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livro
de poesia
Cláudio Schuster
livro de poesia reúne poemas dos livros crime perfeito (edição do autor, 1994), risco (edição
do autor,1997) e bluz (Editora Bloccos, 1999), além de alguns feitos posteriormente.
Cláudio Schuster é jornalista. Nasceu em 1962, em Pelotas (RS). Mora em Florianópolis
desde 1986.
agosto de 2013
para Juliana, Theo e Pedro.
pensar nos diferencia
amar nos poesia
de medo do escuro
morro de altura então
nem se fala de tudo
me assusta um sussurro
e gelo todo silêncio
me arrepia a alma penada
que salta pela janela do quarto
do pânico que entro
com um simples
beijo
se você vem
para pouco
pouco
faz sentido
a um louco
varrido
crime perfeito
venha com violência
traga desordem
ponha tudo a perder
destrua minha vida
mate-me
e esconda meu corpo
entre tuas pernas
diga apenas
uma frase incomum
dessas que mordem
e fazem rir
mal te vejo
bem
te
vi
assovioviropássaro
leve
ao fogo
à chama
leve
queime
aos poucos
como o diabo
me carregue
quando ela descasca o sol
e come seu calor
derrete um cálice
em chuvas cortantes
como dentes de cristal
que cravam em colinas de sangue
temporais de sorrisos
que afundam de rir
arcas lotadas
de mim
dentro
de mim
dormem
teus dentes
sobre um sol
mordido
corro
o risco
que rabisco
giro
360 graus
de febre
suo vinho
me enrolo
nos fios
de alta tensão
e ilumino
um sabor
com a cabeça
nos pés
que dançam
descalços
na calçada
de cacos
de vidro
que brilham
na noite
como pequenos dias
derramados
sobre o solo
de uma guitarra
que explode
minhas veias
em meteoros
que grito
sob o riso
que me bebe
ilusão
azul intocável
a tarde passou
a noite partiu
o dia
em pedaços
a obviedade
obviamente chutando a poesia
procurou-me na seção de achados
ora
tenha paciência!
perdidos não se encontram
na seção de achados
talvez na sessão de cinema
nunca na de achados
que achar é fugaz
e um tremendo azar
para quem quer apenas
estar perdido
jogou-se
fruta a dentro
da minha boca
ela me fodeu
louca
e estraçalhadamente
e tanto
que sobraram peças
quando tentei remontar
o que restou
na manhã embaralhada
será que por isso
saí flutuando?
não me traga
me leve
me siga
me parta
em um só
lá vem um poema
se aproximando
desajeitado
tropeçando
cambaleando danças
acho que esse poema bebeu
se abraça em mim
e de repente
saímos pela rua
dançando
tropeçando
nas margens sóbrias
das calçadas
e zigue
e zague
descalços
rindo à toa
de nossos passos
humorísticos
acho que bebi
um poema
bêbado
das alturas
jogou-me um azul
das profundezas
mandei-lhe lavas vermelhas
corro
com milhares de coelhos
sobre os olhos
fechados
das colinas
que se banham de sol
que come
sorridente
uma cenoura
ria
noturna
estrelada
sobre
mim
toque meu coração
como quem toca uma canção
como quem toca um violão
viole minha razão
a vida
tanto
melhor
fica
quanto
mais
da fantasia
se aproxima
disse a formiguinha
beijando tua boca
no guardanapo
de papel
duelo à sam peckinpah
o desejo tem o sabor
de uma nudez esvoaçante
montada na bala de um beijo
veloz como quem
num duelo com deus
saca antes da dúvida
o copo gira
com meus olhos dentro
o blues de buddy guy
é uma trepada
numa noite louca
de raios nas minhas veias
o mundo é uma besteira
dita por alguém
que nunca beijaria esta noite
no meio das pernas
hoje eu não saio
eu bebo meus olhos
que te olham
bêbados de música
hoje dá pra rir
do mundo
depois
não sei
e nem quero saber
era uma vez
uma saudade
de viver
como se só a vida
existisse
jogo as palavras
pro ar
em bando
voam
poesias
um poema
precisa ter início
e um meio
de não ter fim
nada que reflete
arremessa
ameaça
estremece
a minha pressa
não permite
ver o visto
sem ver o vasto
o que não remete
não me interessa
não me atiça
o que não existe
é relativo
se num dia me matam
no outro
estou vivo
dia de mais nada
dormingar
e chover
sobre você
as palavras não me fogem
pois não as prendo
não me faltam
porque são livres
estão aqui
nestes poemas
apenas
para se divertir
toque
do toque
que me loque
um lance
num pique
de moleque
e o queéque
eu faço
em chequemateme?
não sei direito
como
virar
tudo
pelo avesso
e então
todo o mundo parou
pra trepar de dia
na hora do trabalho
e à noite
o mundo dormiu
exausto
feliz
e não era mais
o mundo
quando acordou
era uma porra louca
voando no espaço
pra fecundar o sol
que nascia
da minha garganta
a vítima se aproxima
apunhalando o chão
como se apenas caminhasse
como se somente fossem sapatos doces
a vítima assalta meus olhos
apontando mísseis nucleares
como se apenas olhasse
como se somente fossem olhos os seus
a vítima esquarteja meu corpo
deslizando uma serra elétrica
como se apenas tocasse
como se somente fosse uma boca a sua
a vítima parte
sorrindo
como se apenas houvesse
cometido um avesso
walking the blues
com um pouco de silêncio
o mundo poderia ouvir
o compasso de teus saltos finos
sobre a rua deserta
um pouco mais de silêncio
e se ouviria nítido
como um absurdo
o blues que pensei
depois da meia-noite
é outro dia
é outra noite
depois do meio-dia
é outro
é meio
é coisa nenhuma
depois
quem sabe
mais tarde
se não for tarde
demais
dói tanto
que nem sei
dói tanto
que esqueci
as palavras bocejam
está na hora de dormir
bom dia
você me come
entro em coma
você me bebe
coca-coma
as farsas estão cansadas
de ser repetidas
reprisadas
em sessões contínuas
de tortura
de tontura
da história
acabou
não há mais
o que escrever
o dito não foi vivido
a poesia não cortou
o sangue não correu
não saciou
a boca seca
calada
as luzes dançam
com o planeta
sob meus sapatos
que reclamam
que bebi demais
e ouvem
"mas não o suficiente
não o suficiente
meus caros
pra ver tudo duplo
como é
e não parece ser"
para onde me viro
lá está ele
real
e estupidamente desenhado
o mundo
não caibo
nas palavras
nas frases
na poesia
e não consigo
inventar nada
tudo já existe
ou não
beije-me
desafogue
minha língua
de tudo
o que já foi
dito
errante
ou errei o mundo
ou errei a hora
a chuva
não simboliza nada
a chuva
é água que entra
e sai
e cai
sobre uma dor
real
que inventamos
o homem acordou
com o som nos olhos
e os olhos no teto
de seu pequeno mundo
a mulher resmungou
pedaços de palavras
o homem riu
porque pensou
ter ouvido o terço
de trás para frente
riu mais
porque pensou
que não tinha diferença
do terço dito na ordem
o som aumentou
o teto abaixou
o terço no quarto
o homem empurrou seu corpo
para fora da cama
calçou sua bola de ferro
pois estava frio
e saiu pelo corredor
para reclamar da invasão
a seu pequeno mundo
a mulher que abriu a porta
disse que estranhava sua demora
para vir escutar música
escrever qualquer coisa
nas paredes
e usar a boca
para coisas mais interessantes
do que dizer o terço
na ordem ou ao revés
enquanto ouvia
atingiu sete pontos
na escala richter
a mulher pegou a bola de ferro
e colocou no cabide
pois pensou que fosse a causa do frio
e da tremedeira
que derrubou os dias
do calendário
em que cristo olha o teto
de um mundo pequeno
no apartamento do homem
o resto da noite
poderia levar richter
a repensar sua escala
pela manhã
cabelos atirando para todos os lados
atravessou o corredor
na contramão
das galinhas
patos porcos e sapos
matinais
a mulher preparava o café
e tudo o que o homem falou
foi assistido em silêncio
pelos dias do calendário
espalhados pelo chão
pela mulher
que cobria os ouvidos
com algodões amarelos
e pelo próprio homem
entorpecido com o eco
das implosões simultâneas
que vinham das noites seguintes
os dias
desde então
não mais existiram
varridos pela mulher
para debaixo do tapete
em que o homem voou
e cristo
nem se deu conta
distraído
com as moscas no teto
um instante
ludibriou
os ponteiros
cordeiros de deus
na distração do tempo
um momento fugiu
com um corte no olhar
fazendo jorrar
rios ameaçadores
e o mundo
virou um ponto
incapaz de deter frases embriagadas
pelos cachos de vinho
que colhi de tuas veias
lenda
consta que deus
antes de ditar os mandamentos
fez um teste com as aves
proibiu rasantes
estabeleceu um teto
limitou distâncias
censurou canções
condenou timbres
cobriu de culpa os cortejos
por isso
enquanto pardais trepam na rua
águias perdem-se nas distâncias
andorinhas veraneiam manobras ousadas
e sabiás cantam à sombra
temos medo das alturas
o que é uma sensação
que demonstra a utilidade
do teste divino
pois deus percebeu
que não era um publicitário
e contratou profissionais de primeira
capazes de nos convencer
da anomalia de nossas asas
que cresciam por dentro
e das vantagens de pedirmos perdão
por comprarmos um produto mais caro
mas que
dizem
lava mais branco
as roupas que usaremos
no céu
o menino
pensava seriamente em atirar-se
num abismo imenso
para assistir seu funeral
e ver o quanto chorariam por ele
e dele sentiriam falta
quando cresceu
viu que o lugar
não tinha mais que dois
ou três metros de altura
achou graça
e para zombar-se
pulou
quebrou uma perna
recebeu visitas
atenções maternais
assinaturas no gesso
mas nada comparável
ao desejo infantil
de querer jogar-se
de uma ilusão
ela sussurrou
ao meu ouvido
que era uma serial killer
que meu número era 17
que sentia muito
pois eu dançava bem
eu danço bem
disse
pois sou um tira
de filme preto & branco
nos afastamos para o duelo
mas rapidamente
voltamos ao beijo mortal
são engraçadas as coisas que às vezes
vêm à cabeça da gente quando estamos
dentro de alguém
por engano
acho
ela comeu minha poesia
e começou a rir
como uma panela
cheia de milho pipoca
e trocou o garfo
pelo tridente
a faca pelo punhal
e saiu
matando todas as saudades
dos pratos
que nunca havia comido
pois nunca estão nestes cardápios
mal humorados
um dia longo
custa-se a passar
um dia curto
veste-se amarrotado
o reflexo de uma mulher
na poça d’água
engole a madrugada
como espadas
como elefantes
que saltam da cartola
de um bêbado
levito sobre a calçada
e desapareço
noite a dentro
pensava
nos estoque de poesia
que ainda resta
se ainda resta
insanidade suficiente aos músicos
imagens nos filmes
que garimpem lágrimas
e sorrisos infantis
fazia sol
e adormeci
sob a sombra da interrogação
bebeu meu coração
deixando só a razão
sólida
da solidão
a luta começa
com meu nocaute
depois
vêm os rounds
e eu nu
do último segundo
até o primeiro
não sou Tyson
sou Chaplin
na lona
ao soar do gongo
danço com porradas
na pesagem
mais leve do que nunca
solto gargalhadas
esgano o mundo
como um lobo faminto
e alimento
o grito
com palavras
que solto
da prisão perpétua
dos dicionários
tango
milonga
blues
tren
bala
roleta
russa
às vezes
escrevo coisas
que não entendo
tanta vezes
você lê essas coisas
e não entende
mas nossos
nãoentenderes
juntam-se
beijam-se
e riem
por razões
que não sabemos
e que talvez
nem razões
sejam
musa ligeira
passageira paixão
ventonteceumeucoração
roça minhas costas
uma pétala
que sai da tua boca
como uma palavra
rouca
drama
atiro a pedra
sou a pedra
e o vidro
estilhaçado
também sou
sendo ainda
o corte
o sangue
a lágrima
e o sal
pra pipoca
razão dos amantes
razantes
convidei o mar
para dançar descalço
sobre meus pés estelares
a canção lunática
que guarda escondida
sob o atlântico disfarce
de um aparente vaivém
frio
e no lixo
o sol passa
pelos furos
de um velho guarda-chuva
caindo
em gotas de luz
sobre palavras
que comem bergamota
e se esquentam
como lagartos
eu bem que gostaria
de ser normal
se o normal
fosse ser
como este grito
que solto de ti
por tuas cordas vocais
desço
rodopio
rodogrito
e amorreço
no calor
do teu canto
flambado
os guizos
de um poema
cintilam cheiros
que te fazem dançar
sobre meu beijo
secular
sob meu tempo
circular
escultor
de seixos
no ar
talvez tudo
não dê em nada
não dê um dia
os pedaços
que junto
todos os dias
por via das dúvidas
o sol
se espanhola
pelas peles
lentas violetas
sonolentos
violões
letais
se você viesse
num dia de sol
e frio
com este jeito
de bolo
com café
ai que preguiça
de morrer
acendo o fogo
estouro
e como
pop-poesia
deus
se escreve
com dê
maiúsculo
disse o homem
vestindo
seu inútil
agá
minúsculo
abs
trair
os trilhos
transar
com o trem
azar de quem
não descarrila
vim vida da água
sou líquido e amo
meu deus meus dedos nos teus
minha língua me deixa brincar
sorrio sou rio que corre e já sou mar
viro chuva e orvalho na pele
suor e lágrimas à flor da pétala
que cobre meu corpo copo de vinho
venha me beba bêbada me tenha
venha me tenha bêbado de você
a interrogação tortura
mas não entrego
minhas camaradas
dúvidas
ser são
sei não
que horas são?
ordem
que legal
tudo no lugar
será que consigo me achar?
vaso vazio
brinco com as palavras
sejam o que sou
sejam o que flor
palavras desesperadas
formam um dia na palma da mão
um dia que recebe outro nome aqui
que nome você daria a um outro dia?
o resto resta lá fora
indescritível
com qualquer coisa real
só o que não há
deve ser descrito
para ser visto
escrevo para chegar ao poema que não há
talvez chegue a ele
sem chegar a ninguém
minha poesia
minhas palavrasdedesordem
minha ilusão em você
o vício de imaginar que posso viciar você com inquietude crônica
ilusão em minhas palavras
tão desesperadas que são minha única esperança
de ver o pássaro ver
de ver o pássaro verde
saudar a grande orgia do mundo num dia
que nasce na palma da mão
movido pela poesia
existo pela inexistência
a luva despe a mão
na uva leva à boca
a lua fruta o gesto
veste o rosto visto
do ponto de vista
deste ritmo livre
a poesia vive
e eu de persegui-la
um poema
me faz carinho
diz que a pedra
virou caminho
o pássaro
humorista e morto em minhas mãos
me falou de amores ventanias verões pedradas de garotos
contou piadas e achou graça
quando disse que ia contar nosso encontro numa poesia
só você me vê e ouve assim
e isso tudo não faz qualquer sentido não existe é impossível
que é do que me interessa falar
falei
voou
sorrindo
e morto
só preciso de um poema malcriado
para dizer foda-se essa porra toda
dou vivas ao palavrão
bem-vindo ao meu poema
que eu quero mais é mandar deus à puta quem nem o pariu
tomava café e ele veio falar sobre a poesia das pequenas coisas
talvez fosse apenas uma desculpa de um solitário
talvez estivesse atraído apenas pelo cheiro de café
mas tudo bem
bebemos juntos
estava frio
sorrimos como meninos para mulheres bonitas
soltamos baforadas sobre as mãos geladas
comentei que do ponto de vista daquele instante
o andar decidido das pessoas parecia absolutamente sem sentido
ainda mais quando o cachorro curtia um facho de sol
por onde todos passavam como ponteiros
para ele ainda faltava alguma coisa na cena
algo que ninguém visse
que só pudesse ser escrito
foi quando o cachorro sorriu
depois falamos besteiras sem direção
tão deliciosas como baforadas sobre mãos frias
e por fim
depois do último gole
antes de sair em busca de algum facho de sol
disse-lhe que se fosse um dia como ele
um poema
num dia como aquele
não pensaria duas vezes
aliás nem pensaria
antes de sentar com alguém numa mesa de bar
para bebermos poesia expressa
que encanta o ar com seu perfume de café
deixei o mundo
que se foda
vou ser um poema
não direi coisa com coisa
não darei o endereço
quem quiser me achar
que se perca
ninguém cabe no mundo
nem em si
ou num poema
a gente simplesmente
não tem cabimento
beber vinho
uvas no lugar de estrelas
num céu verde
tão verde
imensa infinita parreira
para nunca saber
se dormimos ou estamos acordados
quem está dentro de quem
em pé ou deitado
girando só estaremos girando
luminosos pássaros em bando
cagando sobre a bolsa de nova iorque
futebol no barro
banho de chuva
uva com melancia
não faz mal
o que mata mesmo
é perder pro tempo
tudo
ruído
cinzas
da luz
dos olhos
caem
chuva seca
lágrimas caladas
nenhum
ruído
os presos estão rebelados
e sobre o telhado sem telhas onde estão
há um homem morto
o helicóptero da polícia
iça o homem morto
o homem morto que gordo flutua no ar
com sua bala no corpo do helicóptero da polícia
o corpo pousa num campo de futebol de várzea
no meio do campo onde começam os jogos e o plantão da Tv termina
pois não é a transmissão de um jogo decisivo
entra a programação normal os comerciais as liquidações
fora de cena longe do que existe
pousa um quero-quero ao lado do homem morto
e sobre seu corpo gordo o canário que fugiu de uma gaiola
e teve mais sorte que seu camarada que só voou morto
informa o plantão de inutilidade pública
da poesia que flutua crivada de ilusão e morte
direto do campo de futebol sem futebol do homem morto
que flutuou com sua bala
sobre a cidade que não viu nada pois via tudo pela TV
tire os sapatos
descalço
sinta a terra
se mover
água de poço
poço sem fundo
estou cheio
sem tudo
domingo acordo
sem mais nem menos choro
domingo outono e sol
as lágrimas saem pra passear
passava e não via
fosse a vida uma cobra
mordia
não entro
não empurro
vou ficar na rua
se chover me molho
me seco quando vier o sol
na rua é que fico
não entro
não empurro
que negócio é esse de porta me dar ordens?
no fundo
ando à to(n)a
silêncio
ouço o delírio
os elefantes tocam blues
calo as horas
lincho os dias
lancho as notas
ela canta como lágrimas
sinto-me vivo
chamem seus amores
por favor
é uma emergência
os elefantes tocam blues
é preciso ouvir
Linch dirige seu carro
o vento contra o rosto de meus delírios
ela canta e é sua carícia lenta na imagem impossível
estou aqui a ouvir-me
leia-me ao sabor do impossível sabor
descrevo minha loucura com a língua na sua
por favor é uma emergência
isso aqui é um grito
pois os elefantes tocam blues
ela canta como quem embala a morte delicadamente em suas mãos
e se ninguém vier
dançarei sozinho
se tenho sede
vou com sede ao pote
tudo acaba
meu bem
também sou pote
também tem sede
a morte
regras retas
réguas
nada afere
exata mente
desmedida
jogo os olhos pra fora do corpo
que liberdade há no rosto?
de cima da loucura vem teu beijo
e corro e corro que não paro
que é preciso dizer que no fim há o fim
que liberdade virá depois?
a sanidade cansa
de cima de teu beijo mais loucura vejo
e corro e corro que não paro
que liberdade haverá
antes de te alcançar?
na minha boca
explode tua vida
juntando os pedaços da minha
a essas alturas
vejo tudo pequeno
na palma da mão
no copo
tristezas afogadas
e nós boiando
embriagados
dizendo bobagens
contando piadas
ao limão
dogma
dog
doberman
dogma
pra mim
morde
corro e beijo pedras
brilho pois tem sol
e peixes pulando em mim
que me importa o quanto já se falou de amor
como pode ser lugar comum o incomum da gente?
estou a fim de te falar uma longa frase de amor
pra que você chegue ao fim cansada e durma sobre mim
mesmo que eu acorde de uma longa frase de amor
cansado com tua falta dormindo sobre mim
que me importa?
estou a fim de te falar uma longa frase de amor
do amor que me faz humano e mesmo sem amor amante
me faça bem
como o sol
desta manhã
de agosto
o cachorro o gato o galo e a rua
todos latem
cantam vantagem de ter o som
e eu só o sono
lágrimas com gosto de álcool
escorrem para a boca
do bêbado eterno
meu bem maybe
baby talvez
rime em inglês
não sei
quem sabe
em que língua calar
depois de se deixar
dentro de alguém?
dá vontade de dormir sem dormir
palavras sonâmbulas
dançam com óvulos
e fazem filhas
e lágrimas correm como crianças
lágrima
que outra palavra assim
tão linda em minha língua
poderia trazer tal gosto de sal?
moondo da lua
venha me visitar
aprendeu com o sol a me esquentar
virei lagarto
se alguém olhar atravessado
e estiver preocupado
que prenda os versos
motim
fuga em massa
cubro você com cobertores que incendeiam a rebelião
durma assim como se fosse acordar criança
sonhe como se nunca fosse acordar
off
on
descansar é bom
entre demências e dormências
flutuam minhas mil cabeças
moderno dilema eterno
arder ou não arder
no fogo do inferno?
temperado pro banquete
levo comigo um bilhete
ao diabo bom apetite
piano
cobras
joaninhas verdes
gritos
lábios
tiros
é cedo para dormir
é tarde para dormir
afinal
a noite acorda
ou dorme de manhã?
ou é
a noite
o café
da manhã
e somos
sonhos
servidos
quentes?
giro como a terra
em torno
de uma só(l) poesia
há um blues
no fim do túnel
poemas não são escritos
são pintados
são imagens que vêm do exílio
para criar a breve ilusão
de que não somos cegos
gostava das imagens
que os delírios exibiam
nas febres de 40
dos cinco anos
gosto de sonhar
gosto de cinema
não gosto de AAS
eu saí correndo
e aquele amor louco
como um brócolis bom para o coração
me perseguia
e ria da minha cara
de fósforo apavorado
aquele louco amor
me amava
loucamente
e dançava
como uma pitanga pirada
que nem sabia dançar
e ria muito
deslizando
como uma bola de ferro
sobre uma janela de vidro de febre
fazendo voltas
em minha respiração
e em minhas pernas
com uma corda da guitarra
do Jimi Hendrix
e sorriu
como quem lambe o sol
quando caí como chuva
e rolei como um morango com chantilly
para sua boca
vou beijar ameixas na boca
e ver se viro uma gueixa louca
para que você me tenha
como uma lenda
cheguei ao bar
sentei ao balcão
e pedi uma dose de batom vermelho
puro
sem gelo
nacional ou estrangeiro
dei de ombros
já havia bebido tantos vestidos pretos
naquela madrugada
por outros bares
que nem sentiria mais
o gosto de um bom batom vermelho
era o que achava
até perceber que a temperatura
subiu logo aos 40 graus
assim que o garçom colocou
o termômetro no copi
meus caninos cresceram
pela primeira vez
em séculos
e eu bebi aquela página
vermelha
num gole só
com todos me olhando
num inglês em rotação alterada
pelo tempo
de repente
tudo ficou em silêncio
e todos tiveram que ouvir
aqueles beijos
descendo
rubros
pelo meu pescoço
pelo meu peito
ninguém respirava
qualquer outra cor
e o batom
vermelho
desceu ainda mais
me lambendo
e sugando
por dentro
enquanto eu cravava os dentes
no copo
sem notar
que todos saíam
em câmera lenta
deixando seus vestidos de noiva
seus pijamas
e dentaduras
nos copos
sobre as mesas
trêmulas
seus olhos
cortaram minha lâmina
e você me serviu aos pedaços
a você
e seus desejos
musicais
me perfuraram
e cortaram
como talheres sem fim
então eu disse
fodam-se
e nenhum dos pingos nos is entendeu
e os pingos
foram fazer queixa
ao bispo dos pingos
e eu disse
foda-se o bispo
os pingos disseram
que iriam me processar
por desacato
ao bispo dos pingos
porra do caralho
filhos da puta
fodam-se todos
os pingos
nos is
primeiro
só o baixo
depois
o beijo
contornando
com os outros instrumentos
os limites
que não existem
do perfume
das cerejas
que me embalam
como anjos endiabrados
na rede movediça
que me enterra no céu
do teu blues
como num estágio para a morte
uma pipa
erguia o menino
que ria da vida
lá embaixo
descer?
só quando o tempo
romper o fio
para ele cair
leve
dançante
como uma folha de outono
que lei explica
a gravidade desse nosso caso?
ao se juntarem
nossos corpos
mais pesados
que esse ar pesado
sobem
não vivo sem você
meu clichê
não vivo sem você
meu cachê
não vivo sem você
meu sakê
não vivo sem você
e já esqueci porquê
escrevo para mudar 
então mudo de linha
ali encontro
uma ilusão 
sorrindo
zombando do mundo 
imenso globo ocular 
de um olhar perdido 
escrevo para mudar
então mudo de linha
assim mudo de mundo
que nada
é a preguiça
que encurta
meus versos
as palavras
que se virem
poesia
dia de sol e vento
velhos papéis voam para o além
e outros vêm
ao acaso da alma
ao sabor das horas
sinto o gosto
que ainda nem sei
minha vaidade
não é ter um poema lido
é ter um um poema rido
não me leve
a lugar algum
nem me fale
algo incomum
diga boa noite
acorde comigo
simples assim
como um sol
nasce todo dia
nos horizontes
mares
e folhas
de desenhos infantis
simples assim
como um sol
dentro de mim
procura-se um sorriso
largo fácil puro
de brinquedo desejado
(novo ou usado)
um escritor que não ama
escreve um lindo poema de amor
e sem entender de onde vem
chora
e adormece só
sem respostas
sem ver
sem beijar
seu amor
sorrindo
dormindo
profundamente
ao seu lado
nem o doce
mais doce
repõe meus níveis
de você
para Leonard Cohen
velhos poetas
caem sobre o mundo
envelhecido
de novidades sufocantes
chovem suas canções
cortam meu coração
sufocado por sonhos
envelhecidos
e aos prantos
lavo minha alma
para o caso
de chegar alguém
rime qualquer coisa
com coisa alguma
mas arrume um jeito
de me fazer feliz
bata todos os recordes
tome anabolizantes
chegue antes
me faça feliz
na contramão e embriagada
na velocidade da luz
me jogue pra fora da estrada
me faça feliz
politicamente incorreta
a meta justifica os meios
corrompa meus medos
me faça feliz
cometa pecados
me mate e me engula
me come com gula
me faça feliz
não meça as palavras
não seja educada
me mande a merda
só me faça feliz
doenças verdadeiras
doenças inventadas
tudo mata
tristezas verdadeiras
alegrias inventadas
tudo arrasa
verdades absolutas
mentiras relativas
tudo acaba
crimes passionais
guerras venais
tudo ou nada
notícias vendidas
notícias compradas
tudo cala
esperanças perdidas
teu olhar que me acha
tudo é pouco
nada basta
bebeu como se fosse água
que um cara sem nada para dar
trouxe em sua jarra vazia
saciou-se com a miragem
que um cara sem nada para dizer
disse em sua poesia
provou do mundo
que um cara sem nada para fazer
fez em apenas um dia
e descansaram
domingos a fio
um chocolate
e por um triz
não sou feliz
aonde você vai
tão depressa
que não possa
cair na desgraça
dessa noite lenta
que me abraça?
e eu que perdi meus dentes de sabre
vagueio até o dia em que tudo se acabe
eu só queria
um café à tarde
e que o sol me tomasse
também
e o açúcar do fim
não fosse um doce fim
dos sonhos
que mal provei
como vive
um vivente
a beber como água
a aguardente
do amor?
cambaleantes
dançam nas calçadas
embriagadas
as verdades do amor
dançam
e mentem
e creio
e rezo
como vive
um vivente
sem beber como água
a aguardente
do amor?
embriagado
cambaleante
escrevo torto
e atordoadamente
a dúvida
é para os sóbrios
para os sábios
lábios ardentes
línguas incandescentes
palavras delirantes
loucas
e impossíveis
roucas
e improváveis
tantas
e tão poucas
lentas
e insanas
a sussurrar
sorrindo
que o amor
não passa
de um velho
e solitário
poeta bêbado
teimando
infinita
e aguardentemente
em embriagar verdades
e rimar agente

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Livro de poesia

  • 2. livro de poesia reúne poemas dos livros crime perfeito (edição do autor, 1994), risco (edição do autor,1997) e bluz (Editora Bloccos, 1999), além de alguns feitos posteriormente. Cláudio Schuster é jornalista. Nasceu em 1962, em Pelotas (RS). Mora em Florianópolis desde 1986. agosto de 2013
  • 5. de medo do escuro morro de altura então nem se fala de tudo me assusta um sussurro e gelo todo silêncio me arrepia a alma penada que salta pela janela do quarto do pânico que entro com um simples beijo
  • 6. se você vem para pouco pouco faz sentido a um louco varrido
  • 7. crime perfeito venha com violência traga desordem ponha tudo a perder destrua minha vida mate-me e esconda meu corpo entre tuas pernas
  • 8. diga apenas uma frase incomum dessas que mordem e fazem rir
  • 10. leve ao fogo à chama leve queime aos poucos como o diabo me carregue
  • 11. quando ela descasca o sol e come seu calor derrete um cálice em chuvas cortantes como dentes de cristal que cravam em colinas de sangue temporais de sorrisos que afundam de rir arcas lotadas de mim
  • 14. giro 360 graus de febre suo vinho me enrolo nos fios de alta tensão e ilumino um sabor com a cabeça nos pés que dançam descalços na calçada de cacos de vidro que brilham na noite como pequenos dias derramados sobre o solo de uma guitarra que explode minhas veias em meteoros que grito sob o riso que me bebe
  • 15. ilusão azul intocável a tarde passou a noite partiu o dia em pedaços
  • 16. a obviedade obviamente chutando a poesia procurou-me na seção de achados ora tenha paciência! perdidos não se encontram na seção de achados talvez na sessão de cinema nunca na de achados que achar é fugaz e um tremendo azar para quem quer apenas estar perdido
  • 18. ela me fodeu louca e estraçalhadamente e tanto que sobraram peças quando tentei remontar o que restou na manhã embaralhada será que por isso saí flutuando?
  • 19. não me traga me leve me siga me parta em um só
  • 20. lá vem um poema se aproximando desajeitado tropeçando cambaleando danças acho que esse poema bebeu se abraça em mim e de repente saímos pela rua dançando tropeçando nas margens sóbrias das calçadas e zigue e zague descalços rindo à toa de nossos passos humorísticos acho que bebi um poema bêbado
  • 21. das alturas jogou-me um azul das profundezas mandei-lhe lavas vermelhas
  • 22. corro com milhares de coelhos sobre os olhos fechados das colinas que se banham de sol que come sorridente uma cenoura
  • 24. toque meu coração como quem toca uma canção como quem toca um violão viole minha razão
  • 25. a vida tanto melhor fica quanto mais da fantasia se aproxima disse a formiguinha beijando tua boca no guardanapo de papel
  • 26. duelo à sam peckinpah o desejo tem o sabor de uma nudez esvoaçante montada na bala de um beijo veloz como quem num duelo com deus saca antes da dúvida
  • 27. o copo gira com meus olhos dentro o blues de buddy guy é uma trepada numa noite louca de raios nas minhas veias o mundo é uma besteira dita por alguém que nunca beijaria esta noite no meio das pernas hoje eu não saio eu bebo meus olhos que te olham bêbados de música hoje dá pra rir do mundo depois não sei e nem quero saber
  • 28. era uma vez uma saudade de viver como se só a vida existisse
  • 29. jogo as palavras pro ar em bando voam poesias
  • 30. um poema precisa ter início e um meio de não ter fim
  • 31. nada que reflete arremessa ameaça estremece a minha pressa não permite ver o visto sem ver o vasto o que não remete não me interessa não me atiça o que não existe é relativo se num dia me matam no outro estou vivo
  • 32. dia de mais nada dormingar e chover sobre você
  • 33. as palavras não me fogem pois não as prendo não me faltam porque são livres estão aqui nestes poemas apenas para se divertir
  • 34. toque do toque que me loque um lance num pique de moleque e o queéque eu faço em chequemateme?
  • 36. e então todo o mundo parou pra trepar de dia na hora do trabalho e à noite o mundo dormiu exausto feliz e não era mais o mundo quando acordou era uma porra louca voando no espaço pra fecundar o sol que nascia da minha garganta
  • 37. a vítima se aproxima apunhalando o chão como se apenas caminhasse como se somente fossem sapatos doces a vítima assalta meus olhos apontando mísseis nucleares como se apenas olhasse como se somente fossem olhos os seus a vítima esquarteja meu corpo deslizando uma serra elétrica como se apenas tocasse como se somente fosse uma boca a sua a vítima parte sorrindo como se apenas houvesse cometido um avesso
  • 38. walking the blues com um pouco de silêncio o mundo poderia ouvir o compasso de teus saltos finos sobre a rua deserta um pouco mais de silêncio e se ouviria nítido como um absurdo o blues que pensei
  • 39. depois da meia-noite é outro dia é outra noite depois do meio-dia é outro é meio é coisa nenhuma depois quem sabe mais tarde se não for tarde demais
  • 40. dói tanto que nem sei dói tanto que esqueci
  • 41. as palavras bocejam está na hora de dormir bom dia
  • 42. você me come entro em coma você me bebe coca-coma
  • 43. as farsas estão cansadas de ser repetidas reprisadas em sessões contínuas de tortura de tontura da história
  • 44. acabou não há mais o que escrever o dito não foi vivido a poesia não cortou o sangue não correu não saciou a boca seca calada
  • 45. as luzes dançam com o planeta sob meus sapatos que reclamam que bebi demais e ouvem "mas não o suficiente não o suficiente meus caros pra ver tudo duplo como é e não parece ser"
  • 46. para onde me viro lá está ele real e estupidamente desenhado o mundo
  • 47. não caibo nas palavras nas frases na poesia e não consigo inventar nada tudo já existe ou não beije-me desafogue minha língua de tudo o que já foi dito
  • 48. errante ou errei o mundo ou errei a hora
  • 49. a chuva não simboliza nada a chuva é água que entra e sai e cai sobre uma dor real que inventamos
  • 50. o homem acordou com o som nos olhos e os olhos no teto de seu pequeno mundo a mulher resmungou pedaços de palavras o homem riu porque pensou ter ouvido o terço de trás para frente riu mais porque pensou que não tinha diferença do terço dito na ordem o som aumentou o teto abaixou o terço no quarto o homem empurrou seu corpo para fora da cama calçou sua bola de ferro pois estava frio e saiu pelo corredor para reclamar da invasão a seu pequeno mundo a mulher que abriu a porta disse que estranhava sua demora para vir escutar música escrever qualquer coisa nas paredes e usar a boca para coisas mais interessantes do que dizer o terço na ordem ou ao revés enquanto ouvia atingiu sete pontos na escala richter
  • 51. a mulher pegou a bola de ferro e colocou no cabide pois pensou que fosse a causa do frio e da tremedeira que derrubou os dias do calendário em que cristo olha o teto de um mundo pequeno no apartamento do homem o resto da noite poderia levar richter a repensar sua escala pela manhã cabelos atirando para todos os lados atravessou o corredor na contramão das galinhas patos porcos e sapos matinais a mulher preparava o café e tudo o que o homem falou foi assistido em silêncio pelos dias do calendário espalhados pelo chão pela mulher que cobria os ouvidos com algodões amarelos e pelo próprio homem entorpecido com o eco das implosões simultâneas que vinham das noites seguintes os dias desde então não mais existiram varridos pela mulher para debaixo do tapete em que o homem voou
  • 52. e cristo nem se deu conta distraído com as moscas no teto
  • 53. um instante ludibriou os ponteiros cordeiros de deus na distração do tempo um momento fugiu com um corte no olhar fazendo jorrar rios ameaçadores e o mundo virou um ponto incapaz de deter frases embriagadas pelos cachos de vinho que colhi de tuas veias
  • 54. lenda consta que deus antes de ditar os mandamentos fez um teste com as aves proibiu rasantes estabeleceu um teto limitou distâncias censurou canções condenou timbres cobriu de culpa os cortejos por isso enquanto pardais trepam na rua águias perdem-se nas distâncias andorinhas veraneiam manobras ousadas e sabiás cantam à sombra temos medo das alturas o que é uma sensação que demonstra a utilidade do teste divino pois deus percebeu que não era um publicitário e contratou profissionais de primeira capazes de nos convencer da anomalia de nossas asas que cresciam por dentro e das vantagens de pedirmos perdão por comprarmos um produto mais caro mas que dizem lava mais branco as roupas que usaremos no céu
  • 55. o menino pensava seriamente em atirar-se num abismo imenso para assistir seu funeral e ver o quanto chorariam por ele e dele sentiriam falta quando cresceu viu que o lugar não tinha mais que dois ou três metros de altura achou graça e para zombar-se pulou quebrou uma perna recebeu visitas atenções maternais assinaturas no gesso mas nada comparável ao desejo infantil de querer jogar-se de uma ilusão
  • 56. ela sussurrou ao meu ouvido que era uma serial killer que meu número era 17 que sentia muito pois eu dançava bem eu danço bem disse pois sou um tira de filme preto & branco nos afastamos para o duelo mas rapidamente voltamos ao beijo mortal são engraçadas as coisas que às vezes vêm à cabeça da gente quando estamos dentro de alguém
  • 57. por engano acho ela comeu minha poesia e começou a rir como uma panela cheia de milho pipoca e trocou o garfo pelo tridente a faca pelo punhal e saiu matando todas as saudades dos pratos que nunca havia comido pois nunca estão nestes cardápios mal humorados
  • 58. um dia longo custa-se a passar um dia curto veste-se amarrotado
  • 59. o reflexo de uma mulher na poça d’água engole a madrugada como espadas como elefantes que saltam da cartola de um bêbado levito sobre a calçada e desapareço noite a dentro
  • 60. pensava nos estoque de poesia que ainda resta se ainda resta insanidade suficiente aos músicos imagens nos filmes que garimpem lágrimas e sorrisos infantis fazia sol e adormeci sob a sombra da interrogação
  • 61. bebeu meu coração deixando só a razão sólida da solidão
  • 62. a luta começa com meu nocaute depois vêm os rounds e eu nu do último segundo até o primeiro não sou Tyson sou Chaplin na lona ao soar do gongo danço com porradas na pesagem mais leve do que nunca solto gargalhadas
  • 63. esgano o mundo como um lobo faminto e alimento o grito com palavras que solto da prisão perpétua dos dicionários
  • 65. às vezes escrevo coisas que não entendo tanta vezes você lê essas coisas e não entende mas nossos nãoentenderes juntam-se beijam-se e riem por razões que não sabemos e que talvez nem razões sejam
  • 67. roça minhas costas uma pétala que sai da tua boca como uma palavra rouca
  • 68. drama atiro a pedra sou a pedra e o vidro estilhaçado também sou sendo ainda o corte o sangue a lágrima e o sal pra pipoca
  • 70. convidei o mar para dançar descalço sobre meus pés estelares a canção lunática que guarda escondida sob o atlântico disfarce de um aparente vaivém
  • 71. frio e no lixo o sol passa pelos furos de um velho guarda-chuva caindo em gotas de luz sobre palavras que comem bergamota e se esquentam como lagartos
  • 72. eu bem que gostaria de ser normal se o normal fosse ser como este grito que solto de ti
  • 73. por tuas cordas vocais desço rodopio rodogrito e amorreço no calor do teu canto flambado
  • 74. os guizos de um poema cintilam cheiros que te fazem dançar sobre meu beijo secular sob meu tempo circular escultor de seixos no ar
  • 75. talvez tudo não dê em nada não dê um dia os pedaços que junto todos os dias por via das dúvidas
  • 76. o sol se espanhola pelas peles lentas violetas sonolentos violões letais
  • 77. se você viesse num dia de sol e frio com este jeito de bolo com café ai que preguiça de morrer
  • 78. acendo o fogo estouro e como pop-poesia
  • 79. deus se escreve com dê maiúsculo disse o homem vestindo seu inútil agá minúsculo
  • 80. abs trair os trilhos transar com o trem azar de quem não descarrila
  • 81. vim vida da água sou líquido e amo meu deus meus dedos nos teus minha língua me deixa brincar sorrio sou rio que corre e já sou mar viro chuva e orvalho na pele suor e lágrimas à flor da pétala que cobre meu corpo copo de vinho venha me beba bêbada me tenha venha me tenha bêbado de você
  • 82. a interrogação tortura mas não entrego minhas camaradas dúvidas
  • 83. ser são sei não que horas são?
  • 84. ordem que legal tudo no lugar será que consigo me achar?
  • 85. vaso vazio brinco com as palavras sejam o que sou sejam o que flor
  • 86. palavras desesperadas formam um dia na palma da mão um dia que recebe outro nome aqui que nome você daria a um outro dia? o resto resta lá fora indescritível com qualquer coisa real só o que não há deve ser descrito para ser visto escrevo para chegar ao poema que não há talvez chegue a ele sem chegar a ninguém minha poesia minhas palavrasdedesordem minha ilusão em você o vício de imaginar que posso viciar você com inquietude crônica ilusão em minhas palavras tão desesperadas que são minha única esperança de ver o pássaro ver de ver o pássaro verde saudar a grande orgia do mundo num dia que nasce na palma da mão movido pela poesia existo pela inexistência
  • 87. a luva despe a mão na uva leva à boca a lua fruta o gesto veste o rosto visto do ponto de vista deste ritmo livre a poesia vive e eu de persegui-la
  • 88. um poema me faz carinho diz que a pedra virou caminho
  • 89. o pássaro humorista e morto em minhas mãos me falou de amores ventanias verões pedradas de garotos contou piadas e achou graça quando disse que ia contar nosso encontro numa poesia só você me vê e ouve assim e isso tudo não faz qualquer sentido não existe é impossível que é do que me interessa falar falei voou sorrindo e morto
  • 90. só preciso de um poema malcriado para dizer foda-se essa porra toda dou vivas ao palavrão bem-vindo ao meu poema que eu quero mais é mandar deus à puta quem nem o pariu
  • 91. tomava café e ele veio falar sobre a poesia das pequenas coisas talvez fosse apenas uma desculpa de um solitário talvez estivesse atraído apenas pelo cheiro de café mas tudo bem bebemos juntos estava frio sorrimos como meninos para mulheres bonitas soltamos baforadas sobre as mãos geladas comentei que do ponto de vista daquele instante o andar decidido das pessoas parecia absolutamente sem sentido ainda mais quando o cachorro curtia um facho de sol por onde todos passavam como ponteiros para ele ainda faltava alguma coisa na cena algo que ninguém visse que só pudesse ser escrito foi quando o cachorro sorriu depois falamos besteiras sem direção tão deliciosas como baforadas sobre mãos frias e por fim depois do último gole antes de sair em busca de algum facho de sol disse-lhe que se fosse um dia como ele um poema num dia como aquele não pensaria duas vezes aliás nem pensaria antes de sentar com alguém numa mesa de bar para bebermos poesia expressa que encanta o ar com seu perfume de café
  • 92. deixei o mundo que se foda vou ser um poema não direi coisa com coisa não darei o endereço quem quiser me achar que se perca
  • 93. ninguém cabe no mundo nem em si ou num poema a gente simplesmente não tem cabimento
  • 94. beber vinho uvas no lugar de estrelas num céu verde tão verde imensa infinita parreira para nunca saber se dormimos ou estamos acordados quem está dentro de quem em pé ou deitado girando só estaremos girando luminosos pássaros em bando cagando sobre a bolsa de nova iorque
  • 95. futebol no barro banho de chuva uva com melancia não faz mal o que mata mesmo é perder pro tempo
  • 96. tudo ruído cinzas da luz dos olhos caem chuva seca lágrimas caladas nenhum ruído
  • 97. os presos estão rebelados e sobre o telhado sem telhas onde estão há um homem morto o helicóptero da polícia iça o homem morto o homem morto que gordo flutua no ar com sua bala no corpo do helicóptero da polícia o corpo pousa num campo de futebol de várzea no meio do campo onde começam os jogos e o plantão da Tv termina pois não é a transmissão de um jogo decisivo entra a programação normal os comerciais as liquidações fora de cena longe do que existe pousa um quero-quero ao lado do homem morto e sobre seu corpo gordo o canário que fugiu de uma gaiola e teve mais sorte que seu camarada que só voou morto informa o plantão de inutilidade pública da poesia que flutua crivada de ilusão e morte direto do campo de futebol sem futebol do homem morto que flutuou com sua bala sobre a cidade que não viu nada pois via tudo pela TV
  • 99. água de poço poço sem fundo estou cheio sem tudo
  • 100. domingo acordo sem mais nem menos choro domingo outono e sol as lágrimas saem pra passear
  • 101. passava e não via fosse a vida uma cobra mordia
  • 102. não entro não empurro vou ficar na rua se chover me molho me seco quando vier o sol na rua é que fico não entro não empurro que negócio é esse de porta me dar ordens?
  • 103. no fundo ando à to(n)a
  • 104. silêncio ouço o delírio os elefantes tocam blues calo as horas lincho os dias lancho as notas ela canta como lágrimas sinto-me vivo chamem seus amores por favor é uma emergência os elefantes tocam blues é preciso ouvir Linch dirige seu carro o vento contra o rosto de meus delírios ela canta e é sua carícia lenta na imagem impossível estou aqui a ouvir-me leia-me ao sabor do impossível sabor descrevo minha loucura com a língua na sua por favor é uma emergência isso aqui é um grito pois os elefantes tocam blues ela canta como quem embala a morte delicadamente em suas mãos e se ninguém vier dançarei sozinho
  • 105. se tenho sede vou com sede ao pote tudo acaba meu bem também sou pote também tem sede a morte
  • 107. jogo os olhos pra fora do corpo que liberdade há no rosto? de cima da loucura vem teu beijo e corro e corro que não paro que é preciso dizer que no fim há o fim que liberdade virá depois? a sanidade cansa de cima de teu beijo mais loucura vejo e corro e corro que não paro que liberdade haverá antes de te alcançar?
  • 108. na minha boca explode tua vida juntando os pedaços da minha
  • 109. a essas alturas vejo tudo pequeno na palma da mão no copo tristezas afogadas e nós boiando embriagados dizendo bobagens contando piadas ao limão
  • 111. corro e beijo pedras brilho pois tem sol e peixes pulando em mim
  • 112. que me importa o quanto já se falou de amor como pode ser lugar comum o incomum da gente? estou a fim de te falar uma longa frase de amor pra que você chegue ao fim cansada e durma sobre mim mesmo que eu acorde de uma longa frase de amor cansado com tua falta dormindo sobre mim que me importa? estou a fim de te falar uma longa frase de amor do amor que me faz humano e mesmo sem amor amante
  • 113. me faça bem como o sol desta manhã de agosto
  • 114. o cachorro o gato o galo e a rua todos latem cantam vantagem de ter o som e eu só o sono
  • 115. lágrimas com gosto de álcool escorrem para a boca do bêbado eterno
  • 116. meu bem maybe baby talvez rime em inglês não sei quem sabe em que língua calar depois de se deixar dentro de alguém? dá vontade de dormir sem dormir palavras sonâmbulas dançam com óvulos e fazem filhas e lágrimas correm como crianças lágrima que outra palavra assim tão linda em minha língua poderia trazer tal gosto de sal? moondo da lua venha me visitar aprendeu com o sol a me esquentar virei lagarto se alguém olhar atravessado e estiver preocupado que prenda os versos motim fuga em massa cubro você com cobertores que incendeiam a rebelião durma assim como se fosse acordar criança sonhe como se nunca fosse acordar off
  • 117. on descansar é bom entre demências e dormências flutuam minhas mil cabeças moderno dilema eterno arder ou não arder no fogo do inferno? temperado pro banquete levo comigo um bilhete ao diabo bom apetite piano cobras joaninhas verdes gritos lábios tiros é cedo para dormir é tarde para dormir afinal a noite acorda ou dorme de manhã? ou é a noite o café da manhã e somos sonhos servidos quentes?
  • 118. giro como a terra em torno de uma só(l) poesia
  • 119. há um blues no fim do túnel
  • 120. poemas não são escritos são pintados são imagens que vêm do exílio para criar a breve ilusão de que não somos cegos
  • 121. gostava das imagens que os delírios exibiam nas febres de 40 dos cinco anos gosto de sonhar gosto de cinema não gosto de AAS
  • 122. eu saí correndo e aquele amor louco como um brócolis bom para o coração me perseguia e ria da minha cara de fósforo apavorado aquele louco amor me amava loucamente e dançava como uma pitanga pirada que nem sabia dançar e ria muito deslizando como uma bola de ferro sobre uma janela de vidro de febre fazendo voltas em minha respiração e em minhas pernas com uma corda da guitarra do Jimi Hendrix e sorriu como quem lambe o sol quando caí como chuva e rolei como um morango com chantilly para sua boca
  • 123. vou beijar ameixas na boca e ver se viro uma gueixa louca para que você me tenha como uma lenda
  • 124. cheguei ao bar sentei ao balcão e pedi uma dose de batom vermelho puro sem gelo nacional ou estrangeiro dei de ombros já havia bebido tantos vestidos pretos naquela madrugada por outros bares que nem sentiria mais o gosto de um bom batom vermelho era o que achava até perceber que a temperatura subiu logo aos 40 graus assim que o garçom colocou o termômetro no copi meus caninos cresceram pela primeira vez em séculos e eu bebi aquela página vermelha num gole só com todos me olhando num inglês em rotação alterada pelo tempo de repente tudo ficou em silêncio e todos tiveram que ouvir aqueles beijos descendo rubros pelo meu pescoço pelo meu peito ninguém respirava qualquer outra cor e o batom vermelho
  • 125. desceu ainda mais me lambendo e sugando por dentro enquanto eu cravava os dentes no copo sem notar que todos saíam em câmera lenta deixando seus vestidos de noiva seus pijamas e dentaduras nos copos sobre as mesas trêmulas
  • 126. seus olhos cortaram minha lâmina e você me serviu aos pedaços a você e seus desejos musicais me perfuraram e cortaram como talheres sem fim
  • 127. então eu disse fodam-se e nenhum dos pingos nos is entendeu e os pingos foram fazer queixa ao bispo dos pingos e eu disse foda-se o bispo os pingos disseram que iriam me processar por desacato ao bispo dos pingos porra do caralho filhos da puta fodam-se todos os pingos nos is
  • 128. primeiro só o baixo depois o beijo contornando com os outros instrumentos os limites que não existem do perfume das cerejas que me embalam como anjos endiabrados na rede movediça que me enterra no céu do teu blues como num estágio para a morte
  • 129. uma pipa erguia o menino que ria da vida lá embaixo descer? só quando o tempo romper o fio para ele cair leve dançante como uma folha de outono
  • 130. que lei explica a gravidade desse nosso caso? ao se juntarem nossos corpos mais pesados que esse ar pesado sobem
  • 131. não vivo sem você meu clichê não vivo sem você meu cachê não vivo sem você meu sakê não vivo sem você e já esqueci porquê
  • 132. escrevo para mudar  então mudo de linha ali encontro uma ilusão  sorrindo zombando do mundo  imenso globo ocular  de um olhar perdido  escrevo para mudar então mudo de linha assim mudo de mundo
  • 133. que nada é a preguiça que encurta meus versos as palavras que se virem poesia
  • 134. dia de sol e vento velhos papéis voam para o além e outros vêm ao acaso da alma ao sabor das horas sinto o gosto que ainda nem sei
  • 135. minha vaidade não é ter um poema lido é ter um um poema rido
  • 136. não me leve a lugar algum nem me fale algo incomum diga boa noite acorde comigo simples assim como um sol nasce todo dia nos horizontes mares e folhas de desenhos infantis simples assim como um sol dentro de mim
  • 137. procura-se um sorriso largo fácil puro de brinquedo desejado (novo ou usado)
  • 138. um escritor que não ama escreve um lindo poema de amor e sem entender de onde vem chora e adormece só sem respostas sem ver sem beijar seu amor sorrindo dormindo profundamente ao seu lado
  • 139. nem o doce mais doce repõe meus níveis de você
  • 140. para Leonard Cohen velhos poetas caem sobre o mundo envelhecido de novidades sufocantes chovem suas canções cortam meu coração sufocado por sonhos envelhecidos e aos prantos lavo minha alma para o caso de chegar alguém
  • 141. rime qualquer coisa com coisa alguma mas arrume um jeito de me fazer feliz bata todos os recordes tome anabolizantes chegue antes me faça feliz na contramão e embriagada na velocidade da luz me jogue pra fora da estrada me faça feliz politicamente incorreta a meta justifica os meios corrompa meus medos me faça feliz cometa pecados me mate e me engula me come com gula me faça feliz não meça as palavras não seja educada me mande a merda só me faça feliz
  • 142. doenças verdadeiras doenças inventadas tudo mata tristezas verdadeiras alegrias inventadas tudo arrasa verdades absolutas mentiras relativas tudo acaba crimes passionais guerras venais tudo ou nada notícias vendidas notícias compradas tudo cala esperanças perdidas teu olhar que me acha tudo é pouco nada basta
  • 143. bebeu como se fosse água que um cara sem nada para dar trouxe em sua jarra vazia saciou-se com a miragem que um cara sem nada para dizer disse em sua poesia provou do mundo que um cara sem nada para fazer fez em apenas um dia e descansaram domingos a fio
  • 144. um chocolate e por um triz não sou feliz
  • 145. aonde você vai tão depressa que não possa cair na desgraça dessa noite lenta que me abraça?
  • 146. e eu que perdi meus dentes de sabre vagueio até o dia em que tudo se acabe
  • 147. eu só queria um café à tarde e que o sol me tomasse também e o açúcar do fim não fosse um doce fim dos sonhos que mal provei
  • 148. como vive um vivente a beber como água a aguardente do amor? cambaleantes dançam nas calçadas embriagadas as verdades do amor dançam e mentem e creio e rezo como vive um vivente sem beber como água a aguardente do amor? embriagado cambaleante escrevo torto e atordoadamente a dúvida é para os sóbrios para os sábios lábios ardentes línguas incandescentes palavras delirantes loucas e impossíveis roucas e improváveis tantas e tão poucas lentas e insanas
  • 149. a sussurrar sorrindo que o amor não passa de um velho e solitário poeta bêbado teimando infinita e aguardentemente em embriagar verdades e rimar agente