Nota de repudio contra a redução da maioridade penal
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NOTA DE REPÚDIO DE JOVENS DA IEAB
CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
“... Eu vos escolhi, jovens, porque sois fortes, e a Palavra de Deus está em vós...” (I João 2:14).
Nós, jovens da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil - IEAB, abaixo assinados, repudiamos a
decisão proferida na última terça-feira (31 de março) pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania
(CCJ) da Câmara dos Deputados autorizando que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171/93
siga seu trâmite legislativo normal no Congresso Nacional. A PEC em questão tem como objeto reduzir
a maioridade penal dos atuais 18 para os 16 anos de idade.
Em primeiro lugar, a medida em questão é
constitucionalmente inviável, uma vez que compromete direitos
e garantias individuais previstos na Constituição Federal de
1988, como os dos artigos 227 e 228, os quais reconhecem as
crianças e os adolescentes como pessoas em condição peculiar de
desenvolvimento, inimputabilidade penal, e estabelecem que as
medidas de responsabilização por atos infracionais devem ser
específicas, não integradas ao código penal. O artigo 60 da
Constituição define que é inadmissível emenda tendente a abolir
esses direitos e garantias, a menos que seja convocada nova
Assembleia Constituinte.
Além de desrespeitar a Constituição Federal, a proposição
em questão vai contra a Doutrina da Proteção Integral do Direito
Brasileiro, a qual exige que os direitos humanos de crianças e adolescentes sejam respeitados e
garantidos de forma integral e integrada às políticas de natureza universal, protetiva e socioeducativa.
Vai contra a Convençãosobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas
(ONU) e a Declaração Internacional dos Direitos da Criança compromissos assinados pelo Brasil.
Ainda que diferentes interpretações doutrinárias entendam que seja possível atacar esses
direitos fundamentais por meio de emenda constitucional, entendemos que a redução da maioridade
penal não atinge o problema da segurança pública em seu cerne e tem, na realidade, o potencial de
aumentar os índices de violência.
É importante destacar que os menores que cometem crimes violentos estão ou nas grandes
periferias ou na rota do tráfico de drogas e são vítimas dessa realidade. Atualmente, roubos e atividades
relacionadas ao tráfico de drogas representam 38% e 27% dos atos infracionais, respectivamente, de
acordo com o levantamento da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do
Adolescente. Já os homicídios não chegam a 1% dos crimes cometidos entre jovens de 16 e 18 anos.
Segundo a Unicef, o Fundo das Nações Unidas para a Infância da ONU, dos 21 milhões de
adolescentes brasileiros, apenas 0,013% cometeu atos contra a vida. Por outro lado, são os jovens (de
15 a 29 anos) as maiores vítimas da violência. Em 2012, entre os 56 mil homicídios em solo brasileiro,
30 mil eram jovens, em sua maioria, negros e pobres.
Os homicídios de crianças e adolescentes brasileiros cresceram vertiginosamente nas últimas
décadas: 346% entre 1980 e 2010. De 1981 a 2010, mais de 176 mil foram mortos e só em 2010, o
número foi de 8.686 crianças e adolescentes assassinadas, ou seja, 24 POR DIA!
O argumento de defensores da PEC 171 de que os adolescentes estão à margem de qualquer
responsabilização por suas infrações não corresponde à realidade. No Brasil, a partir dos 12 anos,
adolescentes infratores cumprem medidas socioeducativas em unidades específicas de internação, que
têm como objetivo evitar que estes reincidam, tendo sucesso em mais de 80% dos casos. Incluídos no
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sistema carcerário, onde não conquistamos o objetivo de promover a recuperação e a ressocialização
dos detentos, os adolescentes estarão sujeitos às taxas de reincidências observadas neste sistema, que
ultrapassam 70%. Nenhum tipo de experiência na cadeia pode contribuir com o processo de reeducação
e reintegração dos jovens na sociedade.
Dados do Ministério da Justiça (MJ) mostram que entre janeiro de 1992 e junho de 2013 o
número de pessoas presas aumentou 403,5% no Brasil, nos transformando na quarta nação com maior
população carcerária do mundo. Essa superlotação em tempo recorde não reduziu a violência, ao
contrário. Entre 2002 e 2012, o número total de homicídios registrados pelo Sistema de Informações
de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, passou de 49.695 para 56.337 ao ano, tendo entre os
jovens o maior número de vítimas. Nos casos em que crianças ou adolescente são as vitimas de
homicídios, o crescimento foi ainda maior, chegando a 346% entre 1980 e 2010. Esses sim são os
números que deveriam nos alarmar e nos mobilizar a buscar soluções.
Experiências internacionais demonstram que nos 54 países que reduziram a maioridade penal
não se registrou redução da violência. Recentemente, diante do insucesso da medida, Espanha e
Alemanha revogaram a redução da maioridade penal para menores de 18 anos.
O adolescente marginalizado não surge ao acaso. Ele é fruto de um estado de injustiça social que gera e
agrava a pobreza em que sobrevive grande parte da população. A marginalidade torna-se uma prática
moldada pelas condições sociais e históricas em que as pessoas vivem.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 4º, enfatiza a função da sociedade no trato
da juventude: “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar,
com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária”.
Reduzir a maioridade é transferir o problema. Para o Estado é mais fácil prender do que educar. A
educação é fundamental para qualquer indivíduo se tornar um cidadão, mas é realidade que no Brasil
muitos jovens pobres são excluídos deste processo. Puni-los com o encarceramento é tirar a chance de
se tornarem cidadãos conscientes de direitos e deveres, é assumir que falhamos como sociedade em
lhes assegurar esse direito básico que é a educação.
Assim como não é moralmente aceitável que os pais e as mães abandonem seus filhos e filhas,
fere princípios éticos uma nação simplesmente desistir de sua infância e juventude. Jogar nossos
adolescentes em conflito com a lei dentro das cadeias só vai torna-los ainda mais invisíveis.
O que devemos aos e às adolescentes brasileiros é a capacidade, como País, de assegurarmos a
eles e elas formação de projetos de vida baseados nos valores da solidariedade e do respeito mútuo, em
que possam contribuir com a sociedade estando a salvo da violência.
Deixar na margem e desconsiderar totalmente a discussão sobre os motivos que adolescentes e
jovens da mesma classe social, mesmas regiões e basicamente com os mesmos atributos físicos e étnicos
são condicionados a cometer delinquências é fechar os olhos para as causas e tomar medidas a partir
dos efeitos colaterais.
Como jovens da IEAB, lembramos duas das Marcas da Missão Anglicana que diz: *Testemunha
para todo o povo o amor de Cristo, que reconcilia, salva e perdoa; *Desafia a injustiça, a opressão e a
violência. Precisamos defender a vida, a transformação de vidas, e não desistir destas vidas, entregando-
as a um sistema prisional que não resgata ninguém. Precisamos dar um testemunho de compromisso
com nossa juventude. Nesta Sexta-feira Santa, não lavemos nossas mãos diante de uma juventude que
sofre e morre todos os dias, vítima da violência, da ganância e do descaso, assumamos nosso
compromisso com a vida!
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Anderson Soares da Silva – Diocese Anglicana do Recife
Carmen Andrea Blass – Diocese Anglicana de Pelotas
Clarissa Duarte Gomes – Diocese Anglicana de Curitiba
Claudio de Souza Linhares – Diocese Anglicana do Recife
Darlan Fernandes – Diocese Sul-Ocidental
Denise Duarte Gomes - Diocese Anglicana de Curitiba
Diana da Costa Linhares – Diocese Anglicana do Recife
Diorgenes Yuri da Rosa - Diocese Anglicana de Pelotas
Dominique Lima - Diocese Anglicana do Recife
Elineide Ferreira – Distrito Missionário Anglicano
Elizah Afonso – Diocese Meridional
Emerson Peixoto – Diocese Anglicana de Curitiba
Frederiko Luz – Diocese Anglicana de Brasília
Gisele Alzeman – Diocese Anglicana do Rio de Janeiro
Giselle Gomes da Silva Souza – Diocese Anglicana do Recife
Gregorio Oiveira – Diocese Anglicana de Curitiba
Gustavo Correia Alves da Silva - Diocese Anglicana do Recife
Ismenia Garcia Ferreira de Andrade – Diocese Anglicana de Brasília
Izaias Torquato - Diocese Anglicana do Recife
Jessica Aline Rosa - Diocese Anglicana de Pelotas
Jordan Brasil dos Santos – Diocese Sul-Ocidental
Julia Alves Porto – Diocese Anglicana de Brasília
Julio César Pereira da Silva Junior – Diocese Anglicana do Recife
Laís Patricia de Oliveira Santos - Diocese Anglicana do Recife
Lilian Conceição da Silva Pessoa de Lira – Diocese Anglicana do Recife
Lilian Pereira da Costa Linhares – Diocese Anglicana do Recife
Linneu de Rezende Haldermann – Diocese Anglicana do Rio de Janeiro
Lucas Correia - Diocese Anglicana de Brasília
Lucas Correia de Andrade - Diocese Anglicana de Brasília
Luciana Sousa – Diocese Anglicana de Brasília
Luís Alves Porto – Diocese Anglicana de Brasília
Marcos Vinicius Bessa - Diocese Anglicana de Brasília
Maria Claudia Gastal Ramos – Diocese Meridional
Maria Cunha Valente - Diocese Anglicana de Brasília
Marina Ester Pereira dos Prazeres - Diocese Anglicana do Recife
Paula Cristina Alves – Diocese Sul-Ocidental
Pedro Correia de Andrade - Diocese Anglicana de Pelotas
Pedro Rodrigo da Silva - Diocese Anglicana do Recife
Pollianny Ramos Lopes – Diocese Anglicana do Recife
Raiana Camila Rodrigues Bezerra - Diocese Anglicana do Recife
Renata Nunes - Diocese Anglicana de Pelotas
Ricardo Santos – Diocese Anglicana do Recife
Rodrigo Gonçalves Souza – Diocese Anglicana de Brasília
Samanta Ribeiro Bottega – Diocese Sul-Ocidental
Tatiana Ribeiro – Diocese Anglicana de Brasília
Tatiane Cosme – Diocese Anglicana do Recife
Tatiane Vidal – Diocese Meridional
Thiago Correia de Andrade - Diocese Anglicana de Brasília
Thiago Rocha Montenegro – Diocese Anglicana de Brasília
Tiago Ludugerio da Silva Diocese Anglicana do Recife