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PROBLEMATIZANDO A VULNERABILIDADE SOCIAL1


Mirtha Sendic Sudbrack2


INTRODUÇÃO

A epidemia de HIV/Aids na América Latina e Caribe inicia sua terceira década e as
informações epidemiológicas revelam que ela continua crescendo e que as respostas para
enfrentá-la precisam ser mais fortes e integradas.
Mais de 1.800.000 adultos e crianças da América Latina e Caribe estão vivendo com HIV,
atualmente. Na região, como se sabe, registram-se significativas diferenças seja no nível da
epidemia, seja nas tendências das formas de transmissão do vírus, considerando-se os
distintos países e mesmo as peculiaridades no interior de um mesmo país.
Em 2002, 42 milhões de pessoas (40 milhões em 2001), dos quais 36,6 milhões de adultos
(19,2 milhões de mulheres) e 3,2 milhões de crianças com menos de 15 anos em todo o
mundo, estavam com Aids. Nesse mesmo ano, 5 milhões foram infectados pelo vírus,
sendo 4,2 milhões de adultos (2 milhões de mulheres) e 800 mil crianças com menos de 15
anos. É de conhecimento de todos que, atualmente, mais de 90% da pandemia está
concentrada nos países em desenvolvimento, enquanto a maior parte dos recursos
destinados ao seu controle está concentrada nos países desenvolvidos.
A pandemia da Aids é a maior responsável pelo número de mortes de pessoas adultas por
doenças infecciosas no mundo. Causou quase 3 milhões de mortos em 2001 (ONUSIDA,
2002a). Também se sabe que mais de 90% das mortes e das novas infecções ocorrem nos
países pobres, onde menos de 5% das pessoas que necessitam de tratamento anti-retroviral
têm acesso à terapia, dos quais a metade estão no Brasil (OMS, 2002, p. 8). O percentual
relativo ao acesso à terapia seria menos de 1% na África subsaariana, o continente mais
afetado (ONUSIDA, 2002b).
O Caribe, com uma prevalência de 2,2% da população adulta tem a segunda maior taxa de
infecção por HIV, ficando abaixo somente da África. A maior prevalência está no Haiti,
com mais de 6%, enquanto Cuba contém a epidemia com uma taxa de prevalência de
0,03% da população adulta (ONUSIDA, 2002a).
Recordemos também que 75% da população mundial que ganha menos de 1 dólar por dia
vive na área rural. O relatório da ONU, divulgado no dia 30 de junho de 2004, salienta a
urgência de que os governos adotem políticas sérias para os trabalhadores rurais. Se isto

 1
  Este texto é um resumo do Capítulo “El abordaje de otras dimensiones de exclusión y vulnerabilidad : uso
 de drogas, pobreza, minoría étnica, migrantes y privados de libertad” publicado no livro: Situación del
 VIH/SIDA en América Latina y el Caribe, organizado por José Antonio Izazola Licea, Coordenador
 Executivo da Iniciativa Regional sobre Aids para América Latina e o Caribe ( SIDALAC) com o apoio de
 UNAIDS e GCTH.
 2
   Doutora em Psicologia Social, foi Coordenadora Adjunta do Programa Municipal de DST/HIV/Aids da
 cidade de Porto Alegre/RS, de 1998 a 2004, autora e coordenadora de vários projetos e pesquisas nas áreas
 de prevenção e assistência, com enfoques comunitários, interdisciplinares e intersetoriais. Teve uma
 participação importante no trabalho desenvolvido com usuários de drogas na cidade de Porto Alegre.
 Atualmente faz parte da equipe do Centro Internacional de Cooperação Técnica do Programa Nacional de
 DST/Aids, iniciativa do governo brasileiro junto com a UNAIDS.
não acontecer nunca se superarão as seqüelas profundas que a pobreza está deixando nesta
população.
A precariedade daqueles que vivem no campo é assustadora, principalmente nas questões
de saúde e educação. A Aids, por exemplo, já matou cerca de 7 milhões de trabalhadores
rurais em 25 países africanos. Até 2020 a previsão é que outros 16 milhões de africanos que
vivem no meio rural não sobrevivam à Aids.
Também devemos lembrar que a infecção do HIV/Aids produz um impacto em todos os
aspectos da vida humana. Irrompeu na década de 80 e trouxe consigo, não só um problema
de saúde pública, mas também um complexo problema social que se instalou no mundo,
sem distinguir fronteiras geográficas, políticas, culturais ou étnicas. E como aconteceu no
decorrer da história com outras epidemias, o poder dominante demonizou o HIV/Aids,
utilizando-se da epidemia como mais uma forma de dominação e controle social, através da
discriminação e da intolerância em relação às pessoas afetadas.
No entanto, grande parte das pessoas, principalmente aquelas diretamente afetadas, não se
submeteram a este jogo. Pelo contrário, fazendo uma análise retrospectiva, houve um longo
caminho de lutas por parte das pessoas que vivem com HIV, bem como do seu entorno
social, alcançando significativas conquistas na área dos direitos humanos e da cidadania.
Organizando-se em movimentos a partir dos diversos setores da sociedade civil, também
conseguiram que os governos (em suas diferentes instâncias) se mobilizassem e se
comprometessem, implantando medidas individuais e coletivas de redução de danos à
saúde dos portadores e executando programas de prevenção.
No entanto, transcorridos mais de 20 anos da aparição dos primeiros casos de Aids, a
intolerância social, a discriminação e a estigmatização das pessoas afetadas pela epidemia
estão cotidianamente presentes em grande número de comunidades da América Latina e
Caribe, bem como no restante do mundo. Parafraseando Richard Parker e Peter Aggleton
(2001), enquanto o mundo luta para dar respostas à epidemia do HIV/Aids, o estigma, a
discriminação e a negação coletiva da mesma, vêm se tornando cada vez mais, os mais
persistentes dilemas que precisam ser enfrentados com urgência pelas políticas públicas de
saúde e educação.
Sem dúvida, a Aids é hoje muito mais do que uma doença infecciosa. Trouxe consigo a
possibilidade de retroalimentar ideologias classistas e classificadoras nas sociedades
capitalistas e neoliberais, onde o normal e o patológico, o bem e o mal, fundamentam a
separação entre os homens, para que uns poucos possam manter seus privilégios,
justificando a dominação e a violência exercidas sobre a maioria. Análises sociológicas
sobre a questão da discriminação (Parker & Aggleton, 2001, p. 10) afirmam que ela se
concentra em padrões de dominação e opressão e que é expressão constante da busca de
poder e privilégio.
Para Arachu Castro (2003) o estigma da Aids teve, desde o início, uma conotação
culpabilizante. Uma das características da discriminação associada à Aids é que desde o
início associou-se o HIV aos modos de vida, ou seja a “atos voluntários”.
Na América e na Europa, onde, nos anos oitenta, a epidemia se arraigou em grupos
homossexuais e usuários de heroína, houve pouca solidariedade com as pessoas infectadas,
porque elas eram culpabilizadas por terem optado por práticas, sexuais ou de drogadição,
reprovadas pela sociedade e consideradas imorais. Por conseguinte, o estigma que já havia
sobre estes grupos se ampliou (Altman, 1986) e se foi transferindo a outros grupos de
pessoas vulneráveis, como é o caso, por exemplo, das mulheres pobres.
A violência estrutural da sociedade capitalista não reconhece as diferenças que animam
grupos e indivíduos. Impõe a todos a mesma normatividade, sem aceitar a existência de
casos singulares que obrigam a reconhecer modos de vida e convivência distintos. A
arrogância homogeneizante das classes dominantes, desconhece, como bem recorda Luis
Carlos Restrepo (1994) o maior patrimônio da vida e da cultura que é, precisamente, o seu
impressionante leque de diferenças.
O tema que estamos tratando faz referência a grupos sociais da América Latina e Caribe
que ainda possuem dificuldades de abordar os riscos de sua saúde, seja por falta de
informação, habilidades, destrezas; seja por questões relacionadas com a própria
vulnerabilidade social e cultural de que padecem; seja pelo forte estigma que
historicamente lhes acompanha.
São cidadãos que permanecem excluídos das políticas públicas, e mais especificamente dos
programas de assistência e prevenção ao HIV/Aids, por pertencerem a grupos despossuídos
e marginalizados socialmente, seja por sua situação de privação de liberdade, seja por
pertencerem a grupos de minoria étnica ou por serem migrantes, seja por estarem expostos
a situações de extrema pobreza ou por estarem completamente desarticulados socialmente
devido ao uso/abuso legal ou ilegal de substâncias psicoativas.
No entanto, é importante esclarecer que não pretendemos esgotar aqui esta temática,
considerando que esta população pode ser examinada através de múltiplas perspectivas.
Este artigo pretende aprofundar o enfoque da epidemia do HIV/Aids e sua associação com
a exclusão e vulnerabilidade social desde o lugar das populações que fazem uso
problemático de drogas, populações em situação de pobreza, minorias étnicas, migrantes e
privados de liberdade, procurando sintetizar num só texto: a) os pontos mais importantes
apresentados no Fórum 2003, celebrado na cidade de Havana, Cuba, entre os dias 07 e 12
de abril de 2003; b) uma revisão do estado atual do conhecimento sobre o tema; e, c) as
lições aprendidas na América Latina e Caribe, citando também, em paralelo, as aprendidas
em outras regiões geográficas.
Deixamos claro que falar sobre dimensões de exclusão e vulnerabilidade nestas
populações, significa abordar a epidemia desde a perspectiva de populações que se tornam
cada vez mais fragilizadas frente à Aids, devido a políticas proibicionistas e
discriminatórias e devido aos complexos processos de globalização e reestruturação
econômica do mundo.


1. ALGUMAS PREMISSAS COMO PONTOS DE PARTIDA

As idéias trabalhadas neste artigo partem das premissas explicitadas a seguir:
a) a epidemia da Aids continua avançando;
b) cresce numa dimensão plural, de “epidemias”, dado que as situações e contextos que
afetam os diferentes povos e comunidades se entrelaçam singularmente para moldar a
infecção do HIV/Aids de forma especifica, de acordo com o contexto e a sociedade ou
nação que a abriga;
c) a epidemia está viva, mas mudou seu espaço social, atingindo hoje, de forma mais
intensa os setores marginalizados da sociedade, devido à pobreza, racismo, desigualdades
de gênero, opressão sexual e exclusão social.
Citando Richard Parker (2000, p. 101), “a epidemia do HIV/Aids se instala cada vez mais
na polarização crescente entre os ricos e os que vivem em situação de extrema pobreza, na
exclusão de setores inteiros da sociedade e na integração perversa de outros nas economias
criminosas como são as do trafico internacional de drogas, de armas, de órgãos, etc. É neste
contexto que a epidemia se alastra e cresce, em grande medida desapercebida, não porque
seja impossível de vê-la, mas porque a sociedade não quer enxergá-la”.


2. ATENÇÃO ÀS RAÍZES DO PROBLEMA

2.1 A vulnerabilidade da pobreza, da marginalização, da iniqüidade e da exclusão
social

O fato de ser colocado na margem social gera vulnerabilidade. A exclusão e marginalização
em que a sociedade joga os homens que fazem sexo com outros homens, os usuários de
drogas, as mulheres, os jovens, os profissionais do sexo, os migrantes, as minorias étnicas,
as pessoas privadas de liberdade, marcam o caminho em direção à doença e carência.
Parafraseando José Toro-Alfonso (In: Caceres, C.F. et. al., 2002, p. 91), as pesquisas
recentes demonstraram que, muito além da fragilidade individual, são as percepções de:
isolamento social, ausência de apoio social e fragilidade ou inexistência de organização
política e empoderamento social o que gera maior vulnerabilidade. “Se não há espaço
público, o espaço privado se esvazia” (Corporación Chilena de Prevención del Sida, 1997,
p. 42).
O conceito de vulnerabilidade tem sua origem na área dos Direitos Humanos, designando
originariamente: grupos ou indivíduos fragilizados, jurídica ou politicamente, na promoção,
proteção ou garantia de seu direito à cidadania.
Desde que existe a epidemia de Aids, diversas foram as construções explicativas elaboradas
pela sociedade e a ciência na tentativa de compreendê-la. O conceito de “vulnerabilidade
social” é uma das construções mais recentes. Segundo Mann & Tarantola (1996), são três,
basicamente, os modelos explicativos construídos até o momento: a idéia de “grupos de
risco” (entre 1981 e 1984), a idéia de “comportamento de risco” (entre 1985 e 1988) e a
noção de “vulnerabilidade” (desde 1989 até hoje).
A idéia de “grupos de risco” parte de um conceito epidemiológico que percebe a doença
como restrita a grupos que, normalmente, apresentam atributos visíveis de identificação,
como por exemplo, características corporais ou de comportamento. Os primeiros grupos
identificados como “de risco” foram os denominados “os quatro H” para fazer referência
aos homossexuais, hemofílicos, haitianos e usuários de heroína.
Esta forma de identificar os “responsáveis” pela epidemia trouxe como conseqüência um
estímulo à estigmatização, além de ser uma categoria completamente insuficiente para
analisar a epidemia. De qualquer forma, a categorização em “comportamento de risco”
também será insuficiente, embora acrescente a possibilidade de mostrar que a infecção
atinge também indivíduos que estão “fora” dos grupos de risco tradicionais e introduz a
idéia nova de que a Aids é uma doença democrática, que alcança todos os que adotem
comportamentos de risco. Considerando a forma anterior de interpretar a epidemia, esta que
considera os comportamentos traz alguns avanços. Entretanto, também apresenta limites,
pois é respaldada por uma ótica individualista e culpabilizante (a “culpa” é da pessoa que
teve um “comportamento de risco”) e desconsidera que alguns sujeitos podem ser mais
vulneráveis que outros. Dizer que Aids é uma epidemia de “todos” é a mesma coisa que
afirmar que todos estamos na mesma posição social diante dela.
De qualquer modo, como expressa Parker (2002, p.102), dizer que a epidemia é de todos,
que todos somos igualmente expostos à infecção é uma “ficção necessária”. “Necessária”
porque rompe com a complacência generalizada de quem se considerava imune ao risco;
“ficção” na medida em que nunca uma epidemia atinge todas as classes sociais da mesma
forma. Sempre os setores sociais mais pobres são mais atingidos porque os aspectos
socioculturais e político-econômicos que estruturam os contornos da epidemia em seus
diversos cenários precisam ser considerados.
Procurando romper com a concepção da epidemia enraizada em comportamentos
individuais como é a concepção de “grupos e comportamentos de risco”, passou-se a uma
análise da epidemia dentro de uma configuração social e coletiva, utilizando o conceito de
“vulnerabilidade”. Sem negar que todo ser humano é suscetível de infecção por HIV ou que
a transmissão aconteça mediante comportamentos de indivíduos específicos, o conceito de
vulnerabilidade traz consigo um novo paradigma que deixa de individualizar a origem da
epidemia e a coloca num cenário concreto, definido pelos diferentes fatores sociais que
aumentam a fragilidade de alguns indivíduos e grupos. Começa-se a analisar o avanço da
epidemia a partir de coordenadas histórico-sociais concretas como: desigualdade e
injustiça, preconceito e discriminação, opressão, exploração e violência.
O conceito de vulnerabilidade oferece, portanto, a possibilidade de redirecionar a forma de
analisar a epidemia. Auxiliando-nos a perceber a atuação das forças históricas e estruturais
junto aos aspectos subjetivos e individuais, nos alerta para a co-responsabilidade de todos
estes aspectos, no momento de determinar o grau de vulnerabilidade ao HIV/Aids dos
diferentes indivíduos e comunidades. O conceito de vulnerabilidade representa uma
tentativa de analisar a epidemia, integrando fatores de ordem individual – relacionados à
subjetividade e auto-estima de cada um -, social – ligados às raízes socioculturais e
político-econômicas – e programática – relacionada com a infra-estrutura de saúde pública
que contemple a promoção, a prevenção, a proteção e a assistência à saúde em cada
situação. Compreender a vulnerabilidade de um indivíduo ou grupo social é fruto da
articulação desses três grupos de fatores, em modelo tridimensional, onde, a cada momento,
algum grupo pode pesar mais que os outros.
Bastos & Szwarcwald (2001) utilizam os conceitos “bens materiais” e “bens simbólicos” de
Pierre Bourdieu (1982) para tematizar a vulnerabilidade ao HIV. Ou seja, toda situação de
saúde que se caracterize por desigualdades coletivas e que possam resultar em
possibilidades diferenciadas quanto ao acesso aos bens e serviços, tanto materiais
(alimentação, habitação, tratamento médico, etc.), quanto simbólicos (informação e poder
de autodeterminação), geram situações de forte vulnerabilidade. Isto é, a vulnerabilidade se
refere aos diferentes graus de fragilidade dos indivíduos e grupos frente à infecção por
HIV/Aids, segundo a particularidade vivida e de acordo com o conjunto integrado de
aspectos sociais, programáticos e individuais que os coloca em menor ou maior risco frente
ao problema.
A epidemia de HIV/Aids exige, de forma urgente, que se recupere as populações mais
vulneráveis da situação de exclusão, a fim de que elas mesmas tomem conta de sua saúde e
de suas vidas. As bases da vulnerabilidade da infecção por HIV estão cimentadas sobre a
exclusão e o estigma. Recordemos que a exclusão social é entendida como impedimento ao
pleno exercício da cidadania. Por cidadania compreendemos o conjunto de direitos e
deveres relativos às condições materiais, físicas, psíquicas, políticas e sociais que definem a
autonomia do indivíduo em um contexto de vida em sociedade.
A política pública precisa ter a inclusão social como elemento principal, em que os direitos
sociais estejam garantidos em sua plenitude, sendo expressão de uma integralidade dos
direitos políticos, garantia dos direitos sociais universais e eqüitativos. Isto significa que a
situação de exclusão social tem intima relação com o binômio eqüidade/injustiça social. A
eqüidade social deve ser um princípio das políticas públicas, que definem funções
distributivas, as quais têm o objetivo de superar desigualdades existentes e consideradas
socialmente injustas. A eqüidade social tem uma orientação ética social que não admite
diferenças de oportunidades que resultem em diferentes condições sociais de vida. Exige
um olhar não igualitário na aplicação dos recursos para a saúde pública e demais políticas
sociais. A eqüidade se expressa em duas dimensões: uma horizontal (dar respostas iguais a
necessidades equivalentes) e outra vertical (dar respostas diferentes para necessidades
diferenciadas).
A relação entre vulnerabilidade ao HIV e injustiça social foi estudada de forma bastante
ampla pela literatura internacional. Ainda assim, é importante destacar que em virtude da
singularidade dos diversos contextos sociopolitico e culturais nos quais o tema foi
estudado, torna-se difícil chegar a conclusões gerais. Tratam-se de estudos de observação,
com bases bastante diversificadas quanto aos marcos conceituais utilizados pelos diversos
autores. De qualquer forma, chegaram a importantes constatações, algumas das quais
analisaremos a seguir.
É comum que os locais onde se aglomeram as populações mais pobres sejam áreas que
conjugam inumeráveis fatores adversos para a saúde de seus habitantes. Quase sempre não
oferecem oportunidades de trabalho, boas condições de habitação, de atendimento
educacional, de saúde. Ou seja, estão segregadas em um espaço geográfico, pessoas pobres
ou em situação de miséria que, por suas próprias circunstâncias de vida, têm um conjunto
de comportamentos que as fazem vulneráveis ao HIV. São episódios freqüentes na vida
destas pessoas o consumo de álcool e outras drogas, altos níveis de violência e alta
prevalência de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST). Rodrick Wallace et. al. (1997),
demonstraram em diversos estudos, o caráter sinergético destes problemas sociais.
Situação que foi definida por Singer (1994) como sindemia. Ou seja, o conjunto de fatores
atuam de forma uníssona e se entrelaçam de forma tão complexa que e impossível medir a
intensidade que cada um intervém. Isto significa que nos segmentos mais pobres interagem,
de forma sinérgica problemas de diversas ordens, ocasionando diferentes efeitos adversos.
É o que hoje se chama de “sinergia de pragas” ou “a Aids como sindemia”. Os efeitos
negativos de uma gama de diferentes problemas sociais interagem sinergicamente para criar
uma vulnerabilidade acrescida para o HIV/Aids (Wallace, 1988).
De forma semelhante Merril Singer, em seu trabalho sobre a crise da saúde enfrentada pela
população pobre das áreas urbanas nos Estados Unidos, fala do HIV/Aids como uma
espécie de sindemia que interage negativamente com os demais problemas de saúde,
produzindo níveis mais altos de vulnerabilidade. Portanto, segundo a bibliografia
examinada, a pobreza combinada com vários fatores sociais e culturais aumenta a
vulnerabilidade para o HIV.
Nos estudos de Friedman et. al. e nos de Szwarcwald et. al. temos a descrição de como se
dá esta sinergia, por exemplo, entre os usuários de drogas injetáveis (UDI) pertencentes às
camadas mais pobres da sociedade norte-americana, os quais se envolvem na prática do
sexo comercial, ou se envolvem no tráfico de drogas para financiar seu consumo. A estas
situações se somam os efeitos adversos das políticas de controle das drogas, os processos
sociais estigmatizantes e a precariedade da inclusão destas pessoas no mercado formal de
trabalho. Isto faz, sem dúvida, que esta população seja muito mais vulnerável diante da
epidemia e, conseqüentemente, haja uma difusão seletiva do HIV nos extratos sociais mais
pobres.
Poucos autores analisaram o tema da vulnerabilidade social e a conseqüente pauperização
da epidemia do ponto de vista macroeconômico e macropolítico.
O pioneiro foi, sem dúvida, Jonathan Mann tanto no antigo Programa Global de Aids
(1987), quanto nos últimos anos em seu trabalho na Universidade de Harvard (1996).
Também os trabalhos de Paul Farmer (1996, 1997) se enquadram nesta perspectiva. Este
autor incorpora uma dimensão de ecologia social aos modernos estudos sobre a ecologia
das doenças infecciosas e, segundo ele, as formas seletivas como os agentes patológicos
interferem num organismo não se devem somente aos atributos da biologia evolucionista e
da ecologia dos agentes infecciosos, mas também ao impacto da injustiça social e da
violência estrutural (nesta expressão se inclui qualquer violação dos direitos humanos).
Assim, as variáveis scioeconômicas determinam alterações na ecologia das doenças
infecto-contagiosas. As camadas menos assistidas e mais pobres da população tornam-se
mais vulneráveis aos agentes patológicos, por razões biológicas (pior imunidade) e por
razões sociais (impossibilidade de ver suas demandas atendidas, residir em lugares com
infra-estrutura precária, etc.), que se manifestam de forma simultânea.
Taeil et al. (1995) fazem referência que estes segmentos sociais também se deparam com
barreiras estruturais que os impedem de modificar comportamentos que minimizariam os
riscos de infecção. Os pobres não tem, por exemplo, recursos para a prevenção
(preservativos, agulhas e seringas esterilizadas). Por outro lado, têm acesso dificultado para
os serviços de saúde. Possuem também fortes barreiras culturais – baixo nível de
escolaridade, pouco domínio da língua escrita – que lhes dificultam o acesso a informações
atualizadas.
Todos os aspectos até agora apresentados nos fazem retomar o conceito criado por Farmer
& Castro (2001, 2002) de “violência estrutural”, os quais trabalharam oferecendo serviços
médicos e sociais na zona rural do Haiti, país mais pobre da América, um dos mais pobres
do mundo e o país americano mais afetado pela pandemia.
As situações precárias em que vivem milhões de seres humanos favorecem a transmissão
do HIV e impedem que as pessoas que vivem com HIV conheçam seu estado sorológico.
Este processo está intimamente relacionado com a situação dos países pobres que vivem no
círculo vicioso de estarem endividados e necessitarem cada dia contrair novas dívidas,
antes de poder oferecer saúde com qualidade à sua população. “A violência estrutural está
intrinsecamente relacionada com as doenças infecciosas. Ou melhor, forças sociais como a
pobreza, se incorporam no organismo e fazem as pessoas mais vulneráveis serem presas da
doença” (Castro, 2003).
As doenças infecciosas estão cada vez mais concentradas entre os pobres, entre os
oprimidos pela violência estrutural, cujos direitos sociais e econômicos são
sistematicamente violados. Na África Subsaariana, onde a epidemia é de grande magnitude
e os recursos para as ações básicas de saúde são escassos, ocorre um processo real de
pauperização da epidemia. Mais casos de infecção são registrados entre os mais pobres dos
países pobres, que também apresentam quadros clínicos mais graves e óbitos mais rápidos.
Esta situação é dramaticamente ilustrada pelas epidemias recentes em diversas regiões da
Índia e nos antigos enclaves étnicos da África do Sul.
Lurie et al. (1995) levantaram uma idéia polêmica para explicar este assunto. Os autores
identificaram os “ajustes estruturais” como fatores fundamentais da disseminação da
epidemia. Tratam-se dos ajustes impostos pelos organismos internacionais que financiam
os programas nacionais de controle das DST e Aids dos países em desenvolvimento. Em
geral são restrições para os gastos públicos em saúde, nem sempre compatíveis com as
demandas locais. Desta forma, estes “ajustes estruturais” contribuem sinergicamente com
os demais fatores na violência estrutural.
Feitas estas colocações, parece-nos ainda importante abordar os resultados de outros
trabalhos acadêmicos que analisam a transformação da economia internacional na tentativa
de entender a evolução global da epidemia e as causas da violência estrutural. As últimas
décadas do século XX foram marcadas por complexos processos de globalização e
reestruturação econômica que trouxeram, como conseqüência, transformações nas
sociedades, comunidades e famílias.
Parker e Camargo (2000) afirmam que a conseqüência central deste conjunto de
transformações econômicas é a extensão com que as elites se conectam ao redor do mundo,
ao mesmo tempo que se criam novas formas de exclusão, de desigualdades sociais, de
diferenças salariais mais acentuadas, além de pobreza e miséria em todas as sociedades: as
do Norte e as do Sul.
Como afirma Castells, surge um “quarto mundo” onde as divisões entre Norte e Sul,
Primeiro e Terceiro Mundo, são demolidas e segmentos populacionais (inclusive
continentes inteiros, como é o caso da África) começam a se tornar irrelevantes para o
sistema, em termos de produção e consumo. Esta fase recente da globalização se caracteriza
por um profundo acento no processo de diferenciação social. Cresce a polarização entre
pobres e ricos. Os ricos se tornam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. A
classe média está gradualmente desaparecendo. Ao mesmo tempo a diferenciação social nas
relações de produção se caracteriza pela crescente individualização do trabalho
(decadência dos sindicatos e crescimento da economia informal), super-exploração do
trabalho (crescimento do trabalho infantil), exclusão de grupos do mercado de trabalho
(jovens do sexo masculino, por exemplo), integração perversa destes mesmos grupos na
economia criminal (Castells, 1998). Estas tendências aparecem em escala planetária,
independente se o país é desenvolvido ou está em vias de desenvolvimento e estão
associadas à crescente feminização da pobreza e miséria. As mulheres são cada vez mais
excluídas, não só pela opressão de classe e etnia, mas também pelo gênero.
Esta situação também é reforçada pela transformação do Estado, que se tornou “mínimo”,
provocando redução dos programas de saúde, educação e assistência social. Estas
transformações atingiram desproporcionalmente a vida das mulheres, por exemplo, apesar
dos avanços conquistados pelo movimento feminista na área dos direitos civis e políticos.
Esta nova ordem mundial trouxe grandes desafios para a humanidade, entre os quais, a
Aids, para a qual a saúde pública ainda não deu uma resposta contundente, mesmo tendo
mobilizado um montante considerável de recursos.
Os novos mecanismos econômicos ignoram a existência de contingentes imensos de seres
humanos que se tornam literalmente supérfluos, desnecessários, obsoletos, descartáveis.
Trata-se de grupos incompatíveis com o capitalismo, que são colocados à margem do
processo de desenvolvimento de seus países. Ou seja, há uma mudança no processo de
vulnerabilidade social. Pessoas são consideradas descartáveis para a sociedade porque
nunca chegam a se tornar úteis para a nova ordem econômica vigente. É o que alguns
autores denominam “exclusão dos irrelevantes”. O Estado deixa de ser o protetor desses
grupos e se propaga um discurso de que a pobreza é natural.
Temos assim, uma violência estrutural do sistema que usa mecanismos simbólicos para
reproduzir situações que continuam assegurando a hegemonia de uma Ordem Mundial. Esta
violência gera pobreza, desigualdade, opressão, faz reaparecer doenças do passado e
dissemina epidemia entre os mais pobres.
O fato de a epidemia da Aids ter aparecido justamente neste contexto de mudanças
macroeconômicas pode ser apenas um acidente histórico. No entanto, a relação entre a
evolução da epidemia e as conseqüências das mudanças econômicas não podem ser mera
coincidência. Os impactos negativos da globalização geram, como afirma Castells (1998)
uma “integração perversa”: a produção de marginalidade e criminalidade como parte
integrante da nova ordem capitalista mundial. Ou seja, a marginalidade e a criminalidade
não são novos desvios ou acidentes, são ingredientes estruturais da produção de
suscetibilidade crescente frente à infecção. São fatores determinantes na
vulnerabilidade.


2.2 Estigma, discriminação e Aids

Feitas estas considerações, é importante ressaltar que a epidemia da Aids, teve, desde sua
aparição até nossos dias, uma marca forte e persistente de estigma e discriminação. Em
1987, Jonathan Mann, então Diretor Fundador do Programa Global de Aids, da OMS,
dirigiu-se à Assembléia Geral da ONU, sublinhando esta problemática que favoreceu a
disseminação da pandemia de forma explosiva. Em 1995, o Programa Global foi
substituído pelo Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/Aids (Unaids) que
reúne seis órgãos diferentes das Nações Unidas. No ano 2000, Peter Piot, Diretor Executivo
da Unaids, na 10° reunião do Grupo de Coordenação de Programas deste órgão, insiste no
desafio permanente para a comunidade mundial: “o esforço renovado para combater o
estigma”. E enfatizou: “o combate efetivo ao estigma removera o que ainda é um bloco de
pedra” no desenvolvimento e enfrentamento da pandemia (Piot, 2000).
Vários anos nos separam das declarações de Mann e Piot. Muitos recursos foram
mobilizados para o controle da epidemia. Ainda assim, o estigma permanece no centro da
luta contra a pandemia global da Aids. É o que permite alguns autores afirmar que a
complexidade do HIV se torna menor se comparada com a complicada situação da
produção e reprodução do estigma e discriminação como processos sociais em relação ao
HIV/Aids.
Mann (1987) distingue três momentos diferentes da epidemia da Aids em qualquer
comunidade. Momentos que ele identifica como três epidemias diferentes. Um primeiro
momento – epidemia de HIV – em que a epidemia entra em todas as comunidades de
forma silenciosa e sem ser notada; um segundo momento – epidemia de Aids – quando ela
realmente é percebida; e um terceiro momento, chamado também de “terceira epidemia” –
epidemia do estigma, discriminação e negação coletiva – que se torna o momento mais
explosivo e extremamente atual.
As discussões sobre o estigma, particularmente em relação ao HIV/Aids, tem seu ponto de
partida no estudo de Erving Goffman (1988). Baseado na experiência de pesquisa com
doentes mentais, com deficiências físicas ou que tinham comportamentos percebidos como
socialmente desviantes (caso do homossexualismo ou comportamento criminal) Goffman
observou que o indivíduo estigmatizado era visto como uma pessoa que possui uma
“diferença indesejável”, o que o leva a uma “identidade deteriorada” (a pessoa é colocada
naquele lugar e ela mesma se vê ali). O estigma esta baseado na ideologia do “desvio” e é
aplicado pela sociedade através de regras e sanções. O estigma, como atributo negativo, é
aplicado sobre as pessoas que não se ajustam às regras e sanções. O estigmatizado, em
virtude de sua diferença, se auto-identifica como algo negativo para a sociedade. No
entanto, segundo Goffman, o estigma não é algo estático, mas um processo social em
constante mutação. Conhecer de modo preciso esta problemática é importante para pensar
intervenções que desconstruam os modelos estigmatizantes construídos pela sociedade.
Para Parker & Aggleton (2001) estigmatização e discriminação são construções sociais que
somente podem ser entendidas em relação às noções mais amplas de poder e dominação.
Estes autores defendem que o estigma tem um papel central na produção e reprodução das
relações de poder e de controle social. Conseqüentemente, alguns grupos são
desvalorizados e outros sentem-se superiores. Fala-se, em síntese, de desigualdade social.
Assim, para compreender as questões relacionadas à estigmatização e discriminação em
relação ao HIV/Aids ou qualquer outra situação, é necessário pensar de forma ampla sobre
o porque de alguns indivíduos se tornarem socialmente excluídos.
Analisaremos a seguir a situação de algumas populações especificas, cada vez mais
vulneráveis diante da epidemia da Aids. Encontram-se nesta situação por causa da
estigmatização e discriminação sociais e/ou por causa da situação de pobreza e
miserabilidade provocada pelas políticas macroeconômicas marginalizantes.


3. VULNERABILIDADE DE POPULAÇÕES ESPECÍFICAS: ESTADO ATUAL DO
CONHECIMENTO

Continuando, faremos uma análise do estado atual das pesquisas em relação a algumas
populações especificas, envolvidas na epidemia, como: minorias étnicas, migrantes,
usuários de drogas, e privados de liberdade.
Nas páginas anteriores aprofundamos a relação entre a vulnerabilidade para o HIV e a
situação de pobreza, subdesenvolvimento, injustiça e marginalização social. Aqui não será
diferente. Quando nos aproximamos de estudos dirigidos às populações específicas, vemos
que eles documentam influências de fatores estruturais na transmissão do HIV e que a
epidemia se concentra em áreas geográficas com certas singularidades e em populações
identificadas como mais vulneráveis (Ayres, 1994; Sweat & Denison, 1995; Taiwill et al.,
1995; Turshen, 1995; Aggleeton, 1996; Carael et al., 1997; Singer, 1998; entre outros).
Parker e Camargo, na publicação “Sida y Pobreza” (2000) fizeram uma ampla revisão
bibliográfica dos estudos disponíveis na África, Ásia, América do Norte e América Latina.
Mostraram que, apesar de características especificas de cada epidemia local, a transmissão
do HIV/Aids está se concentrando em determinadas populações e regiões, nas quais a
pobreza é o marco fundamental.


3.1 –Populações móveis, migrantes e populações de fronteiras

O próprio processo de subdesenvolvimento cria, com freqüência, por razões políticas e
econômicas, formas de mobilidade das populações: migração, trabalho sazonal, convulsão
social em conseqüência de guerra ou de instabilidade política. Esta mobilidade produz, por
sua vez, práticas sociais que aumentam o risco de infecção por HIV.
Joseph Decosas (1996), relata um dos muitos exemplos que atestam o aumento da
incidência de HIV/Aids nas populações migrantes, como conseqüência do desenvolvimento
econômico. Nesse estudo se descreve a construção da Usina Hidrelétrica de Akosombo, em
Gana (África) nos anos 60/70. Tal construção trouxe uma certa desintegração das estruturas
socioeconômicas tradicionais (de base agrícola na região) e uma acentuada contribuição
para o aumento da epidemia no povo Krobo, habitante da região. Durante a construção da
represa, os homens se transferiram para as margens do Rio Volta para trabalhar no canteiro
de obras, enquanto as mulheres passaram a prover trocas econômico-sexuais.
Em seguida, quando as águas invadiram as terras onde se formou o Lago Volta, destruiu-se
a base agrícola do povo Krobo e um número considerável de mulheres (e depois suas
filhas) dedicou-se ao trabalho sexual. A construção da Usina trouxe, portanto, o
desenvolvimento econômico para a região, aumentando a produção de energia. Por outro
lado, contribuiu para a disseminação da epidemia, pela mudança de comportamento que
produziu na população local.
Paul Farmer (1992) documentou, de forma semelhante, como a mobilidade da população do
Haiti, também por iniciativas de desenvolvimento econômico, provocou o aumento da
infecção por HIV. De fato, a própria situação de pobreza dos povos, faz que seja necessária
a mobilidade, ainda que temporária, para a busca de emprego e melhores condições de vida.
Um número significativo de estudos associou pobreza à migração e mobilidade, sugerindo
que estas possuem maior vulnerabilidade para o HIV por inserir-se e expor-se a diferentes
situações numa variedade de contextos e lugares, como é o caso: dos trabalhadores sazonais
no sul da África (Romero-Daza & Himmelgreen, 1998) e na África Ocidental (Decosas et
al., 1995), os migrantes da República Dominicana nos Estados Unidos (Kreniske, 1997), os
migrantes das áreas rurais para áreas urbanas no Haiti (Farmer, 1992; 1999), os filipinos
trabalhando temporariamente no exterior (Tan, 1993), as profissionais do sexo na Tailândia
(Archavanitkul & Guest, 1994), assim como os trabalhadores do sexo e outros HSH no
Brasil (Larvie, 1997; Parker, 1993; 1997).
Segundo Mario Brofman (2003) a mobilidade populacional deve ser analisada em três
eixos: a magnitude do problema, as causas da migração e os tipos de população móvel.
Em referência à magnitude do problema, o autor destaca alguns dados muito significativos
que nos dão a idéia da amplitude da problemática em relação ao aumento da
vulnerabilidade destas populações. Considerando as cifras apresentadas pela Unaids em
1998, 100 milhões de pessoas se movimentam no interior e entre as nações a cada ano
(OIM, 1998), gerando aumento da vulnerabilidade para os que se movimentam e para seus
anfitriões, em conseqüência dos hábitos sociais e relacionais transitórios, variáveis e mais
flutuantes que se estabelecem. Podemos recordar aqui a idéia da “sinergia de pragas”, de
Wallace, que destaca a confluência de vários fatores sociais ou problemas sociais para
aumentar os riscos de exposição à infecção por HIV/Aids.
Outros números apresentados por Brofman também são assustadores, se olhados do ponto
de vista da saúde pública e da incapacidade desta para oferecer atenção e assistência às
pessoas que transitam de um lado para outro, sem referência domiciliar fixa, com
dificuldades para falar a língua do país, que naquele momento, legal ou ilegalmente, o
abriga. Cento e cinqüenta milhões de pessoas vivem, legal ou ilegalmente, fora de seus
países (OIM 2002), dois milhões de centro-americanos emigraram de seu país em 2002
(Cepal, 2002) e, aproximadamente, trezentos milhões cruzam, anualmente, a fronteira entre
o México e Estados Unidos (Conapo, 2000).
As causas da mobilidade e os tipos de população móveis são duas categorias inseparáveis,
razão pela qual as analisamos conjuntamente. Existem populações cuja mobilidade tem
duração prolongada com o objetivo de exercer atividades laborais. Existe também
mobilidade sazonal de trabalhadores agrícolas, geralmente, com fluxos rural-rural.
Outra população móvel é a categoria que realiza atividades de transporte, como por
exemplo, os caminhoneiros. No Brasil, o Programa Nacional de DST/Aids está financiando
vários estudos em portos secos, portos marítimos, fronteiras, onde os caminhoneiros
permanecem para carregar ou descarregar sua mercadoria. Paulatinamente, estes estudos
estão demonstrando a ampliação da vulnerabilidade desta população para a infecção por
HIV.
Também pertencem ao grupo das populações móveis, as populações fronteiriças, já que os
movimentos cotidianos destes grupos (idas e voltas), bem como a transitoriedade de
pessoas que realizam trabalhos em núcleos fronteiriços, como empregadas domésticas e
profissionais do sexo, podem ter sua vulnerabilidade aumentada.
Em geral, as fronteiras internacionais são áreas onde há grande mobilidade de população,
onde se concentram facilmente as economias ilegais, o tráfico de drogas, altos índices de
prostituição, inclusive infantil, tráfico de mulheres e onde, freqüentemente, há limites no
acesso aos serviços de saúde.
O Brasil, por exemplo, que possui fronteiras com quase todos os países da América do Sul,
enfrenta um problema sério de disseminação do HIV nestes cenários geográficos (Galvan,
2002). Atualmente está se criando um grande movimento nacional para a formulação de
políticas públicas em aliança com os países limítrofes, com o objetivo de proteger tais
populações. Alguns países vendo-se em situação parecida com a do Brasil, dedicam-se a
criar leis e políticas para restringir a liberdade de movimento de pessoas que vivem com
HIV/Aids. Estas políticas foram, supostamente, criadas para proteger as fronteiras
internacionais, o que representa, muitas vezes, uma profunda incongruência com as
políticas locais mais liberais, que pretendem impedir a discriminação das pessoas afetadas e
uma violação dos Direitos Humanos explícitos na Declaração Universal dos Direitos do
Homem e do Cidadão (Malcolm et al., 1998).
Por último não podemos deixar de considerar o fluxo de migrantes de passagem,
usualmente não autorizados ou sem documentação que, por estarem em situação ilegal, têm
menos facilidade de receber os benefícios dos serviços de saúde pública.
Para terminar, queremos destacar que existem determinantes de vulnerabilidade para as
populações móveis e que os nexos causais subjacentes à conexão entre mobilidade e HIV
são muito complexos. Poucas redes de apoio, escasso acesso a programas de prevenção,
falta de acesso a serviços médicos, contato sexual e relacional com diferentes grupos são
determinantes de vulnerabilidade presente na vida destas populações.


3.2 Minorias étnicas e vulnerabilidade frente ao HIV/Aids

Lembremos que Castells (1998) quando fala na globalização do “capitalismo de
informação” afirma que a polarização das desigualdades sociais acontece não só nos países
em desenvolvimento, mas também nos chamados desenvolvidos.
Segundo o Plano Estratégico de Prevenção do HIV até 2005, do CDC (Centro para o
Controle e Prevenção de Doenças – EUA), em 1999 nos Estados Unidos foram registrados
mais afro-estadunidenses que qualquer outro grupo racial/étnico: 63% de todas as mulheres
e 42% de todos os homens.
As crianças afro-estadunidenses representaram quase dois terços dos casos pediátricos.
Estima-se que entre as mulheres, 64% dos novos casos de infecção por HIV são de afro-
estadunidenses.
Por outro lado, também em 1999, os hispânicos representavam 13% da população dos
Estados Unidos, mas constituíam 19% dos casos de Aids registrados neste ano. Estimativas
indicam que as mulheres hispânicas representaram 18% dos novos casos de 1999, enquanto
os homens hispânicos atingiram 20% dos novos casos de HIV.
A produção acadêmica que tematiza raça/etnia e Aids, indica que tanto nas áreas internas
das grandes cidades dos países desenvolvidos ou em desenvolvimento, quanto na África
subdesenvolvida, percebe-se a concentração da pobreza em certas comunidades com
identidade étnica/racial. Associado à pobreza, surgiu nestas comunidades, um conjunto de
problemas como a difusão da epidemia da Aids.
No final da década de 80, autores como Rodrick Wallace, Mindy Fullilove, Robert
Fullilove e Peter Gould trataram de estudar a ligação de uma série de problemas sociais que
afetavam as comunidades onde viviam minorias étnicas nas áreas internas das grandes
cidades dos EUA. Eles focalizaram particularmente o impacto que teve na qualidade de
vida destas populações a redução de um conjunto de serviços essenciais e documentaram os
modos pelos quais as alterações na provisão destes serviços levaram a estas comunidades a
níveis crescentes de “desertificação urbana” (transformação de uma região em deserto).
A desertificação urbana se caracteriza, por exemplo, por casas incendiadas ou demolidas
para dar lugar a construções futuras de vias expressas, o que faz com que os habitantes
vizinhos a elas e que têm condições financeiras abandonem aquelas regiões, dando livre
passagem aos despossuídos, criando efetivamente uma “terra de ninguém” na qual os
aspectos regulares da ordem social (policiamento efetivo, escolas, centro de saúde, etc.)
funcionam precariamente ou não existem e onde os níveis extremamente elevados de
mortalidade por violência, tráfico de drogas, mortalidade infantil e infecção por HIV foram
documentados.
Situações semelhantes aparecem em outras cidades da América Latina. Mariela Rossi et al.
(2003), da Fundação Habitar (Argentina) apresentou no Fórum 2003 a experiência sobre a
“Villa 15” – Ciudad Oculta”, pertencente ao complexo Lugano Soldati, situado na Zona Sul
de Buenos Aires. Trata-se de uma região de pobreza urbana, de alto risco sanitário e social,
cuja taxa de mortalidade por Aids chega a 17,7% do total das mortes de Buenos Aires, onde
41,7% da população de 15 a 19 anos não tem instrução e 75,4% com ensino médio
incompleto (1998). Deduz-se que os casos de Aids informados se correlacionam fortemente
com os grupos étnicos juvenis de 19 a 30 anos.
Observam-se também altas taxas de desemprego e subemprego, ausência de espaços de
inclusão social, ruptura de laços e alta incidência de mortes violentas na faixa etária juvenil
(20 mortos menores de 20 anos no ano 2000, na Villa 15), cifra que se mantém na
atualidade.
A “Ciudad Oculta” surgiu na década de 40 e 50 com o processo de industrialização dos
centros urbanos, atraindo populações rurais pobres do norte argentino onde predominavam
indígenas ou seus descendentes. Naquela época, o alcance das políticas estatais
beneficiavam o crescimento econômico e social destes setores, mas a partir dos anos 70
começa a desindustrialização progressiva e violenta do país e, conseqüentemente, a
deterioração dos níveis de vida, até chegar à pauperização degradante das condições de
subsistência. É um exemplo do que Wallace et al. falam em relação à “sinergia de pragas”.
Em outro trabalho apresentado no Fórum de 2003, Ivo Brito (2003) nos mostra a situação
atual dos povos indígenas no Brasil, onde vivem 370 mil indígenas distribuídos da seguinte
forma: 55% na Região Norte, 17% no Centro-oeste; 18% no Nordeste, 2% no Sudeste e 8%
no Sul. Eles possuem 587 territórios reconhecidos oficialmente, 215 sociedades e culturas
diferenciadas e 180 línguas. Nas áreas urbanas vivem 50 mil índios.
O primeiro caso de Aids nesta população foi notificado em 1988. Atualmente há 54 casos
notificados. Segundo este trabalho a epidemia cresce e se expande entre os índios residentes
nas áreas urbanas que, no entanto, mantém contatos freqüentes com as aldeias.
A maior vulnerabilidade se dá entre a população jovem, representando cerca de 68% dos
casos no grupo etário de 14 a 34 anos, sendo 65,3% entre os homens e 79,2% entre as
mulheres. A maior vulnerabilidade entre as mulheres jovens está associada a vários fatores,
tais como: iniciação sexual precoce, arranjos sexuais diferenciados de um grupo étnico para
outro, contatos inter-étnicos e baixa escolaridade. Por isso a relação da infecção entre os
sexos é 1/1.
Já vimos anteriormente as conseqüências da migração de pessoas de uma região para outra
e as repercussões nas estruturas sociais. Entre os indígenas brasileiros os grandes projetos
de desenvolvimento aumentam os contatos e conflitos inter-étnicos, provocando o
surgimento de doenças emergentes que trazem uma espécie de desordem cultural e a inter-
relação de fatores patogênicos com a ruptura de diferentes entre local e o global.
Neste povos, a compreensão de cultura, como uma teia de significados, não se da pela via
da ciência experimental, mas pela interpretação e compreensão dos significados. Por essa
razão o processo doença/saúde é vivido e construído socialmente. Cada grupo indígena tem
suas formas diferentes de interpretar esse binômio e suas manifestações. Nas sociedades
indígenas, a compreensão de que o vírus é causador da Aids é insuficiente, pois, para eles, o
processo saúde/doença é resultado da deterioração das relações entre o corpo, as pessoas e a
sociedade. Falar que os fluidos são veículos de transmissão também é insuficiente para
explicar a transmissão sexual do HIV, pois para eles, os fluidos estão intimamente ligados à
identidade individual e às relações sociais. A própria sexualidade não está relacionada a
comportamento, mas a um conjunto de regras e arranjos socioculturais, aos ritos de
passagem e aos mitos.
Brito propõe a adoção de algumas estratégias de prevenção que deveriam passar pela
legitimação das formas culturais de os povos indígenas enfrentarem a doença, suas causas e
as formas de cura. Sugere também que os profissionais de saúde que atuam nestas áreas
aprofundem a antropologia e a cultura dos povos indígenas para compreender melhor os
contextos socioculturais. Simultaneamente é preciso capacitar agentes de saúde autóctones,
que permitam a comunicação entre os saberes. Finalmente, Brito sugere: identificar
sistemas de interação com a sociedade não indígena, compreender as formas e arranjos
sexuais dos diferentes grupos e analisar as vulnerabilidades, medir o impacto inter-étnico
dos grandes projetos de desenvolvimento.


3.3 Usuários de Drogas, Redução de Danos e Vulnerabilidade Social

Os usuários de drogas, especialmente os de drogas injetáveis, são considerados um dos
grupos mais expostos à infecção por HIV. O costume de compartilhar instrumentos para
injeção constitui um dos meios mais eficientes de transmissão do HIV e outras patologias
de transmissão sangüínea.
Se nos determos em dados provenientes de alguns países da América Latina e outras
regiões do mundo, percebemos que se trata de uma população fortemente atingida pela
epidemia.
No Brasil, 25% dos casos de Aids estão direta ou indiretamente relacionados com o uso de
drogas injetáveis. Por outro lado, 38,2% das mulheres com Aids,contraíram o vírus
compartilhando seringas com o parceiro UDI (Usuário de Drogas Injetáveis) e 36% dos
casos pediátricos de Aids apontam a mãe ou o companheiro como UDI. Segundo a pesquisa
“Ajude o Brasil I” (Ufmg/CN DST/Aids – 1998, realizado em cinco projetos de Redução
de Danos), o uso de drogas é realizado em lugares isolados, com péssimas condições
higiênicas. A maioria dos usuários são homens, dos quais 82% são desempregados e 70%
estiveram presos em algum momento de sua vida. 85% dos UDI relataram uso grupal da
droga e o costume de compartilhar seringas variou de 56 a 85%. Segundo a mesma
pesquisa o grupo etário predominante é o de 18 a 30 anos.
Segundo o Boletim Epidemiológico (2002), na Argentina, no final de março de 2001,
havia, aproximadamente, 130.000 pessoas vivendo com HIV/Aids. Dos quase 20.000 casos
adultos notificados, 42% do total e 46% dos homens tinham como antecedente o ser UDI.
Na cidade de Buenos Aires, os UDI são o grupo mais atingido pela epidemia (Goltzman,
2003).
Também o Uruguai apresentou cifras alarmantes de infecção entre UDI nos últimos anos.
Além da própria infecção, tem contribuído com a infecção no/a parceiro/a sexual, bem
como na transmissão vertical. Atualmente, 25% dos casos de HIV notificados são UDI.
Destes, 45% são jovens de 15 a 24 anos.
Nos Estados Unidos, os UDI, suas parceiras e seus filhos constituem 36% dos casos de
Aids notificados até 1999 e 31% dos casos informados para este ano. A maioria dos casos
associados com UDI são homens: 52% heterossexuais e 13% de HSH. As mulheres UDI
constituem 21% dos casos. 13% dos casos de mulheres associadas a UDI são parceiras
heterossexuais em que também o homem é UDI. A transmissão vertical destas mulheres
representa 1%.
O consumo de drogas constitui o único habito/comportamento relacionado ao risco de
infecção pelo HIV, que além de ser estigmatizado, é também considerado crime. Na
maioria dos países da América Latina e Caribe não se provê a distribuição gratuita de
materiais descartáveis e se criminaliza o uso de drogas. Por isso, a maioria das pessoas que
consomem drogas ilícitas, precisam fazê-lo às escondidas, em lugares improvisados, onde
as condições de higiene são precárias, aumentando a vulnerabilidade. Em geral os UDI
mais expostos aos danos são os pertencentes às camadas menos favorecidas da sociedade.
Nas epidemias americana e brasileira, desde o princípio, percebeu-se que os UDI em maior
vulnerabilidade pertenciam aos estratos econômicos mais baixos, contribuindo para a
pauperização da epidemia como um todo, na medida em que um grande número de
soropositivos foi sendo registrado entre os UDI e parceiros/as sexuais (Friedman et al.,
1987).
Por serem homens jovens, sexualmente ativos, pouco afeitos ao uso dos preservativos, os
UDI norte-americanos e brasileiros desempenham um papel relevante na disseminação do
HIV para suas companheiras e filhos. Quando as companheiras também são usuárias de
drogas, Friedman et al. demonstram que elas fazem uso compartilhado de agulhas e
seringas com seus companheiros.
Pesquisas indicam que onde há maior repressão, os aspectos adversos do uso de drogas
tendem a ser mais intensos. O fato de criminalizar a posse de drogas para o consumo
pessoal, dificulta o contato do usuário de drogas com o serviços de saúde, em razão da
possibilidade de detenção. Esta população permanece privada, não só da ação terapêutica
que necessita em relação ao consumo, mas também da atenção que necessitaria por outras
doenças transmitidas por via sangüínea, como hepatites, Aids, endocardia, etc. e a
possibilidade de receber informações sobre o modo de evitá-las.
Em países como Argentina e Brasil, trava-se uma luta, a partir de certos setores da
sociedade civil organizada, de profissionais da saúde e afins, para pressionar o Estado a
adotar um política respeitosa frente aos direitos humanos, discriminalizando os Usuários de
Drogas. Livres de perseguições penais, poderão aceder mais facilmente aos serviços de
saúde.
Já se constatou cientificamente que os países que adotaram Programas de Redução de
Danos para UDI como estratégia de saúde pública, diminuíram os índices de contaminação
por esta via (Des Jarlais & Friedman, 1988). A Redução de Danos (RD) é uma estratégia de
prevenção ao HIV que reconhece que o abster-se do uso de drogas é melhor, resultado que
nem sempre se pode alcançar de imediato com todos os UDI. Por isso, a RD tem como
objetivo reduzir os danos que a droga possa provocar em usuários que não desejam deixar
de usá-la.
Os PRD partem do principio de que a epidemia da Aids representa um risco maior que a
droga para a saúde dos indivíduos, para a sociedade e a saúde pública. Do ponto de vista da
prevenção, é preciso informar que o uso compartilhado de agulhas e seringas é mais
perigoso que a relação sexual sem preservativo. Por isso, a RD serve para diminuir os
efeitos nocivos e os riscos relacionados a atividades ou comportamentos, orientando os
UDI a não compartilhar agulhas e seringas, para proteger-se de muitas doenças. O uso
compartilhado de agulhas e seringas entre UDI pode representar o risco de transmissão de
mais de 20 doenças entre as quais está a Aids, as hepatites B e C, sífilis, cardiopatias,
tromboses, infecções pulmonares e muitas outras.
O Ministério da Saúde do Brasil apóia a implantação de PRD associados ao uso de drogas
injetáveis em vários estados e municípios brasileiros (existem cerca de 300 programas em
todo o Brasil).
A Argentina implantou também alguns programas através de Ongs da cidade de Buenos
Aires (como Intercambios, ver Goltzman, P. et al., 2003) e do interior do país como Rosario
(Inchaurraga, S. & Hurtado, G., 2003). Atualmente através do governo da cidade de Buenos
Aires está-se iniciando um projeto em parceria com algumas organizações que atuam na
capital, para estender programas em alguns bairros marginais e outras regiões da cidade.
O Uruguai também desenvolve algumas intervenções neste sentido, através de Ongs, como:
IDES (Instituto de Investigação e Desenvolvimento Social, ver Scalatta, 2003) e Grupo de
Cavia (delta@chasque.apc.org).
Esta ação de RD orientada para os UDI e seu entorno social, que em grande parte dos
estados do Brasil estabeleceu-se como política pública e que se implanta, ainda que de
modo frágil, em outros países da América Latina e Caribe, tem como primeiro eixo a
entrega de preservativos para adoção de sexo seguro e a entrega de seringas e outros
utensílios para o consumo injetável. Mas não é só isso. Entre as medidas especificas
desenvolvidas pelos PRD incluem-se: sensibilização dos usuários em relação aos danos
causados pela droga, aconselhamento individual e grupal sobre o uso/abuso de drogas;
estímulo para a testagem anti-HIV, estímulo para a criação de vínculos entre os UDI e os
serviços de saúde; identificação da rede de usuários, seus hábitos, lugares relacionados ao
uso para realizar prevenção; estímulo para o uso de práticas sexuais seguras e distribuição
de preservativos; estímulo ao auto-cuidado e utilização de técnicas procurando o uso não
compartilhado de agulhas e seringas; substituição dos equipamentos na proporção “devolva
a usada e receba uma nova”; coleta, acondicionamento e descarte adequado dos resíduos de
materiais perfuro-cortante.
Trata-se de uma estratégia que não se preocupa unicamente em distribuir preservativos ou
trocar agulhas e seringas. Preocupa-se com o protagonismo dos usuários, sua organização e
a construção da própria identidade, trabalhando a auto-estima, sua legitimidade social,
percorrendo um longo caminho de reconstruir referências individuais e culturais.
Para finalizar, é importante recordar o impulso que tiveram nestes últimos anos as
associações de usuários de drogas, de redutores de danos e de profissionais que trabalham
com a temática, nos diferentes países.
A Relard (Rede latino-americana de Redução de Danos) é uma dessas organizações que
tem como missão: promover ações de RD associadas ao uso de drogas, tendo como
prioridade a prevenção do HIV/Aids; o marco da saúde pública, dos direitos humanos e a
cidadania. Esta Rede também objetiva expandir o PRD nos vários países para: a) prevenir o
uso indevido de drogas e as infecções por HIV e outras doenças de transmissão sexual e
sangüínea; b) reduzir ou estabilizar a transmissão de HIV e outras doenças de transmissão
sexual e sangüínea; c) incentivar o protagonismo do usuário e sua organização. Hoje fazem
parte da Relard, redes nacionais da Bolívia, Paraguai, Chile, Brasil, Argentina e América
Central e Caribe, mais recentemente.


3.4 O HIV/Aids e as populações privadas de liberdade

A prevalência e incidência de infectados e doentes de HIV/Aids no meio penitenciário é
significativa em todos os países do mundo. Neste meio, as práticas de risco mais
importantes são o compartilhamento de material para uso de drogas e as relações sexuais
sem proteção, tanto as mantidas dentro da instituição quanto as mantidas durante as visitas
íntimas.
Desde o início da epidemia era previsto que as populações privadas de liberdade se
tornariam preferencialmente vulneráveis pela freqüência das práticas de risco, bem como
pelas condições desfavoráveis do ambiente para adoção de práticas seguras. A previsão se
confirmou. Pouco tempo depois dos primeiros casos de HIV, já se registravam nos
presídios dos Estados Unidos, França, Espanha, Itália e outros países níveis de infecção que
alcançavam índices de 10 a 20%. No Brasil, apesar da impossibilidade ética e metodológica
(não se permite teste sem o consentimento da pessoa) de estabelecer índice de infecção
entre os detentos do país, alguns estudos indicaram índices de até 20% em algumas prisões
de grandes metrópoles. Segundo uma pesquisa da Universidade de São Paulo, os maiores
índices de infecção para o vírus se encontram nos presídios da região sudeste, área que
inclui São Paulo e sua enorme população de presos, onde o índice chegou a 30%.
Em geral os estudos mostram que a prevenção da transmissão do HIV entre as populações
privadas de liberdade é ainda um problema difícil que permanece sem solução efetiva. O
uso de drogas injetáveis e as práticas homossexuais são comportamentos de alta prevalência
entre os detentos de vários países. Do mesmo modo, crimes contra a propriedade,
estimulados pela necessidade de obter dinheiro para adquirir drogas, são responsáveis pela
prisão de um grande número de UDI. Isto faz que o número de UDI presos seja alto,
criando condições para transmissão do HIV e hepatites nas cadeias.
A rigor, na maioria dos países não se conhece o número exato de infectados no sistema
prisional. As informações disponíveis permitem, no entanto, fazer uma estimativa e afirmar
que são muito altos os índices de prevalência do HIV e que o fenômeno está vinculado à
origem socioeconômico, baixa escolaridade, ruptura com as estruturas familiares e
comunitárias, freqüência de comportamentos e práticas de risco como o uso de drogas e
múltiplas relações sexuais sem proteção.
A estes determinantes sociais podemos acrescentar as condições institucionais
desfavoráveis e, principalmente, a falta de serviços que dispensem assistência, prevenção e
promoção de saúde. No caso de existir algum programa de prevenção e assistência,
geralmente não tem continuidade e/ou não existem profissionais que os executem. É
importante enfatizar também a mobilidade que os reclusos têm entre as diferentes
instituições carcerárias, por mudança de regime, progressão de pena, transferências
constantes. Tornando mais aguda a situação da epidemia considerando que o sujeito se
vincula com diferentes pessoas de diferentes lugares.
É importante aclarar a escassez de trabalhos apresentados sobre este tema no Fórum 2003,
como a dificuldade de encontrar material estatístico e de pesquisa na América Latina e
Caribe. Ainda assim existem algumas recomendações de organismos internacionais que
definem como indispensáveis os seguintes princípios de atuação e controle da epidemia
entre esta população:
a) evidenciar a mobilidade da população reclusa, enfatizando a importância que ela tem,
inclusive para a disseminação da epidemia também entre a população em geral;
b) considerar as condições precárias de assistência à saúde dos reclusos infectados ou
doentes, facilitando a melhoria dos serviços;
c) incluir as famílias dos presos nas ações de prevenção;
d) garantir a distribuição de preservativos a todos os presos, rompendo com o conceito de
direito sexual restrito aos heterossexuais com parceiras fixas;
e) implantar PRD que trabalhem a prevenção e/ou o uso responsável de droga;
f) estimular os projetos de Ongs, garantindo que se desenvolvam em consonância com os
órgãos governamentais responsáveis;
g) capacitar técnicos e detentos buscando a prevenção às DST/HIV/Aids e a melhoria da
qualidade da assistência;
h) sensibilizar responsáveis pelo sistema penitenciário, juízes, promotores de justiça e
outras autoridades para as questões de saúde através de seminários e oficinas;
i) considerar os funcionários do sistema prisional como destinatários das campanhas de
prevenção;
j) estimular ações que aumentem as trocas entre o sistema penitenciário e outras instituições
e a comunidade;
l) incluir instituições que atendem adolescentes infratores ou abandonados em suas
prioridades


4. DESAFIOS DO FUTURO: SUPERAR A EXCLUSÃO E ACESSAR A SAÚDE COMO
DIREITO
O impacto desproporcional da epidemia nas populações mais excluídas e vulneráveis não
deve ser visto como algo “natural”, mas como algo que tem intima ligação com uma maior
vulnerabilidade desta população frente a este problema de saúde pública.
A redução da vulnerabilidade não acontecerá somente com mudanças na conduta
individual. Depende de modificações nas condições de exclusão social que afetam a
qualidade de vida destes grupos. Eles também devem ter o direito a aceder aos serviços de
prevenção e atenção à saúde no marco de um pleno exercício de seus direitos cidadãos.
Cremos que seja necessário insistir no fato de que Estados e sociedade em seu conjunto,
precisam encontrar formas de enfrentar a epidemia de HIV nas populações mais excluídas e
empobrecidas, de maneira a responder com eficiência e eficácia através de práticas efetivas
de saúde pública, garantindo os direitos humanos destas populações. É preciso reconhecer
que a pobreza é um dos fatores estruturais que aumentam a vulnerabilidade.
Em muitos países onde a epidemia atingiu desproporcionalmente a populações em situação
de maior exclusão e vulnerabilidade, observa-se uma relação clara entre o aumento da
epidemia e os maiores índices de pobreza, limitado acesso à informação e aos serviços de
saúde.
É indispensável que o combate eficaz à epidemia de respostas baseadas na ciência, na
política e na ética. Este é um grande desafio para todos os que trabalhamos com a epidemia
e que somos profissionais desta área: não fazer a ação depender apenas de soluções
técnicas. Não temos dúvidas de que o desenvolvimento de novas tecnologias para a
prevenção e o tratamento serão sempre prioritárias, mas uma resposta técnica não pode
estar separada das respostas políticas e éticas.
Sem realizar mudanças na estrutura da sociedade, nas relações de poder que submetem
certas populações a uma maior vulnerabilidade (ao mesmo tempo que protege outras) não
teremos sucesso no controle da epidemia.
Reconhecer a necessidade de uma mudança a longo prazo como única resposta efetiva não
significa, de nenhuma forma, que nada possa ser feito a curto prazo. Assim mesmo, as
políticas e intervenções que pretendam oferecer respostas a curto prazo, somente serão
efetivas quando planejadas e articuladas dentro de uma visão mais ampla de mudança
social.
Isto significa dizer que nem a ciência, nem a política são concebíveis fora ou
separadamente de uma visão ética mais ampla, enraizada numa filosofia moral capaz de dar
significado ao nosso trabalho e capaz de respeitar – e de superar- as particularidades e
diferenças que nos distinguem.
Desde uma perspectiva mais ampla, cabe reconhecer o direito à saúde como um direito
fundamental do ser humano e entender que não é possível promover a saúde sem as
mínimas condições de nutrição, moradia, educação e trabalho, como garantias. Trata-
se de reconhecer que a violação sistemática dos direitos fundamentais do ser humano tem
provocado quadros de desigualdades, de profundas assimetrias na dinâmica da epidemia e
no acesso a recursos preventivos e terapêuticos.
O grande desafio para o futuro é trabalharmos juntos para vencer a opressão, a
discriminação e a violência que se encontram em todo lugar atrás das estruturas aparentes
da epidemia. Desta forma, o enfrentamento da epidemia da Aids na América Latina e
Caribe tem que passar por transformações sociais profundas. Para tanto, governos e
sociedade civil precisam estabelecer planos de desenvolvimento social e econômico, onde
os setores mais vulneráveis sejam considerados prioritários. Este é um desafio inadiável
para o enfrentamento responsável da epidemia do HIV/Aids.
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Problematizando A Vulnerabilidade Social

  • 1. PROBLEMATIZANDO A VULNERABILIDADE SOCIAL1 Mirtha Sendic Sudbrack2 INTRODUÇÃO A epidemia de HIV/Aids na América Latina e Caribe inicia sua terceira década e as informações epidemiológicas revelam que ela continua crescendo e que as respostas para enfrentá-la precisam ser mais fortes e integradas. Mais de 1.800.000 adultos e crianças da América Latina e Caribe estão vivendo com HIV, atualmente. Na região, como se sabe, registram-se significativas diferenças seja no nível da epidemia, seja nas tendências das formas de transmissão do vírus, considerando-se os distintos países e mesmo as peculiaridades no interior de um mesmo país. Em 2002, 42 milhões de pessoas (40 milhões em 2001), dos quais 36,6 milhões de adultos (19,2 milhões de mulheres) e 3,2 milhões de crianças com menos de 15 anos em todo o mundo, estavam com Aids. Nesse mesmo ano, 5 milhões foram infectados pelo vírus, sendo 4,2 milhões de adultos (2 milhões de mulheres) e 800 mil crianças com menos de 15 anos. É de conhecimento de todos que, atualmente, mais de 90% da pandemia está concentrada nos países em desenvolvimento, enquanto a maior parte dos recursos destinados ao seu controle está concentrada nos países desenvolvidos. A pandemia da Aids é a maior responsável pelo número de mortes de pessoas adultas por doenças infecciosas no mundo. Causou quase 3 milhões de mortos em 2001 (ONUSIDA, 2002a). Também se sabe que mais de 90% das mortes e das novas infecções ocorrem nos países pobres, onde menos de 5% das pessoas que necessitam de tratamento anti-retroviral têm acesso à terapia, dos quais a metade estão no Brasil (OMS, 2002, p. 8). O percentual relativo ao acesso à terapia seria menos de 1% na África subsaariana, o continente mais afetado (ONUSIDA, 2002b). O Caribe, com uma prevalência de 2,2% da população adulta tem a segunda maior taxa de infecção por HIV, ficando abaixo somente da África. A maior prevalência está no Haiti, com mais de 6%, enquanto Cuba contém a epidemia com uma taxa de prevalência de 0,03% da população adulta (ONUSIDA, 2002a). Recordemos também que 75% da população mundial que ganha menos de 1 dólar por dia vive na área rural. O relatório da ONU, divulgado no dia 30 de junho de 2004, salienta a urgência de que os governos adotem políticas sérias para os trabalhadores rurais. Se isto 1 Este texto é um resumo do Capítulo “El abordaje de otras dimensiones de exclusión y vulnerabilidad : uso de drogas, pobreza, minoría étnica, migrantes y privados de libertad” publicado no livro: Situación del VIH/SIDA en América Latina y el Caribe, organizado por José Antonio Izazola Licea, Coordenador Executivo da Iniciativa Regional sobre Aids para América Latina e o Caribe ( SIDALAC) com o apoio de UNAIDS e GCTH. 2 Doutora em Psicologia Social, foi Coordenadora Adjunta do Programa Municipal de DST/HIV/Aids da cidade de Porto Alegre/RS, de 1998 a 2004, autora e coordenadora de vários projetos e pesquisas nas áreas de prevenção e assistência, com enfoques comunitários, interdisciplinares e intersetoriais. Teve uma participação importante no trabalho desenvolvido com usuários de drogas na cidade de Porto Alegre. Atualmente faz parte da equipe do Centro Internacional de Cooperação Técnica do Programa Nacional de DST/Aids, iniciativa do governo brasileiro junto com a UNAIDS.
  • 2. não acontecer nunca se superarão as seqüelas profundas que a pobreza está deixando nesta população. A precariedade daqueles que vivem no campo é assustadora, principalmente nas questões de saúde e educação. A Aids, por exemplo, já matou cerca de 7 milhões de trabalhadores rurais em 25 países africanos. Até 2020 a previsão é que outros 16 milhões de africanos que vivem no meio rural não sobrevivam à Aids. Também devemos lembrar que a infecção do HIV/Aids produz um impacto em todos os aspectos da vida humana. Irrompeu na década de 80 e trouxe consigo, não só um problema de saúde pública, mas também um complexo problema social que se instalou no mundo, sem distinguir fronteiras geográficas, políticas, culturais ou étnicas. E como aconteceu no decorrer da história com outras epidemias, o poder dominante demonizou o HIV/Aids, utilizando-se da epidemia como mais uma forma de dominação e controle social, através da discriminação e da intolerância em relação às pessoas afetadas. No entanto, grande parte das pessoas, principalmente aquelas diretamente afetadas, não se submeteram a este jogo. Pelo contrário, fazendo uma análise retrospectiva, houve um longo caminho de lutas por parte das pessoas que vivem com HIV, bem como do seu entorno social, alcançando significativas conquistas na área dos direitos humanos e da cidadania. Organizando-se em movimentos a partir dos diversos setores da sociedade civil, também conseguiram que os governos (em suas diferentes instâncias) se mobilizassem e se comprometessem, implantando medidas individuais e coletivas de redução de danos à saúde dos portadores e executando programas de prevenção. No entanto, transcorridos mais de 20 anos da aparição dos primeiros casos de Aids, a intolerância social, a discriminação e a estigmatização das pessoas afetadas pela epidemia estão cotidianamente presentes em grande número de comunidades da América Latina e Caribe, bem como no restante do mundo. Parafraseando Richard Parker e Peter Aggleton (2001), enquanto o mundo luta para dar respostas à epidemia do HIV/Aids, o estigma, a discriminação e a negação coletiva da mesma, vêm se tornando cada vez mais, os mais persistentes dilemas que precisam ser enfrentados com urgência pelas políticas públicas de saúde e educação. Sem dúvida, a Aids é hoje muito mais do que uma doença infecciosa. Trouxe consigo a possibilidade de retroalimentar ideologias classistas e classificadoras nas sociedades capitalistas e neoliberais, onde o normal e o patológico, o bem e o mal, fundamentam a separação entre os homens, para que uns poucos possam manter seus privilégios, justificando a dominação e a violência exercidas sobre a maioria. Análises sociológicas sobre a questão da discriminação (Parker & Aggleton, 2001, p. 10) afirmam que ela se concentra em padrões de dominação e opressão e que é expressão constante da busca de poder e privilégio. Para Arachu Castro (2003) o estigma da Aids teve, desde o início, uma conotação culpabilizante. Uma das características da discriminação associada à Aids é que desde o início associou-se o HIV aos modos de vida, ou seja a “atos voluntários”. Na América e na Europa, onde, nos anos oitenta, a epidemia se arraigou em grupos homossexuais e usuários de heroína, houve pouca solidariedade com as pessoas infectadas, porque elas eram culpabilizadas por terem optado por práticas, sexuais ou de drogadição, reprovadas pela sociedade e consideradas imorais. Por conseguinte, o estigma que já havia sobre estes grupos se ampliou (Altman, 1986) e se foi transferindo a outros grupos de pessoas vulneráveis, como é o caso, por exemplo, das mulheres pobres.
  • 3. A violência estrutural da sociedade capitalista não reconhece as diferenças que animam grupos e indivíduos. Impõe a todos a mesma normatividade, sem aceitar a existência de casos singulares que obrigam a reconhecer modos de vida e convivência distintos. A arrogância homogeneizante das classes dominantes, desconhece, como bem recorda Luis Carlos Restrepo (1994) o maior patrimônio da vida e da cultura que é, precisamente, o seu impressionante leque de diferenças. O tema que estamos tratando faz referência a grupos sociais da América Latina e Caribe que ainda possuem dificuldades de abordar os riscos de sua saúde, seja por falta de informação, habilidades, destrezas; seja por questões relacionadas com a própria vulnerabilidade social e cultural de que padecem; seja pelo forte estigma que historicamente lhes acompanha. São cidadãos que permanecem excluídos das políticas públicas, e mais especificamente dos programas de assistência e prevenção ao HIV/Aids, por pertencerem a grupos despossuídos e marginalizados socialmente, seja por sua situação de privação de liberdade, seja por pertencerem a grupos de minoria étnica ou por serem migrantes, seja por estarem expostos a situações de extrema pobreza ou por estarem completamente desarticulados socialmente devido ao uso/abuso legal ou ilegal de substâncias psicoativas. No entanto, é importante esclarecer que não pretendemos esgotar aqui esta temática, considerando que esta população pode ser examinada através de múltiplas perspectivas. Este artigo pretende aprofundar o enfoque da epidemia do HIV/Aids e sua associação com a exclusão e vulnerabilidade social desde o lugar das populações que fazem uso problemático de drogas, populações em situação de pobreza, minorias étnicas, migrantes e privados de liberdade, procurando sintetizar num só texto: a) os pontos mais importantes apresentados no Fórum 2003, celebrado na cidade de Havana, Cuba, entre os dias 07 e 12 de abril de 2003; b) uma revisão do estado atual do conhecimento sobre o tema; e, c) as lições aprendidas na América Latina e Caribe, citando também, em paralelo, as aprendidas em outras regiões geográficas. Deixamos claro que falar sobre dimensões de exclusão e vulnerabilidade nestas populações, significa abordar a epidemia desde a perspectiva de populações que se tornam cada vez mais fragilizadas frente à Aids, devido a políticas proibicionistas e discriminatórias e devido aos complexos processos de globalização e reestruturação econômica do mundo. 1. ALGUMAS PREMISSAS COMO PONTOS DE PARTIDA As idéias trabalhadas neste artigo partem das premissas explicitadas a seguir: a) a epidemia da Aids continua avançando; b) cresce numa dimensão plural, de “epidemias”, dado que as situações e contextos que afetam os diferentes povos e comunidades se entrelaçam singularmente para moldar a infecção do HIV/Aids de forma especifica, de acordo com o contexto e a sociedade ou nação que a abriga; c) a epidemia está viva, mas mudou seu espaço social, atingindo hoje, de forma mais intensa os setores marginalizados da sociedade, devido à pobreza, racismo, desigualdades de gênero, opressão sexual e exclusão social. Citando Richard Parker (2000, p. 101), “a epidemia do HIV/Aids se instala cada vez mais na polarização crescente entre os ricos e os que vivem em situação de extrema pobreza, na
  • 4. exclusão de setores inteiros da sociedade e na integração perversa de outros nas economias criminosas como são as do trafico internacional de drogas, de armas, de órgãos, etc. É neste contexto que a epidemia se alastra e cresce, em grande medida desapercebida, não porque seja impossível de vê-la, mas porque a sociedade não quer enxergá-la”. 2. ATENÇÃO ÀS RAÍZES DO PROBLEMA 2.1 A vulnerabilidade da pobreza, da marginalização, da iniqüidade e da exclusão social O fato de ser colocado na margem social gera vulnerabilidade. A exclusão e marginalização em que a sociedade joga os homens que fazem sexo com outros homens, os usuários de drogas, as mulheres, os jovens, os profissionais do sexo, os migrantes, as minorias étnicas, as pessoas privadas de liberdade, marcam o caminho em direção à doença e carência. Parafraseando José Toro-Alfonso (In: Caceres, C.F. et. al., 2002, p. 91), as pesquisas recentes demonstraram que, muito além da fragilidade individual, são as percepções de: isolamento social, ausência de apoio social e fragilidade ou inexistência de organização política e empoderamento social o que gera maior vulnerabilidade. “Se não há espaço público, o espaço privado se esvazia” (Corporación Chilena de Prevención del Sida, 1997, p. 42). O conceito de vulnerabilidade tem sua origem na área dos Direitos Humanos, designando originariamente: grupos ou indivíduos fragilizados, jurídica ou politicamente, na promoção, proteção ou garantia de seu direito à cidadania. Desde que existe a epidemia de Aids, diversas foram as construções explicativas elaboradas pela sociedade e a ciência na tentativa de compreendê-la. O conceito de “vulnerabilidade social” é uma das construções mais recentes. Segundo Mann & Tarantola (1996), são três, basicamente, os modelos explicativos construídos até o momento: a idéia de “grupos de risco” (entre 1981 e 1984), a idéia de “comportamento de risco” (entre 1985 e 1988) e a noção de “vulnerabilidade” (desde 1989 até hoje). A idéia de “grupos de risco” parte de um conceito epidemiológico que percebe a doença como restrita a grupos que, normalmente, apresentam atributos visíveis de identificação, como por exemplo, características corporais ou de comportamento. Os primeiros grupos identificados como “de risco” foram os denominados “os quatro H” para fazer referência aos homossexuais, hemofílicos, haitianos e usuários de heroína. Esta forma de identificar os “responsáveis” pela epidemia trouxe como conseqüência um estímulo à estigmatização, além de ser uma categoria completamente insuficiente para analisar a epidemia. De qualquer forma, a categorização em “comportamento de risco” também será insuficiente, embora acrescente a possibilidade de mostrar que a infecção atinge também indivíduos que estão “fora” dos grupos de risco tradicionais e introduz a idéia nova de que a Aids é uma doença democrática, que alcança todos os que adotem comportamentos de risco. Considerando a forma anterior de interpretar a epidemia, esta que considera os comportamentos traz alguns avanços. Entretanto, também apresenta limites, pois é respaldada por uma ótica individualista e culpabilizante (a “culpa” é da pessoa que teve um “comportamento de risco”) e desconsidera que alguns sujeitos podem ser mais vulneráveis que outros. Dizer que Aids é uma epidemia de “todos” é a mesma coisa que afirmar que todos estamos na mesma posição social diante dela.
  • 5. De qualquer modo, como expressa Parker (2002, p.102), dizer que a epidemia é de todos, que todos somos igualmente expostos à infecção é uma “ficção necessária”. “Necessária” porque rompe com a complacência generalizada de quem se considerava imune ao risco; “ficção” na medida em que nunca uma epidemia atinge todas as classes sociais da mesma forma. Sempre os setores sociais mais pobres são mais atingidos porque os aspectos socioculturais e político-econômicos que estruturam os contornos da epidemia em seus diversos cenários precisam ser considerados. Procurando romper com a concepção da epidemia enraizada em comportamentos individuais como é a concepção de “grupos e comportamentos de risco”, passou-se a uma análise da epidemia dentro de uma configuração social e coletiva, utilizando o conceito de “vulnerabilidade”. Sem negar que todo ser humano é suscetível de infecção por HIV ou que a transmissão aconteça mediante comportamentos de indivíduos específicos, o conceito de vulnerabilidade traz consigo um novo paradigma que deixa de individualizar a origem da epidemia e a coloca num cenário concreto, definido pelos diferentes fatores sociais que aumentam a fragilidade de alguns indivíduos e grupos. Começa-se a analisar o avanço da epidemia a partir de coordenadas histórico-sociais concretas como: desigualdade e injustiça, preconceito e discriminação, opressão, exploração e violência. O conceito de vulnerabilidade oferece, portanto, a possibilidade de redirecionar a forma de analisar a epidemia. Auxiliando-nos a perceber a atuação das forças históricas e estruturais junto aos aspectos subjetivos e individuais, nos alerta para a co-responsabilidade de todos estes aspectos, no momento de determinar o grau de vulnerabilidade ao HIV/Aids dos diferentes indivíduos e comunidades. O conceito de vulnerabilidade representa uma tentativa de analisar a epidemia, integrando fatores de ordem individual – relacionados à subjetividade e auto-estima de cada um -, social – ligados às raízes socioculturais e político-econômicas – e programática – relacionada com a infra-estrutura de saúde pública que contemple a promoção, a prevenção, a proteção e a assistência à saúde em cada situação. Compreender a vulnerabilidade de um indivíduo ou grupo social é fruto da articulação desses três grupos de fatores, em modelo tridimensional, onde, a cada momento, algum grupo pode pesar mais que os outros. Bastos & Szwarcwald (2001) utilizam os conceitos “bens materiais” e “bens simbólicos” de Pierre Bourdieu (1982) para tematizar a vulnerabilidade ao HIV. Ou seja, toda situação de saúde que se caracterize por desigualdades coletivas e que possam resultar em possibilidades diferenciadas quanto ao acesso aos bens e serviços, tanto materiais (alimentação, habitação, tratamento médico, etc.), quanto simbólicos (informação e poder de autodeterminação), geram situações de forte vulnerabilidade. Isto é, a vulnerabilidade se refere aos diferentes graus de fragilidade dos indivíduos e grupos frente à infecção por HIV/Aids, segundo a particularidade vivida e de acordo com o conjunto integrado de aspectos sociais, programáticos e individuais que os coloca em menor ou maior risco frente ao problema. A epidemia de HIV/Aids exige, de forma urgente, que se recupere as populações mais vulneráveis da situação de exclusão, a fim de que elas mesmas tomem conta de sua saúde e de suas vidas. As bases da vulnerabilidade da infecção por HIV estão cimentadas sobre a exclusão e o estigma. Recordemos que a exclusão social é entendida como impedimento ao pleno exercício da cidadania. Por cidadania compreendemos o conjunto de direitos e deveres relativos às condições materiais, físicas, psíquicas, políticas e sociais que definem a autonomia do indivíduo em um contexto de vida em sociedade.
  • 6. A política pública precisa ter a inclusão social como elemento principal, em que os direitos sociais estejam garantidos em sua plenitude, sendo expressão de uma integralidade dos direitos políticos, garantia dos direitos sociais universais e eqüitativos. Isto significa que a situação de exclusão social tem intima relação com o binômio eqüidade/injustiça social. A eqüidade social deve ser um princípio das políticas públicas, que definem funções distributivas, as quais têm o objetivo de superar desigualdades existentes e consideradas socialmente injustas. A eqüidade social tem uma orientação ética social que não admite diferenças de oportunidades que resultem em diferentes condições sociais de vida. Exige um olhar não igualitário na aplicação dos recursos para a saúde pública e demais políticas sociais. A eqüidade se expressa em duas dimensões: uma horizontal (dar respostas iguais a necessidades equivalentes) e outra vertical (dar respostas diferentes para necessidades diferenciadas). A relação entre vulnerabilidade ao HIV e injustiça social foi estudada de forma bastante ampla pela literatura internacional. Ainda assim, é importante destacar que em virtude da singularidade dos diversos contextos sociopolitico e culturais nos quais o tema foi estudado, torna-se difícil chegar a conclusões gerais. Tratam-se de estudos de observação, com bases bastante diversificadas quanto aos marcos conceituais utilizados pelos diversos autores. De qualquer forma, chegaram a importantes constatações, algumas das quais analisaremos a seguir. É comum que os locais onde se aglomeram as populações mais pobres sejam áreas que conjugam inumeráveis fatores adversos para a saúde de seus habitantes. Quase sempre não oferecem oportunidades de trabalho, boas condições de habitação, de atendimento educacional, de saúde. Ou seja, estão segregadas em um espaço geográfico, pessoas pobres ou em situação de miséria que, por suas próprias circunstâncias de vida, têm um conjunto de comportamentos que as fazem vulneráveis ao HIV. São episódios freqüentes na vida destas pessoas o consumo de álcool e outras drogas, altos níveis de violência e alta prevalência de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST). Rodrick Wallace et. al. (1997), demonstraram em diversos estudos, o caráter sinergético destes problemas sociais. Situação que foi definida por Singer (1994) como sindemia. Ou seja, o conjunto de fatores atuam de forma uníssona e se entrelaçam de forma tão complexa que e impossível medir a intensidade que cada um intervém. Isto significa que nos segmentos mais pobres interagem, de forma sinérgica problemas de diversas ordens, ocasionando diferentes efeitos adversos. É o que hoje se chama de “sinergia de pragas” ou “a Aids como sindemia”. Os efeitos negativos de uma gama de diferentes problemas sociais interagem sinergicamente para criar uma vulnerabilidade acrescida para o HIV/Aids (Wallace, 1988). De forma semelhante Merril Singer, em seu trabalho sobre a crise da saúde enfrentada pela população pobre das áreas urbanas nos Estados Unidos, fala do HIV/Aids como uma espécie de sindemia que interage negativamente com os demais problemas de saúde, produzindo níveis mais altos de vulnerabilidade. Portanto, segundo a bibliografia examinada, a pobreza combinada com vários fatores sociais e culturais aumenta a vulnerabilidade para o HIV. Nos estudos de Friedman et. al. e nos de Szwarcwald et. al. temos a descrição de como se dá esta sinergia, por exemplo, entre os usuários de drogas injetáveis (UDI) pertencentes às camadas mais pobres da sociedade norte-americana, os quais se envolvem na prática do sexo comercial, ou se envolvem no tráfico de drogas para financiar seu consumo. A estas situações se somam os efeitos adversos das políticas de controle das drogas, os processos sociais estigmatizantes e a precariedade da inclusão destas pessoas no mercado formal de
  • 7. trabalho. Isto faz, sem dúvida, que esta população seja muito mais vulnerável diante da epidemia e, conseqüentemente, haja uma difusão seletiva do HIV nos extratos sociais mais pobres. Poucos autores analisaram o tema da vulnerabilidade social e a conseqüente pauperização da epidemia do ponto de vista macroeconômico e macropolítico. O pioneiro foi, sem dúvida, Jonathan Mann tanto no antigo Programa Global de Aids (1987), quanto nos últimos anos em seu trabalho na Universidade de Harvard (1996). Também os trabalhos de Paul Farmer (1996, 1997) se enquadram nesta perspectiva. Este autor incorpora uma dimensão de ecologia social aos modernos estudos sobre a ecologia das doenças infecciosas e, segundo ele, as formas seletivas como os agentes patológicos interferem num organismo não se devem somente aos atributos da biologia evolucionista e da ecologia dos agentes infecciosos, mas também ao impacto da injustiça social e da violência estrutural (nesta expressão se inclui qualquer violação dos direitos humanos). Assim, as variáveis scioeconômicas determinam alterações na ecologia das doenças infecto-contagiosas. As camadas menos assistidas e mais pobres da população tornam-se mais vulneráveis aos agentes patológicos, por razões biológicas (pior imunidade) e por razões sociais (impossibilidade de ver suas demandas atendidas, residir em lugares com infra-estrutura precária, etc.), que se manifestam de forma simultânea. Taeil et al. (1995) fazem referência que estes segmentos sociais também se deparam com barreiras estruturais que os impedem de modificar comportamentos que minimizariam os riscos de infecção. Os pobres não tem, por exemplo, recursos para a prevenção (preservativos, agulhas e seringas esterilizadas). Por outro lado, têm acesso dificultado para os serviços de saúde. Possuem também fortes barreiras culturais – baixo nível de escolaridade, pouco domínio da língua escrita – que lhes dificultam o acesso a informações atualizadas. Todos os aspectos até agora apresentados nos fazem retomar o conceito criado por Farmer & Castro (2001, 2002) de “violência estrutural”, os quais trabalharam oferecendo serviços médicos e sociais na zona rural do Haiti, país mais pobre da América, um dos mais pobres do mundo e o país americano mais afetado pela pandemia. As situações precárias em que vivem milhões de seres humanos favorecem a transmissão do HIV e impedem que as pessoas que vivem com HIV conheçam seu estado sorológico. Este processo está intimamente relacionado com a situação dos países pobres que vivem no círculo vicioso de estarem endividados e necessitarem cada dia contrair novas dívidas, antes de poder oferecer saúde com qualidade à sua população. “A violência estrutural está intrinsecamente relacionada com as doenças infecciosas. Ou melhor, forças sociais como a pobreza, se incorporam no organismo e fazem as pessoas mais vulneráveis serem presas da doença” (Castro, 2003). As doenças infecciosas estão cada vez mais concentradas entre os pobres, entre os oprimidos pela violência estrutural, cujos direitos sociais e econômicos são sistematicamente violados. Na África Subsaariana, onde a epidemia é de grande magnitude e os recursos para as ações básicas de saúde são escassos, ocorre um processo real de pauperização da epidemia. Mais casos de infecção são registrados entre os mais pobres dos países pobres, que também apresentam quadros clínicos mais graves e óbitos mais rápidos. Esta situação é dramaticamente ilustrada pelas epidemias recentes em diversas regiões da Índia e nos antigos enclaves étnicos da África do Sul. Lurie et al. (1995) levantaram uma idéia polêmica para explicar este assunto. Os autores identificaram os “ajustes estruturais” como fatores fundamentais da disseminação da
  • 8. epidemia. Tratam-se dos ajustes impostos pelos organismos internacionais que financiam os programas nacionais de controle das DST e Aids dos países em desenvolvimento. Em geral são restrições para os gastos públicos em saúde, nem sempre compatíveis com as demandas locais. Desta forma, estes “ajustes estruturais” contribuem sinergicamente com os demais fatores na violência estrutural. Feitas estas colocações, parece-nos ainda importante abordar os resultados de outros trabalhos acadêmicos que analisam a transformação da economia internacional na tentativa de entender a evolução global da epidemia e as causas da violência estrutural. As últimas décadas do século XX foram marcadas por complexos processos de globalização e reestruturação econômica que trouxeram, como conseqüência, transformações nas sociedades, comunidades e famílias. Parker e Camargo (2000) afirmam que a conseqüência central deste conjunto de transformações econômicas é a extensão com que as elites se conectam ao redor do mundo, ao mesmo tempo que se criam novas formas de exclusão, de desigualdades sociais, de diferenças salariais mais acentuadas, além de pobreza e miséria em todas as sociedades: as do Norte e as do Sul. Como afirma Castells, surge um “quarto mundo” onde as divisões entre Norte e Sul, Primeiro e Terceiro Mundo, são demolidas e segmentos populacionais (inclusive continentes inteiros, como é o caso da África) começam a se tornar irrelevantes para o sistema, em termos de produção e consumo. Esta fase recente da globalização se caracteriza por um profundo acento no processo de diferenciação social. Cresce a polarização entre pobres e ricos. Os ricos se tornam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. A classe média está gradualmente desaparecendo. Ao mesmo tempo a diferenciação social nas relações de produção se caracteriza pela crescente individualização do trabalho (decadência dos sindicatos e crescimento da economia informal), super-exploração do trabalho (crescimento do trabalho infantil), exclusão de grupos do mercado de trabalho (jovens do sexo masculino, por exemplo), integração perversa destes mesmos grupos na economia criminal (Castells, 1998). Estas tendências aparecem em escala planetária, independente se o país é desenvolvido ou está em vias de desenvolvimento e estão associadas à crescente feminização da pobreza e miséria. As mulheres são cada vez mais excluídas, não só pela opressão de classe e etnia, mas também pelo gênero. Esta situação também é reforçada pela transformação do Estado, que se tornou “mínimo”, provocando redução dos programas de saúde, educação e assistência social. Estas transformações atingiram desproporcionalmente a vida das mulheres, por exemplo, apesar dos avanços conquistados pelo movimento feminista na área dos direitos civis e políticos. Esta nova ordem mundial trouxe grandes desafios para a humanidade, entre os quais, a Aids, para a qual a saúde pública ainda não deu uma resposta contundente, mesmo tendo mobilizado um montante considerável de recursos. Os novos mecanismos econômicos ignoram a existência de contingentes imensos de seres humanos que se tornam literalmente supérfluos, desnecessários, obsoletos, descartáveis. Trata-se de grupos incompatíveis com o capitalismo, que são colocados à margem do processo de desenvolvimento de seus países. Ou seja, há uma mudança no processo de vulnerabilidade social. Pessoas são consideradas descartáveis para a sociedade porque nunca chegam a se tornar úteis para a nova ordem econômica vigente. É o que alguns autores denominam “exclusão dos irrelevantes”. O Estado deixa de ser o protetor desses grupos e se propaga um discurso de que a pobreza é natural.
  • 9. Temos assim, uma violência estrutural do sistema que usa mecanismos simbólicos para reproduzir situações que continuam assegurando a hegemonia de uma Ordem Mundial. Esta violência gera pobreza, desigualdade, opressão, faz reaparecer doenças do passado e dissemina epidemia entre os mais pobres. O fato de a epidemia da Aids ter aparecido justamente neste contexto de mudanças macroeconômicas pode ser apenas um acidente histórico. No entanto, a relação entre a evolução da epidemia e as conseqüências das mudanças econômicas não podem ser mera coincidência. Os impactos negativos da globalização geram, como afirma Castells (1998) uma “integração perversa”: a produção de marginalidade e criminalidade como parte integrante da nova ordem capitalista mundial. Ou seja, a marginalidade e a criminalidade não são novos desvios ou acidentes, são ingredientes estruturais da produção de suscetibilidade crescente frente à infecção. São fatores determinantes na vulnerabilidade. 2.2 Estigma, discriminação e Aids Feitas estas considerações, é importante ressaltar que a epidemia da Aids, teve, desde sua aparição até nossos dias, uma marca forte e persistente de estigma e discriminação. Em 1987, Jonathan Mann, então Diretor Fundador do Programa Global de Aids, da OMS, dirigiu-se à Assembléia Geral da ONU, sublinhando esta problemática que favoreceu a disseminação da pandemia de forma explosiva. Em 1995, o Programa Global foi substituído pelo Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/Aids (Unaids) que reúne seis órgãos diferentes das Nações Unidas. No ano 2000, Peter Piot, Diretor Executivo da Unaids, na 10° reunião do Grupo de Coordenação de Programas deste órgão, insiste no desafio permanente para a comunidade mundial: “o esforço renovado para combater o estigma”. E enfatizou: “o combate efetivo ao estigma removera o que ainda é um bloco de pedra” no desenvolvimento e enfrentamento da pandemia (Piot, 2000). Vários anos nos separam das declarações de Mann e Piot. Muitos recursos foram mobilizados para o controle da epidemia. Ainda assim, o estigma permanece no centro da luta contra a pandemia global da Aids. É o que permite alguns autores afirmar que a complexidade do HIV se torna menor se comparada com a complicada situação da produção e reprodução do estigma e discriminação como processos sociais em relação ao HIV/Aids. Mann (1987) distingue três momentos diferentes da epidemia da Aids em qualquer comunidade. Momentos que ele identifica como três epidemias diferentes. Um primeiro momento – epidemia de HIV – em que a epidemia entra em todas as comunidades de forma silenciosa e sem ser notada; um segundo momento – epidemia de Aids – quando ela realmente é percebida; e um terceiro momento, chamado também de “terceira epidemia” – epidemia do estigma, discriminação e negação coletiva – que se torna o momento mais explosivo e extremamente atual. As discussões sobre o estigma, particularmente em relação ao HIV/Aids, tem seu ponto de partida no estudo de Erving Goffman (1988). Baseado na experiência de pesquisa com doentes mentais, com deficiências físicas ou que tinham comportamentos percebidos como socialmente desviantes (caso do homossexualismo ou comportamento criminal) Goffman observou que o indivíduo estigmatizado era visto como uma pessoa que possui uma “diferença indesejável”, o que o leva a uma “identidade deteriorada” (a pessoa é colocada
  • 10. naquele lugar e ela mesma se vê ali). O estigma esta baseado na ideologia do “desvio” e é aplicado pela sociedade através de regras e sanções. O estigma, como atributo negativo, é aplicado sobre as pessoas que não se ajustam às regras e sanções. O estigmatizado, em virtude de sua diferença, se auto-identifica como algo negativo para a sociedade. No entanto, segundo Goffman, o estigma não é algo estático, mas um processo social em constante mutação. Conhecer de modo preciso esta problemática é importante para pensar intervenções que desconstruam os modelos estigmatizantes construídos pela sociedade. Para Parker & Aggleton (2001) estigmatização e discriminação são construções sociais que somente podem ser entendidas em relação às noções mais amplas de poder e dominação. Estes autores defendem que o estigma tem um papel central na produção e reprodução das relações de poder e de controle social. Conseqüentemente, alguns grupos são desvalorizados e outros sentem-se superiores. Fala-se, em síntese, de desigualdade social. Assim, para compreender as questões relacionadas à estigmatização e discriminação em relação ao HIV/Aids ou qualquer outra situação, é necessário pensar de forma ampla sobre o porque de alguns indivíduos se tornarem socialmente excluídos. Analisaremos a seguir a situação de algumas populações especificas, cada vez mais vulneráveis diante da epidemia da Aids. Encontram-se nesta situação por causa da estigmatização e discriminação sociais e/ou por causa da situação de pobreza e miserabilidade provocada pelas políticas macroeconômicas marginalizantes. 3. VULNERABILIDADE DE POPULAÇÕES ESPECÍFICAS: ESTADO ATUAL DO CONHECIMENTO Continuando, faremos uma análise do estado atual das pesquisas em relação a algumas populações especificas, envolvidas na epidemia, como: minorias étnicas, migrantes, usuários de drogas, e privados de liberdade. Nas páginas anteriores aprofundamos a relação entre a vulnerabilidade para o HIV e a situação de pobreza, subdesenvolvimento, injustiça e marginalização social. Aqui não será diferente. Quando nos aproximamos de estudos dirigidos às populações específicas, vemos que eles documentam influências de fatores estruturais na transmissão do HIV e que a epidemia se concentra em áreas geográficas com certas singularidades e em populações identificadas como mais vulneráveis (Ayres, 1994; Sweat & Denison, 1995; Taiwill et al., 1995; Turshen, 1995; Aggleeton, 1996; Carael et al., 1997; Singer, 1998; entre outros). Parker e Camargo, na publicação “Sida y Pobreza” (2000) fizeram uma ampla revisão bibliográfica dos estudos disponíveis na África, Ásia, América do Norte e América Latina. Mostraram que, apesar de características especificas de cada epidemia local, a transmissão do HIV/Aids está se concentrando em determinadas populações e regiões, nas quais a pobreza é o marco fundamental. 3.1 –Populações móveis, migrantes e populações de fronteiras O próprio processo de subdesenvolvimento cria, com freqüência, por razões políticas e econômicas, formas de mobilidade das populações: migração, trabalho sazonal, convulsão social em conseqüência de guerra ou de instabilidade política. Esta mobilidade produz, por sua vez, práticas sociais que aumentam o risco de infecção por HIV.
  • 11. Joseph Decosas (1996), relata um dos muitos exemplos que atestam o aumento da incidência de HIV/Aids nas populações migrantes, como conseqüência do desenvolvimento econômico. Nesse estudo se descreve a construção da Usina Hidrelétrica de Akosombo, em Gana (África) nos anos 60/70. Tal construção trouxe uma certa desintegração das estruturas socioeconômicas tradicionais (de base agrícola na região) e uma acentuada contribuição para o aumento da epidemia no povo Krobo, habitante da região. Durante a construção da represa, os homens se transferiram para as margens do Rio Volta para trabalhar no canteiro de obras, enquanto as mulheres passaram a prover trocas econômico-sexuais. Em seguida, quando as águas invadiram as terras onde se formou o Lago Volta, destruiu-se a base agrícola do povo Krobo e um número considerável de mulheres (e depois suas filhas) dedicou-se ao trabalho sexual. A construção da Usina trouxe, portanto, o desenvolvimento econômico para a região, aumentando a produção de energia. Por outro lado, contribuiu para a disseminação da epidemia, pela mudança de comportamento que produziu na população local. Paul Farmer (1992) documentou, de forma semelhante, como a mobilidade da população do Haiti, também por iniciativas de desenvolvimento econômico, provocou o aumento da infecção por HIV. De fato, a própria situação de pobreza dos povos, faz que seja necessária a mobilidade, ainda que temporária, para a busca de emprego e melhores condições de vida. Um número significativo de estudos associou pobreza à migração e mobilidade, sugerindo que estas possuem maior vulnerabilidade para o HIV por inserir-se e expor-se a diferentes situações numa variedade de contextos e lugares, como é o caso: dos trabalhadores sazonais no sul da África (Romero-Daza & Himmelgreen, 1998) e na África Ocidental (Decosas et al., 1995), os migrantes da República Dominicana nos Estados Unidos (Kreniske, 1997), os migrantes das áreas rurais para áreas urbanas no Haiti (Farmer, 1992; 1999), os filipinos trabalhando temporariamente no exterior (Tan, 1993), as profissionais do sexo na Tailândia (Archavanitkul & Guest, 1994), assim como os trabalhadores do sexo e outros HSH no Brasil (Larvie, 1997; Parker, 1993; 1997). Segundo Mario Brofman (2003) a mobilidade populacional deve ser analisada em três eixos: a magnitude do problema, as causas da migração e os tipos de população móvel. Em referência à magnitude do problema, o autor destaca alguns dados muito significativos que nos dão a idéia da amplitude da problemática em relação ao aumento da vulnerabilidade destas populações. Considerando as cifras apresentadas pela Unaids em 1998, 100 milhões de pessoas se movimentam no interior e entre as nações a cada ano (OIM, 1998), gerando aumento da vulnerabilidade para os que se movimentam e para seus anfitriões, em conseqüência dos hábitos sociais e relacionais transitórios, variáveis e mais flutuantes que se estabelecem. Podemos recordar aqui a idéia da “sinergia de pragas”, de Wallace, que destaca a confluência de vários fatores sociais ou problemas sociais para aumentar os riscos de exposição à infecção por HIV/Aids. Outros números apresentados por Brofman também são assustadores, se olhados do ponto de vista da saúde pública e da incapacidade desta para oferecer atenção e assistência às pessoas que transitam de um lado para outro, sem referência domiciliar fixa, com dificuldades para falar a língua do país, que naquele momento, legal ou ilegalmente, o abriga. Cento e cinqüenta milhões de pessoas vivem, legal ou ilegalmente, fora de seus países (OIM 2002), dois milhões de centro-americanos emigraram de seu país em 2002 (Cepal, 2002) e, aproximadamente, trezentos milhões cruzam, anualmente, a fronteira entre o México e Estados Unidos (Conapo, 2000).
  • 12. As causas da mobilidade e os tipos de população móveis são duas categorias inseparáveis, razão pela qual as analisamos conjuntamente. Existem populações cuja mobilidade tem duração prolongada com o objetivo de exercer atividades laborais. Existe também mobilidade sazonal de trabalhadores agrícolas, geralmente, com fluxos rural-rural. Outra população móvel é a categoria que realiza atividades de transporte, como por exemplo, os caminhoneiros. No Brasil, o Programa Nacional de DST/Aids está financiando vários estudos em portos secos, portos marítimos, fronteiras, onde os caminhoneiros permanecem para carregar ou descarregar sua mercadoria. Paulatinamente, estes estudos estão demonstrando a ampliação da vulnerabilidade desta população para a infecção por HIV. Também pertencem ao grupo das populações móveis, as populações fronteiriças, já que os movimentos cotidianos destes grupos (idas e voltas), bem como a transitoriedade de pessoas que realizam trabalhos em núcleos fronteiriços, como empregadas domésticas e profissionais do sexo, podem ter sua vulnerabilidade aumentada. Em geral, as fronteiras internacionais são áreas onde há grande mobilidade de população, onde se concentram facilmente as economias ilegais, o tráfico de drogas, altos índices de prostituição, inclusive infantil, tráfico de mulheres e onde, freqüentemente, há limites no acesso aos serviços de saúde. O Brasil, por exemplo, que possui fronteiras com quase todos os países da América do Sul, enfrenta um problema sério de disseminação do HIV nestes cenários geográficos (Galvan, 2002). Atualmente está se criando um grande movimento nacional para a formulação de políticas públicas em aliança com os países limítrofes, com o objetivo de proteger tais populações. Alguns países vendo-se em situação parecida com a do Brasil, dedicam-se a criar leis e políticas para restringir a liberdade de movimento de pessoas que vivem com HIV/Aids. Estas políticas foram, supostamente, criadas para proteger as fronteiras internacionais, o que representa, muitas vezes, uma profunda incongruência com as políticas locais mais liberais, que pretendem impedir a discriminação das pessoas afetadas e uma violação dos Direitos Humanos explícitos na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão (Malcolm et al., 1998). Por último não podemos deixar de considerar o fluxo de migrantes de passagem, usualmente não autorizados ou sem documentação que, por estarem em situação ilegal, têm menos facilidade de receber os benefícios dos serviços de saúde pública. Para terminar, queremos destacar que existem determinantes de vulnerabilidade para as populações móveis e que os nexos causais subjacentes à conexão entre mobilidade e HIV são muito complexos. Poucas redes de apoio, escasso acesso a programas de prevenção, falta de acesso a serviços médicos, contato sexual e relacional com diferentes grupos são determinantes de vulnerabilidade presente na vida destas populações. 3.2 Minorias étnicas e vulnerabilidade frente ao HIV/Aids Lembremos que Castells (1998) quando fala na globalização do “capitalismo de informação” afirma que a polarização das desigualdades sociais acontece não só nos países em desenvolvimento, mas também nos chamados desenvolvidos. Segundo o Plano Estratégico de Prevenção do HIV até 2005, do CDC (Centro para o Controle e Prevenção de Doenças – EUA), em 1999 nos Estados Unidos foram registrados
  • 13. mais afro-estadunidenses que qualquer outro grupo racial/étnico: 63% de todas as mulheres e 42% de todos os homens. As crianças afro-estadunidenses representaram quase dois terços dos casos pediátricos. Estima-se que entre as mulheres, 64% dos novos casos de infecção por HIV são de afro- estadunidenses. Por outro lado, também em 1999, os hispânicos representavam 13% da população dos Estados Unidos, mas constituíam 19% dos casos de Aids registrados neste ano. Estimativas indicam que as mulheres hispânicas representaram 18% dos novos casos de 1999, enquanto os homens hispânicos atingiram 20% dos novos casos de HIV. A produção acadêmica que tematiza raça/etnia e Aids, indica que tanto nas áreas internas das grandes cidades dos países desenvolvidos ou em desenvolvimento, quanto na África subdesenvolvida, percebe-se a concentração da pobreza em certas comunidades com identidade étnica/racial. Associado à pobreza, surgiu nestas comunidades, um conjunto de problemas como a difusão da epidemia da Aids. No final da década de 80, autores como Rodrick Wallace, Mindy Fullilove, Robert Fullilove e Peter Gould trataram de estudar a ligação de uma série de problemas sociais que afetavam as comunidades onde viviam minorias étnicas nas áreas internas das grandes cidades dos EUA. Eles focalizaram particularmente o impacto que teve na qualidade de vida destas populações a redução de um conjunto de serviços essenciais e documentaram os modos pelos quais as alterações na provisão destes serviços levaram a estas comunidades a níveis crescentes de “desertificação urbana” (transformação de uma região em deserto). A desertificação urbana se caracteriza, por exemplo, por casas incendiadas ou demolidas para dar lugar a construções futuras de vias expressas, o que faz com que os habitantes vizinhos a elas e que têm condições financeiras abandonem aquelas regiões, dando livre passagem aos despossuídos, criando efetivamente uma “terra de ninguém” na qual os aspectos regulares da ordem social (policiamento efetivo, escolas, centro de saúde, etc.) funcionam precariamente ou não existem e onde os níveis extremamente elevados de mortalidade por violência, tráfico de drogas, mortalidade infantil e infecção por HIV foram documentados. Situações semelhantes aparecem em outras cidades da América Latina. Mariela Rossi et al. (2003), da Fundação Habitar (Argentina) apresentou no Fórum 2003 a experiência sobre a “Villa 15” – Ciudad Oculta”, pertencente ao complexo Lugano Soldati, situado na Zona Sul de Buenos Aires. Trata-se de uma região de pobreza urbana, de alto risco sanitário e social, cuja taxa de mortalidade por Aids chega a 17,7% do total das mortes de Buenos Aires, onde 41,7% da população de 15 a 19 anos não tem instrução e 75,4% com ensino médio incompleto (1998). Deduz-se que os casos de Aids informados se correlacionam fortemente com os grupos étnicos juvenis de 19 a 30 anos. Observam-se também altas taxas de desemprego e subemprego, ausência de espaços de inclusão social, ruptura de laços e alta incidência de mortes violentas na faixa etária juvenil (20 mortos menores de 20 anos no ano 2000, na Villa 15), cifra que se mantém na atualidade. A “Ciudad Oculta” surgiu na década de 40 e 50 com o processo de industrialização dos centros urbanos, atraindo populações rurais pobres do norte argentino onde predominavam indígenas ou seus descendentes. Naquela época, o alcance das políticas estatais beneficiavam o crescimento econômico e social destes setores, mas a partir dos anos 70 começa a desindustrialização progressiva e violenta do país e, conseqüentemente, a
  • 14. deterioração dos níveis de vida, até chegar à pauperização degradante das condições de subsistência. É um exemplo do que Wallace et al. falam em relação à “sinergia de pragas”. Em outro trabalho apresentado no Fórum de 2003, Ivo Brito (2003) nos mostra a situação atual dos povos indígenas no Brasil, onde vivem 370 mil indígenas distribuídos da seguinte forma: 55% na Região Norte, 17% no Centro-oeste; 18% no Nordeste, 2% no Sudeste e 8% no Sul. Eles possuem 587 territórios reconhecidos oficialmente, 215 sociedades e culturas diferenciadas e 180 línguas. Nas áreas urbanas vivem 50 mil índios. O primeiro caso de Aids nesta população foi notificado em 1988. Atualmente há 54 casos notificados. Segundo este trabalho a epidemia cresce e se expande entre os índios residentes nas áreas urbanas que, no entanto, mantém contatos freqüentes com as aldeias. A maior vulnerabilidade se dá entre a população jovem, representando cerca de 68% dos casos no grupo etário de 14 a 34 anos, sendo 65,3% entre os homens e 79,2% entre as mulheres. A maior vulnerabilidade entre as mulheres jovens está associada a vários fatores, tais como: iniciação sexual precoce, arranjos sexuais diferenciados de um grupo étnico para outro, contatos inter-étnicos e baixa escolaridade. Por isso a relação da infecção entre os sexos é 1/1. Já vimos anteriormente as conseqüências da migração de pessoas de uma região para outra e as repercussões nas estruturas sociais. Entre os indígenas brasileiros os grandes projetos de desenvolvimento aumentam os contatos e conflitos inter-étnicos, provocando o surgimento de doenças emergentes que trazem uma espécie de desordem cultural e a inter- relação de fatores patogênicos com a ruptura de diferentes entre local e o global. Neste povos, a compreensão de cultura, como uma teia de significados, não se da pela via da ciência experimental, mas pela interpretação e compreensão dos significados. Por essa razão o processo doença/saúde é vivido e construído socialmente. Cada grupo indígena tem suas formas diferentes de interpretar esse binômio e suas manifestações. Nas sociedades indígenas, a compreensão de que o vírus é causador da Aids é insuficiente, pois, para eles, o processo saúde/doença é resultado da deterioração das relações entre o corpo, as pessoas e a sociedade. Falar que os fluidos são veículos de transmissão também é insuficiente para explicar a transmissão sexual do HIV, pois para eles, os fluidos estão intimamente ligados à identidade individual e às relações sociais. A própria sexualidade não está relacionada a comportamento, mas a um conjunto de regras e arranjos socioculturais, aos ritos de passagem e aos mitos. Brito propõe a adoção de algumas estratégias de prevenção que deveriam passar pela legitimação das formas culturais de os povos indígenas enfrentarem a doença, suas causas e as formas de cura. Sugere também que os profissionais de saúde que atuam nestas áreas aprofundem a antropologia e a cultura dos povos indígenas para compreender melhor os contextos socioculturais. Simultaneamente é preciso capacitar agentes de saúde autóctones, que permitam a comunicação entre os saberes. Finalmente, Brito sugere: identificar sistemas de interação com a sociedade não indígena, compreender as formas e arranjos sexuais dos diferentes grupos e analisar as vulnerabilidades, medir o impacto inter-étnico dos grandes projetos de desenvolvimento. 3.3 Usuários de Drogas, Redução de Danos e Vulnerabilidade Social Os usuários de drogas, especialmente os de drogas injetáveis, são considerados um dos grupos mais expostos à infecção por HIV. O costume de compartilhar instrumentos para
  • 15. injeção constitui um dos meios mais eficientes de transmissão do HIV e outras patologias de transmissão sangüínea. Se nos determos em dados provenientes de alguns países da América Latina e outras regiões do mundo, percebemos que se trata de uma população fortemente atingida pela epidemia. No Brasil, 25% dos casos de Aids estão direta ou indiretamente relacionados com o uso de drogas injetáveis. Por outro lado, 38,2% das mulheres com Aids,contraíram o vírus compartilhando seringas com o parceiro UDI (Usuário de Drogas Injetáveis) e 36% dos casos pediátricos de Aids apontam a mãe ou o companheiro como UDI. Segundo a pesquisa “Ajude o Brasil I” (Ufmg/CN DST/Aids – 1998, realizado em cinco projetos de Redução de Danos), o uso de drogas é realizado em lugares isolados, com péssimas condições higiênicas. A maioria dos usuários são homens, dos quais 82% são desempregados e 70% estiveram presos em algum momento de sua vida. 85% dos UDI relataram uso grupal da droga e o costume de compartilhar seringas variou de 56 a 85%. Segundo a mesma pesquisa o grupo etário predominante é o de 18 a 30 anos. Segundo o Boletim Epidemiológico (2002), na Argentina, no final de março de 2001, havia, aproximadamente, 130.000 pessoas vivendo com HIV/Aids. Dos quase 20.000 casos adultos notificados, 42% do total e 46% dos homens tinham como antecedente o ser UDI. Na cidade de Buenos Aires, os UDI são o grupo mais atingido pela epidemia (Goltzman, 2003). Também o Uruguai apresentou cifras alarmantes de infecção entre UDI nos últimos anos. Além da própria infecção, tem contribuído com a infecção no/a parceiro/a sexual, bem como na transmissão vertical. Atualmente, 25% dos casos de HIV notificados são UDI. Destes, 45% são jovens de 15 a 24 anos. Nos Estados Unidos, os UDI, suas parceiras e seus filhos constituem 36% dos casos de Aids notificados até 1999 e 31% dos casos informados para este ano. A maioria dos casos associados com UDI são homens: 52% heterossexuais e 13% de HSH. As mulheres UDI constituem 21% dos casos. 13% dos casos de mulheres associadas a UDI são parceiras heterossexuais em que também o homem é UDI. A transmissão vertical destas mulheres representa 1%. O consumo de drogas constitui o único habito/comportamento relacionado ao risco de infecção pelo HIV, que além de ser estigmatizado, é também considerado crime. Na maioria dos países da América Latina e Caribe não se provê a distribuição gratuita de materiais descartáveis e se criminaliza o uso de drogas. Por isso, a maioria das pessoas que consomem drogas ilícitas, precisam fazê-lo às escondidas, em lugares improvisados, onde as condições de higiene são precárias, aumentando a vulnerabilidade. Em geral os UDI mais expostos aos danos são os pertencentes às camadas menos favorecidas da sociedade. Nas epidemias americana e brasileira, desde o princípio, percebeu-se que os UDI em maior vulnerabilidade pertenciam aos estratos econômicos mais baixos, contribuindo para a pauperização da epidemia como um todo, na medida em que um grande número de soropositivos foi sendo registrado entre os UDI e parceiros/as sexuais (Friedman et al., 1987). Por serem homens jovens, sexualmente ativos, pouco afeitos ao uso dos preservativos, os UDI norte-americanos e brasileiros desempenham um papel relevante na disseminação do HIV para suas companheiras e filhos. Quando as companheiras também são usuárias de drogas, Friedman et al. demonstram que elas fazem uso compartilhado de agulhas e seringas com seus companheiros.
  • 16. Pesquisas indicam que onde há maior repressão, os aspectos adversos do uso de drogas tendem a ser mais intensos. O fato de criminalizar a posse de drogas para o consumo pessoal, dificulta o contato do usuário de drogas com o serviços de saúde, em razão da possibilidade de detenção. Esta população permanece privada, não só da ação terapêutica que necessita em relação ao consumo, mas também da atenção que necessitaria por outras doenças transmitidas por via sangüínea, como hepatites, Aids, endocardia, etc. e a possibilidade de receber informações sobre o modo de evitá-las. Em países como Argentina e Brasil, trava-se uma luta, a partir de certos setores da sociedade civil organizada, de profissionais da saúde e afins, para pressionar o Estado a adotar um política respeitosa frente aos direitos humanos, discriminalizando os Usuários de Drogas. Livres de perseguições penais, poderão aceder mais facilmente aos serviços de saúde. Já se constatou cientificamente que os países que adotaram Programas de Redução de Danos para UDI como estratégia de saúde pública, diminuíram os índices de contaminação por esta via (Des Jarlais & Friedman, 1988). A Redução de Danos (RD) é uma estratégia de prevenção ao HIV que reconhece que o abster-se do uso de drogas é melhor, resultado que nem sempre se pode alcançar de imediato com todos os UDI. Por isso, a RD tem como objetivo reduzir os danos que a droga possa provocar em usuários que não desejam deixar de usá-la. Os PRD partem do principio de que a epidemia da Aids representa um risco maior que a droga para a saúde dos indivíduos, para a sociedade e a saúde pública. Do ponto de vista da prevenção, é preciso informar que o uso compartilhado de agulhas e seringas é mais perigoso que a relação sexual sem preservativo. Por isso, a RD serve para diminuir os efeitos nocivos e os riscos relacionados a atividades ou comportamentos, orientando os UDI a não compartilhar agulhas e seringas, para proteger-se de muitas doenças. O uso compartilhado de agulhas e seringas entre UDI pode representar o risco de transmissão de mais de 20 doenças entre as quais está a Aids, as hepatites B e C, sífilis, cardiopatias, tromboses, infecções pulmonares e muitas outras. O Ministério da Saúde do Brasil apóia a implantação de PRD associados ao uso de drogas injetáveis em vários estados e municípios brasileiros (existem cerca de 300 programas em todo o Brasil). A Argentina implantou também alguns programas através de Ongs da cidade de Buenos Aires (como Intercambios, ver Goltzman, P. et al., 2003) e do interior do país como Rosario (Inchaurraga, S. & Hurtado, G., 2003). Atualmente através do governo da cidade de Buenos Aires está-se iniciando um projeto em parceria com algumas organizações que atuam na capital, para estender programas em alguns bairros marginais e outras regiões da cidade. O Uruguai também desenvolve algumas intervenções neste sentido, através de Ongs, como: IDES (Instituto de Investigação e Desenvolvimento Social, ver Scalatta, 2003) e Grupo de Cavia (delta@chasque.apc.org). Esta ação de RD orientada para os UDI e seu entorno social, que em grande parte dos estados do Brasil estabeleceu-se como política pública e que se implanta, ainda que de modo frágil, em outros países da América Latina e Caribe, tem como primeiro eixo a entrega de preservativos para adoção de sexo seguro e a entrega de seringas e outros utensílios para o consumo injetável. Mas não é só isso. Entre as medidas especificas desenvolvidas pelos PRD incluem-se: sensibilização dos usuários em relação aos danos causados pela droga, aconselhamento individual e grupal sobre o uso/abuso de drogas; estímulo para a testagem anti-HIV, estímulo para a criação de vínculos entre os UDI e os
  • 17. serviços de saúde; identificação da rede de usuários, seus hábitos, lugares relacionados ao uso para realizar prevenção; estímulo para o uso de práticas sexuais seguras e distribuição de preservativos; estímulo ao auto-cuidado e utilização de técnicas procurando o uso não compartilhado de agulhas e seringas; substituição dos equipamentos na proporção “devolva a usada e receba uma nova”; coleta, acondicionamento e descarte adequado dos resíduos de materiais perfuro-cortante. Trata-se de uma estratégia que não se preocupa unicamente em distribuir preservativos ou trocar agulhas e seringas. Preocupa-se com o protagonismo dos usuários, sua organização e a construção da própria identidade, trabalhando a auto-estima, sua legitimidade social, percorrendo um longo caminho de reconstruir referências individuais e culturais. Para finalizar, é importante recordar o impulso que tiveram nestes últimos anos as associações de usuários de drogas, de redutores de danos e de profissionais que trabalham com a temática, nos diferentes países. A Relard (Rede latino-americana de Redução de Danos) é uma dessas organizações que tem como missão: promover ações de RD associadas ao uso de drogas, tendo como prioridade a prevenção do HIV/Aids; o marco da saúde pública, dos direitos humanos e a cidadania. Esta Rede também objetiva expandir o PRD nos vários países para: a) prevenir o uso indevido de drogas e as infecções por HIV e outras doenças de transmissão sexual e sangüínea; b) reduzir ou estabilizar a transmissão de HIV e outras doenças de transmissão sexual e sangüínea; c) incentivar o protagonismo do usuário e sua organização. Hoje fazem parte da Relard, redes nacionais da Bolívia, Paraguai, Chile, Brasil, Argentina e América Central e Caribe, mais recentemente. 3.4 O HIV/Aids e as populações privadas de liberdade A prevalência e incidência de infectados e doentes de HIV/Aids no meio penitenciário é significativa em todos os países do mundo. Neste meio, as práticas de risco mais importantes são o compartilhamento de material para uso de drogas e as relações sexuais sem proteção, tanto as mantidas dentro da instituição quanto as mantidas durante as visitas íntimas. Desde o início da epidemia era previsto que as populações privadas de liberdade se tornariam preferencialmente vulneráveis pela freqüência das práticas de risco, bem como pelas condições desfavoráveis do ambiente para adoção de práticas seguras. A previsão se confirmou. Pouco tempo depois dos primeiros casos de HIV, já se registravam nos presídios dos Estados Unidos, França, Espanha, Itália e outros países níveis de infecção que alcançavam índices de 10 a 20%. No Brasil, apesar da impossibilidade ética e metodológica (não se permite teste sem o consentimento da pessoa) de estabelecer índice de infecção entre os detentos do país, alguns estudos indicaram índices de até 20% em algumas prisões de grandes metrópoles. Segundo uma pesquisa da Universidade de São Paulo, os maiores índices de infecção para o vírus se encontram nos presídios da região sudeste, área que inclui São Paulo e sua enorme população de presos, onde o índice chegou a 30%. Em geral os estudos mostram que a prevenção da transmissão do HIV entre as populações privadas de liberdade é ainda um problema difícil que permanece sem solução efetiva. O uso de drogas injetáveis e as práticas homossexuais são comportamentos de alta prevalência entre os detentos de vários países. Do mesmo modo, crimes contra a propriedade, estimulados pela necessidade de obter dinheiro para adquirir drogas, são responsáveis pela
  • 18. prisão de um grande número de UDI. Isto faz que o número de UDI presos seja alto, criando condições para transmissão do HIV e hepatites nas cadeias. A rigor, na maioria dos países não se conhece o número exato de infectados no sistema prisional. As informações disponíveis permitem, no entanto, fazer uma estimativa e afirmar que são muito altos os índices de prevalência do HIV e que o fenômeno está vinculado à origem socioeconômico, baixa escolaridade, ruptura com as estruturas familiares e comunitárias, freqüência de comportamentos e práticas de risco como o uso de drogas e múltiplas relações sexuais sem proteção. A estes determinantes sociais podemos acrescentar as condições institucionais desfavoráveis e, principalmente, a falta de serviços que dispensem assistência, prevenção e promoção de saúde. No caso de existir algum programa de prevenção e assistência, geralmente não tem continuidade e/ou não existem profissionais que os executem. É importante enfatizar também a mobilidade que os reclusos têm entre as diferentes instituições carcerárias, por mudança de regime, progressão de pena, transferências constantes. Tornando mais aguda a situação da epidemia considerando que o sujeito se vincula com diferentes pessoas de diferentes lugares. É importante aclarar a escassez de trabalhos apresentados sobre este tema no Fórum 2003, como a dificuldade de encontrar material estatístico e de pesquisa na América Latina e Caribe. Ainda assim existem algumas recomendações de organismos internacionais que definem como indispensáveis os seguintes princípios de atuação e controle da epidemia entre esta população: a) evidenciar a mobilidade da população reclusa, enfatizando a importância que ela tem, inclusive para a disseminação da epidemia também entre a população em geral; b) considerar as condições precárias de assistência à saúde dos reclusos infectados ou doentes, facilitando a melhoria dos serviços; c) incluir as famílias dos presos nas ações de prevenção; d) garantir a distribuição de preservativos a todos os presos, rompendo com o conceito de direito sexual restrito aos heterossexuais com parceiras fixas; e) implantar PRD que trabalhem a prevenção e/ou o uso responsável de droga; f) estimular os projetos de Ongs, garantindo que se desenvolvam em consonância com os órgãos governamentais responsáveis; g) capacitar técnicos e detentos buscando a prevenção às DST/HIV/Aids e a melhoria da qualidade da assistência; h) sensibilizar responsáveis pelo sistema penitenciário, juízes, promotores de justiça e outras autoridades para as questões de saúde através de seminários e oficinas; i) considerar os funcionários do sistema prisional como destinatários das campanhas de prevenção; j) estimular ações que aumentem as trocas entre o sistema penitenciário e outras instituições e a comunidade; l) incluir instituições que atendem adolescentes infratores ou abandonados em suas prioridades 4. DESAFIOS DO FUTURO: SUPERAR A EXCLUSÃO E ACESSAR A SAÚDE COMO DIREITO
  • 19. O impacto desproporcional da epidemia nas populações mais excluídas e vulneráveis não deve ser visto como algo “natural”, mas como algo que tem intima ligação com uma maior vulnerabilidade desta população frente a este problema de saúde pública. A redução da vulnerabilidade não acontecerá somente com mudanças na conduta individual. Depende de modificações nas condições de exclusão social que afetam a qualidade de vida destes grupos. Eles também devem ter o direito a aceder aos serviços de prevenção e atenção à saúde no marco de um pleno exercício de seus direitos cidadãos. Cremos que seja necessário insistir no fato de que Estados e sociedade em seu conjunto, precisam encontrar formas de enfrentar a epidemia de HIV nas populações mais excluídas e empobrecidas, de maneira a responder com eficiência e eficácia através de práticas efetivas de saúde pública, garantindo os direitos humanos destas populações. É preciso reconhecer que a pobreza é um dos fatores estruturais que aumentam a vulnerabilidade. Em muitos países onde a epidemia atingiu desproporcionalmente a populações em situação de maior exclusão e vulnerabilidade, observa-se uma relação clara entre o aumento da epidemia e os maiores índices de pobreza, limitado acesso à informação e aos serviços de saúde. É indispensável que o combate eficaz à epidemia de respostas baseadas na ciência, na política e na ética. Este é um grande desafio para todos os que trabalhamos com a epidemia e que somos profissionais desta área: não fazer a ação depender apenas de soluções técnicas. Não temos dúvidas de que o desenvolvimento de novas tecnologias para a prevenção e o tratamento serão sempre prioritárias, mas uma resposta técnica não pode estar separada das respostas políticas e éticas. Sem realizar mudanças na estrutura da sociedade, nas relações de poder que submetem certas populações a uma maior vulnerabilidade (ao mesmo tempo que protege outras) não teremos sucesso no controle da epidemia. Reconhecer a necessidade de uma mudança a longo prazo como única resposta efetiva não significa, de nenhuma forma, que nada possa ser feito a curto prazo. Assim mesmo, as políticas e intervenções que pretendam oferecer respostas a curto prazo, somente serão efetivas quando planejadas e articuladas dentro de uma visão mais ampla de mudança social. Isto significa dizer que nem a ciência, nem a política são concebíveis fora ou separadamente de uma visão ética mais ampla, enraizada numa filosofia moral capaz de dar significado ao nosso trabalho e capaz de respeitar – e de superar- as particularidades e diferenças que nos distinguem. Desde uma perspectiva mais ampla, cabe reconhecer o direito à saúde como um direito fundamental do ser humano e entender que não é possível promover a saúde sem as mínimas condições de nutrição, moradia, educação e trabalho, como garantias. Trata- se de reconhecer que a violação sistemática dos direitos fundamentais do ser humano tem provocado quadros de desigualdades, de profundas assimetrias na dinâmica da epidemia e no acesso a recursos preventivos e terapêuticos. O grande desafio para o futuro é trabalharmos juntos para vencer a opressão, a discriminação e a violência que se encontram em todo lugar atrás das estruturas aparentes da epidemia. Desta forma, o enfrentamento da epidemia da Aids na América Latina e Caribe tem que passar por transformações sociais profundas. Para tanto, governos e sociedade civil precisam estabelecer planos de desenvolvimento social e econômico, onde os setores mais vulneráveis sejam considerados prioritários. Este é um desafio inadiável para o enfrentamento responsável da epidemia do HIV/Aids.
  • 20. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTMAN, D.,1986. AIDS in the mind of America. In: Doubleday, Garden City, New York. ANARFI, J., 1993. Sexuality, migration and AIDS in Ghana: A socio-behavioral study. In: Health Transition Review, 3 (Sup.):45-67. ARCHAVANITKUL, K. & GUEST, P., 1994. Migration and the commercial sex sector in Thailand. Health Transition Review, 4 (Sup.):273-295. AYRES, J. R. C. M., 1996. O jovem que buscamos e o encontro que queremos ter: A vulnerabilidade como eixo de avaliação de ações preventivas de abuso de drogas, DST e AIDS entre crianças e adolescentes. In: Papel de Educação na Ação Preventiva ao Abuso de Drogas e às DST/AIDS (D. A. Tozzi, N. L. Santos, C. M. Amarao, E. Almeida, E. J. Silva & M. L. Pereira, eds.), pp. 15-24, São Paulo: Fundação para o Desenvolvimento da Educação. AYRES, J. R. C. M.; FRANÇA Jr., I.; CALAZANS, G. J. & SALETTI FILHO, H. C., 1999. Vulnerabilidade e prevenção em tempos de AIDS. In: Sexualidades pelo Avesso: Direitos, Identidades e Poder (R. M. Barbosa & R. Parker, eds.), pp. 49-72, São Paulo: Editora 34/Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. BASTOS, F. I., 1996. Ruína & Reconstrução: AIDS e Drogas Injetáveis na Cena Contemporânea. Rio de Janeiro: Editora Relume-Dumará/ABIA/IMS-UERJ. BASTOS, F. I. & SZWARCWALD, C. L., 2002. AIDS e Pauperização: principais conceitos e evidências empíricas. In: Cadernos de Saúde Pública v.16 supl.1, Rio de Janeiro. BOURDIEU, P. & PASSERON, J-C., 1982.A Reprodução.Elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro:Francisco Alves. BRONFMAN, M., 2003. Enfrentando las raíces de la epidemia em grupos específicos: el caso de las poblaciones móviles. Conferencia presentada en el Foro 2003, La Habana, Cuba. BRONFMAN, M., LEYVA-FLORES, R., NEGRONI, M., 1999. Proyecto Poblacionales Moviles y VIH/Sida en Mesoamerica. Instituto Nacional de Salud Pública, México. Trabajo presentado en el Foro 2003, La Habana , Cuba. CACERES, C. F.;TORO-ALFONSO, J., 2002. Sida y sexo entre hombres en América Latina, Cáceres et al.Editores. CASTELLS, M., 1999. A Era da Informação. In: A Sociedade em Rede. Rio de Janeiro: Paz e Terra. CASTELLS, M., 1998. The Information Age, III: End of Millenium. Oxford: Blackwell. CASTRO, A.; FARMER, P., 2003. El sida y la violencia estructural: La culpabilización de la víctima. In: Cuadernos de Antropología Social, en prensa. 1. CASTRO, A.; 2003. Determinantes sócio-políticos de la infección por el VIH: violência estructural y culpabilización de la victima. Conferencia presentada em el Foro 2003, La Habana, Cuba. CHIRIBOGA, C. R., 1997. Introducción. Mujer y SIDA: Conceptos sobre el tema. In: Situación de las Mujeres y el VIH/SIDA en América Latina (B. Rico, S. Vandale, B. Allen & A. L. Liguori, eds.), p. 22, Cuernavaca: Instituto Nacional de Salud Pública.
  • 21. CONNELL, R.W., 1987.Gender and power. Cambridge, MA: Polity. CORPORACIÓN CHILENA DE PREVENCIÓN DE LUCHA CONTRA EL SIDA, 1997. De amores y sombras: poblaciones y culturas homo y bisexuales en hombres de Santiago. Santiago, Chile: Autor. DANIEL, H. & PARKER, R., 1991. AIDS: A Terceira Epidemia. São Paulo: Iglu. DECOSAS, J., 1996. HIV and development. In: AIDS, 10 (Sup. 3):S69-S74. DES JARLAIS, D. C.; FRIEDMAN, S.; CHOOPANYA, K.; VANICHSENI, S. & WARD, T. P., 1992. International epidemiology of HIV and AIDS among injecting drug users. In: AIDS, 6:1.053-1.068. FARMER, P., 1992. AIDS and Accusation: Haiti and the Geography of Blame. Berkeley: University of California Press. FARMER, P., 1999. Infections and Inequalities. Berkeley: University of California Press. FARMER, P., 1995. Culture, poverty and the dynamics of HIV transmission in rural Haiti. In: Culture and Sexual Risk: Anthropological Perspectives on AIDS (H. Brummelhuis & G. Herdt, eds.), pp. 3-28, New York: Gordon & Breach. FONSECA, M. G. P. & CASTILHO, E. A., 1997. Os casos de AIDS entre usuários de drogas injetáveis. Brasil, 1980-1997. In: Boletim Epidemiológico - AIDS, X:6-14. FRIEDMAN, S. R.; SOTHERAN, J. L.; ABDUL-QUADER, A.; PRIMM, B. J.; DES JARLAIS, D. C.; KLEINMAN, P.; MAUGE, C.; GOLDSMITH, D. S.; EL-SADR, W. & MASLANSKY, R., 1987. The AIDS epidemic among blacks and Hispanics. In: Milbank Quarterly, 65 (Sup. 2):455-499. FRIEDMAN, S. R.; JOSE, B.; DEREN, S.; DES JARLAIS, D. C. & NEAIGUS, A., 1995. Risk factors for human immunodeficiency virus seroconversion among out-of-treatment drug injectors in high and low seroprevalence cities. The National AIDS Research Consortium. In: American Journal of Epidemiology, 142:864-874. FRIEDMAN, S. R.; FURST, R. T.; JOSE, B.; CURTIS, R.; NEAIGUS, A.; DES JARLAIS, D. C.; GOLDSTEIN, M. F. & ILDEFONSO, G., 1998. Drug scene roles and HIV risk. In: Addiction, 93:1403-1416. FREIRE, P., 1970. Pedagogia del oprimido. In: Siglo XXI, Madrid. GALVAN, L. (Org.), 2002. Diagnóstico estratégico da situação da epidemia da Aids e das doenças sexualmente transmissíveis em Municípios Fronteiriços no Brasil (apostila). Population Council/USAID/Ministério da Saúde, Brasília GOFFMAN, E., 1961. Asylums: Essays on the social situation of menthal patients and other inmates. Anchor Books, Garden City, New York. GOFFMAN, E., 1963. Stigma: Notes on the management of spoiled identity. Anchor Books, Garden City, New York. GOLTZMAN, P. et al., 2003. Reducción de Daños y Prevención del VIH entre población joven de barrios pobres de la Provincia de Buenos Aires, Argentina. Intecambios Asociación Civil. Trabajo presentado en el Foro 2003, La Habana, Cuba. GRANGEIRO, A., 1994. O perfil sócio-econômico da AIDS no Brasil. In: A AIDS no Brasil (R. Parker, C. Bastos, J. Galvão & S. Pedrosa, ed.), pp. 91-128, Rio de Janeiro: ABIA/UERJ/Editora Relume-Dumará. GRUND, J. P.; STERN, L. S.; KAPLAN, C. D.; ADRIAANS, N. F. & DRUCKER, E., 1992. Drug use contexts and HIV-consequences: The effect of drug policy on patterns of everyday drug use in Rotterdam and the Bronx. In: British Journal of Addiction, 87:381-392.
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