Enquanto pacientes sofrem com assistência insuficiente e médicos amargam remuneração indigna, operadoras de planos de saúde acumulam lucros, estabelecem hegemonias e planejam expansão de mercado.
1. Quem ganha com a atual situação da saúde suplementar
Enquanto pacientes sofrem com assistência insuficiente e médicos amargam remuneração indigna, operadoras de
planos de saúde acumulam lucros, estabelecem hegemonias e planejam expansão de mercado
Depois do movimento de paralisação durante 24 horas nos atendimentos eletivos por planos de saúde, no
Dia Mundial da Saúde (7 de abril), a complicada situação do setor da saúde suplementar ganhou evidência, mas
nenhuma medida anunciada permite vislumbrar solução efetiva para os problemas existentes.
Em audiência pública realizada na Câmara dos Deputados em 10 de maio, parlamentares e autoridades cri-
ticaram os ganhos excessivos das operadoras de planos de saúde e reconheceram a baixa remuneração dos
médicos prestadores de serviço. No início de junho, representantes da Federação Nacional de Saúde Suple-
mentar (FenaSaúde) foram à imprensa para falar da necessidade da injeção de R$ 40 bilhões para “fechar
as contas e resolver os problemas de solvência que podem deixar pelo menos quatro milhões de clientes
desassistidos”. A justificativa é sempre a mesma: a necessidade de constituir reservas.
Os 257 planos de saúde que se encontram sob intervenção foram apontados como justificativa para a neces-
sidade de aporte financeiro. A receita do setor em 2011 é próxima de R$ 73 bilhões, maior que o orçamento
do Ministério da Saúde para 2011, que é de R$ 68,5 bilhões. Entre 2005 e 2009, a Agência Nacional de Saúde
Suplementar repassou R$ 33, 64 milhões para operadoras com problemas financeiros e em liquidação extra-
judicial. A quantia de R$ 40 bilhões alardeada pela FenaSaúde é mais uma entre os bilionários e contraditórios
números da saúde suplementar.
Segundo as estatísticas do setor, o número de médicos que atendem pelos planos é de aproximadamente 160
mil, que realizam anualmente em torno de 223 milhões de consultas e respondem por 4,8 milhões de interna-
ções. Segundo dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), o número de mé-
dicos prestando serviços ao sistema público é de 219.499, responsáveis por 491,3 milhões de consultas e 5,64
internações por cada 100 habitantes, o que equivaleria a aproximadamente 8,4 milhões de internações anuais.
Ainda que as operadoras pagassem aos médicos conveniados os R$ 60 por consulta, previstos na Classi-
ficação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM) – o que não ocorre – o gasto das
operadoras com consultas seria de R$ 13,3 bilhões, o que corresponderia a apenas 23% das despesas
assistenciais das operadoras.
2. No estudo estatístico mais recente da Organização Mundial de Saúde (OMS), divulgado em maio, veri-
ficou-se o aumento dos gastos per capta em saúde de US$ 494, em 2000, para US$ 875, em 2008, um
aumento da ordem de 77%. O gasto per capta do governo passou de US$ 199, para US$ 385, o que
representa 95% de aumento.
Os reajustes dos planos de saúde, por sua vez, entre 2000 e 2010 foi de 133% (contra 44% dos honorários
médicos). À taxa de conversão de R$ 1,6 por cada dólar americano, a média do valor pago pelo usuário
dos planos de saúde em 2010 foi maior que o custo per capta anual: US$ 997. Tomadas quatro das maiores
operadoras nacionais (Amil, Bradesco, Golden Cross e Sul América), esse valor é ainda maior.: US$ 1.323.
Dentre mais de um milhar de operadoras, só essas quatro juntas dominam 21% do “mercado” e aboca-
nham 28% das receitas do setor.
Ainda segundo o estudo da OMS, ao passo que em oito anos o investimento governamental na área da
saúde evoluiu apenas 2% e a participação do governo no custeio da saúde avançou 4%, o gasto privado
no setor caiu 4%. O que aumentou a movimentação financeira na área da saúde foi a adesão aos planos
de saúde, que cresceu 7%.
O presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMedico-DF), porta voz da Comissão Dis-
trital de Honorários Médicos, Gutemberg Fialho, ressalta ainda que o governo financia parte do gasto da
população com os planos de saúde. “O abatimento de 27% no Imposto de Renda das despesas com saúde
representa uma participação do governo no custeio por meio de renúncia fiscal”, aponta. Essa participação
seria da ordem de R$ 19,7 bilhões. A grosso modo, é mesmo que dizer que até quem não tem plano de saúde
paga às operadoras.
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