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Ano 2 (2013), nº 12, 14473-14500 / http://www.idb-fdul.com/ ISSN: 2182-7567
POLUIÇÃO MARINHA POR PLÁSTICOS E O
DIREITO INTERNACIONAL DO AMBIENTE
Tiago Vinicius Zanella*
Resumo: A poluição marinha por plásticos é uma realidade que
se impõe à sociedade internacional, causando graves danos de
caráter ambiental, econômico e até mesmo social. Assim, o
objetivo deste artigo é analisar a real dimensão do problema
apresentado, quais suas consequências para o meio marinho e
como o direito internacional do ambiente regula a questão. Para
isso, primeiramente, precisamos entender como surgiu e qual a
atual situação do problema. Também analisaremos qual o papel
do direito no combate e prevenção da poluição por plásticos
entendendo a evolução tanto do problema em si como do pró-
prio direito internacional do ambiente; qual o papel da soft law
perante o tema; e como o sistema internacional regulamenta a
poluição marinha por plásticos.
Palavras-chave: Plástico, poluição, direito ambiental internaci-
onal.
1. INTRODUÇÃO AO PROBLEMA
desenvolvimento industrial é absolutamente um
valor social e cultural contemporâneo e a tecno-
logia é o instrumento imprescindível para a reali-
zação deste objetivo em todo o planeta. Com a
revolução industrial, a ação humana sobre o meio
intensificou-se. O meio ambiente tornou-se, sob o ponto de
vista utilitarista, mais ampla e profundamente aproveitado e
*
Doutorando em Ciências jurídico-internacionais e europeias pela Faculdade de
Direito da Universidade de Lisboa.
14474 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
explorado. Todavia, algumas inovações tecnológicas causam
profundas transformações nas relações sociais e trouxeram de
maneira indesejada e inesperada, certos impactos nocivos à
sociedade e ao meio ambiente. Uma consequência natural e já
muito conhecida é a poluição ambiental advinda do desenvol-
vimento industrial, em especial a grande quantidade de resí-
duos que acaba desperdiçada. Neste viés, nos últimos 40 anos
houve uma mudança drástica na natureza destes resíduos, sen-
do introduzida no meio ambiente uma quantidade cada vez
maior de materiais sintéticos como o plástico1
.
Em um momento que muito se discute sobre a utilização
de produtos plásticos (como as sacolas), pouco se conhece da
consequência poluidora destes polímeros sintéticos nos ocea-
nos, que formam enormes ilhas, verdadeiros aterros gigantes-
cos de lixo. Existem poucos estudos científicos sérios sobre
este problema de forma global, sobretudo no âmbito do direito
internacional do ambiente. Em especial na doutrina brasileira
quase nada se produziu e discutiu acerca do tema, não obstante
sua importância e graves consequências de âmbito internacio-
nal. Como destaca Kara Lavender (e outros), “no oceano aber-
to, a abundância, distribuição e variabilidade temporal e espa-
cial de detritos de plástico são pouco conhecidas, apesar de
uma crescente conscientização do problema”2
. Todavia, princi-
palmente na doutrina estrangeira, a questão vem ganhando ca-
da vez mais atenção e importância. Alguns artigos e bibliogra-
fia de relevo já foram produzidos acerca do tema, a despeito da
sua atualidade.
Presentemente, as fontes terrestres de poluição marinha
são consideradas uma das quatro maiores ameaças aos oceanos
1
KNIGHT, Geof. Plastic Pollution. Heinemann/Raintree, EUA; 2012.
2
LAVENDER, Kara; MORET-FERGUSON, Skye ; MAXIMENKO, Nikolai A.;
PROSKUROWSKI, Giora; PEACOCK, Emily E., HAFNER, Jan; REDDY, Chris-
topher M. Plastic Accumulation in the North Atlantic Subtropical Gyre. Revista
Science; setembro de 2010. P. 1. Tradução do autor.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14475
do mundo3
, sendo causadoras de graves problemas sócio ambi-
entais. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA), já em 1997 cerca de 6,4 milhões de tone-
ladas de lixo eram introduzidos nos oceanos anualmente. Ain-
da, segundo o PNUMA, atualmente há uma estimativa de que
existam 13.000 fragmentos de material plástico por quilômetro
quadrado em todos os oceanos. Este total representa cerca de
70% de todos os detritos alijados no mar4
.
Sendo assim, precisamos entender que as grandes corren-
tes de superfícies dos oceanos são formadas sobretudo pelo
chamado Efeito Coriolis. Esta é uma força que, sem maiores
digressões acerca de seu conceito físico exato5
, tem grande
influência nos oceanos formando grandes giros na superfície
dos mares. No hemisfério norte, estes giros possuem uma rota-
ção em sentido horário, enquanto no hemisfério sul, o sentido é
anti-horário. Ou seja, as correntes marítimas são influenciadas
por esta força Coriolis que forma enormes vértices na superfí-
cie dos oceanos6
.
Ocorre que toda poluição terrestre que é despejada nos
mares, ou é dissolvida ou acaba caindo nas correntes marítimas
e são transportadas pelos oceanos. Com a formação destes
enormes giros oceânicos, todo material plástico, que não é dis-
solvido, vai sendo acumulado em seu interior. Isto é, forma-se
uma zona de convergência, como “uma rodovia de entulho”,
que transporta o lixo plástico até o interior destes giros. É uma
3
As outras três grandes ameaças são: exploração excessiva dos recursos biológicos
do mar; alteração/destruição física do habitat marinho; e a dispersão de espécies
marinhas exóticas. Segundo a Organização Marítima Internacional (IMO). Os dados
estão disponíveis em: http://www.imo.org/Pages/home.aspx . Acesso em 16 de
janeiro de 2012.
4
Dados disponíveis em:
http://www.unep.org/regionalseas/marinelitter/about/distribution/default.asp . Aces-
so em 16 de janeiro de 2012.
5
Para um aprofundamento sobre o conceito do Efeito Coriolis e suas implicações
físicas e hidrodinâmicas ver STOMMEL, Henry M.; MOORE, Dennis W. An intro-
duction to the Coriolis force. Columbia University Press, EUA; 1989.
6
STOMMEL, Henry M.; MOORE, Dennis W. Op. Cit.
14476 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
questão física, na qual os detritos são transportados pelas cor-
rentes e despejados em seu interior. Pode levar vários anos para
que os resíduos alcancem esta área, dependendo de sua origem.
O plástico pode ser trazido desde o interior dos continentes
através de esgotos, regatos e rios, ou pode simplesmente vir da
costa. De qualquer maneira, pode ser uma viagem de seis ou
sete anos antes de rodar na mancha de lixo. Como afirma Joep
Koene, “deste modo, os materiais plásticos ficam a flutuar em
torno destes giros por anos até acabarem no centro do que
chamamos de “sopa de plástico”7
.
A primeira vez que se teve a real dimensão do problema
foi em 1997. Quando o americano Charles Moore e sua tripula-
ção, após participarem de uma regata, voltavam de catamarã do
Havaí para o sul da Califórnia. O capitão decidiu alterar o cur-
so e experimentar uma nova rota, um pouco mais ao norte, pas-
sando pela borda do chamado Giro Subtropical do Pacífico
Norte, uma grande área do oceano que, apesar das águas cal-
mas, normalmente era evitada pelos marinheiros. Nesta região,
Moore encontrou praticamente todo objeto possível de ser feito
com plástico8
:
“Na região oriental do Giro ele [Charles Moore] en-
controu uma quantidade substancial de lixo, principalmente
plástico, espalhados por toda a área. Hoje comumente chama-
do de Grande Mancha de Lixo do Pacífico, a enorme sopa de
plástico (que se estende da superfície à coluna d’água) con-
tém de tudo, desde redes de pesca abandonadas (redes fan-
tasmas), garrafas de plástico, tampas de garrafas, escovas de
dente, containers, caixas, além de minúsculas partículas de
plástico que foram reduzidas pela ação das ondas ou pela luz
solar (fotodegradação)”9
.
7
KOENE, Joep. (coord) Plastic Soup: Mapping the first steps towards solutions.
Wageningen University Press. Países Baixos; 2010. P. 10. Tradução do autor.
8
Após esta viagem Charles Moore criou a Fundação de Pesquisa Marinha Algalita
(AMRF, na sigla em inglês) a fim de estudar e promover a analise e a discussão
acerca da poluição por plástico, sobretudo na Grande Mancha de Lixo do Pacífico.
9
Depoimento do Capitão Charles Moore. Disponível em
http://www.algalita.org/about-us/index.html#History . Acesso em 16 de janeiro de
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14477
Com uma área estimada em mais de 1,3 milhão de qui-
lômetros quadrados de superfície e com cerca de 10 metros de
profundidade10
, o lixão do Pacífico cobre uma extensão maior
que o estado do Pará. E também não é o único, pois existem
mais cinco grandes giros oceânicos semelhantes no mundo:
Atlântico Norte e Sul, Pacífico Norte e Sul, e no Índico. Toda-
via, grande parte desta sujeira não é facilmente visível. Isso
porque, embora a maioria dos plásticos não seja biodegradável,
a ação do Sol e da água faz boa parte deles se fragmentarem
relativamente rápido, sumindo da vista humana. A própria
Grande Mancha do Pacífico, com uma estimativa de 150 mi-
lhões de toneladas de plásticos, é na sua maioria uma grande
sopa de água e fragmentos plásticos11
.
Segundo dados do PNUMA, estima-se que cerca de 80%
de todo lixo plástico marinho seja proveniente de fontes terres-
tres e os 20% restantes venha de fontes no próprio oceano, co-
mo dos navios. Isto é, a maior parte de todo o material plástico
que se encontra atualmente nos cinco grandes giros são origi-
nários do lixo terrestre12
. Deste modo, podemos classificas as
fontes em quatro grandes grupos:
a) Turismo no litoral: detritos deixados pelos banhistas
no litoral como embalagens de alimentos, bebidas, brinquedos,
entre outros.
b) Esgotos que deságuam no mar: incluem os esgotos,
águas de bueiros e até mesmo de rio e da chuva. Estas águas
carregam todo tipo de lixo plástico. Esta é a principal fonte de
todo plástico depositado nos oceanos.
c) Exploração dos recursos, em especial a pesca: incluem
2012. Tradução do autor.
10
ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul.
Plastic Debris in the World’s Oceans. PNUMA; 2011.
11
ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul.
Op. Cit.
12
Dados disponíveis em:
http://www.unep.org/regionalseas/marinelitter/about/distribution/default.asp . Aces-
so em 16 de janeiro de 2012.
14478 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
linhas e redes de pesca, iscas, boias, entre tantos outros materi-
ais de plásticos que são perdidos ou dolosamente jogados no
mar.
d) Navios: muito material plástico é alijado aos oceanos
pelas embarcações, sobretudo as mercantes. Para depositar seu
lixo nos portos que atracam, estes navios devem pagar uma
taxa ao Estado costeiro. Desta forma, a fim de evitar o paga-
mento destas taxas, muitas embarcações acabam deliberada-
mente atirando seu lixo nos mares13
.
As consequências ambientais do problema são notórias.
Como afirma Kara Lavender (e outros):
“Os plásticos são um importante contaminante dos
oceanos no mundo. Sua biodegradação química lenta permite
que estes polímeros sintéticos permaneçam no ambiente ma-
rinho por décadas ou mais. Os impactos ambientais dos plás-
ticos nos oceanos são enormes e incluem complicações à fau-
na marinha com a ingestão [destes plásticos] por aves e de-
mais organismos que variam desde plânctons até mamíferos
marinhos; dispersão de espécies microbianas para águas de
onde não são nativas; transporte de contaminadores orgânicos
em vários níveis tróficos”14
.
Praticamente toda vida marinha pode ser colocada em
risco pelo plástico. A ingestão desta sopa de polímeros sintéti-
cos causa a morte de milhares de espécies todo ano. Ainda, por
repelirem a água, a resina do plástico acaba atraindo diversos
outros tipos de poluentes hidrofóbicos, principalmente compos-
tos orgânicos venenosos como pesticidas (DDT) e bifenilos
policlorados (PCBs), funcionando como verdadeiras esponjas
de sujeira. Estas substâncias - além do próprio plástico, tratado
com aditivos tóxicos como bisfenol A, que podem causar cân-
cer e infertilidade - vão se acumulando ao longo da cadeia ali-
13
DEMERITT, Sean Bennjamin. Marine plastic pollution: varying impacts on ma-
rine wildlife in Oregon's coastal zone. University of Oregon, EUA; 1990.
14
LAVENDER, Kara; MORET-FERGUSON, Skye ; MAXIMENKO, Nikolai A.;
PROSKUROWSKI, Giora; PEACOCK, Emily E., HAFNER, Jan; REDDY, Chris-
topher M. Op. Cit. Tradução do autor.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14479
mentar e podem chegar aos seres humanos. O principal animal
que consome estes plásticos são os plânctons, base de toda ca-
deia alimentar marinha. Em coleta de plânctons foi detectado
que mais de 60% das espécies capturadas continham traços e
resquícios de polímeros15
.
Pelo menos 267 espécies diferentes são conhecidas por
terem se entrelaçado ou ingerido detritos de plástico, incluindo
as aves marinhas, tartarugas, focas, leões marinhos, baleias,
peixes, entre outros. Deste modo, a enorme quantidade de ma-
terial plástico nos oceanos constitui uma real ameaça à fauna
marinha, comprometendo as mais variadas espécies. Ainda, as
consequências podem ser maiores. O acumulo de detritos de
plástico pode funcionar como uma balsa e transportar espécies
exóticas de uma região à outra. Os danos aos recifes de corais
também podem ser amplos, uma vez que esta espécie é sensível
a alterações no seu habitat e o material plástico, sobretudo pro-
dutos de pesca, causa a destruição destes corais16
.
Soma-se a isto o fato de as perdas econômicas em razão
da poluição marinha por plásticos serem enormes. As princi-
pais (e diretas) implicações econômicas do problema assentam,
entre outros, nas avarias às embarcações e na diminuição da
pesca. No primeiro caso os detritos de plásticos causam danos
às hélices, bem como entopem as tubulações e sistemas de res-
friamento de água. Já as perdas do setor pesqueiro podem ser
ainda maiores. Neste sentido, afirma Paul Hagen:
“Plásticos no ambiente marinho matam um grande
número de peixes. Redes feitas de algodão e outros materiais
biodegradáveis, que rapidamente se desintegram na água sal-
gada são agora quase que exclusivamente construídas somen-
te com materiais sintéticos. [...] No Pacífico Norte estima-se
que são introduzidas aproximadamente 1.624 milhas de redes
de pesca a cada ano. Estas redes de pescas perdidas ou joga-
das no meio marinho continuam fortes o suficiente para cap-
15
Idem.
16
ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul.
Op. Cit.
14480 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
turar peixes e animais marinhos por cerca de seis anos. As-
sim, estas redes fantasmas podem esgotar os recursos mari-
nhos por anos ao prenderem os peixes e outros animais. Em
1974 armadilhas de lagostas perdidas ou descartadas no mar
na costa da Nova Inglaterra, principalmente construídas com
material sintético, foram responsáveis por uma perda anual
estimada em mais de 248 milhões de dólares”17
.
Em suma, as perdas socioambientais e econômicas da po-
luição marinha por plásticos são incalculáveis, além de possí-
veis danos à saúde humana. Assim, apesar da atualidade da
descoberta de sua real dimensão, a questão já se tornou um
problema ambiental socialmente construído. A partir, sobretu-
do de 1997, momento no qual é tornada mundialmente conhe-
cida a questão das grandes sopas de plásticos nos giros oceâni-
cos, o problema passa por um processo de construção social.
Assim, podemos analisar o tema sob o viés da Teoria Constru-
tivista proposta por Hannigan, segundo a qual um problema
ambiental só se torna realmente um problema na medida em
que for construído socialmente como tal18
. Assim, a poluição
marinha por plásticos, além de já ser compreendida internacio-
nalmente como um problema ambiental de consequências gra-
ves, também começa a ser normatizada e regulada pelo direito
internacional do ambiente.
2. O DIREITO INTERNACIONAL DO AMBIENTE E A PO-
LUIÇÃO MARINHA POR PLÁSTICO
2.1. A EVOLUÇÃO NA PROTEÇÃO AMBIENTAL DOS
17
HAGEN. Paul E. The international community confronts plastics pollution from
ships: MARPOL Annex V and the problem that won't go away. American Universi-
ty International Law Review 5, n° 2, P 425-496, EUA; 1990. P. 440 e 441. Tradução
do autor.
18
HANNIGAN, J. A. Sociologia ambiental: a formação de uma perspectiva social.
Instituto Piaget, Lisboa; 1995. P 11: “(...) os problemas ambientais não se materiali-
zam por eles próprios; em vez disso, eles devem ser construídos pelos indivíduos ou
organizações que definem a poluição, ou outro objectivo como preocupante e que
procuram fazer algo para resolver o problema”.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14481
MARES: DE RES NULLIUS A RES COMMUNIS
Historicamente, a primeira tentativa de entender a natu-
reza jurídica dos mares surgiu com a teoria da Res Nullius19
,
que pode ser entendida como aquilo que não pertence a qual-
quer pessoa. Esta teoria visava defender os mares das reivindi-
cações de soberania dos Estados, ou seja, este espaço não esta-
va sujeito a nenhuma regulamentação jurídica. Os países não
possuíam qualquer jurisdição exatamente porque aí não existe
nenhum direito que possa ser aplicado. A partir de então houve
uma evolução no conceito dos mares que foi influenciado (e ao
mesmo tempo influenciou) pelo direito internacional do ambi-
ente.
Neste viés, foi no final dos anos 60 que a comunidade in-
ternacional acordou para a questão da proteção do meio ambi-
ente no plano jurídico. Isso não quer dizer que anteriormente
não existissem convenções internacionais com temáticas ambi-
entais, porém é somente a partir desta época que verdadeira-
mente se inicia o processo jurídico internacional de proteção e
preservação do meio ambiente. Como destaca Carla Amado
Gomes:
“Assim, é verdade que o volume de instrumentos in-
ternacionais produzidos desde os anos 1970 tem aumentado
proporcionalmente à progressiva constatação, facticamente
aferível e cientificamente comprovável, de que os bens ambi-
entais naturais do Globo se encontram em adiantado estado de
esgotamento”20
.
São vários os fatores que contribuíram para esse desper-
19
Esta teoria surgiu no século XVII para combater a ideia de apropriação dos mares
e rotas marítimas defendidas alguns Estados, como Portugal e Espanha. Contudo,
existe uma evolução histórica anterior, que surge na antiguidade, passando pelo
período romano, idade média e moderna. Todavia, para nós, vale entendermos a
evolução a partir desta teoria da Res Nullius, até porque foi a primeira vez que se
teorizou sobre o tema.
20
GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na juris-
prudência internacional. In.: Elementos de apoio è disciplina de Direito Internacio-
nal do Ambiente. P. 367 a 408. AAFDL, Lisboa; 2008. P. 370.
14482 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
tar internacional da temática ambiental. Podemos destacar al-
guns mais importantes, como a publicação de trabalhos aca-
dêmicos de alerta para as questões ambientais, como o livro
Silent Spring (Primavera Silenciosa) em 1962 de Rachel Car-
son21
. Esta obra é considerada um marco de alerta para a situa-
ção da degradação ambiental pela intervenção humana. Outro
fator decisivo assenta na conscientização e envolvimento popu-
lar nas discussões socioambientais a partir desta época. No
nosso “Água de lastro: um problema ambiental global” nos
expressamos da seguinte maneira em relação ao assunto:
“Se no início de 1960 somente algumas pessoas fala-
vam em preservação do meio ambiente, em abril de 1970
quase meio milhão de indivíduos participaram do Dia da Ter-
ra nos Estados Unidos. Isto retratava a expansão do ambienta-
lismo no meio popular e dava força para o nascimento de
inúmeras organizações não governamentais, mesmo que sem
uma representatividade política forte. O preservacionismo e
conservacionismo, que dominaram o ambientalismo nas dé-
cadas anteriores, eram revigorados e começaram a se preocu-
par com as questões socioambientais”22
.
Outrossim, podemos destacar os grandes acidentes e in-
cidentes de proporções globais que influenciaram sobremaneira
a realização de convenções internacionais para a proteção do
meio ambiente. Em especial para os espaços marítimos, os aci-
dentes ambientais foram decisivos para a negociação, assinatu-
ra e ratificação de tratados multilaterais de caráter ambiental. O
avanço tecnológico e industrial possibilitou a evolução da in-
dústria naval que foi se tornando capaz de produzir navios cada
vez maiores. Contudo, este progresso trouxe consigo graves
consequências para o meio ambiente marinho, pois os desastres
ambientais também se tornaram maiores. Afirma Guido Fer-
nando da Silva Soares que:
“(...) os espaços marinhos e oceânicos são o meio am-
21
CARSON, Rachel. Silent Spring. Houghton Miffin Co, Boston; 1962.
22
ZANELLA, Tiago Vinicius. Água de Lastro: um problema ambiental global.
Juruá, Curitiba; 2010. P. 29.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14483
biente que mais tem sofrido danos de natureza catastrófica, a
partir da entrada em cena de superpetroleiros, navios super-
dimensionados em tamanho que levam com eles os riscos de
uma extraordinária capacidade de destruição do meio ambien-
te marinho e das atividades comerciais e de entretenimento
relacionados ao uso de praias dos países banhados por essas
águas”23
.
O primeiro grande desastre ambiental marítimo ocorreu
em março de 1967, no Canal da Mancha. O petroleiro Torrey
Canyon, registrado sob a bandeira de conveniência da Libéria,
chocou-se contra um rochedo, naufragando e derramando cerca
de cento e dezoito mil toneladas de óleo cru nas águas do Mar
do Norte, que atingiu a costa da Grã-Bretanha causando prejuí-
zos incalculáveis. Para consumir o óleo que ainda restava a
bordo da embarcação a Royal Air Force britânica teve que
bombardear o navio provocando um incêndio24
. Esse desastre
ganhou notoriedade internacional em razão de suas proporções.
A mobilização para minimizar os impactos de novos acidentes
deu origem à Conferência de Bruxelas, em 1969. Esta, que
resultou na adoção da Convenção Internacional sobre Respon-
sabilidade Civil por danos causados por Poluição por Óleo
(CLC/69), teve por finalidade determinar responsabilidades e,
sobretudo, prevenir novos acidentes.
Outras importantes convenções surgiram na década de
1970 a respeito do meio marinho e seus problemas ambientais.
Em dezembro de 1972, foi celebrada em Londres a Convenção
Sobre Prevenção da Poluição Marinha por Alijamento de Resí-
duos e outras Matérias (LC-72), também denominada Conven-
ção de Londres. Esta visava prevenir a poluição marítima por
resíduos industriais e químicos e previu uma ação internacional
para controlar a contaminação dos oceanos por alijamento de
resíduos ou substâncias lesivas à saúde humana. Outro impor-
23
SOARES, Guido Fernando da Silva. A proteção internacional do meio ambiente:
emergência, obrigações e responsabilidades. 2e Ed. Atlas, São Paulo; 2003. P. 227.
24
BARROS, José Fernando Cedeño de. Direito do mar e do meio ambiente. Adua-
neiras, São Paulo; 2007.
14484 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
tante documento de direito ambiental internacional deste perío-
do foi assinado na Convenção Internacional para a Prevenção
da Poluição por Navios, realizada em 1973, e seu protocolo de
1978 (MARPOL 73/78). Esta convenção criou vários meca-
nismos de prevenção e controle da poluição, instituindo relató-
rios, vistorias e certificados de inspeção das embarcações.
Com efeito, quanto à evolução dos problemas ambientais
marinhos e o direito do mar, a principal conferência já realiza-
da foi a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar
(CNUDM) de 1982 assinada em Montego Bay, Jamaica. Esta
Convenção, sem sombra de dúvida, foi e continua sendo um
marco nas discussões ambientais marítimas e do direito do mar
como um todo. Num único documento concretizaram-se impor-
tantes normas e regras de direito do mar, bem como ficou defi-
nido em termos jurídicos todos os elementos físicos que com-
põem o mar, com notória atenção às regras de preservação do
meio ambiente marinho25
.
A proteção e preservação do meio marinho é uma preo-
cupação constante da Convenção de Montego Bay. Tanto na
Parte XII, com dispositivos específicos de “proteção e preser-
vação do meio marinho”, quanto em artigos esparsos, a
CNUDM é inovadora e estabelece um regime de preservação
ambiental muito bem detalhado e consistente. Como afirma a
Carla Amado Gomes: “foi no âmbito do Direito do Mar que
primeiro se logrou estabelecer um regime geral de proteção do
meio ambiente, na Convenção das Nações Unidas sobre o Di-
reito do Mar, de 10 de dezembro de 1982”26
.
Esta evolução na proteção ambiental do meio marinho
corroborou de forma decisiva para um novo entendimento do
25
ZANELLA, Tiago Vinicius. Direito da Navegação: liberdades e restrições da
navegação marítima no direito internacional. Dissertação de mestrado. Faculdade de
Direito da Universidade de Lisboa; 2010.
26
GOMES. Carla Amado. A protecção internacional do ambiente na Convenção de
Montego bay. In.: textos dispersos de direito do ambiente. Vol I. P. 187 a 222.
AAFDL, Lisboa; 2008. P. 190.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14485
conceito e natureza jurídica dos mares, em especial do alto
mar, onde se situam os grandes giros oceânicos. De um enten-
dimento de que o mar não pertencia a ninguém – Res Nullius –
se passou a compreender este espaço a partir da teoria da Res
Communis, isto é, “coisa comum”. Assim, o mar passou a per-
tencer a todos os Estados de forma conjunta e simultânea. É um
espaço onde todos os países possuem os mesmos direitos, sen-
do insuscetível de apropriação por parte individual. Ainda, o
oceano (alto mar) é de toda sociedade internacional, sendo
compartilhado não apenas pelos Estados, mas também por ou-
tros sujeitos de direito internacional como a ONU; suas agên-
cias especializadas; a Agência Internacional de Energia Atômi-
ca; a Autoridade Internacional para os Fundos Marinhos27
.
2.2. A RESPONSABILIDADE DOS ESTADOS POR DANOS
AO MEIO MARINHO: O PAPEL DA SOFT LAW
O estudo da responsabilidade dos Estados por danos ao
meio marinho passa necessariamente pela análise da sotf law
no direito internacional do ambiente. Não existe uma definição
exata da expressão, que ainda passa por uma fase de construção
conceitual. Todavia, podemos entendê-la como uma norma
contraposta à hard law, ou seja, sem a força do valor normativo
obrigacional. Existem no direito internacional normas jurídicas
com força obrigacional e caráter jurídico (hard law) e os textos
desprovidos deste caráter. Contudo, também há normas que
ficam num meio termo, em uma zona cinzenta entre o direito e
o não direito, entre os textos que criam um vinculo jurídico e
os que não criam, essas são as chamadas sotf laws. Assim, po-
demos entender a expressão inglesa como aquelas regras inter-
nacionais cujo valor normativo é menos constringente que o
das demais normas jurídicas tradicionais, porém sem perder
totalmente o caráter jurídico. Ainda, a tradução da expressão
27
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto Mar. Renovar, Rio de Janeiro; 2001.
14486 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
sotf law para outros idiomas também é muito difícil. Para o
português podemos traduzi-la como um direito flexível, direito
maleável, direito plástico, entre outros28
.
A principal finalidade da sotf law é regulamentar com-
portamentos futuros, para isso tem um duplo papel: a) fixar
metas para futuras ações políticas internacionais; b) recomen-
dar aos Estados a criação de normas jurídicas internas. Assim,
mesmo sem o grau de cogência nem o status de norma jurídica
da hard law, a relevância para o direito internacional da sotf
law é muito grande. Estas normas representam uma espécie de
obrigação moral aos Estados. Como afirma Valerio de Oliveira
Mazzuoli:
“Muitas dessas regras de soft law visam regulamentar
futuros comportamento dos Estados, norteando sua conduta e
dos seus agentes nos foros internacionais multilaterais, esta-
belecendo um programa de ação conjunta, mas sem pretender
enquadrar-se no universo das normas convencionais, cujo tra-
ço principal é a obrigatoriedade de cumprimento do que ali fi-
cou acordado. Isto não significas que o sistema de “sanções”
também não exista, sendo certo que o seu conteúdo será mo-
ral ou extrajurídico em caso de descumprimento ou inobser-
vância das suas diretrizes”29
.
Para o direito internacional do ambiente a importância da
soft law é muito grande. Se este fenômeno não esta restrito às
normas internacionais de foro ambiental, é neste ramo do direi-
to que mais se multiplicam e ganham espaço. As incertezas
científicas sobre os processos naturais e as influências da ação
humana no meio, aliadas ao alto custo político e econômico das
regras de direito ambiental, fazem com que as normas de soft
law sejam utilizadas com bastante frequência. Os Estados mui-
tas vezes não assumem compromissos que possam frear seus
crescimentos econômicos. Historicamente, a dicotomia entre a
preservação ambiental e o crescimento da economia sempre
28
MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 5° Ed.
Editora RT, São Paulo; 2011.
29
Idem. P. 158.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14487
moveu as políticas ambientais internacionais e, consequente-
mente, o direito. A declaração do General Costa Cavalcante,
chefe da delegação brasileira na Conferência de Estocolmo em
1972, demonstra de forma precisa o receio do Brasil e de de-
mais países em desenvolvimento contrários às propostas que
limitavam o crescimento econômico em prol da preservação do
ambiente: “para a maioria da população mundial a melhoria de
condições é muito mais uma questão de mitigar a pobreza, dis-
por de mais alimentos, melhorar vestimentas, habitação, assis-
tência médica e emprego do que reduzir a poluição”30
.
A regulação de acesso e gestão de bens naturais pelo di-
reito internacional do ambiente é uma intercessão que envolve
cercear o aproveitamento de recursos que até então são consi-
derados bens de fruição e apropriação, sem qualquer preocupa-
ção com a gestão racional. Aí residem a dificuldade e a resis-
tência por parte dos Estados em dispor das suas prerrogativas
de exploração dos recursos naturais ambientais de forma desre-
grada em favor da regulamentação e gestão internacional. A
normatização parte necessariamente da relativização dos direi-
tos soberanos dos Estados da utilização exclusiva ou partilhada
de bens naturais, o que nem sempre é de fácil alcance, uma vez
que depende da vontade estatal. Como bem destaca Carla
Amado Gomes:
“(...) a força cogente das convenções ambientais é di-
rectamente proporcional à resistência dos Estados em auto-
limitar-se nos seus direitos de exploração dos bens naturais
mais valiosos do ponto de vista econômico. Daí que o sof law
impere no Direito Internacional do Ambiente ou, por outras
palavras, este seja um domínio de ‘normatividade relativa’
”31
.
A falta de normatividade das regras internacionais de
preservação e gestão do meio ambiente é visualizada no cená-
30
SOUZA, Marcelo Pereira de. Instrumentos de Gestão Ambiental: fundamentos e
prática. Riani Costa, São Paulo; 2000. P. 6.
31
GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na juris-
prudência internacional. Op. Cit. P. 370.
14488 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
rio internacional através de alguns fatores. Não é somente a
utilização nas convenções internacionais das expressões como
“Os Estados esforçar-se-ão por...”, “As partes envidarão as
diligências mais adequadas para...”, que se verifica a utilização
da soft law nesta área do direito. Na prática, alguns são os fato-
res e ao mesmo tempo consequências deste fenômeno, entre
eles podemos descartar: a) a falta de uma instância jurisdicio-
nal internacional para julgar as lides de caráter ambiental com
competência para emitir decisões compulsórias; b) a inexistên-
cia, como regra, da possibilidade de acesso aos tribunais inter-
nacionais pelos indivíduos. (Atualmente apenas os Estados são
sujeitos ativos de lides internacionais ambientais); c) a necessi-
dade de consentimento do Estado violador como pressuposto
para a submissão do litígio à Corte Internacional de Justiça (ou
outro tribunal). Somente com a permissão estatal uma querela
de caráter ambiental pode ser analisada pelos tribunais interna-
cionais, o que permite que um possível Estado infrator de nor-
mas ambientais nunca seja julgado32
.
Entretanto, a utilização da soft law não é necessariamente
negativa, acabando por produzir efeitos de caráter prático posi-
tivos e por equilibrar a regulação jurídica internacional, não
pendendo apenas para a proteção do meio e deixando margina-
lizados seus efeitos e consequências econômicas. Ainda, é me-
lhor uma declaração de vontade que reúna um vasto conteúdo
programático de preservação, com um grande número de Esta-
dos signatários, do que um tratado hard law que pouquíssimos
países ratificam. Neste víeis, os efeitos positivos da soft law
podem ser comprovados pelos resultados obtidos a partir da
Rio 92, como destaca Guido Fernando Silva Soares:
“Na ocasião, no Rio, houve duas decisões de soft law,
dirigidas a futuros comportamentos dos Estados, na esfera das
relações internacionais: a fixação de forma imperativa dos
temas para a subsequente sessão da AG da ONU, de início de
32
GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na juris-
prudência internacional. Op. Cit..
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14489
negociações, sobre a questão do combate à desertificação,
bem como a convocação de uma conferência da ONU para
tratar dos problemas da pesca em alto-mar. De tais entendi-
mentos, resultaram após negociações, a Convenção das Na-
ções Unidas para o Combate à Desertificação Naqueles Países
que Experimentam Sérias secas e/ou Desertificação, Particu-
larmente na África, em 17 de julho de 1994, em Nova Yor-
que, e o Acordo para a Implementação das Provisões da Con-
venção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 10 de
dezembro de 1982, Relativas a Convenção e Gerenciamento
de Espécies de Peixe Altamente Migratórios e Tranzonais,
adotado em Nova Yorque, em 4 de agosto de 1995”33
.
Diante do exposto percebemos que o contencioso inter-
nacional ainda é regido pelo princípio da soberania do Estado
sobre os recursos naturais em seu território ou sob sua jurisdi-
ção e controle. Não se aplica uma lógica altruísta de proteção
do ambiente como riqueza coletiva, fonte de equilíbrio do
ecossistema mundial e responsável pela existência e sobrevi-
vência da espécie humana. Contudo, não podemos ignorar a
importância da regulamentação internacional, mesmo que atra-
vés da soft law. Como dito, é melhor uma legislação com nor-
matividade relativa do que nenhuma normatização. Para o meio
marinho, em especial na proteção contra a poluição por plásti-
co, as normas internacionais ainda não são as ideias, porém,
como veremos adiante, a preocupação já existe e a regulação
procura nortear a atuação dos Estados no sistema internacional.
2.3. A NORMATIZAÇÃO INTERNACIONAL PARA PRO-
TEÇÃO CONTRA POLUIÇÃO MARINHA POR PLÁSTI-
COS
A poluição marinha por plásticos é um problema ambien-
tal de caráter essencialmente internacional. Como visto, a prin-
cipal área afetada por este tipo de poluição é o Alto Mar, sendo
33
SOARES, Guido Fernando da Silva. A proteção internacional do meio ambiente.
Manoele, Barueri; 2003. P. 92 e 93.
14490 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
sua principal fonte a terrestre, com cerca de 80%, contra a po-
luição por navios que representa 20%. Assim, é de fundamental
importância acordos e tratados internacionais para dirimir o
problema, uma vez que apenas através de uma atuação conjun-
ta da sociedade internacional como um todo é que se poderá
preservar e proteger o espaço marinho contra a poluição por
plásticos.
Deste modo, começamos por analisar o principal tratado
internacional sobre o direito do mar, a Convenção das Nações
Unidas sobre o direito do Mar de 1982. (CNUDM). Este, espe-
cificamente na Parte XII, normatiza a proteção e preservação
do meio marinho como um todo. O principal desígnio desta
Parte é regular de forma ampla e total a proteção do meio ma-
rinho. Para isto, como regra, a CNUDM traz artigos que ver-
sam sobre questões gerais, fazendo recomendações aos Estados
sobre o tema do ambiente34
. Alguns artigos fazem menção à
poluição de forma genérica, mas que englobam de forma preci-
sa o problema da poluição marinha por plásticos. Podemos
destacar primeiramente o artigo 194 da Convenção de 1982
que afirma que todos os Estados têm o dever de preservar o
meio marinho:
“ARTIGO 194
Medidas para prevenir, reduzir e controlar a poluição
do meio marinho
1. Os Estados devem tomar, individual ou conjunta-
mente, como apropriado, todas as medidas compatíveis com a
presente Convenção que sejam necessárias para prevenir, re-
duzir e controlar a poluição do meio marinho, qualquer que
seja a sua fonte, utilizando para este fim os meios mais viá-
veis de que disponham e de conformidade com as suas possi-
bilidades, e devem esforçar-se por harmonizar as suas políti-
cas a esse respeito.
34
Existem artigos específicos sobre a proteção ambiental de determinadas espécies,
como é o caso dos peixes anádromos e catádromos, nos artigo 66 e 67 da CNUDM,
respectivamente. Contudo na sua maioria a Convenção, a pesar de regular de forma
abrangente a proteção marinha, transfere a responsabilidade de regulamentar os
casos específicos aos próprios Estados.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14491
(...)
3 As medidas tomadas, de acordo com a presente Par-
te, devem referir-se a todas as fontes de poluição do meio ma-
rinho. Estas medidas devem incluir, inter alia, as destinadas a
reduzir tanto quanto possível:
a) a emissão de substancias tóxicas, prejudiciais ou
nocivas, especialmente as não degradáveis, provenientes de
fontes terrestres, provenientes da atmosfera ou através dela,
ou por alijamento;”35
.
Ademais, a CNUDM procura diferenciar e regulamentar
de forma específica a poluição de origem terrestre e a poluição
por navios. Primeiro, no artigo 207°, a Convenção faz referên-
cia ao dever dos Estados em adotar medidas para prevenir a
poluição de origem terrestre: “Os Estados devem adotar leis e
regulamentos para prevenir, reduzir e controlar a poluição do
meio marinho proveniente de fontes terrestres, incluindo rios,
estuários, dutos e instalações de descarga (...)”36
. Depois, já no
artigo 210°, é regulada da mesma forma a prevenção de polui-
ção por alijamento dos navios: “Os Estados devem adotar leis e
regulamentos para prevenir, reduzir e controlar a poluição do
meio marinho por alijamento”37
. Fica evidente a intenção da
CNUDM em repassar para os Estados o dever de regulamentar
a proteção do ambiente marinho. Ainda, os países devem pro-
curar atuar “por intermédio das organizações internacionais
competentes ou de uma conferência diplomática”38
.
Além da Convenção de Montego Bay existem outros
acordos internacionais que regulamentam de forma mais espe-
cífica a poluição marinha por plásticos. Em especial outros dois
tratados regem o tema: a Convenção sobre Prevenção da Polui-
ção Marinha por Alijamento de Resíduos e outras Matérias, de
1972 (LC-72); e a MARPOL 73/78 (Convenção Internacional
para a Prevenção da Poluição por Navios) em seu Anexo V
35
CNUDM. Art. 194.
36
CNUDM. Art 207, n° 1.
37
CNUDM. Art 210, n° 1.
38
CNUDM. Art 210, n° 4.
14492 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
(Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos
Navios) de 1983.
A Convenção sobre Prevenção da Poluição Marinha por
Alijamento de Resíduos e outras Matérias já em 1972 normati-
zava a questão e tinha como principal escopo:
“Artigo 1
As Partes Contratantes promoverão, individual e cole-
tivamente, o controle efetivo de todas as fontes de contamina-
ção do meio marinho e se comprometem, especialmente, a
adotar todas as medidas possíveis para impedir a contamina-
ção do mar pelo alijamento de resíduos e outras substâncias
que possam gerar perigos para a saúde humana, prejudicar os
recursos biológicos e a vida marinha, bem como danificar as
condições ou interferir em outras aplicações legítimas do
mar.”
Para atingir o objetivo de proteger o meio marinho da po-
luição, a LC-72, que entrou em vigor em 1975, “proíbe o ali-
jamento de resíduos ou outras substâncias enumeradas no Ane-
xo I”39
. O referido anexo traz um rol de substâncias que ficam
proibidas de serem lançadas ao mar, entre elas: “Plásticos per-
sistentes e outros materiais sintéticos persistentes, por exemplo,
redes e cordas, que podem flutuar ou permanecer em suspensão
no mar de tal modo a interferir materialmente com a navega-
ção, de pesca ou outras utilizações legítimas do mar”40
. Outros-
sim, já em 1972 proibia-se que fosse atirado ao mar qualquer
polímero sintético, entretanto nota-se que o principal objetivo
desta proibição assentava na segurança da navegação e da pes-
ca. Até aquela data não se conhecia o real impacto ambiental e
econômico que os plásticos traziam. Assim a preocupação da
poluição por plástico ainda residia no entrave à navegação e à
exploração dos oceanos e não na preservação ambiental do
meio marinho como um bem comum.
A Convenção Internacional para a Prevenção da poluição
por Navios foi assinada em 1973 e posteriormente emendada
39
LC-72. Art. 4, a.
40
LC-72. Anexo I, n°4.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14493
pelo protocolo adicional de 1978, passando a ser denominada
por MARPOL 73/78. O principal objetivo deste tratado é esta-
belecer normas para a completa eliminação da poluição oriunda
das embarcações, como óleo e outras substâncias danosas.
Após sua adoção e emenda, a MARPOL ainda teve o acrésci-
mo de seis anexos que versam sobre causas específicas de po-
luição41
. Deste modo, a partir da adoção do Anexo V, relativo
às Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos
Navios, a preocupação com o alijamento de material plástico
nos oceanos ganhou efetiva proteção internacional. O anexo
mencionado foi assinado em 1983 e entrou em vigor a partir de
1988. Porém, após esta data, já foi revisado em diversas ocasi-
ões, sempre sob os auspícios da Organização Marítima Interna-
cional (OMI). Atualmente, a última atualização ocorreu através
da Resolução MEPC 116 (51), em vigor a partir de 01 de agos-
to de 2005. Já existe uma nova atualização que modificará em
alguns dispositivos o texto atual através da Resolução MEPC
201 (62), que entrará em vigor a partir de 01 de janeiro de
2013. Todavia, a questão da poluição marinha por plástico não
será alterada na sua essência.
O Anexo V versa sobre alijamento de todo o tipo de lixo
nos oceanos, normatizando quando e como cada material pode
ser lançado ao mar. Ademais, o texto regulamenta as áreas
permitidas e as proibidas de alijamento de lixo; a proteção de
certas áreas especiais; as instalações de recebimento de lixo; o
controle do Estado do porto sobre requisitos operacionais; os
planos de gerenciamento do lixo; os tipos de materiais, entre
outros. Contudo, quanto ao lançamento de plástico a partir das
embarcações o anexo é taxativo: “é proibido o lançamento no
mar de todos os tipos de plásticos, inclusive, mas não restrin-
gindo-se a estes, cabos sintéticos, redes de pesca sintéticas,
41
Anexo I – Óleo; Anexo II – Substâncias Líquidas Nocivas Transportadas a granel;
Anexo III – Substâncias Prejudiciais Transportadas em forma Empacotada; Anexo
IV – Esgoto; Anexo V – Lixo; Anexo VI – Poluição de Ar.
14494 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
sacos plásticos para lixo e cinzas de incineradores provenientes
de produtos plásticos que possam conter resíduos tóxicos ou de
metais pesados”42
.
A exceção para a proibição de alijamento de material
plástico nos mares encontra-se na Regra 6 do Anexo que traz
três hipóteses em que é permitido tal lançamento: a) para ga-
rantir a segurança da embarcação e das pessoas a bordo, ou de
salvar vidas humanas no mar; b) o alijamento involuntário de
lixo decorrente de uma avaria sofrida pelo navio ou pelos seus
equipamentos, desde que antes e depois dos fatos tenham sido
tomadas todas as precauções razoáveis com a finalidade de
evitar ou minimizar o lançamento; c) no caso de perda aciden-
tal de redes de pesca sintéticas, desde que tenham sido tomadas
todas as precauções razoáveis para evitar aquela perda43
.
Ainda, em âmbito regional, podemos destacar a Conven-
ção para a Proteção e Desenvolvimento do Ambiente Marinho
da Região do Grande Caribe de 1983, conhecida como Con-
venção de Cartagena. Esta regula, entre outros, tanto a poluição
causada por navios, quanto a de origem terrestre:
“Artigo 6 º
Poluição causada pelo alijamento
As Partes Contratantes tomarão todas as medidas
apropriadas para prevenir, reduzir e controlar a poluição da
área da Convenção pelo alijamento de resíduos e outros mate-
riais no mar de navios, aeronaves ou estruturas feitas pelo
homem no mar, e para assegurar a aplicação efectiva das re-
gras internacionais aplicáveis e padrões.
Artigo 7 º
Poluição de origem terrestre
As Partes Contratantes tomarão todas as medidas
apropriadas para prevenir, reduzir e controlar a poluição da
área da Convenção causada pela disposição costeira ou por
descargas provenientes de rios, estuários, os estabelecimentos
do litoral, de descarga, ou quaisquer outras fontes sobre seus
42
Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos Navios. 17 de feve-
reiro de 1983. Anexo V da MARPOL 73/78. Regra 3.
43
Idem. Regra 6.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14495
territórios”44
.
Todavia, é evidente a falta de uma Convenção de caráter
global que regulamente de forma precisa a poluição por plásti-
co de origem terrestre, uma vez que 80% de toda poluição ma-
rinha deste material tem procedência dos rios e esgotos. A difi-
culdade na adoção de um texto internacional nos moldes do
Anexo V da MARPOL 73/78 que verse sobre a poluição de
origem terrestre é enorme, beirando o inviável. Isto se explica
pela impossibilidade de fiscalização por parte da comunidade
internacional e pela necessidade de legislação interna que regu-
lamente a prevenção e as sanções por descumprimento da lei.
Deste modo, a CNUDM se restringe a requisitar dos Estados
uma regulação interna sobre da poluição marinha que advém
do seu território. Para incentivar e auxiliar no processo de le-
gislação interno dos países sobre o tema, foi criada em 1995
sob os auspícios do PNUMA o Programa de Ação Global para
a Proteção de Ecossistemas Marinhos ameaçados por ativida-
des terrestres com a seguinte finalidade:
“O Programa de Ação Global visa impedir a degrada-
ção do ambiente marinho a partir de atividades terrestres, fa-
cilitando a realização do dever dos Estados de preservar e
proteger o ambiente marinho. O programa é projetado para
ajudar os Estados a tomar medidas, individual ou conjunta-
mente dentro de suas respectivas políticas, prioridades e re-
cursos, que levam à prevenção, controle, redução e/ou elimi-
nação da degradação do ambiente marinho, bem como a sua
recuperação dos impactos causados por atividades terres-
tres”45
.
Neste sentido, o Programa identificou nove categorias de
poluentes de origem terrestre que causam poluição ao meio
marinho e nas quais o Programa atua com recomendações e
auxílio aos países. Entre estas, o material plástico proveniente
44
Convenção para a Proteção e Desenvolvimento do Ambiente Marinho da Região
do Grande Caribe de 1983.
45
Programa de Ação Global para a Proteção de Ecossistemas Marinhos ameaçados
por atividades terrestres. Introdução, b. Tradução do autor.
14496 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
sobretudo de esgotos. Assim, representa uma preocupação e
motivo de real necessidade de regulação das águas residuais
domésticas indevidamente descarregadas nos rios ou direta-
mente no mar46
.
Em suma, existe uma regulação internacional que se ocu-
pa da poluição dos mares, inclusive por material plástico. Esta
normatização se ocupa tanto dos poluentes lançados aos ocea-
nos pelos navios, como de origem terrestre. Porém fica claro
que a legislação internacional por alijamento já alcançou um
patamar muito mais elevado no processo de prevenção e prote-
ção do meio marinho contra a poluição por plástico. Notada-
mente os polímeros sintéticos lançados ao mar a partir da costa,
que representam a maior parte de toda poluição com cerca de
80%, ainda não existe uma legislação internacional específica e
proibitiva, ficando a encargo de cada Estado o dever de norma-
tizar o tema.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A poluição marinha por plástico é uma realidade que se
impõe à sociedade internacional de forma inequívoca. O real
dimensionamento do problema ficou evidenciado há relativa-
mente pouco tempo, sendo que sua regulação pelo direito in-
ternacional do ambiente ainda encontra-se em fase de constru-
ção. Deste modo, a assinatura e ratificação das convenções
internacionais sobre a questão representam um significativo
esforço internacional para dirimir o problema. Assim, a cres-
cente normatividade dos textos internacionais sobre o direito
do ambiente (como o regime global estabelecido no Anexo V
da MARPOL 73/78, por exemplo), representa um passo impor-
tante no combate à poluição por plásticos oriunda de embarca-
ções. Isto em razão de já trazer obrigações exigíveis aos Esta-
dos Partes, além dos próprios indivíduos (capitão, tripulação).
46
Idem. RECOMMENDED APPROACHES BY SOURCE CATEGORY.
RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14497
A crítica que se faz ao direito internacional do ambiente
no combate à poluição marinha por plástico reside na pouca
efetividade prática dos seus resultados. Como vimos, mesmo
após a adoção dos referidos textos convencionais, a poluição
por polímeros sintéticos em todos os oceanos ainda é enorme e
continua a crescer. A principal causa destes resultados negati-
vos é a falta de regulação específica e obrigacional da preven-
ção e controle da poluição de origem terrestre. Como a maior
parte de todo o lixo plástico que é lançado nos oceanos provém
da costa (rios, esgotos e até das praias), a falta de normativida-
de neste sentido traz um atraso ao combate desta degradação.
Uma explicação para a falta de textos legais que não se
resumam a requisitar dos Estados uma legislação interna para a
proteção do meio marinho contra a poluição por plásticos de
origem terrestre, pode estar na relativa novidade do tema em
questão. Ainda, a dificuldade nesta normatização assenta na
necessária autorregulação por parte dos Estados. Esta poluição
exige que os próprios países legislem e fiscalizem, até por uma
questão de soberania. Difícil imaginar uma convenção multila-
teral que obrigue um Estado a coibir os modos de poluição de
origem terrestre, criando responsabilidade internacional sem a
fiscalização do próprio país. Neste viés, o modo mais coerente
encontrado ainda é incentivar as nações a inserir no seu direito
interno normas para a prevenção e até mesmo sanções contra
esta poluição.
Mesmo não estando perto do ideal, a sociedade internaci-
onal já se movimenta em prol de ações a curto e médio prazo a
fim de dirimir cada vez mais o problema analisado. O Progra-
ma de Ação Global é um exemplo evidente disto. Assim, ainda
que o direito internacional do ambiente ainda não alcance todos
os objetivos necessários para combater a poluição por plásticos
no mar, a política internacional e a vontade dos próprios Esta-
dos assumem a função de nortear a ações com a finalidade de
diminuir a poluição por materiais plásticos nos oceanos.
14498 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12
Em suma, muito já se fez e ainda muito mais há de se fa-
zer para combater o problema da poluição de polímeros sintéti-
cos nos mares. Contudo é notório o avanço do direito interna-
cional do ambiente a fim de resolver a questão. Atualmente, é
necessária a vontade dos próprios Estados para dirimir o pro-
blema, mas isto surgiu claramente da iniciativa da sociedade
internacional, até porque o tema não pode ser solucionado por
apenas um país, já que se trata de uma demanda de caráter ab-
solutamente global.

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Poluição marinha por plásticos e o direito internacional do ambiente

  • 1. Ano 2 (2013), nº 12, 14473-14500 / http://www.idb-fdul.com/ ISSN: 2182-7567 POLUIÇÃO MARINHA POR PLÁSTICOS E O DIREITO INTERNACIONAL DO AMBIENTE Tiago Vinicius Zanella* Resumo: A poluição marinha por plásticos é uma realidade que se impõe à sociedade internacional, causando graves danos de caráter ambiental, econômico e até mesmo social. Assim, o objetivo deste artigo é analisar a real dimensão do problema apresentado, quais suas consequências para o meio marinho e como o direito internacional do ambiente regula a questão. Para isso, primeiramente, precisamos entender como surgiu e qual a atual situação do problema. Também analisaremos qual o papel do direito no combate e prevenção da poluição por plásticos entendendo a evolução tanto do problema em si como do pró- prio direito internacional do ambiente; qual o papel da soft law perante o tema; e como o sistema internacional regulamenta a poluição marinha por plásticos. Palavras-chave: Plástico, poluição, direito ambiental internaci- onal. 1. INTRODUÇÃO AO PROBLEMA desenvolvimento industrial é absolutamente um valor social e cultural contemporâneo e a tecno- logia é o instrumento imprescindível para a reali- zação deste objetivo em todo o planeta. Com a revolução industrial, a ação humana sobre o meio intensificou-se. O meio ambiente tornou-se, sob o ponto de vista utilitarista, mais ampla e profundamente aproveitado e * Doutorando em Ciências jurídico-internacionais e europeias pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
  • 2. 14474 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 explorado. Todavia, algumas inovações tecnológicas causam profundas transformações nas relações sociais e trouxeram de maneira indesejada e inesperada, certos impactos nocivos à sociedade e ao meio ambiente. Uma consequência natural e já muito conhecida é a poluição ambiental advinda do desenvol- vimento industrial, em especial a grande quantidade de resí- duos que acaba desperdiçada. Neste viés, nos últimos 40 anos houve uma mudança drástica na natureza destes resíduos, sen- do introduzida no meio ambiente uma quantidade cada vez maior de materiais sintéticos como o plástico1 . Em um momento que muito se discute sobre a utilização de produtos plásticos (como as sacolas), pouco se conhece da consequência poluidora destes polímeros sintéticos nos ocea- nos, que formam enormes ilhas, verdadeiros aterros gigantes- cos de lixo. Existem poucos estudos científicos sérios sobre este problema de forma global, sobretudo no âmbito do direito internacional do ambiente. Em especial na doutrina brasileira quase nada se produziu e discutiu acerca do tema, não obstante sua importância e graves consequências de âmbito internacio- nal. Como destaca Kara Lavender (e outros), “no oceano aber- to, a abundância, distribuição e variabilidade temporal e espa- cial de detritos de plástico são pouco conhecidas, apesar de uma crescente conscientização do problema”2 . Todavia, princi- palmente na doutrina estrangeira, a questão vem ganhando ca- da vez mais atenção e importância. Alguns artigos e bibliogra- fia de relevo já foram produzidos acerca do tema, a despeito da sua atualidade. Presentemente, as fontes terrestres de poluição marinha são consideradas uma das quatro maiores ameaças aos oceanos 1 KNIGHT, Geof. Plastic Pollution. Heinemann/Raintree, EUA; 2012. 2 LAVENDER, Kara; MORET-FERGUSON, Skye ; MAXIMENKO, Nikolai A.; PROSKUROWSKI, Giora; PEACOCK, Emily E., HAFNER, Jan; REDDY, Chris- topher M. Plastic Accumulation in the North Atlantic Subtropical Gyre. Revista Science; setembro de 2010. P. 1. Tradução do autor.
  • 3. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14475 do mundo3 , sendo causadoras de graves problemas sócio ambi- entais. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), já em 1997 cerca de 6,4 milhões de tone- ladas de lixo eram introduzidos nos oceanos anualmente. Ain- da, segundo o PNUMA, atualmente há uma estimativa de que existam 13.000 fragmentos de material plástico por quilômetro quadrado em todos os oceanos. Este total representa cerca de 70% de todos os detritos alijados no mar4 . Sendo assim, precisamos entender que as grandes corren- tes de superfícies dos oceanos são formadas sobretudo pelo chamado Efeito Coriolis. Esta é uma força que, sem maiores digressões acerca de seu conceito físico exato5 , tem grande influência nos oceanos formando grandes giros na superfície dos mares. No hemisfério norte, estes giros possuem uma rota- ção em sentido horário, enquanto no hemisfério sul, o sentido é anti-horário. Ou seja, as correntes marítimas são influenciadas por esta força Coriolis que forma enormes vértices na superfí- cie dos oceanos6 . Ocorre que toda poluição terrestre que é despejada nos mares, ou é dissolvida ou acaba caindo nas correntes marítimas e são transportadas pelos oceanos. Com a formação destes enormes giros oceânicos, todo material plástico, que não é dis- solvido, vai sendo acumulado em seu interior. Isto é, forma-se uma zona de convergência, como “uma rodovia de entulho”, que transporta o lixo plástico até o interior destes giros. É uma 3 As outras três grandes ameaças são: exploração excessiva dos recursos biológicos do mar; alteração/destruição física do habitat marinho; e a dispersão de espécies marinhas exóticas. Segundo a Organização Marítima Internacional (IMO). Os dados estão disponíveis em: http://www.imo.org/Pages/home.aspx . Acesso em 16 de janeiro de 2012. 4 Dados disponíveis em: http://www.unep.org/regionalseas/marinelitter/about/distribution/default.asp . Aces- so em 16 de janeiro de 2012. 5 Para um aprofundamento sobre o conceito do Efeito Coriolis e suas implicações físicas e hidrodinâmicas ver STOMMEL, Henry M.; MOORE, Dennis W. An intro- duction to the Coriolis force. Columbia University Press, EUA; 1989. 6 STOMMEL, Henry M.; MOORE, Dennis W. Op. Cit.
  • 4. 14476 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 questão física, na qual os detritos são transportados pelas cor- rentes e despejados em seu interior. Pode levar vários anos para que os resíduos alcancem esta área, dependendo de sua origem. O plástico pode ser trazido desde o interior dos continentes através de esgotos, regatos e rios, ou pode simplesmente vir da costa. De qualquer maneira, pode ser uma viagem de seis ou sete anos antes de rodar na mancha de lixo. Como afirma Joep Koene, “deste modo, os materiais plásticos ficam a flutuar em torno destes giros por anos até acabarem no centro do que chamamos de “sopa de plástico”7 . A primeira vez que se teve a real dimensão do problema foi em 1997. Quando o americano Charles Moore e sua tripula- ção, após participarem de uma regata, voltavam de catamarã do Havaí para o sul da Califórnia. O capitão decidiu alterar o cur- so e experimentar uma nova rota, um pouco mais ao norte, pas- sando pela borda do chamado Giro Subtropical do Pacífico Norte, uma grande área do oceano que, apesar das águas cal- mas, normalmente era evitada pelos marinheiros. Nesta região, Moore encontrou praticamente todo objeto possível de ser feito com plástico8 : “Na região oriental do Giro ele [Charles Moore] en- controu uma quantidade substancial de lixo, principalmente plástico, espalhados por toda a área. Hoje comumente chama- do de Grande Mancha de Lixo do Pacífico, a enorme sopa de plástico (que se estende da superfície à coluna d’água) con- tém de tudo, desde redes de pesca abandonadas (redes fan- tasmas), garrafas de plástico, tampas de garrafas, escovas de dente, containers, caixas, além de minúsculas partículas de plástico que foram reduzidas pela ação das ondas ou pela luz solar (fotodegradação)”9 . 7 KOENE, Joep. (coord) Plastic Soup: Mapping the first steps towards solutions. Wageningen University Press. Países Baixos; 2010. P. 10. Tradução do autor. 8 Após esta viagem Charles Moore criou a Fundação de Pesquisa Marinha Algalita (AMRF, na sigla em inglês) a fim de estudar e promover a analise e a discussão acerca da poluição por plástico, sobretudo na Grande Mancha de Lixo do Pacífico. 9 Depoimento do Capitão Charles Moore. Disponível em http://www.algalita.org/about-us/index.html#History . Acesso em 16 de janeiro de
  • 5. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14477 Com uma área estimada em mais de 1,3 milhão de qui- lômetros quadrados de superfície e com cerca de 10 metros de profundidade10 , o lixão do Pacífico cobre uma extensão maior que o estado do Pará. E também não é o único, pois existem mais cinco grandes giros oceânicos semelhantes no mundo: Atlântico Norte e Sul, Pacífico Norte e Sul, e no Índico. Toda- via, grande parte desta sujeira não é facilmente visível. Isso porque, embora a maioria dos plásticos não seja biodegradável, a ação do Sol e da água faz boa parte deles se fragmentarem relativamente rápido, sumindo da vista humana. A própria Grande Mancha do Pacífico, com uma estimativa de 150 mi- lhões de toneladas de plásticos, é na sua maioria uma grande sopa de água e fragmentos plásticos11 . Segundo dados do PNUMA, estima-se que cerca de 80% de todo lixo plástico marinho seja proveniente de fontes terres- tres e os 20% restantes venha de fontes no próprio oceano, co- mo dos navios. Isto é, a maior parte de todo o material plástico que se encontra atualmente nos cinco grandes giros são origi- nários do lixo terrestre12 . Deste modo, podemos classificas as fontes em quatro grandes grupos: a) Turismo no litoral: detritos deixados pelos banhistas no litoral como embalagens de alimentos, bebidas, brinquedos, entre outros. b) Esgotos que deságuam no mar: incluem os esgotos, águas de bueiros e até mesmo de rio e da chuva. Estas águas carregam todo tipo de lixo plástico. Esta é a principal fonte de todo plástico depositado nos oceanos. c) Exploração dos recursos, em especial a pesca: incluem 2012. Tradução do autor. 10 ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul. Plastic Debris in the World’s Oceans. PNUMA; 2011. 11 ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul. Op. Cit. 12 Dados disponíveis em: http://www.unep.org/regionalseas/marinelitter/about/distribution/default.asp . Aces- so em 16 de janeiro de 2012.
  • 6. 14478 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 linhas e redes de pesca, iscas, boias, entre tantos outros materi- ais de plásticos que são perdidos ou dolosamente jogados no mar. d) Navios: muito material plástico é alijado aos oceanos pelas embarcações, sobretudo as mercantes. Para depositar seu lixo nos portos que atracam, estes navios devem pagar uma taxa ao Estado costeiro. Desta forma, a fim de evitar o paga- mento destas taxas, muitas embarcações acabam deliberada- mente atirando seu lixo nos mares13 . As consequências ambientais do problema são notórias. Como afirma Kara Lavender (e outros): “Os plásticos são um importante contaminante dos oceanos no mundo. Sua biodegradação química lenta permite que estes polímeros sintéticos permaneçam no ambiente ma- rinho por décadas ou mais. Os impactos ambientais dos plás- ticos nos oceanos são enormes e incluem complicações à fau- na marinha com a ingestão [destes plásticos] por aves e de- mais organismos que variam desde plânctons até mamíferos marinhos; dispersão de espécies microbianas para águas de onde não são nativas; transporte de contaminadores orgânicos em vários níveis tróficos”14 . Praticamente toda vida marinha pode ser colocada em risco pelo plástico. A ingestão desta sopa de polímeros sintéti- cos causa a morte de milhares de espécies todo ano. Ainda, por repelirem a água, a resina do plástico acaba atraindo diversos outros tipos de poluentes hidrofóbicos, principalmente compos- tos orgânicos venenosos como pesticidas (DDT) e bifenilos policlorados (PCBs), funcionando como verdadeiras esponjas de sujeira. Estas substâncias - além do próprio plástico, tratado com aditivos tóxicos como bisfenol A, que podem causar cân- cer e infertilidade - vão se acumulando ao longo da cadeia ali- 13 DEMERITT, Sean Bennjamin. Marine plastic pollution: varying impacts on ma- rine wildlife in Oregon's coastal zone. University of Oregon, EUA; 1990. 14 LAVENDER, Kara; MORET-FERGUSON, Skye ; MAXIMENKO, Nikolai A.; PROSKUROWSKI, Giora; PEACOCK, Emily E., HAFNER, Jan; REDDY, Chris- topher M. Op. Cit. Tradução do autor.
  • 7. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14479 mentar e podem chegar aos seres humanos. O principal animal que consome estes plásticos são os plânctons, base de toda ca- deia alimentar marinha. Em coleta de plânctons foi detectado que mais de 60% das espécies capturadas continham traços e resquícios de polímeros15 . Pelo menos 267 espécies diferentes são conhecidas por terem se entrelaçado ou ingerido detritos de plástico, incluindo as aves marinhas, tartarugas, focas, leões marinhos, baleias, peixes, entre outros. Deste modo, a enorme quantidade de ma- terial plástico nos oceanos constitui uma real ameaça à fauna marinha, comprometendo as mais variadas espécies. Ainda, as consequências podem ser maiores. O acumulo de detritos de plástico pode funcionar como uma balsa e transportar espécies exóticas de uma região à outra. Os danos aos recifes de corais também podem ser amplos, uma vez que esta espécie é sensível a alterações no seu habitat e o material plástico, sobretudo pro- dutos de pesca, causa a destruição destes corais16 . Soma-se a isto o fato de as perdas econômicas em razão da poluição marinha por plásticos serem enormes. As princi- pais (e diretas) implicações econômicas do problema assentam, entre outros, nas avarias às embarcações e na diminuição da pesca. No primeiro caso os detritos de plásticos causam danos às hélices, bem como entopem as tubulações e sistemas de res- friamento de água. Já as perdas do setor pesqueiro podem ser ainda maiores. Neste sentido, afirma Paul Hagen: “Plásticos no ambiente marinho matam um grande número de peixes. Redes feitas de algodão e outros materiais biodegradáveis, que rapidamente se desintegram na água sal- gada são agora quase que exclusivamente construídas somen- te com materiais sintéticos. [...] No Pacífico Norte estima-se que são introduzidas aproximadamente 1.624 milhas de redes de pesca a cada ano. Estas redes de pescas perdidas ou joga- das no meio marinho continuam fortes o suficiente para cap- 15 Idem. 16 ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul. Op. Cit.
  • 8. 14480 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 turar peixes e animais marinhos por cerca de seis anos. As- sim, estas redes fantasmas podem esgotar os recursos mari- nhos por anos ao prenderem os peixes e outros animais. Em 1974 armadilhas de lagostas perdidas ou descartadas no mar na costa da Nova Inglaterra, principalmente construídas com material sintético, foram responsáveis por uma perda anual estimada em mais de 248 milhões de dólares”17 . Em suma, as perdas socioambientais e econômicas da po- luição marinha por plásticos são incalculáveis, além de possí- veis danos à saúde humana. Assim, apesar da atualidade da descoberta de sua real dimensão, a questão já se tornou um problema ambiental socialmente construído. A partir, sobretu- do de 1997, momento no qual é tornada mundialmente conhe- cida a questão das grandes sopas de plásticos nos giros oceâni- cos, o problema passa por um processo de construção social. Assim, podemos analisar o tema sob o viés da Teoria Constru- tivista proposta por Hannigan, segundo a qual um problema ambiental só se torna realmente um problema na medida em que for construído socialmente como tal18 . Assim, a poluição marinha por plásticos, além de já ser compreendida internacio- nalmente como um problema ambiental de consequências gra- ves, também começa a ser normatizada e regulada pelo direito internacional do ambiente. 2. O DIREITO INTERNACIONAL DO AMBIENTE E A PO- LUIÇÃO MARINHA POR PLÁSTICO 2.1. A EVOLUÇÃO NA PROTEÇÃO AMBIENTAL DOS 17 HAGEN. Paul E. The international community confronts plastics pollution from ships: MARPOL Annex V and the problem that won't go away. American Universi- ty International Law Review 5, n° 2, P 425-496, EUA; 1990. P. 440 e 441. Tradução do autor. 18 HANNIGAN, J. A. Sociologia ambiental: a formação de uma perspectiva social. Instituto Piaget, Lisboa; 1995. P 11: “(...) os problemas ambientais não se materiali- zam por eles próprios; em vez disso, eles devem ser construídos pelos indivíduos ou organizações que definem a poluição, ou outro objectivo como preocupante e que procuram fazer algo para resolver o problema”.
  • 9. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14481 MARES: DE RES NULLIUS A RES COMMUNIS Historicamente, a primeira tentativa de entender a natu- reza jurídica dos mares surgiu com a teoria da Res Nullius19 , que pode ser entendida como aquilo que não pertence a qual- quer pessoa. Esta teoria visava defender os mares das reivindi- cações de soberania dos Estados, ou seja, este espaço não esta- va sujeito a nenhuma regulamentação jurídica. Os países não possuíam qualquer jurisdição exatamente porque aí não existe nenhum direito que possa ser aplicado. A partir de então houve uma evolução no conceito dos mares que foi influenciado (e ao mesmo tempo influenciou) pelo direito internacional do ambi- ente. Neste viés, foi no final dos anos 60 que a comunidade in- ternacional acordou para a questão da proteção do meio ambi- ente no plano jurídico. Isso não quer dizer que anteriormente não existissem convenções internacionais com temáticas ambi- entais, porém é somente a partir desta época que verdadeira- mente se inicia o processo jurídico internacional de proteção e preservação do meio ambiente. Como destaca Carla Amado Gomes: “Assim, é verdade que o volume de instrumentos in- ternacionais produzidos desde os anos 1970 tem aumentado proporcionalmente à progressiva constatação, facticamente aferível e cientificamente comprovável, de que os bens ambi- entais naturais do Globo se encontram em adiantado estado de esgotamento”20 . São vários os fatores que contribuíram para esse desper- 19 Esta teoria surgiu no século XVII para combater a ideia de apropriação dos mares e rotas marítimas defendidas alguns Estados, como Portugal e Espanha. Contudo, existe uma evolução histórica anterior, que surge na antiguidade, passando pelo período romano, idade média e moderna. Todavia, para nós, vale entendermos a evolução a partir desta teoria da Res Nullius, até porque foi a primeira vez que se teorizou sobre o tema. 20 GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na juris- prudência internacional. In.: Elementos de apoio è disciplina de Direito Internacio- nal do Ambiente. P. 367 a 408. AAFDL, Lisboa; 2008. P. 370.
  • 10. 14482 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 tar internacional da temática ambiental. Podemos destacar al- guns mais importantes, como a publicação de trabalhos aca- dêmicos de alerta para as questões ambientais, como o livro Silent Spring (Primavera Silenciosa) em 1962 de Rachel Car- son21 . Esta obra é considerada um marco de alerta para a situa- ção da degradação ambiental pela intervenção humana. Outro fator decisivo assenta na conscientização e envolvimento popu- lar nas discussões socioambientais a partir desta época. No nosso “Água de lastro: um problema ambiental global” nos expressamos da seguinte maneira em relação ao assunto: “Se no início de 1960 somente algumas pessoas fala- vam em preservação do meio ambiente, em abril de 1970 quase meio milhão de indivíduos participaram do Dia da Ter- ra nos Estados Unidos. Isto retratava a expansão do ambienta- lismo no meio popular e dava força para o nascimento de inúmeras organizações não governamentais, mesmo que sem uma representatividade política forte. O preservacionismo e conservacionismo, que dominaram o ambientalismo nas dé- cadas anteriores, eram revigorados e começaram a se preocu- par com as questões socioambientais”22 . Outrossim, podemos destacar os grandes acidentes e in- cidentes de proporções globais que influenciaram sobremaneira a realização de convenções internacionais para a proteção do meio ambiente. Em especial para os espaços marítimos, os aci- dentes ambientais foram decisivos para a negociação, assinatu- ra e ratificação de tratados multilaterais de caráter ambiental. O avanço tecnológico e industrial possibilitou a evolução da in- dústria naval que foi se tornando capaz de produzir navios cada vez maiores. Contudo, este progresso trouxe consigo graves consequências para o meio ambiente marinho, pois os desastres ambientais também se tornaram maiores. Afirma Guido Fer- nando da Silva Soares que: “(...) os espaços marinhos e oceânicos são o meio am- 21 CARSON, Rachel. Silent Spring. Houghton Miffin Co, Boston; 1962. 22 ZANELLA, Tiago Vinicius. Água de Lastro: um problema ambiental global. Juruá, Curitiba; 2010. P. 29.
  • 11. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14483 biente que mais tem sofrido danos de natureza catastrófica, a partir da entrada em cena de superpetroleiros, navios super- dimensionados em tamanho que levam com eles os riscos de uma extraordinária capacidade de destruição do meio ambien- te marinho e das atividades comerciais e de entretenimento relacionados ao uso de praias dos países banhados por essas águas”23 . O primeiro grande desastre ambiental marítimo ocorreu em março de 1967, no Canal da Mancha. O petroleiro Torrey Canyon, registrado sob a bandeira de conveniência da Libéria, chocou-se contra um rochedo, naufragando e derramando cerca de cento e dezoito mil toneladas de óleo cru nas águas do Mar do Norte, que atingiu a costa da Grã-Bretanha causando prejuí- zos incalculáveis. Para consumir o óleo que ainda restava a bordo da embarcação a Royal Air Force britânica teve que bombardear o navio provocando um incêndio24 . Esse desastre ganhou notoriedade internacional em razão de suas proporções. A mobilização para minimizar os impactos de novos acidentes deu origem à Conferência de Bruxelas, em 1969. Esta, que resultou na adoção da Convenção Internacional sobre Respon- sabilidade Civil por danos causados por Poluição por Óleo (CLC/69), teve por finalidade determinar responsabilidades e, sobretudo, prevenir novos acidentes. Outras importantes convenções surgiram na década de 1970 a respeito do meio marinho e seus problemas ambientais. Em dezembro de 1972, foi celebrada em Londres a Convenção Sobre Prevenção da Poluição Marinha por Alijamento de Resí- duos e outras Matérias (LC-72), também denominada Conven- ção de Londres. Esta visava prevenir a poluição marítima por resíduos industriais e químicos e previu uma ação internacional para controlar a contaminação dos oceanos por alijamento de resíduos ou substâncias lesivas à saúde humana. Outro impor- 23 SOARES, Guido Fernando da Silva. A proteção internacional do meio ambiente: emergência, obrigações e responsabilidades. 2e Ed. Atlas, São Paulo; 2003. P. 227. 24 BARROS, José Fernando Cedeño de. Direito do mar e do meio ambiente. Adua- neiras, São Paulo; 2007.
  • 12. 14484 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 tante documento de direito ambiental internacional deste perío- do foi assinado na Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios, realizada em 1973, e seu protocolo de 1978 (MARPOL 73/78). Esta convenção criou vários meca- nismos de prevenção e controle da poluição, instituindo relató- rios, vistorias e certificados de inspeção das embarcações. Com efeito, quanto à evolução dos problemas ambientais marinhos e o direito do mar, a principal conferência já realiza- da foi a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar (CNUDM) de 1982 assinada em Montego Bay, Jamaica. Esta Convenção, sem sombra de dúvida, foi e continua sendo um marco nas discussões ambientais marítimas e do direito do mar como um todo. Num único documento concretizaram-se impor- tantes normas e regras de direito do mar, bem como ficou defi- nido em termos jurídicos todos os elementos físicos que com- põem o mar, com notória atenção às regras de preservação do meio ambiente marinho25 . A proteção e preservação do meio marinho é uma preo- cupação constante da Convenção de Montego Bay. Tanto na Parte XII, com dispositivos específicos de “proteção e preser- vação do meio marinho”, quanto em artigos esparsos, a CNUDM é inovadora e estabelece um regime de preservação ambiental muito bem detalhado e consistente. Como afirma a Carla Amado Gomes: “foi no âmbito do Direito do Mar que primeiro se logrou estabelecer um regime geral de proteção do meio ambiente, na Convenção das Nações Unidas sobre o Di- reito do Mar, de 10 de dezembro de 1982”26 . Esta evolução na proteção ambiental do meio marinho corroborou de forma decisiva para um novo entendimento do 25 ZANELLA, Tiago Vinicius. Direito da Navegação: liberdades e restrições da navegação marítima no direito internacional. Dissertação de mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa; 2010. 26 GOMES. Carla Amado. A protecção internacional do ambiente na Convenção de Montego bay. In.: textos dispersos de direito do ambiente. Vol I. P. 187 a 222. AAFDL, Lisboa; 2008. P. 190.
  • 13. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14485 conceito e natureza jurídica dos mares, em especial do alto mar, onde se situam os grandes giros oceânicos. De um enten- dimento de que o mar não pertencia a ninguém – Res Nullius – se passou a compreender este espaço a partir da teoria da Res Communis, isto é, “coisa comum”. Assim, o mar passou a per- tencer a todos os Estados de forma conjunta e simultânea. É um espaço onde todos os países possuem os mesmos direitos, sen- do insuscetível de apropriação por parte individual. Ainda, o oceano (alto mar) é de toda sociedade internacional, sendo compartilhado não apenas pelos Estados, mas também por ou- tros sujeitos de direito internacional como a ONU; suas agên- cias especializadas; a Agência Internacional de Energia Atômi- ca; a Autoridade Internacional para os Fundos Marinhos27 . 2.2. A RESPONSABILIDADE DOS ESTADOS POR DANOS AO MEIO MARINHO: O PAPEL DA SOFT LAW O estudo da responsabilidade dos Estados por danos ao meio marinho passa necessariamente pela análise da sotf law no direito internacional do ambiente. Não existe uma definição exata da expressão, que ainda passa por uma fase de construção conceitual. Todavia, podemos entendê-la como uma norma contraposta à hard law, ou seja, sem a força do valor normativo obrigacional. Existem no direito internacional normas jurídicas com força obrigacional e caráter jurídico (hard law) e os textos desprovidos deste caráter. Contudo, também há normas que ficam num meio termo, em uma zona cinzenta entre o direito e o não direito, entre os textos que criam um vinculo jurídico e os que não criam, essas são as chamadas sotf laws. Assim, po- demos entender a expressão inglesa como aquelas regras inter- nacionais cujo valor normativo é menos constringente que o das demais normas jurídicas tradicionais, porém sem perder totalmente o caráter jurídico. Ainda, a tradução da expressão 27 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto Mar. Renovar, Rio de Janeiro; 2001.
  • 14. 14486 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 sotf law para outros idiomas também é muito difícil. Para o português podemos traduzi-la como um direito flexível, direito maleável, direito plástico, entre outros28 . A principal finalidade da sotf law é regulamentar com- portamentos futuros, para isso tem um duplo papel: a) fixar metas para futuras ações políticas internacionais; b) recomen- dar aos Estados a criação de normas jurídicas internas. Assim, mesmo sem o grau de cogência nem o status de norma jurídica da hard law, a relevância para o direito internacional da sotf law é muito grande. Estas normas representam uma espécie de obrigação moral aos Estados. Como afirma Valerio de Oliveira Mazzuoli: “Muitas dessas regras de soft law visam regulamentar futuros comportamento dos Estados, norteando sua conduta e dos seus agentes nos foros internacionais multilaterais, esta- belecendo um programa de ação conjunta, mas sem pretender enquadrar-se no universo das normas convencionais, cujo tra- ço principal é a obrigatoriedade de cumprimento do que ali fi- cou acordado. Isto não significas que o sistema de “sanções” também não exista, sendo certo que o seu conteúdo será mo- ral ou extrajurídico em caso de descumprimento ou inobser- vância das suas diretrizes”29 . Para o direito internacional do ambiente a importância da soft law é muito grande. Se este fenômeno não esta restrito às normas internacionais de foro ambiental, é neste ramo do direi- to que mais se multiplicam e ganham espaço. As incertezas científicas sobre os processos naturais e as influências da ação humana no meio, aliadas ao alto custo político e econômico das regras de direito ambiental, fazem com que as normas de soft law sejam utilizadas com bastante frequência. Os Estados mui- tas vezes não assumem compromissos que possam frear seus crescimentos econômicos. Historicamente, a dicotomia entre a preservação ambiental e o crescimento da economia sempre 28 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 5° Ed. Editora RT, São Paulo; 2011. 29 Idem. P. 158.
  • 15. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14487 moveu as políticas ambientais internacionais e, consequente- mente, o direito. A declaração do General Costa Cavalcante, chefe da delegação brasileira na Conferência de Estocolmo em 1972, demonstra de forma precisa o receio do Brasil e de de- mais países em desenvolvimento contrários às propostas que limitavam o crescimento econômico em prol da preservação do ambiente: “para a maioria da população mundial a melhoria de condições é muito mais uma questão de mitigar a pobreza, dis- por de mais alimentos, melhorar vestimentas, habitação, assis- tência médica e emprego do que reduzir a poluição”30 . A regulação de acesso e gestão de bens naturais pelo di- reito internacional do ambiente é uma intercessão que envolve cercear o aproveitamento de recursos que até então são consi- derados bens de fruição e apropriação, sem qualquer preocupa- ção com a gestão racional. Aí residem a dificuldade e a resis- tência por parte dos Estados em dispor das suas prerrogativas de exploração dos recursos naturais ambientais de forma desre- grada em favor da regulamentação e gestão internacional. A normatização parte necessariamente da relativização dos direi- tos soberanos dos Estados da utilização exclusiva ou partilhada de bens naturais, o que nem sempre é de fácil alcance, uma vez que depende da vontade estatal. Como bem destaca Carla Amado Gomes: “(...) a força cogente das convenções ambientais é di- rectamente proporcional à resistência dos Estados em auto- limitar-se nos seus direitos de exploração dos bens naturais mais valiosos do ponto de vista econômico. Daí que o sof law impere no Direito Internacional do Ambiente ou, por outras palavras, este seja um domínio de ‘normatividade relativa’ ”31 . A falta de normatividade das regras internacionais de preservação e gestão do meio ambiente é visualizada no cená- 30 SOUZA, Marcelo Pereira de. Instrumentos de Gestão Ambiental: fundamentos e prática. Riani Costa, São Paulo; 2000. P. 6. 31 GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na juris- prudência internacional. Op. Cit. P. 370.
  • 16. 14488 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 rio internacional através de alguns fatores. Não é somente a utilização nas convenções internacionais das expressões como “Os Estados esforçar-se-ão por...”, “As partes envidarão as diligências mais adequadas para...”, que se verifica a utilização da soft law nesta área do direito. Na prática, alguns são os fato- res e ao mesmo tempo consequências deste fenômeno, entre eles podemos descartar: a) a falta de uma instância jurisdicio- nal internacional para julgar as lides de caráter ambiental com competência para emitir decisões compulsórias; b) a inexistên- cia, como regra, da possibilidade de acesso aos tribunais inter- nacionais pelos indivíduos. (Atualmente apenas os Estados são sujeitos ativos de lides internacionais ambientais); c) a necessi- dade de consentimento do Estado violador como pressuposto para a submissão do litígio à Corte Internacional de Justiça (ou outro tribunal). Somente com a permissão estatal uma querela de caráter ambiental pode ser analisada pelos tribunais interna- cionais, o que permite que um possível Estado infrator de nor- mas ambientais nunca seja julgado32 . Entretanto, a utilização da soft law não é necessariamente negativa, acabando por produzir efeitos de caráter prático posi- tivos e por equilibrar a regulação jurídica internacional, não pendendo apenas para a proteção do meio e deixando margina- lizados seus efeitos e consequências econômicas. Ainda, é me- lhor uma declaração de vontade que reúna um vasto conteúdo programático de preservação, com um grande número de Esta- dos signatários, do que um tratado hard law que pouquíssimos países ratificam. Neste víeis, os efeitos positivos da soft law podem ser comprovados pelos resultados obtidos a partir da Rio 92, como destaca Guido Fernando Silva Soares: “Na ocasião, no Rio, houve duas decisões de soft law, dirigidas a futuros comportamentos dos Estados, na esfera das relações internacionais: a fixação de forma imperativa dos temas para a subsequente sessão da AG da ONU, de início de 32 GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na juris- prudência internacional. Op. Cit..
  • 17. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14489 negociações, sobre a questão do combate à desertificação, bem como a convocação de uma conferência da ONU para tratar dos problemas da pesca em alto-mar. De tais entendi- mentos, resultaram após negociações, a Convenção das Na- ções Unidas para o Combate à Desertificação Naqueles Países que Experimentam Sérias secas e/ou Desertificação, Particu- larmente na África, em 17 de julho de 1994, em Nova Yor- que, e o Acordo para a Implementação das Provisões da Con- venção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 10 de dezembro de 1982, Relativas a Convenção e Gerenciamento de Espécies de Peixe Altamente Migratórios e Tranzonais, adotado em Nova Yorque, em 4 de agosto de 1995”33 . Diante do exposto percebemos que o contencioso inter- nacional ainda é regido pelo princípio da soberania do Estado sobre os recursos naturais em seu território ou sob sua jurisdi- ção e controle. Não se aplica uma lógica altruísta de proteção do ambiente como riqueza coletiva, fonte de equilíbrio do ecossistema mundial e responsável pela existência e sobrevi- vência da espécie humana. Contudo, não podemos ignorar a importância da regulamentação internacional, mesmo que atra- vés da soft law. Como dito, é melhor uma legislação com nor- matividade relativa do que nenhuma normatização. Para o meio marinho, em especial na proteção contra a poluição por plásti- co, as normas internacionais ainda não são as ideias, porém, como veremos adiante, a preocupação já existe e a regulação procura nortear a atuação dos Estados no sistema internacional. 2.3. A NORMATIZAÇÃO INTERNACIONAL PARA PRO- TEÇÃO CONTRA POLUIÇÃO MARINHA POR PLÁSTI- COS A poluição marinha por plásticos é um problema ambien- tal de caráter essencialmente internacional. Como visto, a prin- cipal área afetada por este tipo de poluição é o Alto Mar, sendo 33 SOARES, Guido Fernando da Silva. A proteção internacional do meio ambiente. Manoele, Barueri; 2003. P. 92 e 93.
  • 18. 14490 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 sua principal fonte a terrestre, com cerca de 80%, contra a po- luição por navios que representa 20%. Assim, é de fundamental importância acordos e tratados internacionais para dirimir o problema, uma vez que apenas através de uma atuação conjun- ta da sociedade internacional como um todo é que se poderá preservar e proteger o espaço marinho contra a poluição por plásticos. Deste modo, começamos por analisar o principal tratado internacional sobre o direito do mar, a Convenção das Nações Unidas sobre o direito do Mar de 1982. (CNUDM). Este, espe- cificamente na Parte XII, normatiza a proteção e preservação do meio marinho como um todo. O principal desígnio desta Parte é regular de forma ampla e total a proteção do meio ma- rinho. Para isto, como regra, a CNUDM traz artigos que ver- sam sobre questões gerais, fazendo recomendações aos Estados sobre o tema do ambiente34 . Alguns artigos fazem menção à poluição de forma genérica, mas que englobam de forma preci- sa o problema da poluição marinha por plásticos. Podemos destacar primeiramente o artigo 194 da Convenção de 1982 que afirma que todos os Estados têm o dever de preservar o meio marinho: “ARTIGO 194 Medidas para prevenir, reduzir e controlar a poluição do meio marinho 1. Os Estados devem tomar, individual ou conjunta- mente, como apropriado, todas as medidas compatíveis com a presente Convenção que sejam necessárias para prevenir, re- duzir e controlar a poluição do meio marinho, qualquer que seja a sua fonte, utilizando para este fim os meios mais viá- veis de que disponham e de conformidade com as suas possi- bilidades, e devem esforçar-se por harmonizar as suas políti- cas a esse respeito. 34 Existem artigos específicos sobre a proteção ambiental de determinadas espécies, como é o caso dos peixes anádromos e catádromos, nos artigo 66 e 67 da CNUDM, respectivamente. Contudo na sua maioria a Convenção, a pesar de regular de forma abrangente a proteção marinha, transfere a responsabilidade de regulamentar os casos específicos aos próprios Estados.
  • 19. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14491 (...) 3 As medidas tomadas, de acordo com a presente Par- te, devem referir-se a todas as fontes de poluição do meio ma- rinho. Estas medidas devem incluir, inter alia, as destinadas a reduzir tanto quanto possível: a) a emissão de substancias tóxicas, prejudiciais ou nocivas, especialmente as não degradáveis, provenientes de fontes terrestres, provenientes da atmosfera ou através dela, ou por alijamento;”35 . Ademais, a CNUDM procura diferenciar e regulamentar de forma específica a poluição de origem terrestre e a poluição por navios. Primeiro, no artigo 207°, a Convenção faz referên- cia ao dever dos Estados em adotar medidas para prevenir a poluição de origem terrestre: “Os Estados devem adotar leis e regulamentos para prevenir, reduzir e controlar a poluição do meio marinho proveniente de fontes terrestres, incluindo rios, estuários, dutos e instalações de descarga (...)”36 . Depois, já no artigo 210°, é regulada da mesma forma a prevenção de polui- ção por alijamento dos navios: “Os Estados devem adotar leis e regulamentos para prevenir, reduzir e controlar a poluição do meio marinho por alijamento”37 . Fica evidente a intenção da CNUDM em repassar para os Estados o dever de regulamentar a proteção do ambiente marinho. Ainda, os países devem pro- curar atuar “por intermédio das organizações internacionais competentes ou de uma conferência diplomática”38 . Além da Convenção de Montego Bay existem outros acordos internacionais que regulamentam de forma mais espe- cífica a poluição marinha por plásticos. Em especial outros dois tratados regem o tema: a Convenção sobre Prevenção da Polui- ção Marinha por Alijamento de Resíduos e outras Matérias, de 1972 (LC-72); e a MARPOL 73/78 (Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios) em seu Anexo V 35 CNUDM. Art. 194. 36 CNUDM. Art 207, n° 1. 37 CNUDM. Art 210, n° 1. 38 CNUDM. Art 210, n° 4.
  • 20. 14492 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 (Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos Navios) de 1983. A Convenção sobre Prevenção da Poluição Marinha por Alijamento de Resíduos e outras Matérias já em 1972 normati- zava a questão e tinha como principal escopo: “Artigo 1 As Partes Contratantes promoverão, individual e cole- tivamente, o controle efetivo de todas as fontes de contamina- ção do meio marinho e se comprometem, especialmente, a adotar todas as medidas possíveis para impedir a contamina- ção do mar pelo alijamento de resíduos e outras substâncias que possam gerar perigos para a saúde humana, prejudicar os recursos biológicos e a vida marinha, bem como danificar as condições ou interferir em outras aplicações legítimas do mar.” Para atingir o objetivo de proteger o meio marinho da po- luição, a LC-72, que entrou em vigor em 1975, “proíbe o ali- jamento de resíduos ou outras substâncias enumeradas no Ane- xo I”39 . O referido anexo traz um rol de substâncias que ficam proibidas de serem lançadas ao mar, entre elas: “Plásticos per- sistentes e outros materiais sintéticos persistentes, por exemplo, redes e cordas, que podem flutuar ou permanecer em suspensão no mar de tal modo a interferir materialmente com a navega- ção, de pesca ou outras utilizações legítimas do mar”40 . Outros- sim, já em 1972 proibia-se que fosse atirado ao mar qualquer polímero sintético, entretanto nota-se que o principal objetivo desta proibição assentava na segurança da navegação e da pes- ca. Até aquela data não se conhecia o real impacto ambiental e econômico que os plásticos traziam. Assim a preocupação da poluição por plástico ainda residia no entrave à navegação e à exploração dos oceanos e não na preservação ambiental do meio marinho como um bem comum. A Convenção Internacional para a Prevenção da poluição por Navios foi assinada em 1973 e posteriormente emendada 39 LC-72. Art. 4, a. 40 LC-72. Anexo I, n°4.
  • 21. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14493 pelo protocolo adicional de 1978, passando a ser denominada por MARPOL 73/78. O principal objetivo deste tratado é esta- belecer normas para a completa eliminação da poluição oriunda das embarcações, como óleo e outras substâncias danosas. Após sua adoção e emenda, a MARPOL ainda teve o acrésci- mo de seis anexos que versam sobre causas específicas de po- luição41 . Deste modo, a partir da adoção do Anexo V, relativo às Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos Navios, a preocupação com o alijamento de material plástico nos oceanos ganhou efetiva proteção internacional. O anexo mencionado foi assinado em 1983 e entrou em vigor a partir de 1988. Porém, após esta data, já foi revisado em diversas ocasi- ões, sempre sob os auspícios da Organização Marítima Interna- cional (OMI). Atualmente, a última atualização ocorreu através da Resolução MEPC 116 (51), em vigor a partir de 01 de agos- to de 2005. Já existe uma nova atualização que modificará em alguns dispositivos o texto atual através da Resolução MEPC 201 (62), que entrará em vigor a partir de 01 de janeiro de 2013. Todavia, a questão da poluição marinha por plástico não será alterada na sua essência. O Anexo V versa sobre alijamento de todo o tipo de lixo nos oceanos, normatizando quando e como cada material pode ser lançado ao mar. Ademais, o texto regulamenta as áreas permitidas e as proibidas de alijamento de lixo; a proteção de certas áreas especiais; as instalações de recebimento de lixo; o controle do Estado do porto sobre requisitos operacionais; os planos de gerenciamento do lixo; os tipos de materiais, entre outros. Contudo, quanto ao lançamento de plástico a partir das embarcações o anexo é taxativo: “é proibido o lançamento no mar de todos os tipos de plásticos, inclusive, mas não restrin- gindo-se a estes, cabos sintéticos, redes de pesca sintéticas, 41 Anexo I – Óleo; Anexo II – Substâncias Líquidas Nocivas Transportadas a granel; Anexo III – Substâncias Prejudiciais Transportadas em forma Empacotada; Anexo IV – Esgoto; Anexo V – Lixo; Anexo VI – Poluição de Ar.
  • 22. 14494 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 sacos plásticos para lixo e cinzas de incineradores provenientes de produtos plásticos que possam conter resíduos tóxicos ou de metais pesados”42 . A exceção para a proibição de alijamento de material plástico nos mares encontra-se na Regra 6 do Anexo que traz três hipóteses em que é permitido tal lançamento: a) para ga- rantir a segurança da embarcação e das pessoas a bordo, ou de salvar vidas humanas no mar; b) o alijamento involuntário de lixo decorrente de uma avaria sofrida pelo navio ou pelos seus equipamentos, desde que antes e depois dos fatos tenham sido tomadas todas as precauções razoáveis com a finalidade de evitar ou minimizar o lançamento; c) no caso de perda aciden- tal de redes de pesca sintéticas, desde que tenham sido tomadas todas as precauções razoáveis para evitar aquela perda43 . Ainda, em âmbito regional, podemos destacar a Conven- ção para a Proteção e Desenvolvimento do Ambiente Marinho da Região do Grande Caribe de 1983, conhecida como Con- venção de Cartagena. Esta regula, entre outros, tanto a poluição causada por navios, quanto a de origem terrestre: “Artigo 6 º Poluição causada pelo alijamento As Partes Contratantes tomarão todas as medidas apropriadas para prevenir, reduzir e controlar a poluição da área da Convenção pelo alijamento de resíduos e outros mate- riais no mar de navios, aeronaves ou estruturas feitas pelo homem no mar, e para assegurar a aplicação efectiva das re- gras internacionais aplicáveis e padrões. Artigo 7 º Poluição de origem terrestre As Partes Contratantes tomarão todas as medidas apropriadas para prevenir, reduzir e controlar a poluição da área da Convenção causada pela disposição costeira ou por descargas provenientes de rios, estuários, os estabelecimentos do litoral, de descarga, ou quaisquer outras fontes sobre seus 42 Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos Navios. 17 de feve- reiro de 1983. Anexo V da MARPOL 73/78. Regra 3. 43 Idem. Regra 6.
  • 23. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14495 territórios”44 . Todavia, é evidente a falta de uma Convenção de caráter global que regulamente de forma precisa a poluição por plásti- co de origem terrestre, uma vez que 80% de toda poluição ma- rinha deste material tem procedência dos rios e esgotos. A difi- culdade na adoção de um texto internacional nos moldes do Anexo V da MARPOL 73/78 que verse sobre a poluição de origem terrestre é enorme, beirando o inviável. Isto se explica pela impossibilidade de fiscalização por parte da comunidade internacional e pela necessidade de legislação interna que regu- lamente a prevenção e as sanções por descumprimento da lei. Deste modo, a CNUDM se restringe a requisitar dos Estados uma regulação interna sobre da poluição marinha que advém do seu território. Para incentivar e auxiliar no processo de le- gislação interno dos países sobre o tema, foi criada em 1995 sob os auspícios do PNUMA o Programa de Ação Global para a Proteção de Ecossistemas Marinhos ameaçados por ativida- des terrestres com a seguinte finalidade: “O Programa de Ação Global visa impedir a degrada- ção do ambiente marinho a partir de atividades terrestres, fa- cilitando a realização do dever dos Estados de preservar e proteger o ambiente marinho. O programa é projetado para ajudar os Estados a tomar medidas, individual ou conjunta- mente dentro de suas respectivas políticas, prioridades e re- cursos, que levam à prevenção, controle, redução e/ou elimi- nação da degradação do ambiente marinho, bem como a sua recuperação dos impactos causados por atividades terres- tres”45 . Neste sentido, o Programa identificou nove categorias de poluentes de origem terrestre que causam poluição ao meio marinho e nas quais o Programa atua com recomendações e auxílio aos países. Entre estas, o material plástico proveniente 44 Convenção para a Proteção e Desenvolvimento do Ambiente Marinho da Região do Grande Caribe de 1983. 45 Programa de Ação Global para a Proteção de Ecossistemas Marinhos ameaçados por atividades terrestres. Introdução, b. Tradução do autor.
  • 24. 14496 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 sobretudo de esgotos. Assim, representa uma preocupação e motivo de real necessidade de regulação das águas residuais domésticas indevidamente descarregadas nos rios ou direta- mente no mar46 . Em suma, existe uma regulação internacional que se ocu- pa da poluição dos mares, inclusive por material plástico. Esta normatização se ocupa tanto dos poluentes lançados aos ocea- nos pelos navios, como de origem terrestre. Porém fica claro que a legislação internacional por alijamento já alcançou um patamar muito mais elevado no processo de prevenção e prote- ção do meio marinho contra a poluição por plástico. Notada- mente os polímeros sintéticos lançados ao mar a partir da costa, que representam a maior parte de toda poluição com cerca de 80%, ainda não existe uma legislação internacional específica e proibitiva, ficando a encargo de cada Estado o dever de norma- tizar o tema. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS A poluição marinha por plástico é uma realidade que se impõe à sociedade internacional de forma inequívoca. O real dimensionamento do problema ficou evidenciado há relativa- mente pouco tempo, sendo que sua regulação pelo direito in- ternacional do ambiente ainda encontra-se em fase de constru- ção. Deste modo, a assinatura e ratificação das convenções internacionais sobre a questão representam um significativo esforço internacional para dirimir o problema. Assim, a cres- cente normatividade dos textos internacionais sobre o direito do ambiente (como o regime global estabelecido no Anexo V da MARPOL 73/78, por exemplo), representa um passo impor- tante no combate à poluição por plásticos oriunda de embarca- ções. Isto em razão de já trazer obrigações exigíveis aos Esta- dos Partes, além dos próprios indivíduos (capitão, tripulação). 46 Idem. RECOMMENDED APPROACHES BY SOURCE CATEGORY.
  • 25. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14497 A crítica que se faz ao direito internacional do ambiente no combate à poluição marinha por plástico reside na pouca efetividade prática dos seus resultados. Como vimos, mesmo após a adoção dos referidos textos convencionais, a poluição por polímeros sintéticos em todos os oceanos ainda é enorme e continua a crescer. A principal causa destes resultados negati- vos é a falta de regulação específica e obrigacional da preven- ção e controle da poluição de origem terrestre. Como a maior parte de todo o lixo plástico que é lançado nos oceanos provém da costa (rios, esgotos e até das praias), a falta de normativida- de neste sentido traz um atraso ao combate desta degradação. Uma explicação para a falta de textos legais que não se resumam a requisitar dos Estados uma legislação interna para a proteção do meio marinho contra a poluição por plásticos de origem terrestre, pode estar na relativa novidade do tema em questão. Ainda, a dificuldade nesta normatização assenta na necessária autorregulação por parte dos Estados. Esta poluição exige que os próprios países legislem e fiscalizem, até por uma questão de soberania. Difícil imaginar uma convenção multila- teral que obrigue um Estado a coibir os modos de poluição de origem terrestre, criando responsabilidade internacional sem a fiscalização do próprio país. Neste viés, o modo mais coerente encontrado ainda é incentivar as nações a inserir no seu direito interno normas para a prevenção e até mesmo sanções contra esta poluição. Mesmo não estando perto do ideal, a sociedade internaci- onal já se movimenta em prol de ações a curto e médio prazo a fim de dirimir cada vez mais o problema analisado. O Progra- ma de Ação Global é um exemplo evidente disto. Assim, ainda que o direito internacional do ambiente ainda não alcance todos os objetivos necessários para combater a poluição por plásticos no mar, a política internacional e a vontade dos próprios Esta- dos assumem a função de nortear a ações com a finalidade de diminuir a poluição por materiais plásticos nos oceanos.
  • 26. 14498 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 Em suma, muito já se fez e ainda muito mais há de se fa- zer para combater o problema da poluição de polímeros sintéti- cos nos mares. Contudo é notório o avanço do direito interna- cional do ambiente a fim de resolver a questão. Atualmente, é necessária a vontade dos próprios Estados para dirimir o pro- blema, mas isto surgiu claramente da iniciativa da sociedade internacional, até porque o tema não pode ser solucionado por apenas um país, já que se trata de uma demanda de caráter ab- solutamente global.  4. REFERÊNCIAS ALLSOPP Michelle; WALTERS Adam; SANTILLO David; JOHNSTON Paul. Plastic Debris in the World’s Oceans. PNUMA; 2011. BARROS, José Fernando Cedeño de. Direito do mar e do meio ambiente. Aduaneiras, São Paulo; 2007. CARSON, Rachel. Silent Spring. Houghton Miffin Co, Boston; 1962. DEMERITT, Sean Bennjamin. Marine plastic pollu- tion: varying impacts on marine wildlife in Oregon's coastal zone. University of Oregon, EUA; 1990. GOMES. Carla Amado. Apontamentos sobre a protecção do ambiente na jurisprudência internacional. In.: Elementos de apoio è disciplina de Direito Internacional do Ambi- ente. P. 367 a 408. AAFDL, Lisboa; 2008. GOMES. Carla Amado. A protecção internacional do ambien- te na Convenção de Montego bay. In.: Textos dispersos de direito do ambiente. Vol I. P. 187 a 222. AAFDL,
  • 27. RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 | 14499 Lisboa; 2008. HAGEN. Paul E. The international community confronts plas- tics pollution from ships: MARPOL Annex V and the problem that won't go away. American University Inter- national Law Review 5, n° 2, P 425-496, EUA; 1990. HANNIGAN, J. A. Sociologia ambiental: a formação de uma perspectiva social. Instituto Piaget, Lisboa; 1995 LAVENDER, Kara; MORET-FERGUSON, Skye ; MAX- IMENKO, Nikolai A.; PROSKUROWSKI, Giora; PEA- COCK, Emily E., HAFNER, Jan; REDDY, Christopher M. Plastic Accumulation in the North Atlantic Subtropi- cal Gyre. Revista Science; setembro de 2010. KNIGHT, Geof. Plastic Pollution. Heinemann/Raintree, EUA; 2012. KOENE, Joep. (coord) Plastic Soup: Mapping the first steps towards solutions. Wageningen University Press. Países Baixos; 2010. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacio- nal público. 5° Ed. Editora RT, São Paulo; 2011. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto Mar. Renovar, Rio de Janeiro; 2001. OLIVEIRA, Rafael Santos de. Direito Ambiental Internacio- nal: o papel da soft law em sua efetivação. Unijui, Ijuí/RS; 2007. SHEAVLY Seba. Marine debris – an overview of a critical issue for our oceans. Sixth Meeting of the UN Open- ended Informal Consultative Processes on Oceans & the Law of the Sea. 2005. SOARES, Guido Fernando da Silva. A proteção internacional do meio ambiente: emergência, obrigações e responsabi- lidades. 2° Ed. Atlas, São Paulo; 2003. SOARES, Guido Fernando da Silva. A proteção internacional do meio ambiente. Manoele, Barueri; 2003. SOUZA, Marcelo Pereira de. Instrumentos de Gestão Ambien-
  • 28. 14500 | RIDB, Ano 2 (2013), nº 12 tal: fundamentos e prática. Riani Costa, São Paulo; 2000. STOMMEL, Henry M.; MOORE, Dennis W. An introduction to the Coriolis force. Columbia University Press, EUA; 1989. ZANELLA, Tiago Vinicius. Água de Lastro: um problema ambiental global. Juruá, Curitiba; 2010. ZANELLA, Tiago Vinicius. Direito da Navegação: liberdades e restrições da navegação marítima no direito internaci- onal. Dissertação de mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa; 2010. TRATADOS INTERNACIONAIS Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Monte- go Bay; 10 de dezembro de 1982. Convenção para a Proteção e Desenvolvimento do Ambiente Marinho da Região do Grande Caribe de 1983. Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios. (MARPOL 73/78) Convenção sobre Prevenção da Poluição Marinha por Alija- mento de Resíduos e outras Matérias; Londres; 1972. (LC – 72) Regras para a Prevenção da Poluição Causada pelo Lixo dos Navios. 17 de fevereiro de 1983. Anexo V da MARPOL 73/78.