sobre o trabalho: só Deus alimenta o homem dele vem as forças e as condições
para que o homem trabalhe, e com seu suor, compre seu pão.
O trabalho, portanto, é algo eminentemente digno pois é a realização da vontade
de Deus para o homem. Assim, o homem não se realiza plenamente, senão no trabalho,
pois foi para isto que foi criado e vocacionado, conforme está escrito em Génesis 1 e 2.
O pecado tirou a alegria e a graça que acompanhava o trabalho no início.
A queda introduziu no mundo e na sociedade humana os distúrbios sociais
relacionados com o trabalho (Génesis 3). Mas, em Cristo o homem reencontra a alegria
e o gosto do labor. Quanto ao descanso, Calvino insistia que era necessário proporcionar
aos trabalhadores um dia de descanso, o sábado cristão, que é o domingo, conforme sua
interpretação do quarto mandamento (Êxodo 20.8-11). O descanso físico, porém, está
intimamente ligado ao espiritual sem Cristo, não há descanso verdadeiro no domingo.
Assim, Calvino via a profanação do domingo como a origem da corrupção do
trabalho. Segundo ele, é necessário cessarmos dos nossos labores, como Deus cessou
15
dos dele (Heb. 4.3). O que fez o conselho de genebra? Assim, conforme Farel já havia
orientado, o Conselho de Genebra, debaixo da influência de Calvino, aboliu todos os
feriados católicos e determinou que no domingo cessasse todo labor em Genebra. A
função do púlpito no ministério didáctico? Através do púlpito, exercendo o seu
ministério didáctico, a Igreja então levantava o ânimo moral do trabalhador
assegurando-lhe que mesmo os trabalhos mais humildes são honrados por Deus, e que
Deus assim determinou que pelo trabalho o homem encontrasse sua vocação na vida. E
que em Cristo, o trabalhador encontraria a alegria e a satisfação que deveriam
acompanhar o labor diário.
Havia um outro aspecto do ministério didáctico da Igreja que consistia em
repreender, através das pregações, os membros que estivessem incorrendo em pecados
sociais:
Assim, os pastores de Genebra, orientados por Calvino, denunciavam do púlpito a
prática da cobrança de juros excessivos por parte dos agiotas. Da mesma forma
denunciavam a vadiagem. Vadiagem e parasitagem é pecado, ensinava Calvino. Para
ele, quando Deus criou o homem e o ordenou cultivar a terra, condenou com este gesto
a ociosidade e a indolência. Não há nada mais oposto à ordem da própria natureza do
que consagrar a vida à beber, comer, e dormir, sem indagar sobre o que fazer (Sl 128.3;
2 Ts. 3.10-12).
Calvino também falava contra o desemprego causado pela ganância dos ricos.
Privar um homem do seu trabalho é pecado contra Deus pois trabalho é dom de Deus, e
o dever que ordenou ao homem, ensinava Calvino. É tirar-lhe a vida pois os
trabalhadores pobres dependem dia a dia do seu labor para o pão com se sustentam e às
suas famílias ao contrário dos ricos, que têm propriedades, reservas, etc. Assim,
promover o desemprego, na opinião de Calvino, seria um atentado à vida do pobre, e
portanto, um pecado contra o mandamento "Não matarás". Esse era o primeiro aspecto
da responsabilidade social da Igreja no pensamento de Calvino, ou seja, instruir seus
membros, pela pregação da Palavra, acerca dos princípios bíblicos sobre o trabalho e o
descanso.
Ministério Político Ao lado do Estado, a Igreja tinha um outro ministério, na
teologia social do reformador, a saber, o ministério político. Para entendermos melhor o
que Calvino tem a dizer sobre isto, vamos primeiro entender seu pensamento sobre a
relação entre a Igreja e o Estado. A relação entre a Igreja e o estado. Podemos resumi-lo
no que Calvino tem a dizer sobre Romanos 13.1-7, uma passagem onde o apóstolo
16
Paulo menciona as autoridades e nossos deveres para com elas. Para Calvino, a Igreja e
o Estado são duas instituições procedentes de Deus (Rm 13.1-2); são instrumentos de
Deus para a vinda do Seu Reino na terra. A Igreja constitui-se como as primícias deste
Reino vindouro, como já vimos; o Estado, por sua vez, deve manter a ordem provisória
na sociedade humana. Portanto, existem entre as duas instituições laços duráveis e
essenciais, e não simples relações ocasionais.
Qual a missão do Estado no pensamento de Calvino? Ainda com base em
Romanos 13, Calvino sustenta que 1)o Estado deveria manter a ordem na sociedade
(conforme sua interpretação de 1 Tm 2.1-2), 2)prover o sustento da Igreja, 3) e
promover os meios necessários para que haja a pregação fiel da Palavra de Deus entre
os cidadãos. Ou seja, usando o poder civil dado por Deus, as autoridades deveriam
envidar todos os esforços para que a religião verdadeira prevalecesse na terra. O estado
não devia gerenciar os negócios da igreja. Porém, para Calvino isto não implica
qualquer ingerência do Estado nos negócios da Igreja. O Estado faz estas coisas através
de uma boa legislação que garanta a livre pregação da Palavra de Deus. A edificação da
Igreja se faz apenas pela pregação da Palavra no poder do Espírito, e não pela
interferência do poder do Estado. E aqui Calvino critica os demais reformadores que
desejavam uma união entre Igreja e Estado, e que o Estado tomasse conta dos negócios
da Igreja (como ocorreu parcialmente na Alemanha).
Qual seria então a missão política da Igreja? Em primeiro lugar, orar pelas
autoridades constituídas (1 Tm 3.1-2). E isto, em qualquer país em que os cristãos se
encontrassem, independente da forma de governo daquele pais, por mais hostis que as
autoridades fossem, para que se convertam e venham ao bom senso, assim como
Jeremias exortou os cativos a que orassem pela Babilónia (Jr 29.7). Em segundo lugar, a
Igreja deveria, quando necessário, advertir as autoridades, quando estas esquecessem o
senso divino do seu ofício, quando abusassem do poder, quando cometessem injustiça,
quando tolerassem injustiças contra os pobres, os fracos e os oprimidos. Se a Igreja
cessar de vigiar o Estado, diz Calvino, ela se torna cúmplice da injustiça social,
cessando de cumprir sua missão política. Em terceiro lugar, a Igreja também deveria,
como parte de sua tarefa, tomar a defesa dos pobres e fracos contra os ricos e poderosos.
Ela deveria consistentemente alertar o Estado a que proteja os fracos, os oprimidos e
explorados pelos ricos, os que não possuem poder político ou económico, e não têm
protecção social. Neste sentido, a Igreja deve sempre denunciar ao Estado, os ricos que
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exploram a miséria alheia em tempo de calamidade, os que tiram partido da sua situação
social ou oficial para se enriquecerem e se porem a coberto. Calvino entendia que estas
atitudes eram apropriadas para a Igreja pois reflectiam o ensino da lei de Moisés e do
ministério dos profetas, ao denunciarem a opressão social em Israel. Em quarto lugar, a
Igreja deveria recorrer à autoridade do Estado na aplicação de sanções disciplinares, e
solicitar do Estado as medidas necessárias para a manutenção da ordem e da justiça
social. Em resumo, o ideal reformado era este:
 Uma Igreja politicamente livre, inteiramente dependente da Palavra de
Deus, em um Estado que lhe respeite e lhe favoreça o ministério.
 Ministério Social o outro aspecto da responsabilidade social da Igreja era
a assistência social. A Igreja, segundo a teologia social de Calvino, deveria
envolver-se ela mesma no cuidado dos pobres, dos órfãos e das viúvas enfim, dos
necessitados. E isto sem fazer distinção entre os da igreja e os de fora. Ou seja, a
assistência social da Igreja deveria contemplar inclusive os estrangeiros e
refugiados que chegavam a Genebra.
Qual o órgão responsável pelo ministério social da igreja? O órgão encarregado
do ministério social da Igreja, diz Calvino, é o diaconato. Foi Calvino quem primeiro
resgatou esta função bíblica do ofício diaconal.
Ele ensinou que os diáconos eram ministros eclesiásticos, encarregados de toda a
assistência social da Igreja (Atos 6.1-7), e como tal, deveriam ser eleitos conforme as
regras estabelecidas por Paulo em 1 Timóteo 3.8-13. Até hoje em algumas igrejas
Reformadas a administração financeira da Igreja e o uso dos recursos para a assistência
aos pobres e necessitados é atribuição da junta diaconal.
As acções diaconais básicas na teologia social de calvino O diaconato, como
braço do ministério social da Igreja, se desenvolve em três acções básicas, segundo
Calvino:
1) Administração dos bens destinados à comunidade. A igreja recebia recursos
para a assistência social de duas fontes: a generosidade dos fiéis nas colectas levantadas
para este fim aos domingos, e o tesouro do Estado, através do Conselho de Genebra,
que votava verbas para este fim. Estes recursos eram recebidos e administrados pelos
diáconos.
18
2) Distribuição de forma justa e igual entre os necessitados. Os diáconos
cuidavam que todos os genuinamente carentes tivessem participação igual nos bens
destinados aos pobres. Num ambiente marcado pela opressão social e pelas
desigualdades, os diáconos certamente tinham muito trabalho a ser feito, e necessitavam
de muita sabedoria para faze-lo.
3) Visitação e cuidado dos doentes. As guerras, a falta de saneamento público, as
epidemias, a falta de assistência médica do Estado, e a pobreza, deixavam um saldo
enorme de pessoas doentes. O ministério dos diáconos incluía o cuidado para com estas
pessoas, utilizando-se quando necessário dos recursos da Igreja. Uma observação
importante. É necessário observar que no pensamento de Calvino o ministério social da
Igreja era de apoio ao Estado. Cabia ao governo civil cuidar dos pobres, doentes e
necessitados. Mas, como se tratava de uma tarefa de enormes proporções, a Igreja vinha
como apoio e auxílio, dando ela mesma assistência social onde necessário.
A Prática Social de Calvino em Genebra Persuadido por Farel, Calvino se deixa
ficar em Genebra para auxiliar nas reformas necessárias. Logo ficou claro que, para ele,
isto incluía ir além das reformas eclesiásticas. Debaixo de sua influência, a Igreja passa
a agir de forma marcante na vida social e política da cidade. Aquilo que ele expõe em
suas Institutas procurou aplicar de forma prática às necessidades de Genebra. O
diaconato é organizado e entra imediatamente em ação. O Hospital Geral, fundado por
Farel, dá assistência médica gratuita aos pobres, órfãos e viúvas, com médicos de
plantão pagos pelo Estado. É criada a primeira escola primária obrigatória da Europa.
Os refugiados chegados a Genebra recebem treinamento profissional e assistência
médica e alimentar, enquanto se preparam para exercer uma profissão. Os pastores
intercedem continuamente diante do Conselho de Genebra em favor dos pobres e dos
operários.
O próprio Calvino intercedeu várias vezes por aumentos de salários para os
trabalhadores. Os pastores pregavam contra a especulação financeira, e fiscalizavam
parcialmente os preços contra a alta provocada pelos monopólios. Debaixo da influência
dos pastores, o Conselho limita a jornada de trabalho dos operários. A vadiagem é
proibida por leis: vagabundos estrangeiros que não tem meios de trabalhar, devem
deixar Genebra dentro de três dias após a sua chegada. E os vagabundos da cidade
devem aprender um ofício e trabalhar, sob pena de prisão.
19
O Conselho institui cursos profissionalizantes para os vadios e os jovens, para que
eles possam entrar no mercado de trabalho. E finalmente é digno de nota que havia uma
vigilância da parte de Calvino e demais pastores de Genebra contra a má administração
pública. Houve inclusive o caso de um funcionário corrupto que foi despedido por
influência de Calvino. O próprio Calvino levava uma vida modesta, apesar de todo o
seu prestígio e influência. Na prática, procurou viver intensamente os princípios que
defendera em sua teologia social. A sua influência estendeu-se além do seu tempo.
A influência da teologia social de Calvino sobre os puritanos e as confissões de fé.
Os Puritanos, autores da Confissão de Fé de Westminster e dos dois Catecismos, foram
profundamente influenciados pelo ensino de Calvino, e sua teologia social não foi
excepção. No capítulo sobre o Magistrado Civil (Cap. XXIII) a Confissão de Fé
reflecte:
a) o ensino de Calvino sobre a vocação social e política dos cristãos (par. 2),
b) a independência da Igreja do Estado, para gerir seus próprios interesses,
c) e o dever do Estado de proteger a Igreja cristã (par. 3), d)o dever do Estado de
assistir e proteger os necessitados independentemente das convicções religiosas dos
mesmos (par. 3), e)bem como o dever dos cristãos de honrar e de submeterem-se ao
Estado (par. 4). Um outro exemplo são as contínuas referências à questões sociais e
económicas nestes símbolos da fé reformada. A exposição no Catecismo Maior do sexto
mandamento, "Não matarás", inclui como deveres exigidos "... a justa defesa da vida
contra a violência... o uso sóbrio do trabalho e recreios ... Confortando e socorrendo os
aflitos, e protegendo e defendendo o inocente". Como pecado, são incluídos "... a
negligência ou retirada dos meios lícitos ou necessários para a preservação da vida ... o
uso imoderado do trabalho .... a opressão .... e tudo que tende à destruição da vida de
alguém".
Conclusões
Augusto Nicodemos conclui esta discussão com duas observações sobre o ensino
social de Calvino. O Primeiro, a teologia social calvinista estava profundamente
enraizado em sua teologia e em sua interpretação das Escrituras. Era fruto de suas
convicções teológicas. Portanto, é impossível entender a reforma social que empreendeu
em Genebra sem os pressupostos da sua teologia.
20
Segundo, o pensamento social de Calvino tem produzido abundante fruto na
história da humanidade, após a Reforma. Muitas das universidades, escolas, e asilos de
que temos notícia foram fundados por calvinistas.
Boa parte das críticas feitas contra os calvinistas, de que são levados à inércia e
paralisia social por causa de sua ênfase na soberania de Deus em detrimento da
responsabilidade humana, simplesmente revela um desconhecimento (proposital?) dos
fatos e uma ignorância do que seja o Calvinismo.
E finalmente, cabe-nos perguntar em que sentido uma teologia social calvinista
poderia nos ajudar hoje, aqui e agora, a Sociedade Angolana? Evidentemente existem
profundas diferenças culturais, políticas e religiosas entre a Suíça do século XVI e o
Brasil do século XXI. Mas existem muitas semelhanças também, particularmente no
que se refere aos problemas sociais.
Além do mais, os princípios elaborados por Calvino para atender às questões
sociais e económicas são válidos para nós hoje, pois são bíblicos. Quer na Suíça
medieval, quer na sociedade angolana moderna, permanece como verdade imutável o
facto de que a raiz da opressão social é espiritual e moral, como Calvino apregoou. Bem
como o facto de que Jesus Cristo é o Senhor de todas as coisas, em todos os lugares, e
em todas as épocas, e que seu Reino se estende à política, à sociedade e à economia
tanto de genebrinos quanto de Angolanos. Assim, creio que a Igreja Protestante,
Evangélica, Metodista, Pentecostal, Aliancista e cristã em Angola (especialmente os
reformados) deveria envolver-se em todos estes aspectos, usando os meios apropriados,
lícitos e legais para protestar, advertir e resistir à injustiça social, usando a pregação da
Palavra para chamar ao arrependimento os governantes corruptos, os ricos opressores e
os pobres preguiçosos, e exercitando obras de misericórdia e assistência social através
de uma diaconia treinada e motivada.
Todo este envolvimento social deve acontecer sem perder de vista que a missão
primordial da Igreja é promover a reforma (parcial e provisória) da sociedade através da
proclamação do Evangelho de Jesus Cristo, aguardando os novos céus e a nova terra
onde habita a plena justiça de Deus.
Fonte: Calvino e a responsabilidade social da Igreja, Editora PES, 24 p,
10,5x18cm, A. N. Lopes.
II-CAPITULO: O LIBERALISMO TEOLOGICO E O NOVO
ORTODOXISMO DE KARL BARTH
21
2.1. O Liberalismo Teológico neste período
O que o liberalismo teológico não é? O liberalismo teológico não é uma religião
ou uma organização ideológica possuidora de templos, funcionários ou sociedades.
Porém, o que o liberalismo Teológico é? Ele é, simplesmente, uma tendência de ajustar
o Cristianismo aos conceitos da *Alta Crítica da Bíblia, da ciência e das filosofias
modernas. Esta tendência apresenta-se hoje sob diversos outros títulos, como
modernismo, racionalismo, nova teologia, etc.
2.1.1. O nascimento da Teologia Liberal
No centro dessa gama de teorias nasceu o movimento liberalista, hoje presente
nas artes, na música, nos costumes sociais e, como vimos, na própria Teologia. É ele o
principal responsável pelo relaxamento dos padrões éticos, em virtude da sua atitude
irreverente em relação à Divindade e das dúvidas acerca da inspiração das Escrituras,
que lança nos corações.
Sem a poderosa influência moralizadora da Palavra de Deus, os homens se
estupidificam, como descreve o apóstolo Paulo no capítulo 2 da sua Carta aos Romanos.
Em 1780, o hebraísta alemão Eichrodt aceitou a hipótese de Astruc e afirmou que os
referidos documentos tinham características, estilos e expressões distintas um do outro.
Igen, em 1798, também alemão, julgou ter descoberto, dentro do documento Eloísta do
Gênesis, diversas características de estilo e expressões. Por isso foi ele considerado o
descobridor do segundo documento Eloísta. Na Escócia, o padre católico romano,
Alexander Gaddas, anunciou ter encontrado no Pentateuco diversos documentos (1798-
1800).
2.1.2. Principais Teólogos da Teologia Liberal
Vejamos agora alguns nomes implicados no liberalismo teológico, responsáveis
pelos novos rumos tomados pelo protestantismo:
A. Friedrich Schleiermacher (1768-1834)
1. Teólogo e filósofo alemão, embora anti-racionalista, ensinou que não há
religiões falsas e verdadeiras. Todas elas, com maior ou menor grau de eficiência, têm
por objectivo ligar o homem finito com o Deus infinito, sendo o cristianismo a melhor
delas.
22
2. Ao harmonizar as concepções protestantes com as convicções de burguesia
culta e liberal, Schleiermacher foi considerado radical pelos ortodoxos, e visionário
pelos racionalistas. Na verdade, o seu pensamento filosófico-teológico, embora
considerado liberal, está mais perto do transcendentalismo de Karl Barth.
B. Johann David Michalis (1717-1791)
Teólogo protestante alemão, foi o primeiro a abandonar o conceito da inspiração
literal das Escrituras Sagradas.
C. Adoff Von Harnack (1851-1930)
Teólogo protestante alemão, defende em sua obra principal História dos
Dogmas: a evolução dos dogmas do cristianismo pela helenização progressiva da fé
cristã primitiva. Em outra obra, A essência do cristianismo, reduziu a religião cristã a
uma espécie de confiança em Deus, sem dogma algum e sem cristologia.
D. Albrecht Ritschl (1822-1889)
Ritschl ressaltou o conteúdo ético da teologia cristã e afirmou que esta deve
basear-se principalmente na apreciação da vida interior de Cristo.
E. David Friedrich Strauss (1808-1874)
Foi o teólogo alemão que maior influência exerceu no século XIX sobre os não-
teólogos e não-eclesiásticos. Tornou-se professor da Universidade de Tubingen com
apenas 24 anos. Quatro anos mais tarde, em 1836, foi furiosamente afastado do cargo
em virtude de sua obra, denominada Vida de Jesus, criticamente estudada.
2. No ano de 1841 lançou, em dois volumes, sua Fé Cristã - Seu Desenvolvimento
Histórico e seu Conflito com a Ciência Moderna. Nesta obra está negando
completamente a Bíblia, a Igreja e a Dogmática. Em 1864 publicou uma segunda Vida
de Jesus, quando procurou então distinguir o Jesus histórico do Cristo ideal segundo a
maneira típica dos liberais do século XIX. Em sua A Antiga e a Nova Fé, publicada em
1872, adopta a evolução darwiniana em contraste com a fé bíblica.
3. Para Strauss, Jesus é mero homem. Insiste em que é necessário escolher entre
uma observação imparcial e o Cristo da fé. Ensinou que é preciso julgar o que os
Evangelhos dizem de Jesus pela lei lógica, histórica e filosófica, que governa todos os
23
eventos em todos os tempos. Não achou e não procurou um âmago histórico, mas
interessou-se apenas em mostrar a presença e a origem do mito nos evangelhos.
4. Seu conceito do mundo é o de matérias subindo para formas cada vez mais
altas. À pergunta: "Como ordenamos nossas vidas?" - Responde: autodeterminação,
seguindo a espécie.
5. Nas obras de Strauss não há lugar para o sobrenatural. Os milagres são mitos,
contados para confirmar o papel necessário de Jesus, daí as referências ao Velho
Testamento. Em resumo, Jesus é uma figura histórica. Da vida de Jesus nada sabemos,
sendo tudo mito e lenda.
6. Considerado o mais erudito entre os biógrafos infiéis de Jesus, Strauss encerra
o último capítulo da sua segunda Vida de Jesus com estas palavras:
"...aparentemente aniquilaram a maior e mais importante parte daquilo que o cristão se
acostumou a crer concernente a Jesus; desarraigaram todos os encorajamentos que ele
tem tirado de sua fé e privaram-no de todas as suas consolações.
Parece que se acham irremediavelmente solapados os inesgotáveis depósitos de
verdade e vida que por dezoito séculos têm sido o alimento da humanidade; o mais
sublime atirado ao pó, Deus despido de sua graça, o homem despojado de sua
dignidade, e o laço entre o céu e a terra rompido. Recua a piedade em horror diante de
um ato tão temeroso de profanação, e, forte como é na impregnável evidência própria de
sua fé, ousadamente conclui que - não importa se um criticismo audaz tentar o que lhe
aprouver tudo o que as Escrituras declaram e a Igreja crê acerca de Cristo subsistirá
como verdade eterna; nem sequer um jota ou um til será removido."
7. Philip Schaff comenta que Strauss professa admitir a verdade abstracta da
cristologia ortodoxa, "a união do divino e humano, mas perverte-a, emprestando-lhe um
sentido puramente intelectual, ou panteísta. Ele nega atributos e honras divinas à
gloriosa Cabeça da raça, mas aplica os mesmos atributos a uma humanidade acéfala.
Destarte, ele substitui, partindo de preconceitos panteístas, uma viva realidade por
uma abstracção metafísica; um fato histórico por uma mera noção; a vitória moral sobre
o pecado e a morte por um mero passo na filosofia e em artes mecânicas; o culto do
único vivo e verdadeiro Deus por um culto panteísta de heróis, ou própria adoração de
24
uma raça decaída; o pão nutriente por uma pedra; o Evangelho de esperança e vida
eterna por um evangelho de desespero e de final aniquilamento."
F. Sorem Kierkegaard (1813-1855)
1. Teólogo e filósofo dinamarquês. Filho de um homem rico torturado por dúvidas
religiosas e sentimentos de culpa, Kierkegaard adquiriu complexos de natureza
psicopatológica e possíveis deficiências somáticas. Estudou teologia na universidade de
Copenhague, licenciando-se em 1841.
2. Atacou a filosofia de Hegel e afastou-se mais e mais da Igreja Luterana, por
julgá-la muito pouco cristã. Para o teólogo dinamarquês, entre as atitudes (fases)
estética, ética e religiosa da vida, não há mediação, como na dialéctica de Hegel, e não
há entre elas transição, no sentido de evolução. Para chegar da fase estética à fase ética
ou desta à religiosa é preciso dar um salto (ser iluminado, converter-se
instantaneamente) que transforme inteiramente a vida da pessoa.
3. Para Kierkegaard, só o cristianismo é capaz de vencer heroicamente o mundo,
sendo o panteísmo cultural de Hegel impotente contra a consciência do pecado e contra
o medo e temor. Criticou o hegelianismo em sua acomodação ao mundo profano, por
não ser capaz de eliminar a angústia e admitir a existência de contradições irresolúveis
entre o cristianismo e o mundo, cabendo ao homem escolher existencialmente entre esta
e aquela alternativa: ser cristão ou ser não-cristão.
4. São profundos os conceitos de Kierkegaard sobre os estágios da vida, a
diferença entre ser e existir, o subjectivo e o objectivo, o desespero, os critérios
positivos para a verdadeira existência, etc.
Eis alguns deles:
a. No estágio estético, o homem leva uma existência imediata e não reflectiva,
faltando a diferenciação entre ele e o seu mundo; No estágio ético, o homem assume a
responsabilidade pelo seu próprio ser, procura alcançar-se a si - o que não pode fazer;
No estágio religioso, reconhece a impossibilidade de viver conforme gostaria e descobre
que o pecado é não ser o que Deus deseja que seja, e que só se alcança este estado
proposto por Deus através de algo que vem de fora - o próprio Deus;
b. O tempo (e espaço) trata do que o homem é, da sua existência; a eternidade
significa que, embora o homem viva no tempo e no espaço, ele não está totalmente
determinado por estes elementos; a existência fala de liberdade, possibilidade, do ideal,
da obrigação; o momento de decisão é quando a eternidade intercepta o tempo;
25
c. O objectivo cultural é aquilo que é, enquanto o homem fica entre o que é e o
que ele pode e deve ser. A ciência limita-se ao estudo do que é, ao que ela chama "a
verdade"; mas os fatos claramente aceitos jamais encerram a verdade;
d. A essência do ser humano aparece quando traz a eternidade para dentro do
tempo. Cada homem há de sofrer porque vive numa realidade muito física: liberdade
versus tempo;
e. O único que realmente resolveu o paradoxo do tempo e da eternidade foi Jesus
Cristo. Ele mesmo foi um paradoxo: Deus e homem; limitado e ilimitado; ignorante e
conhecedor de tudo.
5. S. Kierkegaard, redescoberto na Alemanha por volta de 1910, é considerado o
precursor da teologia transcendental, de que Karl Barth, no século XX, é o principal
representante.
2.2. Principais Doutrinas Liberais, Exame Crítico
1. Foi a partir de meados do século XIX, como consequência da grande vitalidade
intelectual e reorientação do pensamento, que nasceu a teologia liberal. Foi esta uma
época de renascimento religioso em geral e, em particular, de expansão do
protestantismo, institucional e geográfica mente, caracterizada pelas missões e
surgimento das sociedades bíblicas.
2. O liberalismo teológico, em sua essência, procura libertar as consciências
cristãs das suas amarras escolásticas, apontando-lhes as exigências da razão. Realça a
pessoa de Deus como a fonte de toda a verdade e enfatiza a necessidade de uma certeza
sincera na busca da verdade, embora reconheça a impossibilidade do ser humano
alcançar um conhecimento pleno da verdade absoluta.
3. A maioria dos teólogos da actualidade considera hoje insustentável essa
premissa liberalista de que o espírito humano não possa mover-se em regiões para além
do alcance dos sentidos, além do raciocínio meramente racional. Para Platão, o intelecto
tem ideias supersensíveis, inexplicáveis à luz da razão, sendo que é neste reino que
residem os característicos principais e distintivos da alma humana. Modernamente, é
cada vez maior o número dos que conhecem uma área essencialmente metafísica,
portanto fora do alcance dos meios físicos, na qual o espírito obedece às leis de sua
própria natureza.
4. Segundo os teólogos liberais, o protestantismo precisa "incorporar à sua
teologia os valores básicos, as aspirações e as atitudes características da cultura
26
moderna, ressaltando, dentre outros, o imperativo ético do Evangelho." (Enciclopédia
Mirador). Dessa pregação nasceu o evangelho social, onde a mensagem de Cristo deixa
de ser o poder de Deus para a salvação e regeneração do homem, para tornar-se apenas
uma fórmula social, impotente. "A Igreja transcende os métodos e as fórmulas humanas.
Ela produz aquela vida plena de riqueza, que é o espírito livre e nobre em acção; pensa
os melhores pensamentos; aceita os mais elevados ideais e os reveste de uma linguagem
irresistível.
Assim ela infunde um poder criador na sociedade de espíritos humanos... Não há
fórmula suficiente boa para tornar boa uma sociedade, se não for executada por homens
bons. O cristianismo não elabora fórmulas, mas cria os homens capazes de insuflar
força moral em qualquer fórmula" (Lynn Harold Hough).
5. O movimento liberalista não reivindicou apenas amplas liberdades para o
exercício da razão, mas pregou a tolerância entre as denominações protestantes,
aproximando-as, através da minimização das diferenças doutrinárias.
6. O ressurgimento da intolerância religiosa no seio do catolicismo romano, nas
primeiras décadas do século passado, o que resultou na prisão e morte de protestantes
em diversos países, especialmente na Estónia, Lituânia, Letónia, Turquia, Pérsia,
Portugal e Espanha, contribuiu também para aproximar entre si as denominações
evangélicas. A organização, em 1846, da Aliança Mundial Evangélica, em Londres, foi
uma resposta ao estado de insegurança em que se achavam várias correntes do
protestantismo. Essa Aliança muito fez pela liberdade de culto em todo o mundo.
7. Mas o espírito liberal reclama ainda respeito pela ciência e pelos métodos
científicos de pesquisas, o que implica na aceitação franca do estudo, tanto do mundo
material como da crítica bíblica e da história da Igreja. Foi, valendo-se desse estado de
espírito favorável, que Darwin publicou a sua célebre obra As Origens das Espécies
através de meios de selecção natural, em 24 de Novembro de 1859, que provocou
violentas e intermináveis polémicas.
8. O liberalismo teológico aceita também o princípio da continuidade, ou seja,
considera mais importantes as semelhanças do que os contrastes, admitindo-se a ideia
da evolução para superar os abismos existentes entre o natural e espiritual, entre o
homem e seu Criador, enfatizando mais a imanência do que a transcendência de Deus; o
liberalismo prega ainda a confiança do homem no futuro, gerada pelas grandes
conquistas em todos os campos da ciência.
27
9. Não há dúvida de que o sonho liberalista do século passado mostra a cada dia
mais impossibilidade de materializar-se. A teoria da evolução está hoje negada pelos
principais cientistas, e as conquistas da ciência moderna têm trazido, ao lado do seu
inegável progresso, resultados catastróficos. A confiança do homem no futuro
desvanece-se hoje à luz dos factos actuais e a exemplo de amargas experiências
recentes.
Quanto à imanência de Deus, sugere esta ênfase que a Divindade está identificada
com a totalidade das existências, afirmando, panteisticamente, que tudo é Deus e Deus é
o tudo. Elimina-se, destarte, toda a concepção da personalidade divina e, em
consequência, considera-se o homem um irresponsável. Quando se nega o conceito de
Deus, como o Criador omnipotente que está acima de todas as coisas que criou, corre-se
o risco de cair no fatalismo, característico dos cultos orientais e, infelizmente, em
expansão no Ocidente. Sinais da presença do fatalismo em nossos dias são os
horóscopos, o fetichismo e até mesmo os biorritmos, rejeitados como anticientíficos por
grande número de médicos renomados.
10. Ainda em relação à ênfase dada pelo liberalismo à imanência de Deus em
tudo, há uma implicação séria, quando se trata do problema do pecado.
Despersonalizando a divindade, é o homem colocado no centro de tudo, como a medida
de tudo. Isso significa que o fim do homem é estar satisfeito consigo mesmo, com seus
horizontes etc. O Dr. John A. Mackay afirma que o pecado, como factor na existência
humana, é terrivelmente real, e é coisa que os filósofos balconizados sempre trataram de
fazer desaparecer por meio de argumentos arrazoados. Com a expressão balconizados
fazia ele referência a Aristóteles e Renan, como símbolos daqueles para quem "a vida e
o universo são objectos permanentes de estudo e contemplação".
2.2.1. Outras Doutrinas Liberais
Nessas doutrinas afirma-se que:
1. Os credos primitivos são arcaicos e sem realidade para o mundo moderno.
2. A mente do homem é capaz de raciocinar segundo os pensamentos de Deus.
3. A mente deve estar aberta à verdade independentemente da fonte.
4. As doutrinas cristãs são símbolos de verdades racionais conhecidas pela razão
humana.
5. A divindade de Jesus era uma declaração simbólica do fato de que todos os
homens possuem um aspecto divino.
28
6. 0 conceito bíblico da revelação de Deus na história era ingênuo e pré-filosófico.
7. Os itens "4', "5" e "6" do parágrafo anterior sofreram influência do idealismo
absoluto de Hegel e Letze. Os demais itens justificam plenamente alguns dos títulos do
liberalismo: modernismo e racionalismo.
8. Como vimos, para o liberalismo Deus está presente em todas as fases da vida e
não apenas em alguns eventos espectaculares. Assim, o método de Deus é o caminho da
mudança progressiva e da lei natural, e o nascimento virginal de Cristo não condiz com
a realidade, pois Deus está presente em todos os nascimentos.
9. Defendendo assim a imanência de Deus, o liberalismo podia aceitar a teoria da
evolução, não negando a Deus, todavia, um ato criador, ou seja: Ele teria criado a
primeira célula viva, da qual vieram todos os seres viventes, inclusive o homem.
10. O liberalismo reage contra um evangelho individualista, capaz de salvar o
homem do inferno e não da sociedade corrompida, e insiste em que o reino de Deus não
é além-túmulo e nem milénio, mas sim a sociedade ideal edificada pelo homem com o
auxílio de Deus.
11. Na busca duma "sociedade ideal" muitos teólogos se têm inclinado para uma
espécie de socialismo cristão, envolvendo-se em movimentos subversivos por
acreditarem que as doutrinas de Marx e Engels, se destituídas de seu ateísmo, estariam
em melhores condições de atender aos reclamos dos povos pela justiça social de que a
própria mensagem evangélica.
2.3. O Novo Ortodoxismo de Karl Barth
Esta teologia é comumente conhecida por barthianismo, por ter como seu
principal autor Karl Barth (1886-1968), considerado o maior teólogo do século XX.
Este sistema possui ainda vários outros nomes: teologia dogmática, teologia da crise,
neo-ortodoxia, teologia transcendental, modernismo-negativista e teologia de Lund.
2.3.1. Alguns dados sobre Karl Barth
Karl Barth nasceu na Suíça, leccionou teologia nas universidades de Gottingen,
Munique e Bonn, mas foi demitido deste último posto pelo governo hitlerista, em 1935.
E, por resistir às tentativas do ditador de nazificar a Igreja Reformada da Alemanha,
teve seus diplomas de teologia anulados. Com a derrota do nazi-fascismo, recupera sua
29
cátedra em Bonn, de onde mais tarde se transfere para Basiléia. Aposentou-se em 1961
e iniciou a elaboração da sua teologia.
2.3.2. O pragmatismo e a teologia dialéctica de Karl Barth
Barth abandonou o terreno firme da lógica e ingressou no mundo fabuloso do
pragmatismo, doutrina que considera a acção superior ao pensamento e aceita o valor
prático como critério da verdade. Hegel passou a aceitar que a presença da verdade está
na verdade na síntese, que corresponde ao grau intermediário entre a tese e a antítese.
Barth, ao aplicar esta fórmula ao cristianismo histórico, considerou-o como a tese, o
modernismo como a antítese e o novo modernismo como a síntese.
Dentro de um esquema teológico dialéctico coexistem pacificamente doutrinas
antagônicas: o certo e o errado, a verdade e a mentira. Daí a teologia de Barth pode ser
também denominada de teologia dialéctica ou da crise. Violando dessa maneira as
regras pelas quais se estabelece se uma tese é verdadeira ou não, o barthianismo acabou
negando o carácter absoluto da verdade.
2.3.3. A teologia de Karl Barth manteve alguns pontos de
vista ortodoxos
Não se pode deixar de reconhecer que, sob vários aspectos, a teologia de Barth
foi um retorno, embora aparentemente, às várias doutrinas bíblicas desprezadas pelo
liberalismo, como a Trindade, o nascimento virginal de Cristo, as duas naturezas de
Cristo unidas numa só pessoa, conforme aceita pelo Concilio de Calcedônia (ano 451) e
pela Reforma Protestante, a salvação somente pela graça e a justificação unicamente
pela fé.
Em virtude destes pontos de vista, foi o barthianismo chamado também de
neomodernismo e neo-ortodoxia. A respeito da pessoa de Jesus, é interessante ler o que
Barth escreveu em 1960, em um tempo de revisão da sua própria teologia: e de forma
consequente, em todos os seus enunciados, directa ou indirectamente, doutrina de Jesus
Cristo como da palavra viva de Deus dita a nós. Portanto, observamos que na teologia
de Karl Barth, procurou-se preservar a cristologia.
30
2.3.4. Algumas Falhas Da Teologia De Barth
Mas a teologia de Barth possui falhas seríssimas: a Bíblia não é a Palavra de
Deus, apenas a contém. Por isso pode ela ser criticada à vontade. Estabelece um falso
contraste entre a autoridade espiritual da Igreja, por ele aceita, e a sua autoridade legal,
que rejeita. Assim, deixou a porta aberta à discussão acerca de doutrinas.
Segundo esta teologia transcendental, o mundo está cheio de contradições,
inclusive na religião. Por isso os seguidores desta escola admitem sistemas que se
excluem mutuamente. Um dos seus líderes declarou: Em face do modernismo e da fé
histórica, não se deve dizer um ou outro, mas um e outro. Isto equivale a aceitar a
doutrina de que Jesus é o único mediador entre Deus e o homem e ao mesmo tempo
admitir a mediação de Maria.
Um transcendentalista, portanto, assemelha-se a um balconista que vende
exactamente o produto que o freguês deseja, seja este freguês cristão histórico ou
liberal.
2.4. O desabafo de Francis A. Schaeffer
Francis A. Schaeffer narra o desabafo de um ateu sueco, Dr. Hedeinus, professor
de Filosofia da Universidade de Uppsala, que chamou os teólogos transcendentalistas de
"ateus, disfarçados em bispos e pastores: o cristianismo, não o quero; os seus conceitos
não são nem claramente definidos, nem mesmo definíveis; a posição dos seus
defensores é mais vacilante do que a minha."
2.5. Emil Brunner - Cristo Absoluto ou relativo?
Emil Brunner (1889-1966). Teólogo suíço; exerceu grande influência no
protestantismo dos Estados Unidos, país onde proferiu diversas preleções. Suas obras
foram traduzidas para o inglês antes mesmo que as de Barth. Sintese do pensamento
teológico de Brunner A teologia de Brunner, também conhecida por "dialética" e "da
crise", descreve a busca da verdade por meio de debates entre as posições contrárias.
Brunner acha que há alguma revelação fora da Bíblia, embora não acredite que a
teologia natural inclua a teologia revelada, discordando nesse ponto do liberalismo de
Barth. Entende que a Bíblia é o único critério pelo qual podemos julgar a verdade e a
31
suficiência do conhecimento acerca de Deus, que se encontra em outros lugares.
Diferentemente de Barth, Brunner admite que se pode achar verdade no filósofo, no
ateu ou no adepto de seitas não cristãs, assim estabelecendo diálogo com eles, mas
reconhecendo que eles não podem possuir suficiente e completo conhecimento
verdadeiro de Deus. A teologia Brunniana e Jesus Na teologia brunniana, o dogma de
Jesus sem pecado é acto de fé e não base de fé. "Cremos que ele é sem pecado por
crermos nele. Não é que cremos nele por causa de Ele ser sem pecado." Brunner nega,
além de outros, o nascimento virginal de Cristo, os 40 dias pós-ressurreição, e a
ascensão física do Senhor. As questões acima apresentam implicações seríssimas: ao
admitir que Jesus Cristo pode ser conhecido historicamente, Brunner faz perder tudo.
Na teologia de Brunner, A relação do homem com Deus não pode ser expressa em
termos racionais e lógicos, mas apenas em termos de mitos; Qualquer tentativa para
provar a revelação está errada;
Acerca do pecado, nega a herança de culpa de Adão, aceitando apenas a queda
individual; O cristão deve ser um eterno revolucionário, não se conformando com as
reformas sociais, sempre imperfeitas; O amor de Cristo revela o amor humano, que é
possibilidade impossível; A queda não modificou a natureza e estrutura essenciais do
homem, assim como a cegueira não retira o olho do corpo; No momento em que a
pessoa se transcende, surge a memória da perfeição original.
III- CAPITULO: NOVAS CORRENTES TEOLOGICAS
3.1. A Teologia Do Mito
A teologia do mito tem como um de seus principais criadores o teólogo alemão
Rudolf Bultmann (1884-1976), que em 1941, numa conferência intitulada "O Novo
Testamento e a Mitologia", disse que esta parte das Escrituras está cheia de mitos à luz
dos quais se deveriam examinar a pessoa de Cristo e o comportamento da Igreja
apostólica.
3.1.1. A visão do Bultimann dos escritores do NT
Para Bultmann, todos os escritores do Novo Testamento pensavam e escreviam
tendo em vista uma visão global do mundo antigo, no qual havia três divisões: a
32
superior ou invisível, habitada pelos anjos, o mundo sobrenatural de Deus; o mundo
inferior, escuro, habitado pelos demónios; e o nosso mundo, que fica entre os outros
dois. Segue-se, portanto, que a revelação vem em símbolos que devem ser
decodificados. Para usar o termo de Bultmann, devem ser desmitologizados.
Numa de suas conferências, afirmou Bultmann que hoje "não se pode utilizar a luz
eléctrica e os aparelhos de rádio, apelar para medicamentos e clínicas modernas quando
se está enfermo, e ao mesmo tempo crer nos milagres do Novo Testamento."
De acordo com essa visão, pode-se crer em Jesus Cristo e aceitá-lo como Deus e
Salvador sem a necessidade de acreditar no nascimento virginal, na encarnação, no
túmulo vazio, na Ressurreição e na segunda vinda. Todos estes elementos seriam
derivados da mitologia judaica e do gnosticismo helenístico.
Segundo Bultmann, a desmitificação dos evangelhos não significa a eliminação
do mito, como procurou fazer a teologia liberal, mas a sua interpretação através de uma
hermenêutica particular, sendo eles necessários por oferecerem ao homem condições de
perceber o enigmatismo do mundo. Assim, através da sua reinterpretação, o mito seria
utilizado como instrumento auxiliar na compreensão da existência humana.
O que é a desmitologização que Bultmann propõe? Em seu questionamento sobre
as escrituras, há a necessidade de extrair todo o elemento mitológico, que segundo ele,
encobre o entendimento das sagradas escrituras para o homem moderno.
Vê na desmitologização, um instrumental importante para a actualização da
mensagem bíblica tornando-a compatível com o mundo tecnológico e cientifico que
vivemos hoje.
O homem/mulher moderno, embora seja um ser que viva em uma sociedade de
muitos símbolos e sinais, precisa descodificar o significado desta vasta simbologia.
Carece de um tradutor ou seja, necessita de uma ferramenta que actualize a linguagem
mitológica das Sagradas Escrituras, vigentes à época, para o código de linguagem e a
cultura dos nossos dias.
Segundo Bultmann, o uso do processo da desmitologização das Escrituras elucida,
esclarece e traz nitidez ao leitor, acerca do que realmente a mensagem bíblica quer nos
dizer hoje em dia.
Pois para o homem/mulher secularizado os elementos mitológicos das escrituras,
fruto de uma cultura passada há quase dois mil e quinhentos anos não fazem nenhum
sentido. Devem ser extraídos, sem a perda do conteúdo original, pois sem uma
33
decodificação e uma actualização do sentido, a mensagem não nos diz o porquê, ou pior
ainda, pode levar a uma interpretação dúbia e incompreensível.
A Escritura não explica a si mesma, conforme ensina a hermenêutica da Reforma
Protestante, mas está sujeita aos métodos modernos da ciência autónoma e às
pressuposições filosóficas;
3.1.2. Exame Crítico Da Teologia De Bultmann
Bultmann rejeita, por considerá-los mitológicos:
1) Os conceitos neotestamentários de que o reino escatológico está prestes a
irromper na história;
2) de que o mundo actual está governado por elementos demoníacos
3) e de que o sobrenatural intervém no mundo, manifestando-se através de
milagres. Na sua reinterpretação do evangelho, elimina o sentido original dos termos
encontrados no NT e os recria adoptando uma nova significação.
Ex. Segundo a visão tradicional, o problema do homem é o seu pecado, segundo o
Evangelho, e a solução é o sacrifício de Cristo. Para Bultmann, tal problema é a sua
finitude. O uso da filosofia contemporânea para formular a fé cristã pode distorcer o
ensino cristão, introduzindo ideias estranhas ao Cristianismo através da reinterpretação
da terminologia tradicional, e acomodar a fé cristã à filosofia tradicional; Ao ensinar
que a teologia existencialista é antropocêntrica, concorda com Fenerbach de que a
teologia tornou-se antropologia; Depois do programa de desmistificação dos
evangelhos, o Jesus que sobra é tão débil que jamais chamaria a atenção de alguém, e
muito menos motivaria a sua lealdade.
Um Jesus assim insignificante tem sido o tema de peças teatrais profanas e
irreverentes, como a "Jesus Cristo Superstar", na qual Judas Iscariotes é o verdadeiro
herói e Cristo não passa de uma figura covarde, que duvida a todo momento da sua
missão; Bultmann ignora por completo o papel do Antigo Testamento na formação do
Novo, ao considerar este eivado de mitos e influenciado pelo gnosticismo ou helenismo;
A "Sola fide" de Bultmann nada tem de semelhante à de Lutero, que se baseava no
testemunho bíblico.
34
3.2. A Teologia da Esperança2
A teologia da esperança tem sido articulada nos Estados Unidos por dois teólogos
luteranos, Carl Braaten e Robert Jenson, as suas obras tem como objectivo popularizar o
novo movimento.
Jürgen Moltmann nasceu em 18 de abril de 1926 em Hamburgo.
Iniciou seus estudos de teologia numa situação inusitada. Com dezesseis (1943) foi reira
Após seis meses na guerra, foi feito prisioneiro no campo de concentração de Northon-
Camp, na Inglaterra. Ali se encontravam também alguns professores de teologia que
ministravam lições aos seus companheiros; dentre eles, Jürgen Moltmann.
Em 1948 retornou para Alemanha onde deu continuidade nos seus estudos na
Universidade de Göttingen até 1952. De 1953 a 1958 exerceu actividades pastorais em
Bremen.
Suas especialidades foram: História dos Dogmas e Teologia Sistemática, iniciou sua
docência em 1958 passando pela Escola Kirchliche Hochschule de Wuppertal, pela
Universidade de Bonn, Universidade de Tübingen, Due University - EUA (no carácter
de professor visitante). Depois de Karl Barth, Jurgen Moltomann é considerado o mais
conhecido e influente teólogo reformado do século XX" (LEITH, 1997, p.234).
No Brasil, Rubem A. Alves, com umas poucas revisões dele mesmo, muita coisa
fez para converter a teologia da esperança em programa de acção. Às vezes essa
teologia era chamada de futurologia...
Porque? Por ser um modo de encarar a teologia e as preocupações teológicas da
perspectiva do futuro e não do passado ou do presente.
O passado e o presente somente têm valor com referência ao futuro. A realidade
ainda não é; está orientada para o futuro.
A questão da existência de Deus pode ser respondida somente no futuro, pois
Deus está sujeito ao tempo enquanto este se esforça em direcção ao futuro.
A teologia da esperança é caracterizada... como uma reacção ao desespero
existencialista, pela fé no futuro e pelo optimismo, a esperança baseia-se na promessa
divina e o cristão suporta as contradições do presente porque vive na expectativa do
futuro. Não enxergar uma solução para seus dilemas presentes. Assim, a teologia da
esperança acha que não podemos encontrar respostas para as nossas questões atuais na
2
https://teologiacontemporanea.wordpress.com/2009/10/07/teologia-da-esperanca-jurgen-moltmann-e-a-
analise-escatologica-existencial/, pag. Consultada aos 02/05/2014
35
sociedade de hoje. Abrange mais do que geralmente se reconhece tradicionalmente
como sendo teologia, falando a rigor. Sua orientação secular permite que seja
combinada com qualquer número de matérias, inclusive a política e a biologia. A
teologia da esperança vê um esboço para sua exposição nas temáticas escatológicas. Ela
entende a realidade a partir de uma perspectiva escatológica.
O movimento também é chamado de teologia futurista. A teologia da esperança
reage contra o subjectivismo da neo-ordoxia, visto que sua abrangência vai além do
universo pessoal e interior de individuo. Esta teologia se dirige ao mundo como mundo.
A teologia da esperança foi a resposta do público a teorias como a que Deus está morto,
ideia que foi criada na década 60. Os teólogos futuristas deixaram para trás o sepulcro
criado para Deus. O humanismo dos teólogos de Deus-está-morto veio a ser a
sementeira em que a teologia da esperança deitaria raízes.
3.2.1. Entendendo a teologia futurista de Moltmann.
A chave central para entender a teologia futurista de Moltmann é a sua ideia de
que Deus está sujeito ao processo temporal. Neste processo, Deus não é plenamente
Deus, porque ele é parte do tempo que avança para o futuro. No cristianismo
tradicional, Deus e Jesus Cristo aparecem fora do tempo, no atempo. Na teologia de
Moltmann, a eternidade se perde no tempo.
Para Moltmann, o futuro é a natureza essencial de Deus. Deus não revela quem
ele é, e sim quem ele será no futuro. Desta forma, Deus está presente apenas em suas
promessas. Deus está presente na esperança. Todas as afirmações que fazemos sobre
Deus, são produto da esperança. Nosso Deus será Deus quando cumprir suas promessas
e com isso estabelecer o seu reino. Deus não é absoluto; ele está determinado pelo
futuro.
Segundo Moltmann, toda teologia cristã deve modelar-se através da escatologia.
Acontece que a escatologia para ele não significa a previsão tradicional da segunda
vinda de Jesus. Moltmann interpreta como aberta ao futuro, aberta à liberdade do futuro.
Deus entrou no tempo, e consequentemente o futuro se tornou algo desconhecido tanto
para o homem como para Deus.
36
O cristianismo evangélico relaciona intimamente a ressurreição de Cristo com a
escatologia. O Cristo ressuscitado é “as primícias” da ressurreição (1Coríntios 15.23;
Act. 4.2). A morte e ressurreição de Cristo são a garantia que Deus dá de que haverá
Ressurreição futura, e por isso, o começo da Ressurreição final. A Ressurreição de
Cristo é um facto histórico que atribui pleno significado ao nosso futuro. Porém, para
Moltmann, a questão da historicidade da Ressurreição corporal de Jesus não é válida.
Jesus ressuscitou dentre os mortos há quase dois mil anos com seu corpo físico? Para
Moltmann essa é uma questão sem importância. Não devemos olhar desde o Calvário
para a Nova Jerusalém, e sim olhar o nosso futuro ilimitado para o Calvário. Afirma-se
tradicionalmente que a Ressurreição de Cristo é a base histórica da Ressurreição final.
Moltmann porém diria que a ressurreição final é a base da ressurreição de Jesus.
Ainda quanto ao futuro, Moltmann diz que o homem não deve olhá-lo
passivamente; ele deve participar activamente na sociedade. A tarefa da Igreja não é
apenas de se informar sobre o passado para mudar o futuro. É também “pregar o
Evangelho de tal forma que o futuro se apodere do indivíduo e lhe impulsione a agir de
modo concreto para mudar o seu próprio futuro. O presente em si mesmo não é
importante. O importante é que o futuro se apodere da pessoa no presente”.
Para que o futuro se realize na sociedade, as categorias do passado devem ser
descartadas, pois não existem formas ou categorias fixas no mundo. O futuro significa
liberdade e liberdade é relatividade.
O principal propósito da Igreja é ser o instrumento por meio do qual Deus trará a
“reconciliação universal e social”. A participação da Igreja na sociedade poderá utilizar
a revolução como meio apropriado, mesmo que ela não seja necessariamente o único
meio. Neste avanço para o futuro, o problema da violência versus não-violência recebe
o nome de “problema ilusório”. A questão não é a violência em si, mas sim se o uso da
violência foi justificado ou injustificado. Essa tendência pragmática em que os fins
justificam os meios é uma tendência muito forte dentro da Teologia da Esperança.
Assim como na “Teologia Secular”, aqui também pode ser vista uma profunda
consciência para com o mundo. A ideia de Moltmann de considerar a Bíblia desde o
começo como um livro escatológico pode parecer um atractivo para o cristão ortodoxo.
Realmente um assunto tão importante quanto a escatologia não deveria ocupar as
37
últimas páginas em nossos livros de teologia sistemática. Porém, qualquer conservador
certamente saberá reconhecer os erros patentes de Moltmann, bem como os horrores
que trariam a sua visão ética.
3.2.2. Objecções à Teologia da Esperança.
Moltmann critica muitos conceitos neo-ortodoxos, mas ele acaba levando os
conceitos barthianos muito mais longe. Barth havia transcedentalisado a escatologia por
meio do emprego da distinção entre Historie e Geschichte, mas Moltmann foi ainda
mais além, e rejeitou todo o conceito objectivo da história. Se por um lado a dialéctica
de Barth acabou com a possibilidade da relação entre história e fé, a teologia de
Moltmann destruiu até mesmo a possibilidade de haver história.
Ainda que Moltmann revista sua escatologia de conceitos bíblicos, seu sistema
está mais fundamentado no marxismo do que em Cristo. O primeiro livro de Moltmann,
“Teologia da Esperança” nasceu de um diálogo com o ateu alemão Ernst Bloch, e
quando lemos o seu segundo livro, vemos que nesse intercâmbio, Moltmann assimilou
muitas ideias de Bloch.
A ideia que Moltmann tem da escatologia é destituída de base bíblica. Apesar de
todo esforço de Moltmann para produzir uma teologia bíblica, no final, seu sistema nada
mais é do que uma teologia centralizada no homem, em um homem que observa o
futuro e age na sociedade. A meta do futuro de Moltmann não é a plena manifestação da
glória de Cristo; ela é a edificação da utopia na terra. Para ele, o Reino de Deus se
introduz na terra por meio da política e da revolução. Para o apóstolo Paulo, no entanto,
o Reino de Deus é, e será introduzido por meio da proclamação do poder salvador de
Jesus Cristo (Actos 28.30-31). Para Moltmann, esse reino é também uma realidade
terrena e tangível; o Reino de Deus, no entanto, é descrito na Bíblia como celestial. Para
Moltmann, o Reino de Deus é trazido por meio da revolução; no entanto, segundo a
Bíblia, o Reino de Deus traz a paz, e não a guerra (Romanos 14.7).
Quanto ao conceito de Deus, ele não admitia nenhum Deus eterno ou infinito. Ao
entrar no tempo, segundo ele, Deus se tornou finito e aberto a um futuro desconhecido.
O Deus da Bíblia existe de eternidade a eternidade; o de Moltmann, porém, só existe no
futuro, pois no presente ele sequer é Deus. Como observou certo escritor: “No monte
38
sinai, Deus disse a Moisés: Eu sou o que sou, mas Moltmann não permitua que Deus lhe
dissesse o mesmo.
A teologia de Moltmann tem maior dívida com Nietzche, com Overback e com
Feurbach do que com Paulo, Pedro ou João. Ela é mais marxista que bíblica, e mais
filosófica que teológica. Em seu afã de refutar as teologias não-ortoxas do seu tempo,
Moltmann ultrapassou o limite do bom senso e acabou por propor uma teologia quase
tão nociva quanto aquela a que ele se dedicou a refutar. Essa teologia do Deus finito e
temporal, e que ainda incita a rebeldia e a revolução, não pode ser teologia bíblica. Ela é
antes, um tropeço, um escândalo e uma nociva ameaça à sã doutrina.
IV- CAPITULO: AS TEOLOGIAS SOCIAIS
Na teologia social é ressaltado do conteúdo ético e social da Igreja. Portanto, nas
teologias sociais, analisamos as seguintes questões:
Qual é a realidade social na qual está inserida a igreja?
Qual o papel da igreja junto aos problemas encontrados na sociedade?
Como a Igreja pode ser um instrumento de transformação social?
4.1. É boa a aproximação entre teologia e ciências sociais?
Alguns teólogos, de perfil, fundamentalista, rejeitam por completo tal
aproximação. Na prática, ocorre o contrário, pois qualquer teologia é feita num
ambiente cultural e que a influência.
Ao estabelecer um diálogo com as Ciências Sociais, o teólogo cristão terá, por sua
vez, de renunciar sua posição cómoda de considerar sua religião um santuário protegido
de críticas.
4.2. Personagens do Evangelho Social
O evangelho social teve como o seu maior intérprete o pastor Batista Walter
Rauschembusch (1861-1918), professor no seminário baptista de Rochester, de 1897 até
o seu falecimento. Um outro grande nome a lembrar é o do Pastor Martin Luther King,
que lutou nos Estados Unidos contra o preconceito racial e a injustiça social contra os
negros. Ele foi o responsável por disseminar a prática do protesto não violento,
semelhantemente a Gandi.
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Há uma frase de Martin Luter King: "Eu não me preocupo tanto com as palavras
dos desonestos e as atitudes dos corruptos. Eu me preocupo muito mais, quando os bons
fazem silêncio."
4.3. O Evangelho Social na América do Sul
O evangelho social na América do sul Na América do Sul, esse movimento
pode também ser identificado como a "teologia da libertação", com o propósito comum
de estabelecer-se a "justiça social", até mesmo por meio de uma revolução. O sucesso
da teologia da libertação na América do sul deve-se aos seguintes factores:
 Grandes índices de desemprego.
 Diferenças sociais alarmantes.
 Pobreza.
 Diferenças Extremas entre classes sociais.
 A ausência de uma teologia relevante ao contexto da América latina, que
nascesse no berço dos países subdesenvolvidos.
A teologia do evangelho social alcançou maior sucesso nos anos seguintes à
Primeira Guerra Mundial, pelo fato de se atribuir às injustiças sociais as causas da
grande conflagração internacional que ceifou milhões de vidas. Precisamos entender
que no evangelho social, a Igreja é o instrumento de libertação para uma sociedade que
está inserida numa estrutura social injusta e corrupta.
O movimento do evangelho social teve o seu lado positivo: Procurou levar a
Igreja a empenhar-se em actividades mais amplas em favor dos menos favorecidos da
sorte, Criticou os governos corruptos e os sistemas ideológicos injustos. Foi uma
resposta nova da ética cristã em uma nova situação histórica, pois, particularmente nos
Estados Unidos, era grande o número de problemas decorrentes do rápido crescimento
industrial. A consciência cristã, assim desafiada, converteu-se numa "consciência
social".
40
V- CAPITULO: TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO, UMA RESPOSTA
À CRISE ECONÓMICA, SOCIAL LATINO-
AMERICANA E AFRICANA
Até aqui a nossa abordagem tem sido principalmente teórica, passando pelas
principais escolas teológicas da era contemporânea. Temos analisado as doutrinas
dessas escolas e em nenhum momento fugimos da responsabilidade de apresentar o
nosso parecer. A análise que fazemos dessas propostas teológicas encontra seus
pressupostos na ortodoxia bíblica, conforme já foi dito no capítulo primeiro. Apesar da
relevância dos problemas até aqui levantados, a influência dessas escolas teológicas na
nossa teologia e em nossas denominações é pequena, ou quase nula. Muitos dos
programas teológicos até aqui apresentados foram postos em carácter de informação, e
talvez o leitor nunca se depare com os problemas aqui levantados, salvo nas esferas
seculares, onde o liberalismo teológico e o naturalismo têm estado activo e presente.
Nas comunidades eclesiásticas brasileiras, quase não se vê a influência desses
movimentos, a não ser um ou outro incidente recente de pastores que abraçaram a
teologia relacional ou social, apresentada anteriormente. Porém, à partir desse capítulo,
abordaremos três correntes teológicas cuja presença é marcante no Brasil, e em alguns
países Africanos, cujos pressupostos tem de alguma maneira modelado a forma de fazer
teologia. A primeira dessas três escolas, de origem Latina, é a Teologia da Libertação.
5.1. Contextualizando a teologia da libertação na América
Latina.
Nas décadas de 60 e 70, o ambiente teológico da América Latina passou por sérias
transformações. O ambiente no Brasil e na Argentina era de ditadura. Os teólogos que
viveram esse período foram levados a formular uma teologia que fosse menos
académica e teórica, e mais laica e prática, que pudesse sanar os problemas sociais e
económicos de então. Em meio a uma estrutura social em que um homem velho morre
aos vinte e oito anos, onde quinhentos em cada mil crianças morrem antes de completar
um ano de idade, onde os estudantes que protestam são torturados, e oitenta por cento
da população vive com uma renda de oitenta dólares por ano, a voz revolucionária
começou a clamar em favor das massas.
41
Católicos romanos como Juan Luís Segundo, Hugo Assman e Gustavo Gutiérrez
Merino, animados pela política mais aberta do Vaticano II; protestantes como Rubem
Alves, Emílio Castro, José Míguez Bonino e o então missionário no Brasil, Richard
Shaull, se empenharam em buscar uma teologia que pudesse resolver os conflitos
sociais da América Ibero Hispana.
As palavras-chaves para entender essa teologia social são “revolução”,
“libertação”, “exploração”, “dominação estrangeira”, “capitalismo” e “proletariado”.
Qualquer semelhança com os conhecidos jargões do comunismo não é mera
coincidência. Ele foi a maior fonte de inspiração e o impulso motor dessa nova
tendência teológica.
Sob a palavra “libertação”, não está subentendida a obra de Cristo por nós, e sim
os ideais do marxismo. A palavra, dentro desse movimento teológico significa:
a) Libertação política, das pessoas e sectores socialmente oprimidas.
b) Libertação social, para melhores condições de vida, uma mudança radical nas
estruturas, resultante da criação contínua de uma nova maneira de ser e de uma
revolução permanente.
c) Libertação pedagógica, para uma consciência crítica através do que o pedagogo
brasileiro Paulo Freire chamou de “conscientização”, sendo o cerne dessa
conscientização o despertar da consciência das massas miseráveis que vivem a
cultura do silêncio, para se inteirarem da dominação social, política e económica
que lhes é imposta.
5.1.1. A teologia da libertação e a revolução social.
Os teólogos da libertação se declararam várias vezes favoráveis a luta armada, ao
ponto de alguns considerarem Camilo Torres, sacerdote colombiano que morreu em um
tiroteio como membro da guerrilha de Che Guevara, como o santo patrono da causa. O
padre Camilo costumava dizer que “cada católico que não é revolucionário e não está do
lado da revolução comete pecado mortal”.
Na questão da violência, como se pode deduzir dessas linhas, os teólogos da
libertação são bem pragmáticos. Para eles, o problema da violência e da não-violência é
42
um problema ilusório. Apenas existe a questão do uso justificado ou injustificado da
força, e se o fim é nobre, os meios se fazem necessário. Essa atitude violenta foi de fato
uma proposta aberta aos religiosos para que tomem lugar nas barricadas e lutem em prol
do desenvolvimento social e económico da América Latina. No Brasil, Dom Hélder
Câmara, então arcebispo do Recife, promove uma revolução pacífica, por não se
contentar com as reformas triviais.
5.2. Leonardo Boff e a sua Teologia de Libertação, a principal
voz do movimento no Brasil.
Embora Hugo Assman e Dom Hélder Câmara sejam dos nomes que representam o
pensamento da teologia da libertação no Brasil, actualmente é o Dr. Leonardo Boff que
está no centro do debate sobre a teologia da libertação. Como membro do conselho
editorial da Editora Vozes entre 1970 e 1985, Boff participou da coordenação e
publicação da colecção “Teologia da Libertação”. Em 1984, em razão de suas teses
ligadas à teologia da libertação, apresentadas no livro “Igreja: Carisma e Poder”, foi
submetido a um processo no Vaticano. Em 1985, foi interrogado pelo cardeal Joseph
Ratzinger (o actual papa Bento XVI), então prefeito da Congregação da Doutrina e da
Fé, órgão herdeiro da Inquisição, e condenado a um ano de “silêncio obsequioso”,
sendo também deposto de todas as suas funções editoriais e de magistério no campo
religioso. Dada a pressão mundial sobre o Vaticano, a pena foi suspensa em 1986,
podendo retomar algumas de suas actividades.
Em 1992, sendo de novo ameaçado com uma segunda punição pelas autoridades
de Roma, “apostatou” de sua condição de padre e da própria Igreja Católica para se unir
com uma mulher. “Mudou de trincheira para continuar a mesma luta”: continua como
teólogo da libertação, escritor, professor e conferencista nos mais diferentes auditórios
do Brasil e do exterior, assessor de movimentos sociais de cunho popular libertador,
como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e as Comunidades Eclesiais de
Base (CEB’s), entre outros.
Curiosamente a cúpula da CNBB parece continuar com boas relações com Boff,
apesar de sua “apostasia” e de seu marxismo. Os três passos básicos da teologia da
libertação de Leonardo Boff:
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 Ver: Aqui observamos os problemas sociais existentes e nos tornamos
conscientes de sua existência.
 Pensar: Neste passo, teorizamos teologicamente as questões sociais que
serão abordadas pela Igreja na sociedade.
 Agir: este é o passo da práxis, da acção, onde os fiéis são convocados para
promover mudanças e transformações nas estruturas sociais.
5.2.1. Os pressupostos da Teologia da Libertação e as
objecções à doutrina.
O ponto de partida para a elaboração da teologia da libertação, segundo o peruano
Gutiérrez, “é o esforço do ser humano para ser parte do processo através do qual o
mundo será transformado”, o que faz da teologia da libertação mais um movimento
político que um movimento exactamente teológico.
Tal ponto de partida deve ser contextual, com raízes na dimensão humana e
política, e a teologia deve ser elaborada à partir de elucubrações sociopolíticas. Como
movimento político, ela tem sido um brado a favor da dignidade humana, de uma
sociedade mais justa e fraterna. Porém, o que eles admitem na teoria, foi negado por
eles mesmos muitas vezes na prática.
A salvação, dentro da cosmovisão libertária, se resume em “um processo que
abarca o homem e a história”, e o evangelho, em nossa época, deve ter uma transcrição
e aplicação política. O encontro com Deus é descrito como “o compromisso com o
processo histórico da humanidade”. Essa concepção de salvação talvez corresponda à
ideia judaica de messianismo na época de Cristo, mas pouco tem a ver com o conceito
tal como utilizado por Jesus e por Paulo. A responsabilidade social é um dever do
cristão, mas a salvação não se restringe a essa responsabilidade: salvação significa
perdão e cancelamento dos pecados cometidos contra Deus (Hebreus 9.28, 1João 3.5).
Nesse processo de teologia libertária, a missão da igreja acaba por confundir-se com
confrontamento político e adesão e exposição de ideias sociais, mas a missão do cristão,
segundo a Bíblia, é proclamar que o filho de Deus ressuscitou e tem poder de perdoar
pecados.
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É preciso ressaltar que as afirmações de violência não são de nenhum modo
característica de todos os teólogos da libertação. Toda rotulação é pobre, e nesse
sentido, há de se admitir a classificação do movimento da teologia da libertação como
um movimento violento é falha. Ainda assim, não podemos deixar de aludir que, ainda
que não totalmente, a teologia da libertação é fortemente um movimento violento.
Como disse, Rubem Alves, também teólogo libertário, “a violência se converte na força
que move a história no caminho para conduzir à sociedade perfeita”. Em outras
palavras, é justo empregar a violência contra a violência, pois neste caso, os fins
justificam os meios. Ele também afirma que o “amor para os oprimidos significa cólera
contra os opressores”. Como é difícil associar todo esse discurso com as palavras de
Jesus no Sermão da Montanha!
Como o evangelicalismo deve responder a essa “revolução teológica”? É óbvio
que o cristão não deve viver alienado de qualquer ideia política ou deva se conformar a
uma mentalidade status quo. O problema é que, conforme temos exposto em tese, a
tendência da teologia cristã é polarizar: Ou a experiência, ou a razão; ou a história, ou a
fé; e no caso da Teologia da Libertação, ou o marxismo, ou não somos cristãos. Não é
preciso polarizar para ter responsabilidade social, nem é preciso forçar a exegese ou
fazer exegese para defender pressupostos sociais.
Devido à repressão ao movimento, hoje não há muitos grupos ou indivíduos que
mantém a Teologia da Libertação. Actualmente o movimento se reduz a algumas
“comunidades de base”, que tentam colocar em prática as ideias sociais da mesma, mas
a influência nas faculdades ainda é grande.
A teologia da libertação está fundamentada em uma postura na qual a presente
práxis histórica se transforma em norma canónica para descobrir a vontade de Deus. Ao
reflectir algo parecido com a ética situacional, a teologia da libertação não pode escapar
das mesmas acusações levantadas contra ela: moralidade relativista e pragmática. Ela
foge totalmente a ortodoxia reformada, e não há nenhuma possibilidade de um crente
evangélico sustentá-la sem cair em contradição, isso porque a “Sola Scriptura” não
admite nenhum “somado a”, ou “junto com”.
Nascimento da TDL no Brasil A Teologia da Libertação nasceu da influência de
três frentes de pensamento:
45
 O Evangelho Social das Igrejas norte-americanas, trazido ao Brasil pelo
missionário e teólogo presbiteriano Richard Shaull;
 A Teologia da Esperança, do teólogo reformado Jürgen Moltmann;
 A teologia política que tinha como seus grandes expoentes o teólogo
católico Johann Baptist Metz, na Europa, e o teólogo baptista Harvey Cox,
nos EUA.
Eventos que precederam o nascimento da TDL no Brasil Há uma série de eventos
que precederam o nascimento da Teologia da Libertação:
 1952: O missionário presbiteriano Richard Shaull chega ao Brasil
trazendo o Evangelho Social e cria uma estreita relação com os pastores
presbiterianos Rubem Alves e Jaime Wright;
 1964: O teólogo reformado Jürgen Moltmann publica sua obra Teologia
da Esperança;
 1965: O teólogo batista Harvey Cox publica A Cidade Secular;
 1967: O teólogo católico Johann Baptist Metz pronuncia a conferência
5.2.2. Obras sobre a Teologia de Libertação no Mundo
O marco do nascimento da Teologia da Libertação no Brasil, está na publicação
de uma obra de Rubem Alves, criticando a teologia metafísica de uma forma geral e
propondo o nascimento de novas comunidades de cristãos animados por uma visão e
por uma paixão pela libertação humana e cuja linguagem teológica se tornava histórica.
A primeira participação católica no lançamento da Teologia da Libertação foi a
publicação da Teologia da Revolução, em 1970, pelo teólogo belga radicado no Brasil
José Comblin.
Em 1971, Gustavo Gutiérrez publicou Teologia da Libertação. Somente em 1972,
Leonardo Boff surge no cenário teológico com a publicação de Jesus Cristo Libertador.
Como Rubem Alves estava asilado nos EUA neste período, Boff passou a ser o mais
conhecido representante desta corrente teológica que vivia no Brasil, devido à protecção
recebida pela ordem dos franciscanos, à qual ele pertencia.
46
5.3. Teologia de Libertação no contexto Africano
A Teologia Africana se enquadra num paradigma pluralista, onde caracterizamos
a Teologia de Libertação como uma das mais destacadas. O número de livros e artigos
sobre a teologia africana chegou a tais proporções que não mais se pode dizer com confiança
que se conheçam todos os seus aspectos ou desenvolvimentos. Mesmo assim, esperamos, com o
presente mostrar que a teologia africana tem um paradigma específico, o qual não é nem aquele
da teologia ocidental nem o de outras teologias da libertação.
Em primeiro lugar temos de realçar algo sobre a relação entre a teologia Africana e outras
teologias da libertação. Depois mostrarmos concretamente a espécie de paradigma que a
Teologia Africana de facto tem. Por fim, essa intuição será exemplificada por meio de algumas
reflexões sobre a cristologia africana.
5.3.1. Teologia Africana e Teologia da Libertação3
Tòmou-se comum, hoje em dia, falar sobre teologias da libertação no plural. As
diversas teologias da libertação incluirão a teologia sul-americana da libertação, a
teologia negra norte-americana, a teologia sul-africana, a teologia feminista e a teologia
africana (possivelmente ainda outras, como a teologia rastafariana das Antilhas, teologia
índia norte-americana, teologia minjung, teologia waterbuffalo, etc.).
A teologia da libertação sul-americana caracteriza-se por sua forte ênfase nos
pobres e nas precárias condições económicas do povo. A teologia negra se caracteriza
pela predominância da questão racial e da desigualdade social, ao passo que a teologia
feminista se preocupa primariamente com o sexismo e a desigualdade entre homens e
mulheres.
Será que a teologia africana pertence a esse grupo? Não automaticamente. Pode-se
falar da libertação do imperialismo cultural ocidental. Entretanto, vários teólogos
africanos alegam que a teologia africana abrange um campo muito mais amplo. O
fundamento da teologia africana não é uma crítica negativa da cultura e filosofia
ocidentais, mas uma avaliação positiva de sua própria cultura e filosofia africanas. Isto
levou à crítica da teologia negra por parte de John S. Mbiti. Segundo ele, “a teologia
negra é demasiadamente negativa, limitada em seu foco e carente de fundamento
bíblico adequado”
3
Thor H. Hovland,O Novo Paradigma da Teologia Africana, s/l., s/d., p.213.
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Tomás Nsunda Lelo, Fasciculo de teologia contemporanea

  • 1. UNIVERSIDADE METODISTA DE ANGOLA FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS CURSO DE TEOLOGIA FASCÍCULO DE TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA Dispensado pelo Docente, Tomás Nsunda Lelo Contactos: 929809366 / 912187091 lelonsunda@gmail.com
  • 2. 2 Dispensado pelo Docente, Tomás Nsunda Lelo Contactos: 929809366 / 912187091 lelonsunda@gmail.com
  • 3. 3 I. OBJECTIVOS DA DISCIPLINA E SUA DESCRIÇÃO Esta disciplina, de Teologia Contemporânea, tem como objectivo dedicar-se ao estudo do pensamento dos teólogos que impactaram através das suas obras a teologia moderna e actual. A disciplina interessa-se ao estudo da origem dos diferentes correntes teológicos actuais, a descrição das suas evoluções assim como as reacções que elas suscitam e ela toma em conta o conjunto de correntes teológicos modernos. Neste contexto, realça-se que a disciplina tem como conceito a visão de Deus no contexto que estamos inseridos tornando inteligíveis os pilares da nossa fé. Ela serve de bússola para nos orientar no exercício da verdadeira fé cristã. Ajuda nos a visualizar a essência da nossa fé a luz dos movimentos teológicos contemporâneos. II. EXIGENCIAS E MODALIDADES DE AVALIAÇÃO  Nesta cadeira requer a participação activa dos estudantes nas aulas, ler o fasciculo ao menos 20 minutos por dia com objectivo de compreender o pensamento teológico dos movimentos teológicos em estudo e seus personagens  Entre os teólogos da T. contemporânea, o estudante deverá dissertar sobre um deles.  No entanto, o estudante deve constantemente preparar-se para as provas de frequência.
  • 4. 4 INTRODUÇÃO Sendo a Teologia, “o estudo da existência de Deus, das questões referentes ao conhecimento da sua divindade, assim como de sua relação com o mundo e com os homens”1 , a Teologia Contemporânea é considerada como Teologia dos tempos atuais, é o estudo de Deus no contexto actual e a evolução dos dogmas e dos pensamentos formados a respeito das doutrinas bíblicas no contexto que estamos inseridos. Ela origina-se no contexto da Reforma, no séc. XVI. Esta Teologia, recebeu influência de diversas tendências teológicas, entre elas: a Teologia Bíblica, a Teologia Católica, a Teologia Protestante, a Teologia Natural e a Teologia Especulativa. Conforme as direcções que vão tomando, a Teologia Contemporânea recebe várias designações, entre elas: Teologia Modernista, Teologia Neomodernista, Teologia da Esperança e Teologia do Evangelho Social. Nisto reside a pertinência do seu estudo na formação teológica dos estudantes da Bíblia. Desta feita, nos praz articular o presente fasciculo em quatro capítulos sucessivos. 1 Conf. http://www.significados.com.br/teologia/, pag. Consultada, 25/08/2015
  • 5. 5 I-CAPITULO: TEOLOGIA PRÉ-CONTEMPORÂNEA 1.1. Factores influentes na existência da teologia Contemporânea A actual teologia contemporânea recebeu a influência de inúmeras manifestações teológicas e filosóficas do passado. Para uma melhor compreensão desta Teologia, é imprescindível conhecer as principais correntes ou tendências teológicas, desde os dias apostólicos que a influenciam: A) A Teologia Bíblica, procura conhecer a Deus, seus atributos e sua vontade, através de uma reflexão a respeito dos temas presentes tanto no Antigo como no Novo Testamento, considerados como infalível Palavra de Deus B) A Teologia Católica, por sua vez, que corresponde às teologias moral (orienta o comportamento humano em relação aos princípios religiosos), dogmática (estuda os elementos da fé, ou seja, as doutrinas), bíblica (estuda o carácter de Deus, seus atributos e sua vontade a nosso respeito, com base na Bíblia) e patrística (estuda a religião de acordo com a interpretação dos pais da Igreja, da tradição e do magistério); C) A Teologia Protestante, enfatiza o retorno às origens e à reinterpretação das Escrituras, tendo Cristo como única perspectiva. Seus temas principais são: somente a Escritura, somente Cristo, somente a fé, somente a graça; D) A Teologia Natural ou Teodiceia, busca o conhecimento de Deus baseando- se na razão humana; E) A Teologia Especulativa, tem por fundamento o estudo sintético dos textos sagrados, apoiado nos conhecimentos filosóficos do homem. Nesta categoria pode ser classificada a teologia tomás de Aquino. F) A Teologia Mística, fundamenta-se na experiência religiosa que permite ao iniciado supor-se imediatamente relacionado com a divindade, sendo sinais dessa união as visões, os êxtases, as profecias e os estigmas. Esta teologia tem as seguintes características :  A teologia mística não tem carácter reflexivo.  Não da prioridade ao uso da razão.  Evidência as experiências.
  • 6. 6  Da maior importância a sentimentos, emoções, do que ao uso do intelecto. Portanto, a Teologia Contemporânea origina-se directamente do método especulativo, e desde a Reforma Protestante tem tomado várias direcções, conforme as designações recebidas: Teologia modernista, teologia Neomodernista, teologia da esperança, teologia do evangelho social, teologia do cristianismo sem religião, teologia da morte de Deus etc, conforme veremos no decorrer desse estudo; 1.1.1.Filosofia Tomista e a sua influente nos conceitos da teologia Contemporânea A filosofia grega ameaçou toda a estrutura do Cristianismo, tentando helenizar as doutrinas apostólicas, ou seja, contextualizá-las à luz da cultura grega. As doutrinas passaram a ser examinadas a luz da razão e da lógica. A influência da teologia filosófica de Tomas de Aquino: Com Tomás de Aquino, no século XII, ressurge a teologia especulativa, mas com outras vestes. Esse famoso doutor do catolicismo procurou explicar racionalmente os dogmas cristãos, e acabou invertendo o princípio bíblico de que "pela fé entendemos", ao afirmar que “o conhecimento conduz à fé ”. É o pai não apenas da teologia tomística, mas também da filosofia tomística, como já vimos. 1.1.2. A influência da reforma e contra reforma na teologia Contemporânea Com o advento da Reforma Religiosa no século XVI, a tradição católica foi desafiada pelos reformadores. Os reformadores apegaram-se às Escrituras Sagradas e trouxeram à lume os grandes fundamentos da fé cristã, como: a autoridade suprema da Bíblia, a justificação pela fé, o verdadeiro significado dos sacramentos, o sacerdócio universal dos crentes, etc. As divisas protestantes tornaram-se célebres: Solus Cristus, Sola Scriptura, Sola fide, Sola gratia. 1.2. Reacção católica a Reforma
  • 7. 7 A Igreja Católica, ao ver-se ameaçada, organizou a sua contra reforma principalmente através da convocação do concilio de Trento, que se reuniu durante 18 anos, de 1545 a 1563. O que aconteceu neste concílio? Nesse célebre concílio ficaram confirmados pela Igreja Católica todos os dogmas anteriormente aceitos. A tradição foi considerada de valor igual ao da Bíblia, e ainda juntaram-se ao cânon do Antigo Testamento os livros e aditamentos apócrifos. 1.2.1. Galileu e a inquisição em Roma Constatamos uma clara incapacidade da teologia católica de acompanhar e explicar os inúmeros avanços científicos que estavam acontecendo naquele período. Caso do Galileu, o grande físico, já com 70 anos, foi citado a comparecer perante o Tribunal da Inquisição, em Roma, por perjurar contra os dogmas do catolicismo e considerado herético pelos clericalistas, onde na manhã do dia 22 de Junho de 1633, ajoelhado ante seus inimigos, Galileu abjura seus "erros e heresias" e "renega" todas as suas pertinentes descobertas para salvar a vida, dizendo “declaramos que a afirmação de que a terra não é o centro do mundo e de que ela se desloca com um movimento diurno é coisa absurda, filosoficamente falsa; e errónea, quanto à fé”. Mediante esta suposta declaração, o papa Urbano VIII, pontífice de 1632 à 1644, assinou o seu infalível (!!!) decreto nos seguintes termos: “Em nome e pela autoridade de Jesus Cristo, cuja plenitude reside em seu vigário, “declaramos que a afirmação de que a terra não é o centro do mundo e de que ela se desloca com um movimento diurno é coisa absurda, filosoficamente falsa; e errónea, quanto à fé”. 1.2.2. A Bíblia e os confrontos entre a Igreja e as novas ideias A Bíblia foi a grande vítima de todos os conflitos entre a Igreja e as novas ideias. A posição medievalista da Igreja Católica nos primeiros séculos da Idade Moderna, em relação ao desenvolvimento da cultura, trouxe males sem conta a ela mesma, Porque à medida que a ciência começou a provar os "absurdos" condenados pela religião, esta começou a ser contestada por eminentes escritores, secularistas e irreverentes, a cujos olhos o romanismo não passava de um mal social e um entrave ao progresso dos povos.
  • 8. 8 1.3. O que é alta crítica da Bíblia? Em exegese, a Alta crítica é o nome dado aos estudos críticos da Bíblia. Sua abordagem trata a Bíblia como literatura, utilizando-se do aparato crítico normalmente aplicado a textos literários semelhantes. Caracteriza-se, de uma forma geral, por não partir do dogma da inerrância bíblica para efectuar suas análises. Em contraste com a Baixa crítica, seu foco está no estudo dos autores dos textos bíblicos, seu processo de formação editorial, sua transmissão histórica e o contexto de formação, denominado Sitz im Leben na teologia liberal. 1.3.1. Exemplo de actuação da alta Crítica Os fundamentos históricos dessa tendência remontam, de acordo com a maioria dos autores, ao ano de 1753, quando Jean Astruc (1684-1766), francês incrédulo e professor de medicina em Paris, publicou anonimamente, em Bruxelas, em francês, o livro Conjecturas Sobre as Memórias Originais que Parece Terem Sido Usadas por Moisés na Composição do Gênesis. Nesse livro Astruc, que foi médico do rei da Polônia e de Luís XV, da França, dúvida da origem mosaica dos cinco primeiros livros do Antigo Testamento e aventa a hipótese de existirem duas fontes literárias Jeovista e Eloísta partindo-se dos nomes usados para se referirem a Deus. Antes dessa data, muito raramente alguém ousava criticar assim a Palavra de Deus, lançando dúvidas sobre a sua historicidade tradicionalmente aceita. Os mesmos métodos de desintegração aplicados ao Antigo Testamento foram também aplicados, de maneira violenta, ao Novo, lançando descrédito sobre o seu valor histórico e resultando, em alguns casos, no completo desaparecimento da pessoa divina de Jesus Cristo, para instalar em seu lugar apenas um profeta destituído de todos os seus atributos sobrenaturais. 1.4. A Teologia Social de João Calvino O pensamento teológico social de Calvino, é despercebido para muitos, pelo facto dos modernos manuais de teologia não fazerem tanta referência a tudo o que o
  • 9. 9 reformador produziu especificamente nesta área. Faremos uma síntese de tudo que Calvino produziu nesta área. A Reforma Protestante ocorrida no século XVI não foi somente um movimento espiritual e eclesiástico. Teve também aspectos e dimensões políticas e sociais. Calvino, bem como os outros reformadores, deu atenção aos problemas sociais de sua época. Talvez pelo facto de ser da segunda geração de reformadores, Calvino podia ter uma visão mais ampla e amadurecida sobre o assunto. Ele esforçou-se para entender qual deveria ser o papel da Igreja cristã na reconstrução de uma sociedade justa que reflectisse a vontade de Deus em termos de justiça social. Essa questão era extremamente aguda para os reformadores, particularmente pelo facto de viverem numa época e numa situação de grandes problemas sociais. Não é de se admirar que em suas Institutas da Religião Cristã, bem como em seus comentários, Calvino frequentemente trata de questões relacionadas com a responsabilidade social da Igreja e do Estado. Duas considerações importantes: Primeiro, Não devemos dissociar o pensamento social de Calvino da sua teologia. Calvino era acima de tudo um teólogo, um homem da Igreja. Ele não era um político, nem activista social, mas essencialmente um pastor e um estudioso das Escrituras. Seu pensamento social desenvolveu-se dentro da estrutura de seus pressupostos teológicos e bíblicos. Calvino construiu a sua teologia social a partir da sua convicção de que Cristo é Senhor de todos os aspectos da vida humana, e de que a Palavra de Deus deve regular todas as áreas da vida. A segunda consideração, Não devemos dissociar o pensamento social de Calvino da época em que ele viveu. Embora sua teologia social brotasse de princípios bíblicos válidos e atuais para todas as épocas, Calvino só poderia dar-lhes expressão dentro das circunstâncias históricas em que viveu e labutou. Naquela época, a Igreja Católica Romana era o grande poder económico e político. Prevalecia naquela época o sistema económico e social medieval e a monarquia como sistema de governo. 1.4.1. Genebra na Época de Calvino A cidade de Genebra foi o local onde Calvino passou a maior parte de sua vida, pregando, pastoreando e ensinando. Ali passou momentos de grande popularidade e também de rejeição. Foi ali que sua teologia social amadureceu, à medida em que
  • 10. 10 enfrentava os males sociais que oprimiam Genebra bem como as demais cidades da Europa medieval. O Governo de Genebra, antes da Reforma e da chegada de Calvino, era um bispado, uma importante cidade. Seu comando estava nas mãos de três autoridades:  O bispo, que era não somente o chefe espiritual da Igreja, o "príncipe de Genebra", como teoricamente, era o soberano da cidade, com poderes para cunhar moedas, comandar a cidade em tempo de guerra, julgar apelações, e perdoar crimes.  Depois vinha o magistrado, incumbido da defesa da cidade, da guarda, e da execução de prisioneiros.  E por fim, o Conselho de Genebra, composto de Conselheiros de entre os moradores da cidade, que julgavam as questões criminais concernentes aos leigos (os pecados dos sacerdotes era competência do bispo), cuidavam do abastecimento da cidade, das finanças da cidade, e mantinham a boa ordem durante a noite através da polícia. Este era o sistema adoptado pela maioria das cidades europeias católicas. Quando Genebra adoptou oficialmente a Reforma (1536), o bispo foi despojado do seu poder, e os Conselheiros assumiram suas funções. Durante o período de bispado em Genebra, a Igreja Católica representada pelo bispo estivera acima do Estado. Com a expulsão do bispo, o Conselho assumiu suas funções, e agora o Estado estava acima da Igreja (agora Reformada). A Igreja permanecia ligada ao Estado, e estava debaixo do poder do Conselho de Genebra (cujos Conselheiros agora eram protestantes), que tinha em suas mãos o poder de disciplinar, designar os pastores, bem como a função de sustentá-los financeiramente. Havia pobreza extrema, agravada por impostos pesados. Os trabalhadores eram oprimidos por baixos salários e jornadas extensas de trabalho. Campeava o analfabetismo, e a ignorância; havia aguda falta de assistência social por parte do Estado; Prevalecia a embriagues e a prostituição. Destacava-se o vício do jogo de cartas, que levava o pouco dinheiro do povo.  As trevas espirituais eram características da Idade Média e reflectiam-se nas condições morais e sociais das massas. Essa era a situação que prevalecia em Genebra antes da chegada da Reforma espiritual, a qual deu lugar, em seguida, a
  • 11. 11 reformas sociais, económicas e políticas, mesmo antes de Calvino chegar à Genebra.  As Mudanças Introduzidas por Farel em Genebra Guilherme Farel foi o grande líder destas mudanças em Genebra. Sob sua influência, o Conselho da cidade cria o Hospital Geral no antigo Convento de Santa Clara, para dar atendimento médico aos pobres. O Conselho também passou a regulamentar a vida dos seus cidadãos:  Proíbem-se as danças de ruas, a polícia é mobilizada para manter a ordem nas ruas, são promulgadas leis que regulamentam o uso dos bares, que proíbem jogo de cartas, blasfemar o nome de Deus, e servir bebidas durante o horário do sermão.  Torna-se proibido vender pão e vinho a preços acima dos estipulados; são proibidos todos os dias santos, à excepção do domingo. Passa a ser obrigatório a todos os cidadãos de Genebra irem ouvir o sermão de domingo, sob pena de pesadas multas. E a instrução pública se torna obrigatória, pela primeira vez na Europa.  As reacções as mudanças trazidas por Farel Evidentemente, nem todos em Genebra estavam satisfeitos com as pesadas proibições impostas pelos Conselheiros, que por sua vez, seguiam a Farel. As leis, por demais severas, que excedem os limites do razoável, provocam insatisfação, mesmo entre crentes verdadeiros. É neste momento de mudanças que Calvino chega a Genebra Foi a esta altura que Calvino chegou a Genebra. Ele estava apenas de passagem pela cidade. Seus planos eram de prosseguir em frente e achar um local tranqüilo onde pudesse estudar e escrever. Tinha na época 27 anos de idade, e havia acabado de publicar a primeira edição das Institutas. Quando Farel soube que Calvino estava na cidade foi visitá-lo, e instou com o jovem teólogo a que ficasse ali em Genebra, para ajudá-lo no trabalho de reforma. É conhecida a história de como Calvino, após ter apresentado toda sorte de desculpas, finalmente rendeu-se, aterrorizado pela maldição que o velho reformador invocou sobre ele, em caso de recusa. Assim, ele ficou, para ajudar Farel a solidificar as reformas eclesiásticas e sociais em Genebra. Em breve, Genebra iria tornar-se o centro espiritual e social da Reforma protestante na Europa. Foi ali em Genebra, trabalhando como pregador, mestre e pastor na Igreja de Genebra, e lidando com as questões sociais
  • 12. 12 mencionadas acima, que Calvino desenvolveu sua teologia social. No que se segue, procuraremos sintetizar seus pontos principais, concentrando-nos no que Calvino ensinou como sendo a responsabilidade social da Igreja de Cristo. 1.4.2. O Ensino de João Calvino A causa dos males sociais Fundamental para entendermos o pensamento de Calvino nesta área é termos em mente que para ele as causas da pobreza, miséria e a opressão, bem como da perversão e da corrupção da sociedade humana, estavam enraizadas na natureza decaída do homem, que por sua vez, remonta-se à Queda no Éden. Este princípio é crucial no entendimento de Calvino. Para ele, o pecado do homem havia trazido toda sorte de transtorno à ordem social: Pela queda do homem foi demolida toda ordem social, e em Adão tudo foi amaldiçoado por Deus, como está escrito em Romanos 8.20-23, onde Paulo afirma que a criação de Deus está em cativeiro imposto pelo pecado do homem. A queda do homem introduziu perturbações profundas na sociedade humana, incluindo distúrbios na vida conjugal e familiar. Para Calvino, o caos económico é causado pela ganância dos homens, e pela incredulidade de que Deus haverá de nos suprir as necessidades básicas, conforme Cristo nos promete em Mateus 6. Calvino denuncia neste contexto, pecados sociais como: Estocagem de alimentos (trigo), monopólios, e a especulação financeira, como tendo origem no egoísmo e na avareza do homem. Ele denunciava aqueles que preferiam deixar deteriorar-se o trigo em seus celeiros, para que ali fosse devorado por bichos, e apodrecesse, ao invés de ser vendido, quando a necessidade do povo se fazia sentir. Por identificar biblicamente a raiz dos transtornos sociais, Calvino estava em posição de elaborar uma solução que atingisse o problema em seus fundamentos. O Senhorio de Cristo é um segundo princípio que norteava a teologia social de Calvino era que o Cristo vivo e exaltado é Senhor de todo o universo. Os milagres que Ele exerceu sobre a ordem natural (acalmar a tempestade, por exemplo; ou tirar uma moeda da boca do peixe) demonstram esta realidade, diz Calvino. Portanto, a obra de restauração realizada por Cristo não se limita apenas à nova vida dada ao indivíduo, mas abrange a restauração de todo o universo o que inclui a ordem social e económica. Desta forma, a atenção de Calvino como pastor e mestre, se estendeu para além das questões
  • 13. 13 individuais e "espirituais". Se Cristo era o Senhor de toda a existência humana, era dever da Igreja dar atenção às questões sociais e políticas. A Restauração da Sociedade Para Calvino, a restauração inaugurada por Cristo ocorre inicialmente no seio da Igreja. É na Igreja que a ordem primitiva da sociedade, tal qual Deus havia estabelecido, tende a ser restaurada. Na Igreja, as diferenças exacerbadas entre as classes sociais, económicas e raciais, bem como os preconceitos delas procedentes, desaparecem, pois Cristo de todos faz um único povo (Gl 3.28; Ef 2.14). Calvino não concebia a total abolição das classes sociais. Ele concebia a coexistência harmónica entre a Igreja e instituições como o Estado, a sociedade e a família, com as suas respectivas estruturas e funcionamento. É na Igreja, porém, que as relações sociais de trabalho sofrem profundas alterações, ensina o reformador. Os patrões continuam patrões, mas aprendem a exercer sua autoridade sem opressão, ao passo que os empregados (que continuam empregados) aprendem a serem subordinados sem recriminação. Na Igreja, diz Calvino, Jesus Cristo estabelece entre os cristãos a justa redistribuição dos bens destinados a todos. Isto se dava através da actividade diaconal, trazendo alívio para as necessidades dos pobres e oprimidos, com recursos vindos dos ricos e abastados. Quando Calvino falava em restauração social, ele tinha em mente uma sociedade civil governada por cristãos reformados, que aplicassem os princípios bíblicos às questões sociais, políticas e económicas. Ou seja, um Estado que fosse orientado pela Igreja no exercício de suas funções. Para Calvino a reforma social não é perfeita, pois os efeitos do pecado não são todos eliminados. É também importante notar que para Calvino a reforma da sociedade não é completa nem perfeita, visto que os efeitos do pecado não são de todo eliminados na presente época. É uma restauração parcial, portanto. Ela não consegue estabelecer plenamente a justiça no mundo presente. Ao mesmo tempo, ela não abole determinados aspectos da ordem social: permanece a hierarquia determinada por Deus entre o homem e a mulher, o patrão e o empregado, os pais e seus filhos. Quando ocorrerá então a completa reforma da sociedade? A plena abolição dos distúrbios agora presentes da ordem social (as injustiças, a opressão, a corrupção, por exemplo) só se efectuará plenamente no Reino de Deus, no fim dos tempos, para o qual marcha toda a história dos homens e do universo. Sua vinda será precedida por convulsões cósmicas. Então, Jesus Cristo regressará em glória, e o príncipe deste mundo
  • 14. 14 será aniquilado. Assim, será então estabelecido o novo céu e a nova terra, onde habitam plenamente a justiça (2 Pe 3.13; cf. Is 65.17; 66.22; Ap 21.1). Portanto, para Calvino, a Igreja é uma antecipação do reino de justiça a ser introduzido por Cristo em sua vinda. Como tal, ela funciona no presente como uma sociedade provisória, governada pelas leis de Cristo. Embora já foram reflectidos estes ideais, a Igreja ainda não o faz de forma perfeita, o que ocorrerá apenas no fim dos tempos. A Responsabilidade Social da Igreja Quais as responsabilidades da Igreja nesta restauração provisória da sociedade? Podemos resumir o ensino de Calvino em três aspectos fundamentais. Segundo ele, a Igreja tinha um ministério didáctico, um político, e um social. Ministério Didáctico Esse ministério da Igreja era para ser exercido através dos seus pastores e mestres. Consistia na instrução pública e particular, através de sermões e orientação individual, quanto ao ensino bíblico sobre a administração dos bens outorgados por Deus ao Estado e ao indivíduo. Em outras palavras, Mordomia Cristã. A ênfase do ministério didáctico: a questão do trabalho e do descanso. Tomemos como exemplo a questão do trabalho e descanso. De acordo com Calvino, a Igreja deveria através do ministério regular de seus pastores, instruir seus membros no ensino das Escrituras sobre o assunto. Em suas Institutas Calvino escreveu o que possivelmente foi o seu ensino em Genebra sobre o trabalho: só Deus alimenta o homem dele vem as forças e as condições para que o homem trabalhe, e com seu suor, compre seu pão. O trabalho, portanto, é algo eminentemente digno pois é a realização da vontade de Deus para o homem. Assim, o homem não se realiza plenamente, senão no trabalho, pois foi para isto que foi criado e vocacionado, conforme está escrito em Génesis 1 e 2. O pecado tirou a alegria e a graça que acompanhava o trabalho no início. A queda introduziu no mundo e na sociedade humana os distúrbios sociais relacionados com o trabalho (Génesis 3). Mas, em Cristo o homem reencontra a alegria e o gosto do labor. Quanto ao descanso, Calvino insistia que era necessário proporcionar aos trabalhadores um dia de descanso, o sábado cristão, que é o domingo, conforme sua interpretação do quarto mandamento (Êxodo 20.8-11). O descanso físico, porém, está intimamente ligado ao espiritual sem Cristo, não há descanso verdadeiro no domingo. Assim, Calvino via a profanação do domingo como a origem da corrupção do trabalho. Segundo ele, é necessário cessarmos dos nossos labores, como Deus cessou
  • 15. 15 dos dele (Heb. 4.3). O que fez o conselho de genebra? Assim, conforme Farel já havia orientado, o Conselho de Genebra, debaixo da influência de Calvino, aboliu todos os feriados católicos e determinou que no domingo cessasse todo labor em Genebra. A função do púlpito no ministério didáctico? Através do púlpito, exercendo o seu ministério didáctico, a Igreja então levantava o ânimo moral do trabalhador assegurando-lhe que mesmo os trabalhos mais humildes são honrados por Deus, e que Deus assim determinou que pelo trabalho o homem encontrasse sua vocação na vida. E que em Cristo, o trabalhador encontraria a alegria e a satisfação que deveriam acompanhar o labor diário. Havia um outro aspecto do ministério didáctico da Igreja que consistia em repreender, através das pregações, os membros que estivessem incorrendo em pecados sociais: Assim, os pastores de Genebra, orientados por Calvino, denunciavam do púlpito a prática da cobrança de juros excessivos por parte dos agiotas. Da mesma forma denunciavam a vadiagem. Vadiagem e parasitagem é pecado, ensinava Calvino. Para ele, quando Deus criou o homem e o ordenou cultivar a terra, condenou com este gesto a ociosidade e a indolência. Não há nada mais oposto à ordem da própria natureza do que consagrar a vida à beber, comer, e dormir, sem indagar sobre o que fazer (Sl 128.3; 2 Ts. 3.10-12). Calvino também falava contra o desemprego causado pela ganância dos ricos. Privar um homem do seu trabalho é pecado contra Deus pois trabalho é dom de Deus, e o dever que ordenou ao homem, ensinava Calvino. É tirar-lhe a vida pois os trabalhadores pobres dependem dia a dia do seu labor para o pão com se sustentam e às suas famílias ao contrário dos ricos, que têm propriedades, reservas, etc. Assim, promover o desemprego, na opinião de Calvino, seria um atentado à vida do pobre, e portanto, um pecado contra o mandamento "Não matarás". Esse era o primeiro aspecto da responsabilidade social da Igreja no pensamento de Calvino, ou seja, instruir seus membros, pela pregação da Palavra, acerca dos princípios bíblicos sobre o trabalho e o descanso. Ministério Político Ao lado do Estado, a Igreja tinha um outro ministério, na teologia social do reformador, a saber, o ministério político. Para entendermos melhor o que Calvino tem a dizer sobre isto, vamos primeiro entender seu pensamento sobre a relação entre a Igreja e o Estado. A relação entre a Igreja e o estado. Podemos resumi-lo no que Calvino tem a dizer sobre Romanos 13.1-7, uma passagem onde o apóstolo
  • 16. 16 Paulo menciona as autoridades e nossos deveres para com elas. Para Calvino, a Igreja e o Estado são duas instituições procedentes de Deus (Rm 13.1-2); são instrumentos de Deus para a vinda do Seu Reino na terra. A Igreja constitui-se como as primícias deste Reino vindouro, como já vimos; o Estado, por sua vez, deve manter a ordem provisória na sociedade humana. Portanto, existem entre as duas instituições laços duráveis e essenciais, e não simples relações ocasionais. Qual a missão do Estado no pensamento de Calvino? Ainda com base em Romanos 13, Calvino sustenta que 1)o Estado deveria manter a ordem na sociedade (conforme sua interpretação de 1 Tm 2.1-2), 2)prover o sustento da Igreja, 3) e promover os meios necessários para que haja a pregação fiel da Palavra de Deus entre os cidadãos. Ou seja, usando o poder civil dado por Deus, as autoridades deveriam envidar todos os esforços para que a religião verdadeira prevalecesse na terra. O estado não devia gerenciar os negócios da igreja. Porém, para Calvino isto não implica qualquer ingerência do Estado nos negócios da Igreja. O Estado faz estas coisas através de uma boa legislação que garanta a livre pregação da Palavra de Deus. A edificação da Igreja se faz apenas pela pregação da Palavra no poder do Espírito, e não pela interferência do poder do Estado. E aqui Calvino critica os demais reformadores que desejavam uma união entre Igreja e Estado, e que o Estado tomasse conta dos negócios da Igreja (como ocorreu parcialmente na Alemanha). Qual seria então a missão política da Igreja? Em primeiro lugar, orar pelas autoridades constituídas (1 Tm 3.1-2). E isto, em qualquer país em que os cristãos se encontrassem, independente da forma de governo daquele pais, por mais hostis que as autoridades fossem, para que se convertam e venham ao bom senso, assim como Jeremias exortou os cativos a que orassem pela Babilónia (Jr 29.7). Em segundo lugar, a Igreja deveria, quando necessário, advertir as autoridades, quando estas esquecessem o senso divino do seu ofício, quando abusassem do poder, quando cometessem injustiça, quando tolerassem injustiças contra os pobres, os fracos e os oprimidos. Se a Igreja cessar de vigiar o Estado, diz Calvino, ela se torna cúmplice da injustiça social, cessando de cumprir sua missão política. Em terceiro lugar, a Igreja também deveria, como parte de sua tarefa, tomar a defesa dos pobres e fracos contra os ricos e poderosos. Ela deveria consistentemente alertar o Estado a que proteja os fracos, os oprimidos e explorados pelos ricos, os que não possuem poder político ou económico, e não têm protecção social. Neste sentido, a Igreja deve sempre denunciar ao Estado, os ricos que
  • 17. 17 exploram a miséria alheia em tempo de calamidade, os que tiram partido da sua situação social ou oficial para se enriquecerem e se porem a coberto. Calvino entendia que estas atitudes eram apropriadas para a Igreja pois reflectiam o ensino da lei de Moisés e do ministério dos profetas, ao denunciarem a opressão social em Israel. Em quarto lugar, a Igreja deveria recorrer à autoridade do Estado na aplicação de sanções disciplinares, e solicitar do Estado as medidas necessárias para a manutenção da ordem e da justiça social. Em resumo, o ideal reformado era este:  Uma Igreja politicamente livre, inteiramente dependente da Palavra de Deus, em um Estado que lhe respeite e lhe favoreça o ministério.  Ministério Social o outro aspecto da responsabilidade social da Igreja era a assistência social. A Igreja, segundo a teologia social de Calvino, deveria envolver-se ela mesma no cuidado dos pobres, dos órfãos e das viúvas enfim, dos necessitados. E isto sem fazer distinção entre os da igreja e os de fora. Ou seja, a assistência social da Igreja deveria contemplar inclusive os estrangeiros e refugiados que chegavam a Genebra. Qual o órgão responsável pelo ministério social da igreja? O órgão encarregado do ministério social da Igreja, diz Calvino, é o diaconato. Foi Calvino quem primeiro resgatou esta função bíblica do ofício diaconal. Ele ensinou que os diáconos eram ministros eclesiásticos, encarregados de toda a assistência social da Igreja (Atos 6.1-7), e como tal, deveriam ser eleitos conforme as regras estabelecidas por Paulo em 1 Timóteo 3.8-13. Até hoje em algumas igrejas Reformadas a administração financeira da Igreja e o uso dos recursos para a assistência aos pobres e necessitados é atribuição da junta diaconal. As acções diaconais básicas na teologia social de calvino O diaconato, como braço do ministério social da Igreja, se desenvolve em três acções básicas, segundo Calvino: 1) Administração dos bens destinados à comunidade. A igreja recebia recursos para a assistência social de duas fontes: a generosidade dos fiéis nas colectas levantadas para este fim aos domingos, e o tesouro do Estado, através do Conselho de Genebra, que votava verbas para este fim. Estes recursos eram recebidos e administrados pelos diáconos.
  • 18. 18 2) Distribuição de forma justa e igual entre os necessitados. Os diáconos cuidavam que todos os genuinamente carentes tivessem participação igual nos bens destinados aos pobres. Num ambiente marcado pela opressão social e pelas desigualdades, os diáconos certamente tinham muito trabalho a ser feito, e necessitavam de muita sabedoria para faze-lo. 3) Visitação e cuidado dos doentes. As guerras, a falta de saneamento público, as epidemias, a falta de assistência médica do Estado, e a pobreza, deixavam um saldo enorme de pessoas doentes. O ministério dos diáconos incluía o cuidado para com estas pessoas, utilizando-se quando necessário dos recursos da Igreja. Uma observação importante. É necessário observar que no pensamento de Calvino o ministério social da Igreja era de apoio ao Estado. Cabia ao governo civil cuidar dos pobres, doentes e necessitados. Mas, como se tratava de uma tarefa de enormes proporções, a Igreja vinha como apoio e auxílio, dando ela mesma assistência social onde necessário. A Prática Social de Calvino em Genebra Persuadido por Farel, Calvino se deixa ficar em Genebra para auxiliar nas reformas necessárias. Logo ficou claro que, para ele, isto incluía ir além das reformas eclesiásticas. Debaixo de sua influência, a Igreja passa a agir de forma marcante na vida social e política da cidade. Aquilo que ele expõe em suas Institutas procurou aplicar de forma prática às necessidades de Genebra. O diaconato é organizado e entra imediatamente em ação. O Hospital Geral, fundado por Farel, dá assistência médica gratuita aos pobres, órfãos e viúvas, com médicos de plantão pagos pelo Estado. É criada a primeira escola primária obrigatória da Europa. Os refugiados chegados a Genebra recebem treinamento profissional e assistência médica e alimentar, enquanto se preparam para exercer uma profissão. Os pastores intercedem continuamente diante do Conselho de Genebra em favor dos pobres e dos operários. O próprio Calvino intercedeu várias vezes por aumentos de salários para os trabalhadores. Os pastores pregavam contra a especulação financeira, e fiscalizavam parcialmente os preços contra a alta provocada pelos monopólios. Debaixo da influência dos pastores, o Conselho limita a jornada de trabalho dos operários. A vadiagem é proibida por leis: vagabundos estrangeiros que não tem meios de trabalhar, devem deixar Genebra dentro de três dias após a sua chegada. E os vagabundos da cidade devem aprender um ofício e trabalhar, sob pena de prisão.
  • 19. 19 O Conselho institui cursos profissionalizantes para os vadios e os jovens, para que eles possam entrar no mercado de trabalho. E finalmente é digno de nota que havia uma vigilância da parte de Calvino e demais pastores de Genebra contra a má administração pública. Houve inclusive o caso de um funcionário corrupto que foi despedido por influência de Calvino. O próprio Calvino levava uma vida modesta, apesar de todo o seu prestígio e influência. Na prática, procurou viver intensamente os princípios que defendera em sua teologia social. A sua influência estendeu-se além do seu tempo. A influência da teologia social de Calvino sobre os puritanos e as confissões de fé. Os Puritanos, autores da Confissão de Fé de Westminster e dos dois Catecismos, foram profundamente influenciados pelo ensino de Calvino, e sua teologia social não foi excepção. No capítulo sobre o Magistrado Civil (Cap. XXIII) a Confissão de Fé reflecte: a) o ensino de Calvino sobre a vocação social e política dos cristãos (par. 2), b) a independência da Igreja do Estado, para gerir seus próprios interesses, c) e o dever do Estado de proteger a Igreja cristã (par. 3), d)o dever do Estado de assistir e proteger os necessitados independentemente das convicções religiosas dos mesmos (par. 3), e)bem como o dever dos cristãos de honrar e de submeterem-se ao Estado (par. 4). Um outro exemplo são as contínuas referências à questões sociais e económicas nestes símbolos da fé reformada. A exposição no Catecismo Maior do sexto mandamento, "Não matarás", inclui como deveres exigidos "... a justa defesa da vida contra a violência... o uso sóbrio do trabalho e recreios ... Confortando e socorrendo os aflitos, e protegendo e defendendo o inocente". Como pecado, são incluídos "... a negligência ou retirada dos meios lícitos ou necessários para a preservação da vida ... o uso imoderado do trabalho .... a opressão .... e tudo que tende à destruição da vida de alguém". Conclusões Augusto Nicodemos conclui esta discussão com duas observações sobre o ensino social de Calvino. O Primeiro, a teologia social calvinista estava profundamente enraizado em sua teologia e em sua interpretação das Escrituras. Era fruto de suas convicções teológicas. Portanto, é impossível entender a reforma social que empreendeu em Genebra sem os pressupostos da sua teologia.
  • 20. 20 Segundo, o pensamento social de Calvino tem produzido abundante fruto na história da humanidade, após a Reforma. Muitas das universidades, escolas, e asilos de que temos notícia foram fundados por calvinistas. Boa parte das críticas feitas contra os calvinistas, de que são levados à inércia e paralisia social por causa de sua ênfase na soberania de Deus em detrimento da responsabilidade humana, simplesmente revela um desconhecimento (proposital?) dos fatos e uma ignorância do que seja o Calvinismo. E finalmente, cabe-nos perguntar em que sentido uma teologia social calvinista poderia nos ajudar hoje, aqui e agora, a Sociedade Angolana? Evidentemente existem profundas diferenças culturais, políticas e religiosas entre a Suíça do século XVI e o Brasil do século XXI. Mas existem muitas semelhanças também, particularmente no que se refere aos problemas sociais. Além do mais, os princípios elaborados por Calvino para atender às questões sociais e económicas são válidos para nós hoje, pois são bíblicos. Quer na Suíça medieval, quer na sociedade angolana moderna, permanece como verdade imutável o facto de que a raiz da opressão social é espiritual e moral, como Calvino apregoou. Bem como o facto de que Jesus Cristo é o Senhor de todas as coisas, em todos os lugares, e em todas as épocas, e que seu Reino se estende à política, à sociedade e à economia tanto de genebrinos quanto de Angolanos. Assim, creio que a Igreja Protestante, Evangélica, Metodista, Pentecostal, Aliancista e cristã em Angola (especialmente os reformados) deveria envolver-se em todos estes aspectos, usando os meios apropriados, lícitos e legais para protestar, advertir e resistir à injustiça social, usando a pregação da Palavra para chamar ao arrependimento os governantes corruptos, os ricos opressores e os pobres preguiçosos, e exercitando obras de misericórdia e assistência social através de uma diaconia treinada e motivada. Todo este envolvimento social deve acontecer sem perder de vista que a missão primordial da Igreja é promover a reforma (parcial e provisória) da sociedade através da proclamação do Evangelho de Jesus Cristo, aguardando os novos céus e a nova terra onde habita a plena justiça de Deus. Fonte: Calvino e a responsabilidade social da Igreja, Editora PES, 24 p, 10,5x18cm, A. N. Lopes. II-CAPITULO: O LIBERALISMO TEOLOGICO E O NOVO ORTODOXISMO DE KARL BARTH
  • 21. 21 2.1. O Liberalismo Teológico neste período O que o liberalismo teológico não é? O liberalismo teológico não é uma religião ou uma organização ideológica possuidora de templos, funcionários ou sociedades. Porém, o que o liberalismo Teológico é? Ele é, simplesmente, uma tendência de ajustar o Cristianismo aos conceitos da *Alta Crítica da Bíblia, da ciência e das filosofias modernas. Esta tendência apresenta-se hoje sob diversos outros títulos, como modernismo, racionalismo, nova teologia, etc. 2.1.1. O nascimento da Teologia Liberal No centro dessa gama de teorias nasceu o movimento liberalista, hoje presente nas artes, na música, nos costumes sociais e, como vimos, na própria Teologia. É ele o principal responsável pelo relaxamento dos padrões éticos, em virtude da sua atitude irreverente em relação à Divindade e das dúvidas acerca da inspiração das Escrituras, que lança nos corações. Sem a poderosa influência moralizadora da Palavra de Deus, os homens se estupidificam, como descreve o apóstolo Paulo no capítulo 2 da sua Carta aos Romanos. Em 1780, o hebraísta alemão Eichrodt aceitou a hipótese de Astruc e afirmou que os referidos documentos tinham características, estilos e expressões distintas um do outro. Igen, em 1798, também alemão, julgou ter descoberto, dentro do documento Eloísta do Gênesis, diversas características de estilo e expressões. Por isso foi ele considerado o descobridor do segundo documento Eloísta. Na Escócia, o padre católico romano, Alexander Gaddas, anunciou ter encontrado no Pentateuco diversos documentos (1798- 1800). 2.1.2. Principais Teólogos da Teologia Liberal Vejamos agora alguns nomes implicados no liberalismo teológico, responsáveis pelos novos rumos tomados pelo protestantismo: A. Friedrich Schleiermacher (1768-1834) 1. Teólogo e filósofo alemão, embora anti-racionalista, ensinou que não há religiões falsas e verdadeiras. Todas elas, com maior ou menor grau de eficiência, têm por objectivo ligar o homem finito com o Deus infinito, sendo o cristianismo a melhor delas.
  • 22. 22 2. Ao harmonizar as concepções protestantes com as convicções de burguesia culta e liberal, Schleiermacher foi considerado radical pelos ortodoxos, e visionário pelos racionalistas. Na verdade, o seu pensamento filosófico-teológico, embora considerado liberal, está mais perto do transcendentalismo de Karl Barth. B. Johann David Michalis (1717-1791) Teólogo protestante alemão, foi o primeiro a abandonar o conceito da inspiração literal das Escrituras Sagradas. C. Adoff Von Harnack (1851-1930) Teólogo protestante alemão, defende em sua obra principal História dos Dogmas: a evolução dos dogmas do cristianismo pela helenização progressiva da fé cristã primitiva. Em outra obra, A essência do cristianismo, reduziu a religião cristã a uma espécie de confiança em Deus, sem dogma algum e sem cristologia. D. Albrecht Ritschl (1822-1889) Ritschl ressaltou o conteúdo ético da teologia cristã e afirmou que esta deve basear-se principalmente na apreciação da vida interior de Cristo. E. David Friedrich Strauss (1808-1874) Foi o teólogo alemão que maior influência exerceu no século XIX sobre os não- teólogos e não-eclesiásticos. Tornou-se professor da Universidade de Tubingen com apenas 24 anos. Quatro anos mais tarde, em 1836, foi furiosamente afastado do cargo em virtude de sua obra, denominada Vida de Jesus, criticamente estudada. 2. No ano de 1841 lançou, em dois volumes, sua Fé Cristã - Seu Desenvolvimento Histórico e seu Conflito com a Ciência Moderna. Nesta obra está negando completamente a Bíblia, a Igreja e a Dogmática. Em 1864 publicou uma segunda Vida de Jesus, quando procurou então distinguir o Jesus histórico do Cristo ideal segundo a maneira típica dos liberais do século XIX. Em sua A Antiga e a Nova Fé, publicada em 1872, adopta a evolução darwiniana em contraste com a fé bíblica. 3. Para Strauss, Jesus é mero homem. Insiste em que é necessário escolher entre uma observação imparcial e o Cristo da fé. Ensinou que é preciso julgar o que os Evangelhos dizem de Jesus pela lei lógica, histórica e filosófica, que governa todos os
  • 23. 23 eventos em todos os tempos. Não achou e não procurou um âmago histórico, mas interessou-se apenas em mostrar a presença e a origem do mito nos evangelhos. 4. Seu conceito do mundo é o de matérias subindo para formas cada vez mais altas. À pergunta: "Como ordenamos nossas vidas?" - Responde: autodeterminação, seguindo a espécie. 5. Nas obras de Strauss não há lugar para o sobrenatural. Os milagres são mitos, contados para confirmar o papel necessário de Jesus, daí as referências ao Velho Testamento. Em resumo, Jesus é uma figura histórica. Da vida de Jesus nada sabemos, sendo tudo mito e lenda. 6. Considerado o mais erudito entre os biógrafos infiéis de Jesus, Strauss encerra o último capítulo da sua segunda Vida de Jesus com estas palavras: "...aparentemente aniquilaram a maior e mais importante parte daquilo que o cristão se acostumou a crer concernente a Jesus; desarraigaram todos os encorajamentos que ele tem tirado de sua fé e privaram-no de todas as suas consolações. Parece que se acham irremediavelmente solapados os inesgotáveis depósitos de verdade e vida que por dezoito séculos têm sido o alimento da humanidade; o mais sublime atirado ao pó, Deus despido de sua graça, o homem despojado de sua dignidade, e o laço entre o céu e a terra rompido. Recua a piedade em horror diante de um ato tão temeroso de profanação, e, forte como é na impregnável evidência própria de sua fé, ousadamente conclui que - não importa se um criticismo audaz tentar o que lhe aprouver tudo o que as Escrituras declaram e a Igreja crê acerca de Cristo subsistirá como verdade eterna; nem sequer um jota ou um til será removido." 7. Philip Schaff comenta que Strauss professa admitir a verdade abstracta da cristologia ortodoxa, "a união do divino e humano, mas perverte-a, emprestando-lhe um sentido puramente intelectual, ou panteísta. Ele nega atributos e honras divinas à gloriosa Cabeça da raça, mas aplica os mesmos atributos a uma humanidade acéfala. Destarte, ele substitui, partindo de preconceitos panteístas, uma viva realidade por uma abstracção metafísica; um fato histórico por uma mera noção; a vitória moral sobre o pecado e a morte por um mero passo na filosofia e em artes mecânicas; o culto do único vivo e verdadeiro Deus por um culto panteísta de heróis, ou própria adoração de
  • 24. 24 uma raça decaída; o pão nutriente por uma pedra; o Evangelho de esperança e vida eterna por um evangelho de desespero e de final aniquilamento." F. Sorem Kierkegaard (1813-1855) 1. Teólogo e filósofo dinamarquês. Filho de um homem rico torturado por dúvidas religiosas e sentimentos de culpa, Kierkegaard adquiriu complexos de natureza psicopatológica e possíveis deficiências somáticas. Estudou teologia na universidade de Copenhague, licenciando-se em 1841. 2. Atacou a filosofia de Hegel e afastou-se mais e mais da Igreja Luterana, por julgá-la muito pouco cristã. Para o teólogo dinamarquês, entre as atitudes (fases) estética, ética e religiosa da vida, não há mediação, como na dialéctica de Hegel, e não há entre elas transição, no sentido de evolução. Para chegar da fase estética à fase ética ou desta à religiosa é preciso dar um salto (ser iluminado, converter-se instantaneamente) que transforme inteiramente a vida da pessoa. 3. Para Kierkegaard, só o cristianismo é capaz de vencer heroicamente o mundo, sendo o panteísmo cultural de Hegel impotente contra a consciência do pecado e contra o medo e temor. Criticou o hegelianismo em sua acomodação ao mundo profano, por não ser capaz de eliminar a angústia e admitir a existência de contradições irresolúveis entre o cristianismo e o mundo, cabendo ao homem escolher existencialmente entre esta e aquela alternativa: ser cristão ou ser não-cristão. 4. São profundos os conceitos de Kierkegaard sobre os estágios da vida, a diferença entre ser e existir, o subjectivo e o objectivo, o desespero, os critérios positivos para a verdadeira existência, etc. Eis alguns deles: a. No estágio estético, o homem leva uma existência imediata e não reflectiva, faltando a diferenciação entre ele e o seu mundo; No estágio ético, o homem assume a responsabilidade pelo seu próprio ser, procura alcançar-se a si - o que não pode fazer; No estágio religioso, reconhece a impossibilidade de viver conforme gostaria e descobre que o pecado é não ser o que Deus deseja que seja, e que só se alcança este estado proposto por Deus através de algo que vem de fora - o próprio Deus; b. O tempo (e espaço) trata do que o homem é, da sua existência; a eternidade significa que, embora o homem viva no tempo e no espaço, ele não está totalmente determinado por estes elementos; a existência fala de liberdade, possibilidade, do ideal, da obrigação; o momento de decisão é quando a eternidade intercepta o tempo;
  • 25. 25 c. O objectivo cultural é aquilo que é, enquanto o homem fica entre o que é e o que ele pode e deve ser. A ciência limita-se ao estudo do que é, ao que ela chama "a verdade"; mas os fatos claramente aceitos jamais encerram a verdade; d. A essência do ser humano aparece quando traz a eternidade para dentro do tempo. Cada homem há de sofrer porque vive numa realidade muito física: liberdade versus tempo; e. O único que realmente resolveu o paradoxo do tempo e da eternidade foi Jesus Cristo. Ele mesmo foi um paradoxo: Deus e homem; limitado e ilimitado; ignorante e conhecedor de tudo. 5. S. Kierkegaard, redescoberto na Alemanha por volta de 1910, é considerado o precursor da teologia transcendental, de que Karl Barth, no século XX, é o principal representante. 2.2. Principais Doutrinas Liberais, Exame Crítico 1. Foi a partir de meados do século XIX, como consequência da grande vitalidade intelectual e reorientação do pensamento, que nasceu a teologia liberal. Foi esta uma época de renascimento religioso em geral e, em particular, de expansão do protestantismo, institucional e geográfica mente, caracterizada pelas missões e surgimento das sociedades bíblicas. 2. O liberalismo teológico, em sua essência, procura libertar as consciências cristãs das suas amarras escolásticas, apontando-lhes as exigências da razão. Realça a pessoa de Deus como a fonte de toda a verdade e enfatiza a necessidade de uma certeza sincera na busca da verdade, embora reconheça a impossibilidade do ser humano alcançar um conhecimento pleno da verdade absoluta. 3. A maioria dos teólogos da actualidade considera hoje insustentável essa premissa liberalista de que o espírito humano não possa mover-se em regiões para além do alcance dos sentidos, além do raciocínio meramente racional. Para Platão, o intelecto tem ideias supersensíveis, inexplicáveis à luz da razão, sendo que é neste reino que residem os característicos principais e distintivos da alma humana. Modernamente, é cada vez maior o número dos que conhecem uma área essencialmente metafísica, portanto fora do alcance dos meios físicos, na qual o espírito obedece às leis de sua própria natureza. 4. Segundo os teólogos liberais, o protestantismo precisa "incorporar à sua teologia os valores básicos, as aspirações e as atitudes características da cultura
  • 26. 26 moderna, ressaltando, dentre outros, o imperativo ético do Evangelho." (Enciclopédia Mirador). Dessa pregação nasceu o evangelho social, onde a mensagem de Cristo deixa de ser o poder de Deus para a salvação e regeneração do homem, para tornar-se apenas uma fórmula social, impotente. "A Igreja transcende os métodos e as fórmulas humanas. Ela produz aquela vida plena de riqueza, que é o espírito livre e nobre em acção; pensa os melhores pensamentos; aceita os mais elevados ideais e os reveste de uma linguagem irresistível. Assim ela infunde um poder criador na sociedade de espíritos humanos... Não há fórmula suficiente boa para tornar boa uma sociedade, se não for executada por homens bons. O cristianismo não elabora fórmulas, mas cria os homens capazes de insuflar força moral em qualquer fórmula" (Lynn Harold Hough). 5. O movimento liberalista não reivindicou apenas amplas liberdades para o exercício da razão, mas pregou a tolerância entre as denominações protestantes, aproximando-as, através da minimização das diferenças doutrinárias. 6. O ressurgimento da intolerância religiosa no seio do catolicismo romano, nas primeiras décadas do século passado, o que resultou na prisão e morte de protestantes em diversos países, especialmente na Estónia, Lituânia, Letónia, Turquia, Pérsia, Portugal e Espanha, contribuiu também para aproximar entre si as denominações evangélicas. A organização, em 1846, da Aliança Mundial Evangélica, em Londres, foi uma resposta ao estado de insegurança em que se achavam várias correntes do protestantismo. Essa Aliança muito fez pela liberdade de culto em todo o mundo. 7. Mas o espírito liberal reclama ainda respeito pela ciência e pelos métodos científicos de pesquisas, o que implica na aceitação franca do estudo, tanto do mundo material como da crítica bíblica e da história da Igreja. Foi, valendo-se desse estado de espírito favorável, que Darwin publicou a sua célebre obra As Origens das Espécies através de meios de selecção natural, em 24 de Novembro de 1859, que provocou violentas e intermináveis polémicas. 8. O liberalismo teológico aceita também o princípio da continuidade, ou seja, considera mais importantes as semelhanças do que os contrastes, admitindo-se a ideia da evolução para superar os abismos existentes entre o natural e espiritual, entre o homem e seu Criador, enfatizando mais a imanência do que a transcendência de Deus; o liberalismo prega ainda a confiança do homem no futuro, gerada pelas grandes conquistas em todos os campos da ciência.
  • 27. 27 9. Não há dúvida de que o sonho liberalista do século passado mostra a cada dia mais impossibilidade de materializar-se. A teoria da evolução está hoje negada pelos principais cientistas, e as conquistas da ciência moderna têm trazido, ao lado do seu inegável progresso, resultados catastróficos. A confiança do homem no futuro desvanece-se hoje à luz dos factos actuais e a exemplo de amargas experiências recentes. Quanto à imanência de Deus, sugere esta ênfase que a Divindade está identificada com a totalidade das existências, afirmando, panteisticamente, que tudo é Deus e Deus é o tudo. Elimina-se, destarte, toda a concepção da personalidade divina e, em consequência, considera-se o homem um irresponsável. Quando se nega o conceito de Deus, como o Criador omnipotente que está acima de todas as coisas que criou, corre-se o risco de cair no fatalismo, característico dos cultos orientais e, infelizmente, em expansão no Ocidente. Sinais da presença do fatalismo em nossos dias são os horóscopos, o fetichismo e até mesmo os biorritmos, rejeitados como anticientíficos por grande número de médicos renomados. 10. Ainda em relação à ênfase dada pelo liberalismo à imanência de Deus em tudo, há uma implicação séria, quando se trata do problema do pecado. Despersonalizando a divindade, é o homem colocado no centro de tudo, como a medida de tudo. Isso significa que o fim do homem é estar satisfeito consigo mesmo, com seus horizontes etc. O Dr. John A. Mackay afirma que o pecado, como factor na existência humana, é terrivelmente real, e é coisa que os filósofos balconizados sempre trataram de fazer desaparecer por meio de argumentos arrazoados. Com a expressão balconizados fazia ele referência a Aristóteles e Renan, como símbolos daqueles para quem "a vida e o universo são objectos permanentes de estudo e contemplação". 2.2.1. Outras Doutrinas Liberais Nessas doutrinas afirma-se que: 1. Os credos primitivos são arcaicos e sem realidade para o mundo moderno. 2. A mente do homem é capaz de raciocinar segundo os pensamentos de Deus. 3. A mente deve estar aberta à verdade independentemente da fonte. 4. As doutrinas cristãs são símbolos de verdades racionais conhecidas pela razão humana. 5. A divindade de Jesus era uma declaração simbólica do fato de que todos os homens possuem um aspecto divino.
  • 28. 28 6. 0 conceito bíblico da revelação de Deus na história era ingênuo e pré-filosófico. 7. Os itens "4', "5" e "6" do parágrafo anterior sofreram influência do idealismo absoluto de Hegel e Letze. Os demais itens justificam plenamente alguns dos títulos do liberalismo: modernismo e racionalismo. 8. Como vimos, para o liberalismo Deus está presente em todas as fases da vida e não apenas em alguns eventos espectaculares. Assim, o método de Deus é o caminho da mudança progressiva e da lei natural, e o nascimento virginal de Cristo não condiz com a realidade, pois Deus está presente em todos os nascimentos. 9. Defendendo assim a imanência de Deus, o liberalismo podia aceitar a teoria da evolução, não negando a Deus, todavia, um ato criador, ou seja: Ele teria criado a primeira célula viva, da qual vieram todos os seres viventes, inclusive o homem. 10. O liberalismo reage contra um evangelho individualista, capaz de salvar o homem do inferno e não da sociedade corrompida, e insiste em que o reino de Deus não é além-túmulo e nem milénio, mas sim a sociedade ideal edificada pelo homem com o auxílio de Deus. 11. Na busca duma "sociedade ideal" muitos teólogos se têm inclinado para uma espécie de socialismo cristão, envolvendo-se em movimentos subversivos por acreditarem que as doutrinas de Marx e Engels, se destituídas de seu ateísmo, estariam em melhores condições de atender aos reclamos dos povos pela justiça social de que a própria mensagem evangélica. 2.3. O Novo Ortodoxismo de Karl Barth Esta teologia é comumente conhecida por barthianismo, por ter como seu principal autor Karl Barth (1886-1968), considerado o maior teólogo do século XX. Este sistema possui ainda vários outros nomes: teologia dogmática, teologia da crise, neo-ortodoxia, teologia transcendental, modernismo-negativista e teologia de Lund. 2.3.1. Alguns dados sobre Karl Barth Karl Barth nasceu na Suíça, leccionou teologia nas universidades de Gottingen, Munique e Bonn, mas foi demitido deste último posto pelo governo hitlerista, em 1935. E, por resistir às tentativas do ditador de nazificar a Igreja Reformada da Alemanha, teve seus diplomas de teologia anulados. Com a derrota do nazi-fascismo, recupera sua
  • 29. 29 cátedra em Bonn, de onde mais tarde se transfere para Basiléia. Aposentou-se em 1961 e iniciou a elaboração da sua teologia. 2.3.2. O pragmatismo e a teologia dialéctica de Karl Barth Barth abandonou o terreno firme da lógica e ingressou no mundo fabuloso do pragmatismo, doutrina que considera a acção superior ao pensamento e aceita o valor prático como critério da verdade. Hegel passou a aceitar que a presença da verdade está na verdade na síntese, que corresponde ao grau intermediário entre a tese e a antítese. Barth, ao aplicar esta fórmula ao cristianismo histórico, considerou-o como a tese, o modernismo como a antítese e o novo modernismo como a síntese. Dentro de um esquema teológico dialéctico coexistem pacificamente doutrinas antagônicas: o certo e o errado, a verdade e a mentira. Daí a teologia de Barth pode ser também denominada de teologia dialéctica ou da crise. Violando dessa maneira as regras pelas quais se estabelece se uma tese é verdadeira ou não, o barthianismo acabou negando o carácter absoluto da verdade. 2.3.3. A teologia de Karl Barth manteve alguns pontos de vista ortodoxos Não se pode deixar de reconhecer que, sob vários aspectos, a teologia de Barth foi um retorno, embora aparentemente, às várias doutrinas bíblicas desprezadas pelo liberalismo, como a Trindade, o nascimento virginal de Cristo, as duas naturezas de Cristo unidas numa só pessoa, conforme aceita pelo Concilio de Calcedônia (ano 451) e pela Reforma Protestante, a salvação somente pela graça e a justificação unicamente pela fé. Em virtude destes pontos de vista, foi o barthianismo chamado também de neomodernismo e neo-ortodoxia. A respeito da pessoa de Jesus, é interessante ler o que Barth escreveu em 1960, em um tempo de revisão da sua própria teologia: e de forma consequente, em todos os seus enunciados, directa ou indirectamente, doutrina de Jesus Cristo como da palavra viva de Deus dita a nós. Portanto, observamos que na teologia de Karl Barth, procurou-se preservar a cristologia.
  • 30. 30 2.3.4. Algumas Falhas Da Teologia De Barth Mas a teologia de Barth possui falhas seríssimas: a Bíblia não é a Palavra de Deus, apenas a contém. Por isso pode ela ser criticada à vontade. Estabelece um falso contraste entre a autoridade espiritual da Igreja, por ele aceita, e a sua autoridade legal, que rejeita. Assim, deixou a porta aberta à discussão acerca de doutrinas. Segundo esta teologia transcendental, o mundo está cheio de contradições, inclusive na religião. Por isso os seguidores desta escola admitem sistemas que se excluem mutuamente. Um dos seus líderes declarou: Em face do modernismo e da fé histórica, não se deve dizer um ou outro, mas um e outro. Isto equivale a aceitar a doutrina de que Jesus é o único mediador entre Deus e o homem e ao mesmo tempo admitir a mediação de Maria. Um transcendentalista, portanto, assemelha-se a um balconista que vende exactamente o produto que o freguês deseja, seja este freguês cristão histórico ou liberal. 2.4. O desabafo de Francis A. Schaeffer Francis A. Schaeffer narra o desabafo de um ateu sueco, Dr. Hedeinus, professor de Filosofia da Universidade de Uppsala, que chamou os teólogos transcendentalistas de "ateus, disfarçados em bispos e pastores: o cristianismo, não o quero; os seus conceitos não são nem claramente definidos, nem mesmo definíveis; a posição dos seus defensores é mais vacilante do que a minha." 2.5. Emil Brunner - Cristo Absoluto ou relativo? Emil Brunner (1889-1966). Teólogo suíço; exerceu grande influência no protestantismo dos Estados Unidos, país onde proferiu diversas preleções. Suas obras foram traduzidas para o inglês antes mesmo que as de Barth. Sintese do pensamento teológico de Brunner A teologia de Brunner, também conhecida por "dialética" e "da crise", descreve a busca da verdade por meio de debates entre as posições contrárias. Brunner acha que há alguma revelação fora da Bíblia, embora não acredite que a teologia natural inclua a teologia revelada, discordando nesse ponto do liberalismo de Barth. Entende que a Bíblia é o único critério pelo qual podemos julgar a verdade e a
  • 31. 31 suficiência do conhecimento acerca de Deus, que se encontra em outros lugares. Diferentemente de Barth, Brunner admite que se pode achar verdade no filósofo, no ateu ou no adepto de seitas não cristãs, assim estabelecendo diálogo com eles, mas reconhecendo que eles não podem possuir suficiente e completo conhecimento verdadeiro de Deus. A teologia Brunniana e Jesus Na teologia brunniana, o dogma de Jesus sem pecado é acto de fé e não base de fé. "Cremos que ele é sem pecado por crermos nele. Não é que cremos nele por causa de Ele ser sem pecado." Brunner nega, além de outros, o nascimento virginal de Cristo, os 40 dias pós-ressurreição, e a ascensão física do Senhor. As questões acima apresentam implicações seríssimas: ao admitir que Jesus Cristo pode ser conhecido historicamente, Brunner faz perder tudo. Na teologia de Brunner, A relação do homem com Deus não pode ser expressa em termos racionais e lógicos, mas apenas em termos de mitos; Qualquer tentativa para provar a revelação está errada; Acerca do pecado, nega a herança de culpa de Adão, aceitando apenas a queda individual; O cristão deve ser um eterno revolucionário, não se conformando com as reformas sociais, sempre imperfeitas; O amor de Cristo revela o amor humano, que é possibilidade impossível; A queda não modificou a natureza e estrutura essenciais do homem, assim como a cegueira não retira o olho do corpo; No momento em que a pessoa se transcende, surge a memória da perfeição original. III- CAPITULO: NOVAS CORRENTES TEOLOGICAS 3.1. A Teologia Do Mito A teologia do mito tem como um de seus principais criadores o teólogo alemão Rudolf Bultmann (1884-1976), que em 1941, numa conferência intitulada "O Novo Testamento e a Mitologia", disse que esta parte das Escrituras está cheia de mitos à luz dos quais se deveriam examinar a pessoa de Cristo e o comportamento da Igreja apostólica. 3.1.1. A visão do Bultimann dos escritores do NT Para Bultmann, todos os escritores do Novo Testamento pensavam e escreviam tendo em vista uma visão global do mundo antigo, no qual havia três divisões: a
  • 32. 32 superior ou invisível, habitada pelos anjos, o mundo sobrenatural de Deus; o mundo inferior, escuro, habitado pelos demónios; e o nosso mundo, que fica entre os outros dois. Segue-se, portanto, que a revelação vem em símbolos que devem ser decodificados. Para usar o termo de Bultmann, devem ser desmitologizados. Numa de suas conferências, afirmou Bultmann que hoje "não se pode utilizar a luz eléctrica e os aparelhos de rádio, apelar para medicamentos e clínicas modernas quando se está enfermo, e ao mesmo tempo crer nos milagres do Novo Testamento." De acordo com essa visão, pode-se crer em Jesus Cristo e aceitá-lo como Deus e Salvador sem a necessidade de acreditar no nascimento virginal, na encarnação, no túmulo vazio, na Ressurreição e na segunda vinda. Todos estes elementos seriam derivados da mitologia judaica e do gnosticismo helenístico. Segundo Bultmann, a desmitificação dos evangelhos não significa a eliminação do mito, como procurou fazer a teologia liberal, mas a sua interpretação através de uma hermenêutica particular, sendo eles necessários por oferecerem ao homem condições de perceber o enigmatismo do mundo. Assim, através da sua reinterpretação, o mito seria utilizado como instrumento auxiliar na compreensão da existência humana. O que é a desmitologização que Bultmann propõe? Em seu questionamento sobre as escrituras, há a necessidade de extrair todo o elemento mitológico, que segundo ele, encobre o entendimento das sagradas escrituras para o homem moderno. Vê na desmitologização, um instrumental importante para a actualização da mensagem bíblica tornando-a compatível com o mundo tecnológico e cientifico que vivemos hoje. O homem/mulher moderno, embora seja um ser que viva em uma sociedade de muitos símbolos e sinais, precisa descodificar o significado desta vasta simbologia. Carece de um tradutor ou seja, necessita de uma ferramenta que actualize a linguagem mitológica das Sagradas Escrituras, vigentes à época, para o código de linguagem e a cultura dos nossos dias. Segundo Bultmann, o uso do processo da desmitologização das Escrituras elucida, esclarece e traz nitidez ao leitor, acerca do que realmente a mensagem bíblica quer nos dizer hoje em dia. Pois para o homem/mulher secularizado os elementos mitológicos das escrituras, fruto de uma cultura passada há quase dois mil e quinhentos anos não fazem nenhum sentido. Devem ser extraídos, sem a perda do conteúdo original, pois sem uma
  • 33. 33 decodificação e uma actualização do sentido, a mensagem não nos diz o porquê, ou pior ainda, pode levar a uma interpretação dúbia e incompreensível. A Escritura não explica a si mesma, conforme ensina a hermenêutica da Reforma Protestante, mas está sujeita aos métodos modernos da ciência autónoma e às pressuposições filosóficas; 3.1.2. Exame Crítico Da Teologia De Bultmann Bultmann rejeita, por considerá-los mitológicos: 1) Os conceitos neotestamentários de que o reino escatológico está prestes a irromper na história; 2) de que o mundo actual está governado por elementos demoníacos 3) e de que o sobrenatural intervém no mundo, manifestando-se através de milagres. Na sua reinterpretação do evangelho, elimina o sentido original dos termos encontrados no NT e os recria adoptando uma nova significação. Ex. Segundo a visão tradicional, o problema do homem é o seu pecado, segundo o Evangelho, e a solução é o sacrifício de Cristo. Para Bultmann, tal problema é a sua finitude. O uso da filosofia contemporânea para formular a fé cristã pode distorcer o ensino cristão, introduzindo ideias estranhas ao Cristianismo através da reinterpretação da terminologia tradicional, e acomodar a fé cristã à filosofia tradicional; Ao ensinar que a teologia existencialista é antropocêntrica, concorda com Fenerbach de que a teologia tornou-se antropologia; Depois do programa de desmistificação dos evangelhos, o Jesus que sobra é tão débil que jamais chamaria a atenção de alguém, e muito menos motivaria a sua lealdade. Um Jesus assim insignificante tem sido o tema de peças teatrais profanas e irreverentes, como a "Jesus Cristo Superstar", na qual Judas Iscariotes é o verdadeiro herói e Cristo não passa de uma figura covarde, que duvida a todo momento da sua missão; Bultmann ignora por completo o papel do Antigo Testamento na formação do Novo, ao considerar este eivado de mitos e influenciado pelo gnosticismo ou helenismo; A "Sola fide" de Bultmann nada tem de semelhante à de Lutero, que se baseava no testemunho bíblico.
  • 34. 34 3.2. A Teologia da Esperança2 A teologia da esperança tem sido articulada nos Estados Unidos por dois teólogos luteranos, Carl Braaten e Robert Jenson, as suas obras tem como objectivo popularizar o novo movimento. Jürgen Moltmann nasceu em 18 de abril de 1926 em Hamburgo. Iniciou seus estudos de teologia numa situação inusitada. Com dezesseis (1943) foi reira Após seis meses na guerra, foi feito prisioneiro no campo de concentração de Northon- Camp, na Inglaterra. Ali se encontravam também alguns professores de teologia que ministravam lições aos seus companheiros; dentre eles, Jürgen Moltmann. Em 1948 retornou para Alemanha onde deu continuidade nos seus estudos na Universidade de Göttingen até 1952. De 1953 a 1958 exerceu actividades pastorais em Bremen. Suas especialidades foram: História dos Dogmas e Teologia Sistemática, iniciou sua docência em 1958 passando pela Escola Kirchliche Hochschule de Wuppertal, pela Universidade de Bonn, Universidade de Tübingen, Due University - EUA (no carácter de professor visitante). Depois de Karl Barth, Jurgen Moltomann é considerado o mais conhecido e influente teólogo reformado do século XX" (LEITH, 1997, p.234). No Brasil, Rubem A. Alves, com umas poucas revisões dele mesmo, muita coisa fez para converter a teologia da esperança em programa de acção. Às vezes essa teologia era chamada de futurologia... Porque? Por ser um modo de encarar a teologia e as preocupações teológicas da perspectiva do futuro e não do passado ou do presente. O passado e o presente somente têm valor com referência ao futuro. A realidade ainda não é; está orientada para o futuro. A questão da existência de Deus pode ser respondida somente no futuro, pois Deus está sujeito ao tempo enquanto este se esforça em direcção ao futuro. A teologia da esperança é caracterizada... como uma reacção ao desespero existencialista, pela fé no futuro e pelo optimismo, a esperança baseia-se na promessa divina e o cristão suporta as contradições do presente porque vive na expectativa do futuro. Não enxergar uma solução para seus dilemas presentes. Assim, a teologia da esperança acha que não podemos encontrar respostas para as nossas questões atuais na 2 https://teologiacontemporanea.wordpress.com/2009/10/07/teologia-da-esperanca-jurgen-moltmann-e-a- analise-escatologica-existencial/, pag. Consultada aos 02/05/2014
  • 35. 35 sociedade de hoje. Abrange mais do que geralmente se reconhece tradicionalmente como sendo teologia, falando a rigor. Sua orientação secular permite que seja combinada com qualquer número de matérias, inclusive a política e a biologia. A teologia da esperança vê um esboço para sua exposição nas temáticas escatológicas. Ela entende a realidade a partir de uma perspectiva escatológica. O movimento também é chamado de teologia futurista. A teologia da esperança reage contra o subjectivismo da neo-ordoxia, visto que sua abrangência vai além do universo pessoal e interior de individuo. Esta teologia se dirige ao mundo como mundo. A teologia da esperança foi a resposta do público a teorias como a que Deus está morto, ideia que foi criada na década 60. Os teólogos futuristas deixaram para trás o sepulcro criado para Deus. O humanismo dos teólogos de Deus-está-morto veio a ser a sementeira em que a teologia da esperança deitaria raízes. 3.2.1. Entendendo a teologia futurista de Moltmann. A chave central para entender a teologia futurista de Moltmann é a sua ideia de que Deus está sujeito ao processo temporal. Neste processo, Deus não é plenamente Deus, porque ele é parte do tempo que avança para o futuro. No cristianismo tradicional, Deus e Jesus Cristo aparecem fora do tempo, no atempo. Na teologia de Moltmann, a eternidade se perde no tempo. Para Moltmann, o futuro é a natureza essencial de Deus. Deus não revela quem ele é, e sim quem ele será no futuro. Desta forma, Deus está presente apenas em suas promessas. Deus está presente na esperança. Todas as afirmações que fazemos sobre Deus, são produto da esperança. Nosso Deus será Deus quando cumprir suas promessas e com isso estabelecer o seu reino. Deus não é absoluto; ele está determinado pelo futuro. Segundo Moltmann, toda teologia cristã deve modelar-se através da escatologia. Acontece que a escatologia para ele não significa a previsão tradicional da segunda vinda de Jesus. Moltmann interpreta como aberta ao futuro, aberta à liberdade do futuro. Deus entrou no tempo, e consequentemente o futuro se tornou algo desconhecido tanto para o homem como para Deus.
  • 36. 36 O cristianismo evangélico relaciona intimamente a ressurreição de Cristo com a escatologia. O Cristo ressuscitado é “as primícias” da ressurreição (1Coríntios 15.23; Act. 4.2). A morte e ressurreição de Cristo são a garantia que Deus dá de que haverá Ressurreição futura, e por isso, o começo da Ressurreição final. A Ressurreição de Cristo é um facto histórico que atribui pleno significado ao nosso futuro. Porém, para Moltmann, a questão da historicidade da Ressurreição corporal de Jesus não é válida. Jesus ressuscitou dentre os mortos há quase dois mil anos com seu corpo físico? Para Moltmann essa é uma questão sem importância. Não devemos olhar desde o Calvário para a Nova Jerusalém, e sim olhar o nosso futuro ilimitado para o Calvário. Afirma-se tradicionalmente que a Ressurreição de Cristo é a base histórica da Ressurreição final. Moltmann porém diria que a ressurreição final é a base da ressurreição de Jesus. Ainda quanto ao futuro, Moltmann diz que o homem não deve olhá-lo passivamente; ele deve participar activamente na sociedade. A tarefa da Igreja não é apenas de se informar sobre o passado para mudar o futuro. É também “pregar o Evangelho de tal forma que o futuro se apodere do indivíduo e lhe impulsione a agir de modo concreto para mudar o seu próprio futuro. O presente em si mesmo não é importante. O importante é que o futuro se apodere da pessoa no presente”. Para que o futuro se realize na sociedade, as categorias do passado devem ser descartadas, pois não existem formas ou categorias fixas no mundo. O futuro significa liberdade e liberdade é relatividade. O principal propósito da Igreja é ser o instrumento por meio do qual Deus trará a “reconciliação universal e social”. A participação da Igreja na sociedade poderá utilizar a revolução como meio apropriado, mesmo que ela não seja necessariamente o único meio. Neste avanço para o futuro, o problema da violência versus não-violência recebe o nome de “problema ilusório”. A questão não é a violência em si, mas sim se o uso da violência foi justificado ou injustificado. Essa tendência pragmática em que os fins justificam os meios é uma tendência muito forte dentro da Teologia da Esperança. Assim como na “Teologia Secular”, aqui também pode ser vista uma profunda consciência para com o mundo. A ideia de Moltmann de considerar a Bíblia desde o começo como um livro escatológico pode parecer um atractivo para o cristão ortodoxo. Realmente um assunto tão importante quanto a escatologia não deveria ocupar as
  • 37. 37 últimas páginas em nossos livros de teologia sistemática. Porém, qualquer conservador certamente saberá reconhecer os erros patentes de Moltmann, bem como os horrores que trariam a sua visão ética. 3.2.2. Objecções à Teologia da Esperança. Moltmann critica muitos conceitos neo-ortodoxos, mas ele acaba levando os conceitos barthianos muito mais longe. Barth havia transcedentalisado a escatologia por meio do emprego da distinção entre Historie e Geschichte, mas Moltmann foi ainda mais além, e rejeitou todo o conceito objectivo da história. Se por um lado a dialéctica de Barth acabou com a possibilidade da relação entre história e fé, a teologia de Moltmann destruiu até mesmo a possibilidade de haver história. Ainda que Moltmann revista sua escatologia de conceitos bíblicos, seu sistema está mais fundamentado no marxismo do que em Cristo. O primeiro livro de Moltmann, “Teologia da Esperança” nasceu de um diálogo com o ateu alemão Ernst Bloch, e quando lemos o seu segundo livro, vemos que nesse intercâmbio, Moltmann assimilou muitas ideias de Bloch. A ideia que Moltmann tem da escatologia é destituída de base bíblica. Apesar de todo esforço de Moltmann para produzir uma teologia bíblica, no final, seu sistema nada mais é do que uma teologia centralizada no homem, em um homem que observa o futuro e age na sociedade. A meta do futuro de Moltmann não é a plena manifestação da glória de Cristo; ela é a edificação da utopia na terra. Para ele, o Reino de Deus se introduz na terra por meio da política e da revolução. Para o apóstolo Paulo, no entanto, o Reino de Deus é, e será introduzido por meio da proclamação do poder salvador de Jesus Cristo (Actos 28.30-31). Para Moltmann, esse reino é também uma realidade terrena e tangível; o Reino de Deus, no entanto, é descrito na Bíblia como celestial. Para Moltmann, o Reino de Deus é trazido por meio da revolução; no entanto, segundo a Bíblia, o Reino de Deus traz a paz, e não a guerra (Romanos 14.7). Quanto ao conceito de Deus, ele não admitia nenhum Deus eterno ou infinito. Ao entrar no tempo, segundo ele, Deus se tornou finito e aberto a um futuro desconhecido. O Deus da Bíblia existe de eternidade a eternidade; o de Moltmann, porém, só existe no futuro, pois no presente ele sequer é Deus. Como observou certo escritor: “No monte
  • 38. 38 sinai, Deus disse a Moisés: Eu sou o que sou, mas Moltmann não permitua que Deus lhe dissesse o mesmo. A teologia de Moltmann tem maior dívida com Nietzche, com Overback e com Feurbach do que com Paulo, Pedro ou João. Ela é mais marxista que bíblica, e mais filosófica que teológica. Em seu afã de refutar as teologias não-ortoxas do seu tempo, Moltmann ultrapassou o limite do bom senso e acabou por propor uma teologia quase tão nociva quanto aquela a que ele se dedicou a refutar. Essa teologia do Deus finito e temporal, e que ainda incita a rebeldia e a revolução, não pode ser teologia bíblica. Ela é antes, um tropeço, um escândalo e uma nociva ameaça à sã doutrina. IV- CAPITULO: AS TEOLOGIAS SOCIAIS Na teologia social é ressaltado do conteúdo ético e social da Igreja. Portanto, nas teologias sociais, analisamos as seguintes questões: Qual é a realidade social na qual está inserida a igreja? Qual o papel da igreja junto aos problemas encontrados na sociedade? Como a Igreja pode ser um instrumento de transformação social? 4.1. É boa a aproximação entre teologia e ciências sociais? Alguns teólogos, de perfil, fundamentalista, rejeitam por completo tal aproximação. Na prática, ocorre o contrário, pois qualquer teologia é feita num ambiente cultural e que a influência. Ao estabelecer um diálogo com as Ciências Sociais, o teólogo cristão terá, por sua vez, de renunciar sua posição cómoda de considerar sua religião um santuário protegido de críticas. 4.2. Personagens do Evangelho Social O evangelho social teve como o seu maior intérprete o pastor Batista Walter Rauschembusch (1861-1918), professor no seminário baptista de Rochester, de 1897 até o seu falecimento. Um outro grande nome a lembrar é o do Pastor Martin Luther King, que lutou nos Estados Unidos contra o preconceito racial e a injustiça social contra os negros. Ele foi o responsável por disseminar a prática do protesto não violento, semelhantemente a Gandi.
  • 39. 39 Há uma frase de Martin Luter King: "Eu não me preocupo tanto com as palavras dos desonestos e as atitudes dos corruptos. Eu me preocupo muito mais, quando os bons fazem silêncio." 4.3. O Evangelho Social na América do Sul O evangelho social na América do sul Na América do Sul, esse movimento pode também ser identificado como a "teologia da libertação", com o propósito comum de estabelecer-se a "justiça social", até mesmo por meio de uma revolução. O sucesso da teologia da libertação na América do sul deve-se aos seguintes factores:  Grandes índices de desemprego.  Diferenças sociais alarmantes.  Pobreza.  Diferenças Extremas entre classes sociais.  A ausência de uma teologia relevante ao contexto da América latina, que nascesse no berço dos países subdesenvolvidos. A teologia do evangelho social alcançou maior sucesso nos anos seguintes à Primeira Guerra Mundial, pelo fato de se atribuir às injustiças sociais as causas da grande conflagração internacional que ceifou milhões de vidas. Precisamos entender que no evangelho social, a Igreja é o instrumento de libertação para uma sociedade que está inserida numa estrutura social injusta e corrupta. O movimento do evangelho social teve o seu lado positivo: Procurou levar a Igreja a empenhar-se em actividades mais amplas em favor dos menos favorecidos da sorte, Criticou os governos corruptos e os sistemas ideológicos injustos. Foi uma resposta nova da ética cristã em uma nova situação histórica, pois, particularmente nos Estados Unidos, era grande o número de problemas decorrentes do rápido crescimento industrial. A consciência cristã, assim desafiada, converteu-se numa "consciência social".
  • 40. 40 V- CAPITULO: TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO, UMA RESPOSTA À CRISE ECONÓMICA, SOCIAL LATINO- AMERICANA E AFRICANA Até aqui a nossa abordagem tem sido principalmente teórica, passando pelas principais escolas teológicas da era contemporânea. Temos analisado as doutrinas dessas escolas e em nenhum momento fugimos da responsabilidade de apresentar o nosso parecer. A análise que fazemos dessas propostas teológicas encontra seus pressupostos na ortodoxia bíblica, conforme já foi dito no capítulo primeiro. Apesar da relevância dos problemas até aqui levantados, a influência dessas escolas teológicas na nossa teologia e em nossas denominações é pequena, ou quase nula. Muitos dos programas teológicos até aqui apresentados foram postos em carácter de informação, e talvez o leitor nunca se depare com os problemas aqui levantados, salvo nas esferas seculares, onde o liberalismo teológico e o naturalismo têm estado activo e presente. Nas comunidades eclesiásticas brasileiras, quase não se vê a influência desses movimentos, a não ser um ou outro incidente recente de pastores que abraçaram a teologia relacional ou social, apresentada anteriormente. Porém, à partir desse capítulo, abordaremos três correntes teológicas cuja presença é marcante no Brasil, e em alguns países Africanos, cujos pressupostos tem de alguma maneira modelado a forma de fazer teologia. A primeira dessas três escolas, de origem Latina, é a Teologia da Libertação. 5.1. Contextualizando a teologia da libertação na América Latina. Nas décadas de 60 e 70, o ambiente teológico da América Latina passou por sérias transformações. O ambiente no Brasil e na Argentina era de ditadura. Os teólogos que viveram esse período foram levados a formular uma teologia que fosse menos académica e teórica, e mais laica e prática, que pudesse sanar os problemas sociais e económicos de então. Em meio a uma estrutura social em que um homem velho morre aos vinte e oito anos, onde quinhentos em cada mil crianças morrem antes de completar um ano de idade, onde os estudantes que protestam são torturados, e oitenta por cento da população vive com uma renda de oitenta dólares por ano, a voz revolucionária começou a clamar em favor das massas.
  • 41. 41 Católicos romanos como Juan Luís Segundo, Hugo Assman e Gustavo Gutiérrez Merino, animados pela política mais aberta do Vaticano II; protestantes como Rubem Alves, Emílio Castro, José Míguez Bonino e o então missionário no Brasil, Richard Shaull, se empenharam em buscar uma teologia que pudesse resolver os conflitos sociais da América Ibero Hispana. As palavras-chaves para entender essa teologia social são “revolução”, “libertação”, “exploração”, “dominação estrangeira”, “capitalismo” e “proletariado”. Qualquer semelhança com os conhecidos jargões do comunismo não é mera coincidência. Ele foi a maior fonte de inspiração e o impulso motor dessa nova tendência teológica. Sob a palavra “libertação”, não está subentendida a obra de Cristo por nós, e sim os ideais do marxismo. A palavra, dentro desse movimento teológico significa: a) Libertação política, das pessoas e sectores socialmente oprimidas. b) Libertação social, para melhores condições de vida, uma mudança radical nas estruturas, resultante da criação contínua de uma nova maneira de ser e de uma revolução permanente. c) Libertação pedagógica, para uma consciência crítica através do que o pedagogo brasileiro Paulo Freire chamou de “conscientização”, sendo o cerne dessa conscientização o despertar da consciência das massas miseráveis que vivem a cultura do silêncio, para se inteirarem da dominação social, política e económica que lhes é imposta. 5.1.1. A teologia da libertação e a revolução social. Os teólogos da libertação se declararam várias vezes favoráveis a luta armada, ao ponto de alguns considerarem Camilo Torres, sacerdote colombiano que morreu em um tiroteio como membro da guerrilha de Che Guevara, como o santo patrono da causa. O padre Camilo costumava dizer que “cada católico que não é revolucionário e não está do lado da revolução comete pecado mortal”. Na questão da violência, como se pode deduzir dessas linhas, os teólogos da libertação são bem pragmáticos. Para eles, o problema da violência e da não-violência é
  • 42. 42 um problema ilusório. Apenas existe a questão do uso justificado ou injustificado da força, e se o fim é nobre, os meios se fazem necessário. Essa atitude violenta foi de fato uma proposta aberta aos religiosos para que tomem lugar nas barricadas e lutem em prol do desenvolvimento social e económico da América Latina. No Brasil, Dom Hélder Câmara, então arcebispo do Recife, promove uma revolução pacífica, por não se contentar com as reformas triviais. 5.2. Leonardo Boff e a sua Teologia de Libertação, a principal voz do movimento no Brasil. Embora Hugo Assman e Dom Hélder Câmara sejam dos nomes que representam o pensamento da teologia da libertação no Brasil, actualmente é o Dr. Leonardo Boff que está no centro do debate sobre a teologia da libertação. Como membro do conselho editorial da Editora Vozes entre 1970 e 1985, Boff participou da coordenação e publicação da colecção “Teologia da Libertação”. Em 1984, em razão de suas teses ligadas à teologia da libertação, apresentadas no livro “Igreja: Carisma e Poder”, foi submetido a um processo no Vaticano. Em 1985, foi interrogado pelo cardeal Joseph Ratzinger (o actual papa Bento XVI), então prefeito da Congregação da Doutrina e da Fé, órgão herdeiro da Inquisição, e condenado a um ano de “silêncio obsequioso”, sendo também deposto de todas as suas funções editoriais e de magistério no campo religioso. Dada a pressão mundial sobre o Vaticano, a pena foi suspensa em 1986, podendo retomar algumas de suas actividades. Em 1992, sendo de novo ameaçado com uma segunda punição pelas autoridades de Roma, “apostatou” de sua condição de padre e da própria Igreja Católica para se unir com uma mulher. “Mudou de trincheira para continuar a mesma luta”: continua como teólogo da libertação, escritor, professor e conferencista nos mais diferentes auditórios do Brasil e do exterior, assessor de movimentos sociais de cunho popular libertador, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e as Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s), entre outros. Curiosamente a cúpula da CNBB parece continuar com boas relações com Boff, apesar de sua “apostasia” e de seu marxismo. Os três passos básicos da teologia da libertação de Leonardo Boff:
  • 43. 43  Ver: Aqui observamos os problemas sociais existentes e nos tornamos conscientes de sua existência.  Pensar: Neste passo, teorizamos teologicamente as questões sociais que serão abordadas pela Igreja na sociedade.  Agir: este é o passo da práxis, da acção, onde os fiéis são convocados para promover mudanças e transformações nas estruturas sociais. 5.2.1. Os pressupostos da Teologia da Libertação e as objecções à doutrina. O ponto de partida para a elaboração da teologia da libertação, segundo o peruano Gutiérrez, “é o esforço do ser humano para ser parte do processo através do qual o mundo será transformado”, o que faz da teologia da libertação mais um movimento político que um movimento exactamente teológico. Tal ponto de partida deve ser contextual, com raízes na dimensão humana e política, e a teologia deve ser elaborada à partir de elucubrações sociopolíticas. Como movimento político, ela tem sido um brado a favor da dignidade humana, de uma sociedade mais justa e fraterna. Porém, o que eles admitem na teoria, foi negado por eles mesmos muitas vezes na prática. A salvação, dentro da cosmovisão libertária, se resume em “um processo que abarca o homem e a história”, e o evangelho, em nossa época, deve ter uma transcrição e aplicação política. O encontro com Deus é descrito como “o compromisso com o processo histórico da humanidade”. Essa concepção de salvação talvez corresponda à ideia judaica de messianismo na época de Cristo, mas pouco tem a ver com o conceito tal como utilizado por Jesus e por Paulo. A responsabilidade social é um dever do cristão, mas a salvação não se restringe a essa responsabilidade: salvação significa perdão e cancelamento dos pecados cometidos contra Deus (Hebreus 9.28, 1João 3.5). Nesse processo de teologia libertária, a missão da igreja acaba por confundir-se com confrontamento político e adesão e exposição de ideias sociais, mas a missão do cristão, segundo a Bíblia, é proclamar que o filho de Deus ressuscitou e tem poder de perdoar pecados.
  • 44. 44 É preciso ressaltar que as afirmações de violência não são de nenhum modo característica de todos os teólogos da libertação. Toda rotulação é pobre, e nesse sentido, há de se admitir a classificação do movimento da teologia da libertação como um movimento violento é falha. Ainda assim, não podemos deixar de aludir que, ainda que não totalmente, a teologia da libertação é fortemente um movimento violento. Como disse, Rubem Alves, também teólogo libertário, “a violência se converte na força que move a história no caminho para conduzir à sociedade perfeita”. Em outras palavras, é justo empregar a violência contra a violência, pois neste caso, os fins justificam os meios. Ele também afirma que o “amor para os oprimidos significa cólera contra os opressores”. Como é difícil associar todo esse discurso com as palavras de Jesus no Sermão da Montanha! Como o evangelicalismo deve responder a essa “revolução teológica”? É óbvio que o cristão não deve viver alienado de qualquer ideia política ou deva se conformar a uma mentalidade status quo. O problema é que, conforme temos exposto em tese, a tendência da teologia cristã é polarizar: Ou a experiência, ou a razão; ou a história, ou a fé; e no caso da Teologia da Libertação, ou o marxismo, ou não somos cristãos. Não é preciso polarizar para ter responsabilidade social, nem é preciso forçar a exegese ou fazer exegese para defender pressupostos sociais. Devido à repressão ao movimento, hoje não há muitos grupos ou indivíduos que mantém a Teologia da Libertação. Actualmente o movimento se reduz a algumas “comunidades de base”, que tentam colocar em prática as ideias sociais da mesma, mas a influência nas faculdades ainda é grande. A teologia da libertação está fundamentada em uma postura na qual a presente práxis histórica se transforma em norma canónica para descobrir a vontade de Deus. Ao reflectir algo parecido com a ética situacional, a teologia da libertação não pode escapar das mesmas acusações levantadas contra ela: moralidade relativista e pragmática. Ela foge totalmente a ortodoxia reformada, e não há nenhuma possibilidade de um crente evangélico sustentá-la sem cair em contradição, isso porque a “Sola Scriptura” não admite nenhum “somado a”, ou “junto com”. Nascimento da TDL no Brasil A Teologia da Libertação nasceu da influência de três frentes de pensamento:
  • 45. 45  O Evangelho Social das Igrejas norte-americanas, trazido ao Brasil pelo missionário e teólogo presbiteriano Richard Shaull;  A Teologia da Esperança, do teólogo reformado Jürgen Moltmann;  A teologia política que tinha como seus grandes expoentes o teólogo católico Johann Baptist Metz, na Europa, e o teólogo baptista Harvey Cox, nos EUA. Eventos que precederam o nascimento da TDL no Brasil Há uma série de eventos que precederam o nascimento da Teologia da Libertação:  1952: O missionário presbiteriano Richard Shaull chega ao Brasil trazendo o Evangelho Social e cria uma estreita relação com os pastores presbiterianos Rubem Alves e Jaime Wright;  1964: O teólogo reformado Jürgen Moltmann publica sua obra Teologia da Esperança;  1965: O teólogo batista Harvey Cox publica A Cidade Secular;  1967: O teólogo católico Johann Baptist Metz pronuncia a conferência 5.2.2. Obras sobre a Teologia de Libertação no Mundo O marco do nascimento da Teologia da Libertação no Brasil, está na publicação de uma obra de Rubem Alves, criticando a teologia metafísica de uma forma geral e propondo o nascimento de novas comunidades de cristãos animados por uma visão e por uma paixão pela libertação humana e cuja linguagem teológica se tornava histórica. A primeira participação católica no lançamento da Teologia da Libertação foi a publicação da Teologia da Revolução, em 1970, pelo teólogo belga radicado no Brasil José Comblin. Em 1971, Gustavo Gutiérrez publicou Teologia da Libertação. Somente em 1972, Leonardo Boff surge no cenário teológico com a publicação de Jesus Cristo Libertador. Como Rubem Alves estava asilado nos EUA neste período, Boff passou a ser o mais conhecido representante desta corrente teológica que vivia no Brasil, devido à protecção recebida pela ordem dos franciscanos, à qual ele pertencia.
  • 46. 46 5.3. Teologia de Libertação no contexto Africano A Teologia Africana se enquadra num paradigma pluralista, onde caracterizamos a Teologia de Libertação como uma das mais destacadas. O número de livros e artigos sobre a teologia africana chegou a tais proporções que não mais se pode dizer com confiança que se conheçam todos os seus aspectos ou desenvolvimentos. Mesmo assim, esperamos, com o presente mostrar que a teologia africana tem um paradigma específico, o qual não é nem aquele da teologia ocidental nem o de outras teologias da libertação. Em primeiro lugar temos de realçar algo sobre a relação entre a teologia Africana e outras teologias da libertação. Depois mostrarmos concretamente a espécie de paradigma que a Teologia Africana de facto tem. Por fim, essa intuição será exemplificada por meio de algumas reflexões sobre a cristologia africana. 5.3.1. Teologia Africana e Teologia da Libertação3 Tòmou-se comum, hoje em dia, falar sobre teologias da libertação no plural. As diversas teologias da libertação incluirão a teologia sul-americana da libertação, a teologia negra norte-americana, a teologia sul-africana, a teologia feminista e a teologia africana (possivelmente ainda outras, como a teologia rastafariana das Antilhas, teologia índia norte-americana, teologia minjung, teologia waterbuffalo, etc.). A teologia da libertação sul-americana caracteriza-se por sua forte ênfase nos pobres e nas precárias condições económicas do povo. A teologia negra se caracteriza pela predominância da questão racial e da desigualdade social, ao passo que a teologia feminista se preocupa primariamente com o sexismo e a desigualdade entre homens e mulheres. Será que a teologia africana pertence a esse grupo? Não automaticamente. Pode-se falar da libertação do imperialismo cultural ocidental. Entretanto, vários teólogos africanos alegam que a teologia africana abrange um campo muito mais amplo. O fundamento da teologia africana não é uma crítica negativa da cultura e filosofia ocidentais, mas uma avaliação positiva de sua própria cultura e filosofia africanas. Isto levou à crítica da teologia negra por parte de John S. Mbiti. Segundo ele, “a teologia negra é demasiadamente negativa, limitada em seu foco e carente de fundamento bíblico adequado” 3 Thor H. Hovland,O Novo Paradigma da Teologia Africana, s/l., s/d., p.213.