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O turismo em Portugal está na moda! Mui-
to se fala atualmente deste sector, que em
bom rigor há mais de 20 anos vem tra-
çando um caminho de determinação com
altos e baixos mas que neste momento nos
coloca num lugar de destaque no panorama
internacional.
Fazendo uma análise cuidada dos dados
deste sector comparativamente com os
de outros sectores estruturantes da eco-
nomia nacional poderemos constatar um
crescimento consistente de todos os seus
indicadores (salvo raras exceções em anos
atípicos), com especial acentuação nos úl-
timos 7 anos.
No que se refere a número de dormidas,
receitas do sector e sua contribuição para
o PIB, taxas de ocupação hoteleira, entre
outros indicadores, poderemos facilmente
perceber que, de facto, Portugal tem estado
na moda desde há um largo período.
Mas quais são, de facto, as razões funda-
mentais para a perceção de que existe uma
mudança recente tão acentuada neste sec-
tor de atividade e para a sua importância
mais abrangente para a economia nacio-
nal?
Sou da opinião de que verificámos uma al-
teração de paradigma no sector do turismo
nacional. Portugal deixou de ser percecio-
nado como um destino “very typical” para,
num curto espaço de tempo, passar a ser
associado a um produto “trendy”.
E esta alteração na imagem do país trans-
cendeu o sector do turismo e consolidou
a imagem percebida pelo mercado de ou-
tros sectores como a indústria do vinho, da
moda, calçado, têxteis, até da construção
civil, soluções de IT e outros serviços.
O sector terciário nas mais diversas va-
lências em Portugal, é agora associado a
qualidade. Qualidade nos recursos huma-
nos, altamente qualificados, qualidade na
relação e qualidade na entrega do serviço
no seu todo.
Esta perceção, que temos que assumir
como realidade, é um asset importantíssi-
mo para se capitalizar e exportar. É este o
efeito multiplicador e agregador da econo-
mia que o turismo pode trazer e sobretudo
“comunicar”. Comunicar através da forma
mais eficaz e eloquente das formas, a ex-
periência. É esta sem dúvida a grande força
que este sector é capaz de imprimir na
nossa economia.
Quais as maiores consequências des-
ta alteração de paradigma?
O que se percebe é que a grande alteração
está no posicionamento da marca Portugal
(e todas as submarcas associadas – Lis-
boa, Porto, Algarve, Alentejo, Douro, etc) e
nos perfis dos mercados preferenciais que
o nosso país está a atrair.
O que se pode verificar atualmente é que
Portugal está a atrair perfis de turistas mais
sofisticados e apreciadores de um lifestyle
holístico, cada vez mais atento e interes-
sado nas várias dimensões da experiência
turística, nomeadamente cultura, incluindo
a gastronomia, arquitetura, experiências na
natureza, espetáculos, diversão noturna, in-
tercâmbio cultural e todas as experiências
que possam transmitir o máximo de infor-
mação sobre o destino visitado, no caso o
nosso país.
Estamos a traçar um caminho que nos afas-
ta dos mercados menos sofisticados que
procuravam uma oferta de referências in-
ternacionais e experiências viradas para si
próprios, mais estandardizadas e de “me-
nor risco sensorial” e logicamente menos
ricas culturalmente.
Felizmente estamos a encontrar o cami-
nho certo no nosso posicionamento en-
quanto fornecedores de serviços e produ-
tos turísticos, conseguindo desta forma
valorizar o nosso território, as nossas in-
fraestruturas, a nossa cultura e as nossas
pessoas.
Desta forma também nos valorizamos em
termos económicos, fornecendo um produ-
to mais qualificado e mais sofisticado a um
preço mais elevado do que aquele que era
habitual até aos primeiros anos da década
de 2000.
RESEARCH
TURISMO
Maio 2017
O TURISMO COMO CATALIZADOR DO
DESENVOLVIMENTO DO SETOR IMOBILIÁRIO
Miguel Mesquita Figueiredo, Diretor - Consultancy & Valuation Department - Aguirre Newman
60,0%
50,0%
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2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
TAXA DE OCUPAÇÃO Hoteleira
PORTUGAL
FONTE INE, 2017
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RESEARCH
TURISMO
Maio 2017
Esta alteração da procura é também verifi-
cada e acompanhada pelas marcas de topo
(High End) que paulatinamente vão procu-
rando o nosso país para se instalarem e
responderem a este novo paradigma.
Ainda que comparativamente com outros
mercados continuemos a marcar-nos por
apresentarmos preços bastante competi-
tivos, fornecemos características bastan-
te diferenciadoras de alta qualidade, que
com tempo para nos consolidarmos penso
que trará frutos que transbordarão os limi-
tes do sector e contagiarão positivamente
a economia, assim sejamos “politicamente
inteligentes e fiscalmente assertivos” para
capitalizar as oportunidades deste posicio-
namento.
Que efeito positivo poderá trazer
o turismo para outros sectores da
economia?
Para além dos efeitos indiretos de produção
interna, o sector do turismo é em primeira
instância o maior e mais poderoso canal de
comunicação e marketing internacional que
pode existir num país.
A mudança de paradigma anteriormen-
te descrita poderá ser determinante para
uma alteração de posicionamento não só
do sector do turismo, seus serviços e pro-
dutos, mas de um país nas suas diferentes
dimensões e potencialidades.
A recente “corrente quente” que tem afe-
tado o território nacional e mais concreta-
mente o imobiliário de algumas regiões do
país, nomeadamente, Lisboa, Porto, Algarve,
Madeira, Açores, Alentejo entre outras, tem
sido uma consequência indireta da presta-
ção do sector do turismo.
O posicionamento do país alterou-se e com
esta transformação a perceção dos investi-
dores também se alterou. A valorização dos
recursos humanos portugueses como alta-
mente qualificados, flexíveis, com bons co-
nhecimentos linguísticos tem sido um fator
valorizado pelos investidores institucionais
que olham cada vez com “melhores olhos”
para a instalação das suas organizações no
nosso país.
Neste sentido a procura por imobiliário de
escritórios e residencial tem tido índices
sem igual no passado.
Será este o momento da confirmação
do nosso país como uma alternati-
va às grandes capitais europeias,
nomeadamente em localizações como
Lisboa e Porto?
Será este movimento consistente?
Terá este investimento recente a
valores nunca antes verificados a
rendibilidade esperada pelos investi-
dores a médio-longo prazo?
Que tipo de análises e medidas de-
veremos tomar para evitarmos uma
nova bolha no sector imobiliário?
Estas são questões que deverão ser discu-
tidas neste momento, exatamente para pro-
longar ao máximo o clima favorável, tanto
na economia como no sector imobiliário,
visto que em meu entender o sector do
turismo entrou num patamar que só ve-
rificará crescimento consistente no futuro
a médio-prazo, assim tenhamos segurança.
Este comportamento do turismo conferirá
uma imagem de credibilidade e posicio-
namento distintivo ao país. Mas são ne-
cessárias medidas económicas e políticas
para que se mantenha e até aumente a
atratividade económica de Portugal.
São necessárias medidas que confiram es-
tabilidade de políticas fiscais, laborais e
sistema judicial que permitam decisões
seguras de médio-longo prazo por parte
das empresas que visem nomeadamente a
instalação das suas sedes em Portugal.
A minha resposta à primeira questão acima
colocada é de que estamos no momento
certo para capitalizar a nossa notoriedade
conseguida por via da excelência dos pro-
dutos e serviços turísticos, posicionando
também o sector terciário de outras va-
lências ao nível do que melhor se faz na
europa e no mundo. Porque estamos a ser
falados, porque estamos a ser reconhecidos
e portanto este é o momento de afirmação.
60 000 000
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Dormidas nos establecimentos hoteleiros e similares
PORTUGAL
FONTE INE, 2017
27
RESEARCH
TURISMO
Maio 2017
Relativamente à consistência do movi-
mento de investimento, acredito que só
será consistente se acompanhado por um
enquadramento das políticas fiscais, labo-
rais e de reformas da justiça que permi-
tam uma maior clareza e menor imprevisi-
bilidade nos investimentos a médio-longo
prazo.
Quanto às rendibilidades esperadas dos
investimentos que estão acontecer neste
momento sou da opinião de que ou as
anteriores questões são respondidas po-
sitivamente e acontece uma consolida-
ção e estabilização económica associada
a investimento, crescimento e emprego ou
caso contrário essas rendibilidades terão
que ser suportadas pelo único sector que
terá um crescimento consistente que é o
turismo.
Assim, o investimento em escritórios po-
derá reviver momentos de maior incerte-
za e vacancies elevadas, com a migração
das empresas para ambientes económi-
cos, políticos e fiscais mais apetecíveis
como aconteceu no passado a migração
para a europa de leste, movimento que
agora começa a ser revertido por algumas
empresas.
Também as rendibilidades do sector resi-
dencial são colocadas em causa, pois os
valores de comercialização agora praticados
vão “exigir” valores de renda muito acima
daquilo que o mercado nacional está em
condições de pagar.
Neste ponto as dinâmicas urbanas verifi-
cadas noutras cidades de referência como
Londres, Barcelona, Paris, Madrid entre ou-
tras, mostram a migração dos mercados na-
cionais tradicionais para as periferias dei-
xando os centros das cidades aos cuidados
de estrangeiros e de uma elite não repre-
sentativa da autenticidade das cidades,
mas este é o caminho natural do mercado
e a sua influência nas dinâmicas urbanas
do sector imobiliário.
Aqui surge uma, e por hoje a minha última
questão:
Será este o caminho a tomar sem
restrições ou orientações?
As rendibilidades esperadas no sector re-
sidencial vão afastar as populações locais
para fora dos centros das cidades e toda a
oferta existente e futura estará maioritaria-
mente orientada para o mercado de alo-
jamento, seja ele hoteleiro ou alojamento
local.
Deste cenário poderemos tirar duas con-
clusões, uma é que esta dinâmica acelerará
a reabilitação urbana muito necessária nas
cidades portuguesas, e a segunda é que
essa reabilitação recriará uma nova vivên-
cia nos centros das cidades, com novas
populações, em grande número itinerantes,
que não manterão a autenticidade cultu-
ral que é um dos pilares do nosso produto
turístico.
Este será um desafio que se aproxima. Ou
assumimos uma postura economicista e
nos resignamos aos efeitos globalizadores
do mercado e suas “exigências” ou tenta-
mos encontrar o meio-termo que a longo
prazo produzirá efeitos de equilíbrio que
manterá não só a atratividade do mercado
turístico como a do mercado residencial e
outros segmentos do mercado imobiliário.
Para este tema dou como exemplo a cidade
de Barcelona, que desde há algum tempo
restringiu as licenças de exploração hotelei-
ras e licenças de exploração de alojamento
local no centro da cidade, exatamente para
reequilibrar e reinstalar as populações au-
tóctones no centro da cidade.
Não digo que só exista um caminho a tomar
mas demos atenção ao que vai acontecen-
do noutras latitudes para nos prepararmos
para o downturn deste ciclo económico do
qual ainda não percebemos em que ponto
nos encontramos.
Desejos de bons negócios e sabedoria no
aproveitamento sustentável dos nossos re-
cursos.
7,0%
6,0%
5,0%
4,0%
3,0%
2,0%
1,0%
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2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Contribuição Direta em % do PIB
PORTUGAL
FONTE WTTC – World Travel & Tourism Council, 2017

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  • 1. 25 O turismo em Portugal está na moda! Mui- to se fala atualmente deste sector, que em bom rigor há mais de 20 anos vem tra- çando um caminho de determinação com altos e baixos mas que neste momento nos coloca num lugar de destaque no panorama internacional. Fazendo uma análise cuidada dos dados deste sector comparativamente com os de outros sectores estruturantes da eco- nomia nacional poderemos constatar um crescimento consistente de todos os seus indicadores (salvo raras exceções em anos atípicos), com especial acentuação nos úl- timos 7 anos. No que se refere a número de dormidas, receitas do sector e sua contribuição para o PIB, taxas de ocupação hoteleira, entre outros indicadores, poderemos facilmente perceber que, de facto, Portugal tem estado na moda desde há um largo período. Mas quais são, de facto, as razões funda- mentais para a perceção de que existe uma mudança recente tão acentuada neste sec- tor de atividade e para a sua importância mais abrangente para a economia nacio- nal? Sou da opinião de que verificámos uma al- teração de paradigma no sector do turismo nacional. Portugal deixou de ser percecio- nado como um destino “very typical” para, num curto espaço de tempo, passar a ser associado a um produto “trendy”. E esta alteração na imagem do país trans- cendeu o sector do turismo e consolidou a imagem percebida pelo mercado de ou- tros sectores como a indústria do vinho, da moda, calçado, têxteis, até da construção civil, soluções de IT e outros serviços. O sector terciário nas mais diversas va- lências em Portugal, é agora associado a qualidade. Qualidade nos recursos huma- nos, altamente qualificados, qualidade na relação e qualidade na entrega do serviço no seu todo. Esta perceção, que temos que assumir como realidade, é um asset importantíssi- mo para se capitalizar e exportar. É este o efeito multiplicador e agregador da econo- mia que o turismo pode trazer e sobretudo “comunicar”. Comunicar através da forma mais eficaz e eloquente das formas, a ex- periência. É esta sem dúvida a grande força que este sector é capaz de imprimir na nossa economia. Quais as maiores consequências des- ta alteração de paradigma? O que se percebe é que a grande alteração está no posicionamento da marca Portugal (e todas as submarcas associadas – Lis- boa, Porto, Algarve, Alentejo, Douro, etc) e nos perfis dos mercados preferenciais que o nosso país está a atrair. O que se pode verificar atualmente é que Portugal está a atrair perfis de turistas mais sofisticados e apreciadores de um lifestyle holístico, cada vez mais atento e interes- sado nas várias dimensões da experiência turística, nomeadamente cultura, incluindo a gastronomia, arquitetura, experiências na natureza, espetáculos, diversão noturna, in- tercâmbio cultural e todas as experiências que possam transmitir o máximo de infor- mação sobre o destino visitado, no caso o nosso país. Estamos a traçar um caminho que nos afas- ta dos mercados menos sofisticados que procuravam uma oferta de referências in- ternacionais e experiências viradas para si próprios, mais estandardizadas e de “me- nor risco sensorial” e logicamente menos ricas culturalmente. Felizmente estamos a encontrar o cami- nho certo no nosso posicionamento en- quanto fornecedores de serviços e produ- tos turísticos, conseguindo desta forma valorizar o nosso território, as nossas in- fraestruturas, a nossa cultura e as nossas pessoas. Desta forma também nos valorizamos em termos económicos, fornecendo um produ- to mais qualificado e mais sofisticado a um preço mais elevado do que aquele que era habitual até aos primeiros anos da década de 2000. RESEARCH TURISMO Maio 2017 O TURISMO COMO CATALIZADOR DO DESENVOLVIMENTO DO SETOR IMOBILIÁRIO Miguel Mesquita Figueiredo, Diretor - Consultancy & Valuation Department - Aguirre Newman 60,0% 50,0% 40,0% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 TAXA DE OCUPAÇÃO Hoteleira PORTUGAL FONTE INE, 2017
  • 2. 26 RESEARCH TURISMO Maio 2017 Esta alteração da procura é também verifi- cada e acompanhada pelas marcas de topo (High End) que paulatinamente vão procu- rando o nosso país para se instalarem e responderem a este novo paradigma. Ainda que comparativamente com outros mercados continuemos a marcar-nos por apresentarmos preços bastante competi- tivos, fornecemos características bastan- te diferenciadoras de alta qualidade, que com tempo para nos consolidarmos penso que trará frutos que transbordarão os limi- tes do sector e contagiarão positivamente a economia, assim sejamos “politicamente inteligentes e fiscalmente assertivos” para capitalizar as oportunidades deste posicio- namento. Que efeito positivo poderá trazer o turismo para outros sectores da economia? Para além dos efeitos indiretos de produção interna, o sector do turismo é em primeira instância o maior e mais poderoso canal de comunicação e marketing internacional que pode existir num país. A mudança de paradigma anteriormen- te descrita poderá ser determinante para uma alteração de posicionamento não só do sector do turismo, seus serviços e pro- dutos, mas de um país nas suas diferentes dimensões e potencialidades. A recente “corrente quente” que tem afe- tado o território nacional e mais concreta- mente o imobiliário de algumas regiões do país, nomeadamente, Lisboa, Porto, Algarve, Madeira, Açores, Alentejo entre outras, tem sido uma consequência indireta da presta- ção do sector do turismo. O posicionamento do país alterou-se e com esta transformação a perceção dos investi- dores também se alterou. A valorização dos recursos humanos portugueses como alta- mente qualificados, flexíveis, com bons co- nhecimentos linguísticos tem sido um fator valorizado pelos investidores institucionais que olham cada vez com “melhores olhos” para a instalação das suas organizações no nosso país. Neste sentido a procura por imobiliário de escritórios e residencial tem tido índices sem igual no passado. Será este o momento da confirmação do nosso país como uma alternati- va às grandes capitais europeias, nomeadamente em localizações como Lisboa e Porto? Será este movimento consistente? Terá este investimento recente a valores nunca antes verificados a rendibilidade esperada pelos investi- dores a médio-longo prazo? Que tipo de análises e medidas de- veremos tomar para evitarmos uma nova bolha no sector imobiliário? Estas são questões que deverão ser discu- tidas neste momento, exatamente para pro- longar ao máximo o clima favorável, tanto na economia como no sector imobiliário, visto que em meu entender o sector do turismo entrou num patamar que só ve- rificará crescimento consistente no futuro a médio-prazo, assim tenhamos segurança. Este comportamento do turismo conferirá uma imagem de credibilidade e posicio- namento distintivo ao país. Mas são ne- cessárias medidas económicas e políticas para que se mantenha e até aumente a atratividade económica de Portugal. São necessárias medidas que confiram es- tabilidade de políticas fiscais, laborais e sistema judicial que permitam decisões seguras de médio-longo prazo por parte das empresas que visem nomeadamente a instalação das suas sedes em Portugal. A minha resposta à primeira questão acima colocada é de que estamos no momento certo para capitalizar a nossa notoriedade conseguida por via da excelência dos pro- dutos e serviços turísticos, posicionando também o sector terciário de outras va- lências ao nível do que melhor se faz na europa e no mundo. Porque estamos a ser falados, porque estamos a ser reconhecidos e portanto este é o momento de afirmação. 60 000 000 50 000 000 40 000 000 30 000 000 20 000 000 10 000 000 0 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 Dormidas nos establecimentos hoteleiros e similares PORTUGAL FONTE INE, 2017
  • 3. 27 RESEARCH TURISMO Maio 2017 Relativamente à consistência do movi- mento de investimento, acredito que só será consistente se acompanhado por um enquadramento das políticas fiscais, labo- rais e de reformas da justiça que permi- tam uma maior clareza e menor imprevisi- bilidade nos investimentos a médio-longo prazo. Quanto às rendibilidades esperadas dos investimentos que estão acontecer neste momento sou da opinião de que ou as anteriores questões são respondidas po- sitivamente e acontece uma consolida- ção e estabilização económica associada a investimento, crescimento e emprego ou caso contrário essas rendibilidades terão que ser suportadas pelo único sector que terá um crescimento consistente que é o turismo. Assim, o investimento em escritórios po- derá reviver momentos de maior incerte- za e vacancies elevadas, com a migração das empresas para ambientes económi- cos, políticos e fiscais mais apetecíveis como aconteceu no passado a migração para a europa de leste, movimento que agora começa a ser revertido por algumas empresas. Também as rendibilidades do sector resi- dencial são colocadas em causa, pois os valores de comercialização agora praticados vão “exigir” valores de renda muito acima daquilo que o mercado nacional está em condições de pagar. Neste ponto as dinâmicas urbanas verifi- cadas noutras cidades de referência como Londres, Barcelona, Paris, Madrid entre ou- tras, mostram a migração dos mercados na- cionais tradicionais para as periferias dei- xando os centros das cidades aos cuidados de estrangeiros e de uma elite não repre- sentativa da autenticidade das cidades, mas este é o caminho natural do mercado e a sua influência nas dinâmicas urbanas do sector imobiliário. Aqui surge uma, e por hoje a minha última questão: Será este o caminho a tomar sem restrições ou orientações? As rendibilidades esperadas no sector re- sidencial vão afastar as populações locais para fora dos centros das cidades e toda a oferta existente e futura estará maioritaria- mente orientada para o mercado de alo- jamento, seja ele hoteleiro ou alojamento local. Deste cenário poderemos tirar duas con- clusões, uma é que esta dinâmica acelerará a reabilitação urbana muito necessária nas cidades portuguesas, e a segunda é que essa reabilitação recriará uma nova vivên- cia nos centros das cidades, com novas populações, em grande número itinerantes, que não manterão a autenticidade cultu- ral que é um dos pilares do nosso produto turístico. Este será um desafio que se aproxima. Ou assumimos uma postura economicista e nos resignamos aos efeitos globalizadores do mercado e suas “exigências” ou tenta- mos encontrar o meio-termo que a longo prazo produzirá efeitos de equilíbrio que manterá não só a atratividade do mercado turístico como a do mercado residencial e outros segmentos do mercado imobiliário. Para este tema dou como exemplo a cidade de Barcelona, que desde há algum tempo restringiu as licenças de exploração hotelei- ras e licenças de exploração de alojamento local no centro da cidade, exatamente para reequilibrar e reinstalar as populações au- tóctones no centro da cidade. Não digo que só exista um caminho a tomar mas demos atenção ao que vai acontecen- do noutras latitudes para nos prepararmos para o downturn deste ciclo económico do qual ainda não percebemos em que ponto nos encontramos. Desejos de bons negócios e sabedoria no aproveitamento sustentável dos nossos re- cursos. 7,0% 6,0% 5,0% 4,0% 3,0% 2,0% 1,0% 0,0% 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 Contribuição Direta em % do PIB PORTUGAL FONTE WTTC – World Travel & Tourism Council, 2017