O passeio de Carlos e Ega por Lisboa dez anos depois permite observar como nada mudou na cidade e em sua gente. Eles notam a mesma tristeza, decadência e falta de cultura na sociedade portuguesa. Ao encontrarem Dâmaso, descobrem que ele casou, ilustrando como os antigos amigos seguiram caminhos inesperados.
Slides Lição 9, Betel, Ordenança para uma vida de santificação, 2Tr24.pptx
Os Maias, Eça de Queirós
1. “Episódios da vida romântica”
Crónica de Costumes
Crítica social
Os Maias de Eça de Queirós
2. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
A educação
Jantar no
Hotel
Central
Corridas do
hipódromo de
Belém
Jantar em
casa dos
Gouvarinho
Jornal
Corneta do
Diabo
e
Jornal
A Tarde
Sarau no
Teatro da
Trindade
Passeio final
de Carlos e
Ega
(dez anos
depois)
3. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
Jantar no Hotel
Central
Episódio que retrata o primeiro contacto social de
Carlos com a sociedade lisboeta.
É um jantar de homenagem a Cohen, banqueiro da
alta finança, organizado por Ega, o amante de Raquel
Cohen.
As conversas entre as diferentes personagens
presentes no jantar abordam temas fundamentais da
vida política e cultural lisboeta:
- a literatura e a crítica literária (Ultrarromantismo
versus Realismo),
- o mau estado das finanças do país,
- assim como a decadência em que o país se
encontrava,
- permitindo a denúncia da mentalidade retrógrada
deste grupo social.
4. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
Corridas do
hipódromo de
Belém
Quadro que está ao serviço da crítica à sociedade
portuguesa e à sua tendência para imitar tudo
quanto é estrangeiro. Ser vs parecer.
Numa perspetiva muito crítica, Eça evidencia o
provincianismo português e o seu desejo de
cosmopolitismo.
O cenário é descrito como desajustado e vê-se nele
desfilar a alta sociedade lisboeta, as mulheres com
roupas de missa, desinteresse pelas corridas,
poucos jockeys, altercados pelos resultados. Todos
evidenciando desajuste relativamente a
acontecimentos daquela natureza.
5. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
Jantar em casa
dos Gouvarinho
Foi oferecido a Carlos, propiciando a reunião de
diferentes elementos da alta burguesia e da
aristocracia portuguesa.
Neste jantar, os temas discutidos são, novamente,
denunciadores do estado intelectual decadente
do país, bem como da inequívoca falta de
valores sociais: a educação das mulheres, a falta
de cultura e de inteligência de personagens como
Sousa Neto, ligado ao poder político, e do próprio
conde de Gouvarinho, que aparece associado a
comentários que denotam a sua pouca cultura e
incompetência política.
6. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
Jornal
A Corneta do
Diabo
Jornal
A Tarde
São situações que denunciam um jornalismo
corrupto, parcial, comprometido com
apadrinhamentos políticos.
A mediocridade ressalta quando se constata que os
artigos publicados versam, essencialmente,
assuntos sensacionalistas e degradantes da
sociedade portuguesa.
7. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
Sarau LITERÁRIO
do Teatro da
Trindade
Permite constatar o problema cultural da sociedade
portuguesa, a sua superficialidade, bem como a sua
ligação à retórica fácil e de sentimentalismo excessivo,
marcada pelo Ultrarromantismo, movimento aqui
representado pelo poeta Alencar.
O desinteresse manifestado pela música de Cruges é
evidente e reflete a insensibilidade cultural da suposta
elite nacional.
É neste cenário humano e social que se evidencia a falta
de espírito crítico, a decadência e a degradação da
sociedade portuguesa, bem como a sua apatia e
incapacidade de reação.
8. Crítica aos vícios e costumes da
sociedade dos finais do séc. XIX
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Permite constatar o problema cultural da sociedade
portuguesa, a sua superficialidade, bem como a sua
ligação à retórica fácil e de sentimentalismo excessivo,
marcada pelo Ultrarromantismo, movimento aqui
representado pelo poeta Alencar.
O desinteresse manifestado pela música de Cruges é
evidente e reflete a insensibilidade cultural da suposta
elite nacional.
É neste cenário humano e social que se evidencia a falta
de espírito crítico, a decadência e a degradação da
sociedade portuguesa, bem como a sua apatia e
incapacidade de reação.
9. PASSEIO DE CARLOS E EGA POR LX
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
10. PASSEIO DE CARLOS E EGA POR LX
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Estavam no Loreto; e Carlos parara,
olhando, reentrando na intimidade
daquele velho coração da capital. Nada
mudara. A mesma sentinela sonolenta
rondava em torno à estátua triste de
Camões. O Hotel Aliance conservava o
mesmo ar mudo e deserto. Um lindo sol
dourava o lajedo; batedores de chapéu à
faia fustigavam as pilecatrês varinas, de
canastra à cabeça, meneavam os quadris,
fortes e ágeis na plena luzs;. A uma
esquina, vadios em farrapos fumavam; e
na esquina defronte, na Havaneza,
fumavam também outros vadios, de
sobrecasaca, politicando.
- Isto é horrível quando se vem de
fora! exclamou Carlos. Não é a cidade, é
a gente. Uma gente feiíssima, encardida,
molenga, reles, amarelada,
acabrunhada!...
11. PASSEIO DE CARLOS E EGA POR LX
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Foram descendo o Chiado. E Carlos
reconhecia, encostados às mesmas portas,
sujeitos que lá deixara havia dez anos, já
assim encostados, já assim melancólicos.
Tinham rugas, tinham brancas. Mas lá
estacionavam ainda, apagados e murchos,
rente das mesmas ombreiras, com colarinhos
à moda.
12. PASSEIO DE CARLOS E EGA POR LX
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
O que atraia pois ali aquela mocidade pálida? E o que
sobretudo o espantava eram as botas desses
cavalheiros, botas despropositadamente compridas,
rompendo para fora da calça colante com pontas
aguçadas e reviradas como proas de barcos varinos...
- Isto é fantástico, Ega!
Ega esfregava as mãos. Sim, mas precioso! Porque
essa simples forma de botas explicava todo o Portugal
contemporâneo. Via-se por ali como a coisa era. Tendo
abandonado o seu feitio antigo, à D. João VI, que tão
bem lhe ficava, este desgraçado Portugal decidira
arranjar-se à moderna: mas sem originalidade, sem
força, sem carácter para criar um feitio seu, um feitio
próprio, manda vir modelos do estrangeiro - modelos
de ideias, de calças, de costumes, de leis, de arte, de
cozinha... Somente, como lhe falta o sentimento da
proporção, e ao mesmo tempo o domina a impaciência
de parecer muito moderno e muito civilizado - exagera
o modelo, deforma-o, estraga-o até à caricatura.
Carlos ria:
- De modo que isto está cada vez pior...
- Medonho! É dum reles, dum postiço! Sobretudo
postiço! Já não há nada genuíno neste miserável país,
nem mesmo o pão que comemos!
13. RAMALHETE
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Ainda falavam de Portugal e dos seus males quando a
tipoia parou. Com que comoção Carlos avistou a
fachada severa do Ramalhete.
Em baixo o jardim, bem areado, limpo e frio na sua
nudez de inverno, tinha a melancolia de um retiro
esquecido que já ninguém ama: uma ferrugem
verde de humidade cobria os grossos membros da
Vénus Citereia; o cipreste e o cedro envelheciam
juntos como dois amigos num ermo; e mais lento corria
o prantozinho da cascata, esfiando saudosamente gota a
gota na bacia de mármore.
14. PASSEIO DE CARLOS E EGA POR LX
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Depois, diante da livraria Bertrand, Ega, rindo,
tocou no braço de Carlos:
- Olha quem ali está…
Era o Dâmaso. O Dâmaso, barrigudo, nédio,
mais pesado, de flor ao peito, mamando um grande
charuto, e pasmaceando, com o ar regaladamente
embrutecido dum ruminante farto e feliz. […]
- Sabes que o nosso Dâmaso casou? disse o Ega um
pouco adiante, travando outra vez do braço de Carlos.
E foi um espanto para Carlos.
- O quê! O nosso Dâmaso! Casado?!...
- Sim, casado com uma filha dos condes de
Águeda, uma gente arruinada, com um rancho de
raparigas. Tinham-lhe impingido a mais nova.
- É bonita?
- Sim, bonitinha... Faz aí a felicidade dum rapazote
simpático, chamado Barroso.
- - O quê? O Dâmaso, coitado...
- - Sim, coitado, coitadinho, coitadíssimo... Mas
como vês, imensamente ditoso, até tem
engordado com a perfídia!
15. O que sucedera às personagens?
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
• O MARQUÊS morrera.
• D. DIOGO casara por fim com a cozinheira.
• GENERAL SEQUEIRA morto numa noite numa tipoia.
• CRAFT vivia em Richmond em Inglaterra e continuava a
encontrar-se com Carlos.
• TAVEIRA continuava metido com espanholas.
• CRUGES fez um ópera cómica: “ Flor de Sevilha”
• STEINBROKEN era ministro em Atenas.
• EUSEBIOZINHO casado e espancado pela mulher. (“ Deus
a conserve)
• CHARLIE GOUVARINHO tinha uma amizade com um
velho…
• Alencar adotara um sobrinha.
Era para Ega, no meio da Lisboa toda postiça, o único
português genuíno. Conservava uma honestidade
resistente. Além disso havia nele lealdade, bondade,
generosidade. O seu comportamento com a sobrinhita
era tocante. Tinha mais cortesia, melhores maneiras que
os novos. Um bocado de piteirice não lhe ia mal ao seu
feitio lírico.
E por fim, no estado a que descambara a literatura, a
versalhada do Alencar tomara relevo pela correção,
pela simplicidade, por um resto de sincera emoção.
Em resumo, um bardo infinitamente estimável.
16. O que sucedera às personagens?
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
• O MARQUÊS morrera.
• D. DIOGO casara por fim com a cozinheira.
• GENERAL SEQUEIRA morto numa noite numa tipoia.
• CRAFT vivia em Richmond em Inglaterra e continuava a
encontrar-se com Carlos.
• TAVEIRA continuava metido com espanholas.
• CRUGES fez um ópera cómica: “ Flor de Sevilha”
• STEINBROKEN era ministro em Atenas.
• EUSEBIOZINHO casado e espancado pela mulher. (“ Deus
a conserve)
• CHARLIE GOUVARINHO tinha uma amizade com um
velho…
• Alencar adotara um sobrinha.
Era para Ega, no meio da Lisboa toda postiça, o único
português genuíno. Conservava uma honestidade
resistente. Além disso havia nele lealdade, bondade,
generosidade. O seu comportamento com a sobrinhita
era tocante. Tinha mais cortesia, melhores maneiras que
os novos. Um bocado de piteirice não lhe ia mal ao seu
feitio lírico.
E por fim, no estado a que descambara a literatura, a
versalhada do Alencar tomara relevo pela correção,
pela simplicidade, por um resto de sincera emoção.
Em resumo, um bardo infinitamente estimável.
Raquel Cohen estuporada.
Teresa Gouvarinho resignada.
17. Filosofia de vida
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
- Falhámos a vida, menino – atirou Ega num gesto
desolado.
- Creio que sim... Mas todo o mundo mais ou menos a
falha. Isto é falha-se sempre na realidade aquela
vida que se planeou com a imaginação. Diz-se: «vou
ser assim, porque a beleza está em ser assim». E
nunca se é assim, é-se invariavelmente assado, como
dizia o pobre marquês. Às vezes melhor, mas
sempre diferente.
- É curioso! Só vivi dois anos nesta casa, e é nela
que me parece estar metida a minha vida inteira!
Ega não se admirava. Só ali no Ramalhete ele vivera
realmente daquilo que dá sabor e relevo à vida - a
paixão.
- Muitas outras coisas dão valor à vida... Isso é
uma velha ideia de romântica, meu Ega!
- E que somos nós? exclamou Ega. Que temos nós
sido desde o colégio, desde o exame de latim?
Românticos: isto é, indivíduos inferiores que se
governam na vida pelo sentimento e não pela razão...
18. Filosofia de vida
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Mas Carlos queria realmente saber se, no fundo, eram mais
felizes esses que se dirigiam só pela razão, não se desviando
nunca dela, torturando-se para se manter na sua linha
inflexível, secos, hirtos, lógicos, sem emoção até ao fim...
- Creio que não, disse o Ega. Por fora, à vista, são
desconsoladores. E por dentro, para eles mesmos, são talvez
desconsolados. O que prova que neste lindo mundo ou tem
de se ser insensato ou sem sabor...
- Resumo: não vale a pena viver...
19. Filosofia de vida – fatalismo muçulmano
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
Depois Carlos, outra vez sério, deu a sua teoria da
vida, a teoria definitiva que ele deduzira da experiência
e que agora o governava. Era o fatalismo muçulmano.
Nada desejar e nada recear... Não se abandonar a uma
esperança - nem a um desapontamento. Tudo aceitar, o
que vem e o que foge, com a tranquilidade com que se
acolhem as naturais mudanças de dias agrestes e de
dias suaves. E, nesta placidez, deixar esse pedaço de
matéria organizada, que se chama o Eu, ir-se
deteriorando e decompondo até reentrar e se perder no
infinito Universo... Sobretudo não ter apetites. E, mais
que tudo, não ter contrariedades.
Ega, em suma, concordava. Do que ele
principalmente se convencera, nesses estreitos anos de
vida, era da inutilidade do todo o esforço. Não valia a
pena dar um passo para alcançar coisa alguma na terra
- porque tudo se resolve, como já ensinara o sábio do
Eclesiastes, em desilusão e poeira.
- Se me dissessem que ali em baixo estava uma
fortuna como a dos Rotschilds ou a coroa imperial de
Carlos V, à minha espera, eu não apressava o passo...
Não! Não saia deste passinho lento, prudente, correto,
seguro, que é o único que se deve ter na vida.
- Nem eu! acudiu Carlos com uma convicção decisiva
20. Ironia de Eça no final
Passeio de Carlos
e de Ega por
Lisboa
(10 anos depois)
De repente Carlos teve um largo gesto de contrariedade:
- Que ferro! E eu que vinha desde Paris com este apetite!
Esqueci-me de mandar fazer hoje para o jantar um grande
prato de paio com ervilhas.
E agora já era tarde, lembrou Ega. Eram seis e um quarto!
- Oh, diabo!... E eu que disse ao Vilaça e aos rapazes para
estarem no Bragança pontualmente às seis! Não aparecer
por aí uma tipoia!...
- Espera! exclamou Ega. Lá vem um «Americano», ainda o
apanhamos.
- Ainda o apanhamos!
Os dois amigos lançaram o passo, largamente.
- Que raiva ter esquecido o paiozinho! Enfim, acabou-se.
Ao menos assentamos a teoria definitiva da existência.
Com efeito, não vale a pena fazer um esforço, correr com
ânsia para coisa alguma...
Ega, ao lado, ajuntava, ofegante, atirando as pernas magras:
- Nem para o amor, nem para a gloria, nem para o dinheiro,
nem para o poder...
- Ainda o apanhamos!
- Ainda o apanhamos!