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Autor:	Prof. Rafael Morgado Batista
Colaboradoras:	Profa. Ana Carolina Bueno Borges
	 					Profa. Thaís Cavalheri
Gravitação
Professor conteudista: Rafael Morgado Batista
É bacharel em Física com habilitação em Pesquisa Básica desde 2007 pelo Instituto de Física da Universidade de
São Paulo (USP). É mestre (2010) e doutor (2014) em Ciências pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, cujo
programa de pós-graduação é filiado à Universidade de São Paulo (USP).
É professor titular na Universidade Paulista (UNIP), onde ministra disciplinas nas áreas de Mecânica, Termodinâmica
e Eletromagnetismo desde 2012. Desenvolve pesquisas científicas na área de sinterização de materiais cerâmicos e
condutores iônicos.
Possui publicações em periódicos internacionais e em anais de congressos nacionais e internacionais.
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
B333g Batista, Rafael Morgado.
Gravitação. / Rafael Morgado Batista. – São Paulo: Editora Sol, 2017.
120 p., il.
Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e
Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIII, n. 2-034/17, ISSN 1517-9230.
1. Gravitação. 2. Cálculo. 3. Teoria da gravidade. I. Título.
CDU 53
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Prof. Fábio Romeu de Carvalho
Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças
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Vice-Reitora de Unidades Universitárias
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Unip Interativa – EaD
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	 Material Didático – EaD
	 Comissão editorial:
		 Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
		 Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
		 Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
		 Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
		 Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)
	Apoio:
		 Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
		 Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
	 Projeto gráfico:
		 Prof. Alexandre Ponzetto
	Revisão:
		Vitor Andrade
		Giovanna Oliveira
Sumário
Gravitação
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................8
Unidade I
1 O UNIVERSO OBSERVÁVEL...........................................................................................................................11
1.1 A noção de “em cima” e “embaixo”................................................................................................11
1.2 A determinação do raio da Terra....................................................................................................13
1.3 Aristóteles e Ptolomeu: o geocentrismo.....................................................................................15
1.4 Copérnico e o heliocentrismo..........................................................................................................16
1.5 Evidências a favor do sistema heliocêntrico..............................................................................16
2 COMO AS COISAS CAEM...............................................................................................................................18
2.1 O experimento do pêndulo e a Torre de Pisa.............................................................................18
2.2 O experimento do plano inclinado.................................................................................................21
2.3 Velocidade instantânea.......................................................................................................................25
2.4 Composição dos movimentos..........................................................................................................27
2.5 Lançamentos oblíquos: o movimento dos projéteis...............................................................30
2.5.1 Queda livre e lançamento vertical....................................................................................................30
2.5.2 Movimento horizontal...........................................................................................................................30
2.5.3 Lançamentos oblíquos...........................................................................................................................31
3 A MAÇÃ E A LUA..............................................................................................................................................37
3.1 Newton e a queda da maçã..............................................................................................................37
3.2 O movimento da Lua e de outros corpos celestes...................................................................38
3.3 A lei da gravitação universal.............................................................................................................44
3.4 O experimento de Cavendish e a determinação de G............................................................44
4 CÁLCULO..............................................................................................................................................................49
4.1 Aproximações e limites.......................................................................................................................50
4.2 Velocidades e taxas de variação......................................................................................................52
4.2.1 Derivadas e taxas de variação............................................................................................................52
4.2.2 Velocidade...................................................................................................................................................55
4.2.3 Aceleração e derivadas segundas......................................................................................................57
4.2.4 Regra do tombo........................................................................................................................................59
4.3 Deslocamentos e áreas........................................................................................................................64
4.3.1 Áreas de regiões curvas.........................................................................................................................64
4.3.2 Integrais.......................................................................................................................................................67
4.3.3 Cálculo de deslocamentos...................................................................................................................68
4.4 Teorema fundamental do cálculo...................................................................................................68
4.4.1 Regra do tombo inversa........................................................................................................................70
4.5 A força gravitacional exercida pela Terra....................................................................................75
Unidade II
5 ÓRBITA PLANETÁRIA.......................................................................................................................................80
5.1 Leis de Kepler..........................................................................................................................................80
5.1.1 Primeira lei de Kepler.............................................................................................................................80
5.1.2 Segunda lei de Kepler............................................................................................................................81
5.1.3 Terceira lei de Kepler...............................................................................................................................82
5.2 A concordância entre a teoria da gravitação de Newton e as leis de Kepler...............84
5.3 O movimento de precessão...............................................................................................................87
6 O FENÔMENO DAS MARÉS .........................................................................................................................89
7 FUGINDO DA GRAVIDADE............................................................................................................................96
7.1 Potencial gravitacional........................................................................................................................96
7.2 Velocidade de escape...........................................................................................................................98
8 TEORIA DA GRAVIDADE DE EINSTEIN: PROBLEMAS
NÃO SOLUCIONADOS DA GRAVITAÇÃO....................................................................................................103
7
APRESENTAÇÃO
Caro aluno,
Neste livro-texto estudaremos a gravitação e suas concepções desde a Antiguidade até os dias atuais.
A força gravitacional ocupa um papel central no funcionamento da natureza. Ela é o mecanismo que
mantém todas as coisas na Terra, incluindo a nós mesmos. A própria atmosfera e o ar que respiramos não
se acumulariam ao redor do planeta e escapariam para o espaço se não fosse a atração gravitacional.
Além disso, a gravidade é também responsável pelas órbitas dos planetas. Sem ela, a Terra não giraria
ao redor do Sol. Se a Terra não estivesse próxima do Sol, a vida aqui não seria possível. A origem e a
existência do Sol, bem como de todas as outras estrelas, deve-se à atração gravitacional.
Ao longo do texto, vamos elucidar aspectos gerais da concepção do mundo e do fenômeno da
gravitação. Especial destaque será dado à concepção do método científico e sua prevalência sobre a
especulação e o dogmatismo. Se, num primeiro instante, a descrição dos fenômenos era guiada pela
mitologia e pelo misticismo, depois a filosofia e a razão passaram a desempenhar papéis cada vez mais
importantes no processo de descrição do mundo. Entretanto, é essencial salientar que nem uma visão
mítica e nem uma visão racional podem substituir a experimentação como mecanismo de validação.
Nesse sentido, cabe destacar o trabalho de Galileu e o desenvolvimento e uso do método científico.
Enquanto a proposta de Copérnico de um sistema heliocêntrico se apoiava muito mais na beleza dos
argumentos em si, Galileu seria capaz de demonstrar a veracidade dessas ideias por meio da observação.
O trabalho de Galileu sobre o movimento e a queda dos corpos constitui a base para a formulação da
mecânica newtoniana.
Muitas vezes a prevalência de dogmatismos ou simplesmente o medo e a preguiça de pensar de
maneira profunda impõem obstáculos à evolução científica. Esses entraves podem ter consequências
catastróficas ou extremamente duradouras. O geocentrismo permaneceu por mais de 1500 anos
incontestado, desde Ptolomeu até Copérnico. Isto aconteceu porque era o padrão mais tradicional e
mais aceito até então. Ao defender o modelo heliocêntrico, Galileu se tornou alvo da Inquisição e foi
perseguido por defender uma visão tida como revolucionária. No entanto, seu legado se propagou
através do tempo. Galileu representa um marco na transição de um mundo em que as ponderações
científicas passavam por um julgamento de acordo com a crença em vigor para uma época na qual a
compatibilidade com a observação seria a responsável por determinar aquilo em que se deve acreditar.
Sem essa trajetória, Newton, que, curiosamente, nasceu no ano seguinte ao da morte de Galileu, não
teria desfrutado da liberdade de pensamento para promover seu trabalho.
A teoria da gravitação de Newton, que também será abordada nesta obra, é uma obra notável. Ela foi
desenvolvida no século XVII e permaneceu absoluta e intocável por mais de 200 anos. Ainda hoje é uma
excelente ferramenta para descrever a maior parte dos fenômenos gravitacionais que experimentamos
no nosso cotidiano ou que notamos no movimento dos corpos celestes. Contudo, cabe destacar que em
ciência não existe verdade absoluta. As explicações e modelos que construímos necessitam de constante
revisão e questionamento. Isto não é uma falha da ciência, mas, ao contrário, uma de suas mais relevantes
características.Mesmonummundoondeateorianewtonianadagravitaçãoestavamuitobemestabelecida,
8
havia margem para reformulação. Esse novo princípio da gravitação foi proposto por Einstein em 1916
– tratava-se da teoria da relatividade geral. Com ela, passou a ser possível explicar alguns poucos
fenômenos mal-compreendidos até então. À primeira vista, parecia um ganho pequeno, mas isso foi capaz
de prever uma série de fenômenos que nem sequer se imaginava que poderiam ocorrer.
A janela do questionamento nunca deve ser fechada. Mesmo hoje as teorias instituídas devem ser
constantemente testadas, e o estudante é convidado a interrogar e duvidar sempre, inclusive do que
está escrito neste livro! A dúvida e a experimentação constituem a principal frente de defesa contra a
estagnação e são importantes ferramentas no auxílio ao pensamento e ao desenvolvimento.
Boa leitura!
INTRODUÇÃO
Com o advento da ciência, um alto grau de entendimento da natureza foi atingido. Hoje é possível
saber não apenas o que acontece, mas, em muitos casos, como e por que determinado fenômeno
acontece. A ciência tem sido capaz de contar uma história coerente sobre como nosso Universo começou
e sobre como ele tem evoluído.
Na história do Universo, a gravidade ocupa um papel central. Ela é a força da natureza que opera
em todos os lugares, controlando os efeitos de todas as outras forças onde quer que elas atuem.
Regula inúmeros relógios naturais e a própria passagem do tempo, sejam as órbitas dos planetas,
seja o tempo de vida das estrelas. A gravidade é a força que domina em alguns dos locais e eventos
mais violentos e poderosos no cosmos, como os buracos negros, quasares, pulsares e supernovas.
Ela é responsável por nos manter no chão, por preservar a Lua em órbita ao redor da Terra, a Terra
e os outros planetas em órbita ao redor do Sol e também o Sol em sua órbita na nossa galáxia. Ela
conserva o vínculo entre as estrelas que formam galáxias inteiras, bem como controla o movimento
e a interação que agrupam diferentes galáxias, formando os chamados aglomerados de galáxias. A
interação gravitacional entre pequenos átomos de hidrogênio cria gigantescas nuvens, muito maiores
que o nosso sistema solar. O colapso gravitacional dessas nuvens, por sua vez, é o evento que dá
origem às estrelas e aos sistemas planetários.
A gravidade está em todo lugar. Não importa aonde vamos, não podemos escapar dela. Pegando uma
pedra na mão, podemos sentir o seu peso. Se levarmos a pedra para dentro de um prédio, continuaremos
sentindo o seu peso e não notaremos nenhuma diferença. Se a levarmos para dentro de um carro
em movimento, ainda assim não haverá diferença. Essa característica (impossibilidade de escapar da
gravidade) a faz diferente de todas as outras forças da natureza. Por exemplo, se levarmos um rádio
portátil para dentro de um invólucro de metal, como um carro, teremos sérias dificuldades para sintonizar
as estações. Ondas de rádio são ondas eletromagnéticas que propagam informação por meio de forças
eletromagnéticas. Esse tipo de força, ao contrário da gravitacional, não é capaz de penetrar em qualquer
lugar. Ela pode ser excluída de alguma região desde que escolhamos o material certo para as paredes.
Para a gravidade, porém, isso não é verdade. Mesmo que coloquemos a nossa pedra dentro de uma sala
cujas paredes sejam extremamente espessas, ela ainda vai pesar o mesmo que antes. A gravidade atua
em tudo da mesma maneira.
9
Neste livro apresentaremos os desenvolvimentos realizados pela civilização humana na busca da
compreensão da gravidade. Vamos iniciar nosso percurso descrevendo as primeiras ideias a respeito
de como o nosso Universo é formado. Ideias de caráter um tanto quanto filosofal, sem grande rigor
científico ainda. Depois, estudaremos o excelente trabalho de Galileu Galilei sobre o movimento de
corpos sob a ação da gravidade. Daremos ênfase à forma como ele obteve suas conclusões, de modo a
apresentar como o desenvolvimento na ciência ocorre de maneira gradual, com recorrentes verificações
experimentais de nossas ideias. Subsequentemente, evidenciaremos uma das mais belas teorias já criadas
pelo homem, a lei da gravitação universal, de Newton. Além disso, abordaremos as consequências de
sua análise, demonstrando uma série de aplicações, discutindo fenômenos naturais e indicando as
ferramentas necessárias para a concepção da teoria. Por fim, faremos uma introdução à teoria moderna
da gravitação, a relatividade geral de Einstein. Discutiremos por que este modelo suprimiu a teoria
newtoniana da gravitação, expondo exemplos de casos em que a concepção newtoniana falhava.
11
GRAVITAÇÃO
Unidade I
1 O UNIVERSO OBSERVÁVEL
1.1 A noção de “em cima” e “embaixo”
Não é difícil notar que os objetos em geral denotam uma tendência natural de ir de cima para baixo.
Se abandonarmos uma pedra no ar, supomos que ela cairá. Se a colocamos sobre uma mesa, esperamos
que ela repouse ali indefinidamente. Não seria nem um pouco natural, por exemplo, observar a pedra
levantar voo espontaneamente. Alguém poderia dizer que é claro que os pássaros voam e que, portanto,
nem tudo na natureza apresenta a tendência de ir para baixo. Contudo, o voo dos pássaros deve ser
explicado pelo movimento das asas em relação ao ar. Se não houvesse esse movimento ou se o ar não
estivesse presente, o pássaro cairia como qualquer outro objeto.
Apesar da proposição de que os objetos caem de cima para baixo parecer simples, os próprios
conceitos de “em cima” e “embaixo” não são absolutos. Sua definição requer um conhecimento sobre o
mundo que nos cerca. Para um observador na Terra, o sentido que vai do solo para o céu é “para cima”.
Já o sentido contrário, que vai do céu contra o chão é “para baixo”, sendo este último a direção de queda
dos corpos.
Em cima
Embaixo
Figura 1 – Ilustração mostrando o conceito de “em cima” e “embaixo” para um observador na Terra
Por outro lado, alguém que vê a Terra de longe pode notar claramente seu formato esférico. Então,
nota que os corpos sempre caem no sentido do centro da Terra. Desse modo, não pode haver um
ponto mais “embaixo” do que o centro do planeta, e “em cima” pode ser qualquer direção que se afaste
radialmente do centro. Para tal espectador, a proposição de que os objetos caem de cima para baixo já
não é a maneira mais precisa de se relatar o que ocorre. Provavelmente, nessa situação, seria melhor
dizer simplesmente que os objetos são atraídos no sentido do centro da Terra.
12
Unidade I
Em cima
Em cima
Em cima
Em cima
Embaixo
Embaixo
Embaixo
Embaixo
Figura 2 – Ilustração mostrando o conceito de “em cima” e “embaixo” para um observador fora da Terra
É claro que o observador que vê a Terra de fora ocupa uma posição privilegiada, e se não tivéssemos
acesso à tecnologia isso seria impossível. Embora atualmente possa parecer muito óbvio que a Terra
é de fato esférica, no passado acreditava-se que ela era plana. Dadas às limitações tecnológicas de
determinadas épocas e civilizações, não havia meio evidente ou acessível que permitisse destacar razões
contrárias a essa hipótese. A defesa da tese de que a Terra seria esférica poderia facilmente encontrar
oposição em argumentos como:
“Se a Terra fosse redonda, as pessoas do outro lado cairiam no espaço vazio.”
“Se a Terra fosse redonda, os oceanos escoariam para a parte de baixo e se esvaziariam.”
A ideia de uma Terra esférica começou a surgir na Grécia Antiga – por volta do século VI a.C. –
mas, foi superada nos séculos seguintes por inúmeros experimentos, argumentos filosóficos e cálculos
astronômicos. As alegações mais simples que evidenciam esse fato são: o desaparecimento dos navios
no horizonte e a forma redonda da projeção da sombra da Terra sobre a Lua.
Mesmo em tempos atuais, existem correntes ideológicas que defendem ideias notoriamente
antiquadas. Algumas dessas divisões sugerem que a Terra na verdade teria o formato de um disco
e que a proposição (e todas as respectivas e inúmeras comprovações) de que a Terra seria esférica
não passa de uma grande conspiração envolvendo governos, indústria e até mesmo a comunidade
científica internacional.
Não acredita? Então pesquise na internet: “a Terra é plana”!
13
GRAVITAÇÃO
1.2 A determinação do raio da Terra
Um famoso cálculo que veio a corroborar o modelo de uma Terra esférica foi realizado por Eratóstenes
no século III a.C. Ele definiu o comprimento da circunferência e, consequentemente, o raio do planeta.
Eratóstenes de Cirene foi o diretor da Biblioteca de Alexandria. Em um dos manuscritos da instituição,
tomou conhecimento que no solstício de verão (o primeiro dia do verão), seria possível observar ao meio-
dia o fundo de um poço na cidade de Siena. Em outras palavras, nesse dia, horário e local específicos, o
Sol se encontrava no zênite, no topo da esfera celeste, bem no centro do céu. Por causa disso a luz do
Sol chegava àquele local em uma direção perpendicular em relação ao solo e podia incidir diretamente
sobre o fundo do poço. Nessa situação, a luz formava um ângulo q=0º em relação à vertical.
Em Alexandria, em data e hora equivalente, o mesmo fenômeno não era verificado. Isto é, a luz do
Sol não chegava ao fundo de nenhum poço ao meio-dia. Fixando uma estaca verticalmente no chão,
Eratóstenes podia medir o ângulo que a luz do Sol formava com a estaca, e assim poderia medir o
ângulo q que a luz formava com a vertical.
Para realizar o cálculo do ângulo, era necessário o conhecimento prévio da altura h da estaca e medir
o tamanho da sombra formada (s). A razão entre o comprimento da sombra e a altura da estaca seria
exatamente a tangente do ângulo q. A figura a seguir esquematiza a afirmação.
tanθ =
h
s
Terra
Siena
Alexandria
d
s
Solθ
θt
hR
Figura 3 – Esquema dos ângulos e distâncias envolvidas no experimento de Eratóstenes para determinação do raio da Terra
Baseado neste procedimento, Eratóstenes realizou as medidas e encontrou um ângulo de
aproximadamente 7,2º.
Para a determinação do raio da Terra, Eratóstenes precisaria seguir a distância entre as cidades de
Siena e Alexandria. Ele obteve tal informação contratando um itinerante, que contaria o número de
passos na viagem. Por mais estranho que possa parecer, esse era um método comum na época para
14
Unidade I
medir distâncias. As pessoas que faziam essas medidas eram treinadas para caminhar com passadas
muito regulares. A distância obtida com esse método foi de 5.040 estádios.
O estádio era uma unidade de medida para distância utilizada naquela época, sendo que 1
estádio = 157,7 metros. Logo, a distância d medida entre as duas cidades foi de 5.040 x 157,7 = 794.808
metros, ou seja, cerca de 795 km.
Considerando que os raios de luz do Sol se propagam praticamente paralelos uns aos outros, a
distância d entre as cidades corresponde a um arco de circunferência, conforme a figura anterior.
Portanto:
d R= ( ). .
π
θ
1800
O ângulo q é dado em graus e R é o raio da Terra.
A fórmula destacada permite determinar o raio R da Terra, mas na verdade o que Eratóstenes
calculou foi o comprimento da circunferência C. Para repetir o procedimento dele, basta lembrar que
uma circunferência possui 360o
e definir uma regra de proporção como esta:
7,2º ↔ 795 km
360º ↔ C km
Que leva a:
C = 39750 km para o comprimento da circunferência da Terra
ou
R = 6326 km para o raio da Terra
Esses valores são muito próximos dos valores reais. O comprimento da circunferência da
Terra, por exemplo, é de 40.030 km, que difere em apenas 0,7% do valor obtido por Eratóstenes.
Os resultados são importantes e é um feito notável que eles tenham sido obtidos com tamanha
precisão já no século III a.C. No entanto, talvez mais notável ainda seja perceber que, mesmo
nessa época remota, já se tenha percebido um fato aparentemente não óbvio: a Terra é, de
fato, redonda!
É surpreendente que na Idade Média o retrocesso cultural tenha levado a sociedade a aceitar
como senso comum que a Terra era achatada. Por ocasião das Grandes Navegações, a proposta de
que se poderia chegar às Índias navegando para o Ocidente parecia completamente revolucionária
e contrassensual.
15
GRAVITAÇÃO
1.3 Aristóteles e Ptolomeu: o geocentrismo
A idealização de um Universo geocêntrico, ou seja, com a Terra ocupando o centro do Universo, teve
como um dos principais defensores Aristóteles. Ele foi um importante filósofo grego que viveu no século
IV a.C. Sua influência se tornou marcante na história da ciência porque diversas de suas ideias foram
tidas como corretas por séculos. Segundo sua concepção, o Universo seria uma esfera finita (esfera
celeste) cujas estrelas ficariam todas presas. A Terra permaneceria no centro do Universo e os planetas e
astros do sistema solar orbitariam ao seu redor. A atração da gravidade seria resultado da tendência que
todas as coisas teriam de ir ao seu lugar natural no Universo, o centro, e logo, a Terra.
Baseado em sua visão, Ptolomeu criou um modelo planetário preditivo, ou seja, que permitia a
previsão de alguns eventos astronômicos. Este foi apresentado em sua principal obra, o Almagesto
(que, em grego, significa “grande tratado”). Em seu modelo, assim como proposto por Aristóteles, a
Terra permaneceria no centro do Universo e os outros corpos celestes, planetas e estrelas seriam órbitas
ao seu redor. As órbitas dos planetas eram relativamente complicadas, resultando de um sistema de
epiciclos, que consistem de círculos com centro em outros círculos. A palavra “planeta”, em grego,
significa “errante”, que aponta para a observação do comportamento estranho de movimento não
padronizado. As estrelas pareciam se mover todas juntas na esfera celeste e o Sol e a Lua representariam
órbitas simples ao redor da Terra. A imagem a seguir mostra uma ilustração esquemática do modelo.
Epiciclo
Figura 4 – Esquema do modelo planetário proposto por Ptolomeu
Se avaliarmos a questão com cautela, a visão geocêntrica é uma ideia bastante óbvia do ponto de
vista de um observador na Terra. Não há razão a princípio para supor que a Terra, como um todo, possa
estar se movendo. Quando olhamos para o céu durante o dia, o Sol se move do Leste para o Oeste. Da
mesma forma, todas as estrelas parecem se mover juntas no céu durante a noite. A Lua e os planetas
se movem de modo independente, indo e voltando. Ora, se as estrelas andam todas juntas, também é
razoável supor que todas elas se encontrem fixas em alguma estrutura. Vem daí a ideia de uma esfera
celeste.
O modelo ptolomaico foi o modelo consensual até o período renascentista, sendo defendido pela
Igreja Católica durante a Idade Média e o Renascimento.
16
Unidade I
1.4 Copérnico e o heliocentrismo
NicolauCopérnicofoiumastrônomopolonêsque,noséculoXVI,propôsemseulivroDeRevolutionibus
Orbium Coelestium (“Da Revolução de Esferas Celestes“) a teoria heliocêntrica ou heliocentrismo (em
grego, helios significa Sol). Essa revolucionária ideia propunha que o Sol, e não a Terra, é que seria o
centro do universo. Os planetas, incluindo a Terra, orbitariam ao redor do Sol em trajetórias circulares.
Ao contrário do que se pode imaginar, não foram constatadas críticas sistemáticas ao modelo
heliocêntrico por parte do clero católico durante a vida de Copérnico. Talvez porque o próprio Copérnico
fosse cônego da Igreja Católica. De fato, membros importantes da cúpula da Igreja ficaram positivamente
impressionados pela nova proposta e insistiram para que aquelas ideias fossem mais desenvolvidas.
Ainda assim, quase um século depois, quando Galileu veio a defender a teoria heliocêntrica, ele acabou
deparando com grandes resistências no seio da mesma Igreja Católica.
ComoCopérnicotinhaporbaseapenassuasobservaçõesdosastrosaolhonuenãotinhapossibilidade
de demonstração de sua hipótese, a comunidade científica da época acolheu suas ideias com bastante
ceticismo.Apesardisso,seutrabalhomarcouoiníciodeduasgrandesmudançasdeperspectiva.Aprimeira
diz respeito à escala de grandeza do Universo: avanços subsequentes na astronomia demonstraram que
o Universo era muito mais vasto do que se imaginava até então. A segunda está relacionada justamente
à queda dos corpos. A explicação aristotélica dizia que a Terra era o centro do Universo e, portanto, o
lugar natural de todas as coisas. Na teoria heliocêntrica, contudo, a Terra perdia esse status, o que exigia
uma revisão das leis que governavam a queda dos corpos. Posteriormente, essa necessidade de revisão
conduziria Newton a formular sua lei da gravitação universal.
Figura 5 – Esquema do modelo planetário proposto por Copérnico
1.5 Evidências a favor do sistema heliocêntrico
Durante o Renascimento diversas evidências foram apresentadas a favor do modelo heliocêntrico,
diminuindoaaceitaçãodomodeloptolomaico.Dentreosprincipaisproponentesdomodeloheliocêntrico
nesse período, destacam-se Johannes Kepler e Galileu Galilei.
Johannes Kepler foi um astrônomo e matemático alemão nascido no ano de 1571. Foi um amplo
defensor do modelo heliocêntrico, embora suas convicções fossem baseadas em crenças teológicas.
Para ele o Universo representaria Deus; o Sol, o pai; os astros, o filho; e o espaço, o espírito santo. Kepler
17
GRAVITAÇÃO
realizou medidas da órbita de planetas e herdou uma extensa coleção de observações feitas por outro
astrônomo, Tycho Brahe, que havia falecido precocemente. A partir dos dados da órbita de Marte, ele
verificou que os planetas realizavam órbitas elípticas ao redor do Sol, quando este era colocado em um
dos focos. Formulou o que chamamos de leis de Kepler, que serão discutidas mais a frente. Seu trabalho
foi incluído na lista de livros proibidos pela Igreja Católica, mas foi utilizado por Isaac Newton décadas
depois para corroborar seu modelo gravitacional.
Galileu Galilei foi um importantíssimo físico e é tido como um dos pais da ciência moderna.
Nascido em Pisa em 1564, atuou no campo da astronomia, mecânica, hidráulica e acústica. Foi o
primeiro cientista a utilizar telescópios para a observação dos astros. Com essa ferramenta, chegou
à conclusão de que o modelo ptolomaico não poderia estar certo. Como importantes resultados,
verificou os seguintes aspectos:
•	 Júpiter possuía satélites, o que provava que nem todos os astros giravam em torno da Terra. A
publicação desse resultado causou bastante comoção na Europa.
•	 As fases de Vênus, cheia ou nova, e a variação no seu tamanho. Galileu mostrou que somente seria
possível obter essas visualizações se Vênus orbitasse ao redor do Sol. A partir de sua publicação, o
modelo ptolomaico se tornava racionalmente inconsistente e insustentável.
•	 Manchas solares. Galileu provou a partir de suas observações que o Sol apresentava movimento
de rotação, sugerindo que a Terra também poderia estar girando.
•	Um dos principais argumentos dos defensores do Geocentrismo na época era que deveria ser
possível utilizar o método de paralaxe para determinação das distâncias das estrelas caso o
modelo copernicano fosse correto. Com suas observações, Galileu mostrou que as distâncias até
as estrelas eram grandes demais em relação às suas órbitas. Assim, seria impossível utilizar o
método de paralaxe.
Com o aumento dos indícios de que o modelo geocêntrico não seria correto, Galileu começou a sofrer
severas retaliações por parte da Igreja Católica. Como resultado final, Galileu foi julgado e condenado
pela Santa Inquisição em 1633. Foi sentenciado a três penas:
•	 assinar uma declaração relatando que jamais defenderia novamente o modelo heliocêntrico e que
o refutava de toda forma;
•	 prisão perpétua, que acabou sendo trocada por prisão perpétua domiciliar;
•	banimento de seu último escrito, Dialogue, no qual expunha de modo mais claro o modelo
heliocêntrico e suas evidências.
Tanto os trabalhos de Galileu quanto os de Kepler se difundiram nas décadas seguintes, tornando
o heliocentrismo uma ideia bastante popular, contudo, sua aceitação definitiva só veio após a lei da
gravitação universal de Newton.
18
Unidade I
2 COMO AS COISAS CAEM
Durante séculos a filosofia aristotélica dominou o pensamento humano. As questões científicas
eram respondidas com argumentos dialéticos e nenhuma tentativa de verificação experimental direta
era feita. Um exemplo clássico é que se acreditava que os corpos mais pesados caíam mais rapidamente
que os leves. Mesmo uma afirmação tão simples de ser refutada na prática permaneceu por séculos
como verdadeira.
O desenvolvimento da metodologia científica, cujo princípio se baseia na comprovação de hipóteses
por meio de experimentos previamente planejados, só ocorreu no Renascimento, sendo atribuído
principalmente a Galileu. Na História, não se conhece nenhuma tentativa anterior à dele em realizar de
estudo sistemático sobre o movimento.
2.1 O experimento do pêndulo e a Torre de Pisa
Conta-se que Galileu, quando foi a uma missa na catedral de Pisa, observou um lustre balançar
de um lado para o outro devido à ação do vento. Ele notou que apesar da amplitude das oscilações
(diminuindo até pararem), o tempo de cada oscilação, isto é, o tempo de cada movimento completo de
vaivém, permanecia mais ou menos constante.
Voltando à sua casa, ele decidiu tentar checar a veracidade daquela hipótese. Para isso, amarrou uma
pedra em um barbante e a pendurou, formando um pêndulo. Na sequência, fez a pedra balançar e passou
a medir o período das oscilações. Em pleno século XVII, ele não dispunha de relógios ou cronômetros.
Então, para contar o tempo, utilizou como referência a contagem de suas próprias pulsações (tente
fazer isso! Você vai notar que exige certa habilidade). Assim, conseguiu verificar que sua hipótese era de
fato verdadeira: à medida que o pêndulo oscilava, embora com amplitudes cada vez menores, o tempo
de cada oscilação permanecia praticamente constante.
θ θ
M
M
L1
L2
Figura 6 – Esquema ilustrativo do experimento de Galileu com pêndulos utilizando barbantes de diferentes comprimentos
19
GRAVITAÇÃO
θ θ
M1 M2
L L
Figura 7 – Esquema ilustrativo do experimento de Galileu com pêndulos utilizando objetos de massas diferentes
Não satisfeito, Galileu repetiu o mesmo experimento inúmeras vezes, usando fios mais curtos e mais
longos, bem como pedras diferentes, mais leves e mais pesadas. Isso acabou levando-o a no mínimo
duas descobertas:
•	 Os períodos de oscilação dependiam do comprimento do fio, de modo que, se o fio era mais longo,
o período de oscilação era maior.
•	 Surpreendentemente, os períodos de oscilação pareciam ser independentes do peso das pedras
penduradas, ou seja, se ele pendurasse uma pedra mais leve ou mais pesada num fio de mesmo
comprimento e a fizesse oscilar a partir da mesma posição, o tempo de cada oscilação seria
exatamente o mesmo.
A segunda observação relatada representava uma contradição em relação à noção vigente de que
os corpos deviam cair mais rápido se fossem mais pesados. De fato, o movimento de balanço de um
pêndulo pode ser pensado como um movimento de queda livre, em que a trajetória do objeto é defletida
da vertical por uma restrição imposta pela presença do fio. Desse modo, o fio acaba por conduzir
o objeto a descrever uma trajetória na forma de um arco de circunferência. Se objetos com pesos
diferentes, presos a fios de mesmo comprimento, e abandonados do mesmo ângulo, levam o mesmo
tempo para chegar ao ponto mais baixo da trajetória, então deveriam levar o mesmo tempo para atingir
o solo ao serem abandonados em queda livre de uma mesma altura.
Embora não haja registro oficial desse fato, muitos dizem que, após chegar à conclusão resultante
do experimento com os pêndulos, Galileu subiu até o alto da famosa Torre de Pisa. De lá, abandonou dois
objetos ao mesmo tempo, um bem mais leve do que o outro. Para surpresa geral, os dois objetos teriam
então atingido o solo ao mesmo tempo.
Alguém poderia facilmente argumentar que nem todos os corpos abandonados da mesma altura no
mesmo instante chegam juntos ao chão. Essa pessoa usaria talvez como fundamento uma folha de papel
em comparação com uma pedra. De fato, a folha de papel demora mais para chegar ao solo. Porém, se
a amassarmos e repetirmos o experimento, iremos constatar que ambas caem praticamente juntas. Para
20
Unidade I
explicar a diferença antes observada, temos que levar em conta a resistência do ar. Amassando a folha,
não mudamos sua massa, mas alteramos drasticamente a maneira como a resistência do ar atua. Se, em
vez de amassar a folha de papel, tivéssemos uma câmara de vácuo, observaríamos o mesmo tempo de
queda tanto para a folha quanto para a pedra.
Exemplo de Aplicação
Há um experimento muito simples que você pode fazer. Assim, poderá constatar a igualdade nos
tempos de queda e ao mesmo tempo anular a resistência do ar. Para realizá-lo, não é preciso amassar a
folha de papel nem ter uma câmara de vácuo.
O material necessário é um caderno.
Procedimento:
•	 parte 1:
—	arranque uma folha de papel de dentro do caderno;
—	segure a folha com uma mão e o caderno com a outra;
—	solte o caderno e a folha ao mesmo tempo e note o que acontece.
•	 parte 2:
—	coloque a folha de papel em cima do caderno;
—	certifique-se de que nenhuma borda da folha fique para fora do caderno;
—	segure o conjunto (caderno + folha);
—	solte o conjunto e observe o que acontece.
Resultado esperado:
•	 parte 1:
O caderno chega ao chão antes da folha, pois ela é mais suscetível à ação da resistência do ar.
•	 parte 2:
—	ao ser posicionado embaixo da folha, o caderno bloqueia o ar, que ofereceria resistência à
folha, durante o movimento de queda;
—	o caderno e a folha caem praticamente juntos.
21
GRAVITAÇÃO
2.2 O experimento do plano inclinado
O próximo passo de Galileu no estudo da queda dos corpos foi tentar encontrar uma expressão
matemática que relacionasse o tempo de queda e a altura de onde o objeto caía. Ocorre, porém, que
o movimento de queda livre é muito rápido para ser acompanhado em detalhe pelo olho humano. Por
isso, Galileu resolveu fazer bolas feitas de diferentes materiais descerem um plano inclinado. Quando
um corpo desce pelo plano, este o faz somente devido à ação da gravidade, como no movimento de
queda livre. A ideia do experimento consiste em utilizar o plano inclinado como um suporte parcial para
retardar o movimento de queda.
θ
Figura 8 – Esquema ilustrativo do experimento com planos inclinados realizado por Galileu
Para medir o tempo nesse experimento, Galileu utilizou um relógio d’água. Esse instrumento consiste
basicamente num recipiente com um furo por onde a água pode escoar a uma vazão constante. A
água é coletada em outra fôrma, que é posteriormente pesada em uma balança. O tempo de descida é
proporcional ao peso de água recolhida.
Exemplo de Aplicação
Podemos facilmente repetir o experimento do plano inclinado de Galileu. O objetivo é medir o tempo
de descida de um objeto e relacioná-lo à distância por ele percorrida. Poderíamos construir nossos
próprios relógios d’água também. Contudo, para medir o tempo de descida e chegar à conclusão que
desejamos, podemos usar um cronômetro.
Material necessário:
•	 Uma tábua de madeira suficientemente longa (pelo menos 2 metros).
•	 Um cronômetro (ou pode fazer o seu próprio relógio d’água).
•	 Um ou dois livros (de Física) com pelo menos umas 200 páginas cada ou qualquer outro objeto
que possa servir de apoio para a tábua. O ideal é que a altura do objeto que servirá de apoio seja
de cerca de 10 cm.
•	 Um cilindro ou esfera que possa rolar pela tábua (um cilindro seria melhor nesse caso, pois é mais
difícil para um cilindro do que para uma esfera rolar para o lado e sair da tábua).
22
Unidade I
•	 Uma trena.
•	 Uma caneta marcadora.
•	 Uma balança de precisão.
Procedimento:
—	parte 1:
-	 posicione uma das extremidades da tábua sobre a pilha de livros ou suporte e a outra extremidade
no chão, formando um plano inclinado;
-	 use a trena para medir o comprimento da tábua e a altura da extremidade elevada.
Então, temos a seguinte questão: Qual será a fração da força gravitacional que irá contribuir com o
movimento de descida do objeto no plano?
—	parte 2:
-	 Inicialmente tire a medida da massa do cilindro que irá utilizar.
-	 Coloque o cilindro no topo do plano inclinado de modo que ele possa rolar descendo o plano.
Abandone-o a partir dessa posição.
-	 Conte 1 segundo no cronômetro a partir do instante em que o cilindro começou a descer e então
observe com atenção a posição onde ele se encontra.
-	 Use a caneta marcadora para fixar na tábua a posição do cilindro no instante t = 1 s.
-	 Repita o procedimento várias vezes a fim de determinar a posição do cilindro com a maior
precisão possível. Depois de decidir qual o ponto da tábua que melhor representa a posição do cilindro
no instante t = 1 s, marque aquela posição com a caneta e anote “t = 1 s” perto dela.
-	 Repita todos os passos desde o início da parte 2, mas agora para um tempo de 2 segundos.
-	 Repita novamente, mas agora para 3 segundos.
-	 Continue a repetir as medidas enquanto o intervalo de tempo permitir a realização das marcações
no plano.
-	 Meça as distâncias entre o ponto de partida do cilindro e os pontos por onde ele passa em t = 1 s,
2 s, 3 s etc.
23
GRAVITAÇÃO
-	 Monte uma tabela relacionando os tempos e as distâncias percorridas. Desenhe uma coluna para
as distâncias e uma coluna para os tempos. Depois, faça uma terceira coluna e coloque nela os valores
dos tempos elevados ao quadrado.
Nesse instante, pergunte-se: qual a relação matemática conectando distância e tempo?
—	parte 3:
-	 repita a parte anterior (2) com cilindros de massas diferentes.
A relação matemática encontrada muda?
Resultado esperado na parte 1:
A força produzida pela ação da gravidade é denominada força peso e sempre atua verticalmente no
sentido do centro da Terra. Neste experimento, entretanto, devido à presença do plano inclinado, apenas
a componente tangencial Pt
= P sen q irá contribuir com o movimento de descida.
θ
Psenθ
Pcosθ
P
θ
Figura 9 – Ilustração dos componentes vetoriais da força peso atuando na esfera que desce o plano inclinado
O ângulo de inclinação q pode ser calculado através das medidas do comprimento c da tábua e da
altura h de onde o corpo é abandonado. A equação utilizada para essa finalidade é:
sen
h
c
θ =
A partir da inclinação, podemos calcular qual a fração da força peso que contribui com o movimento
de descida do cilindro. Basta lembrar que somente a força peso na direção tangencial produz o
movimento:
F
P
P
P sen
P
sen
h
c
t .
= = = =
θ
θ
Ou seja, a fração da força peso que produz o movimento depende apenas da inclinação do plano.
Esse é um problema típico envolvendo a decomposição de vetores (que estudaremos mais adiante).
Resultado esperado na parte 2:
24
Unidade I
Ao construir a tabela, faça o seguinte:
- Pegue a primeira linha da tabela e divida a distância medida pelo quadrado do tempo. Depois faça
o mesmo para a segunda linha, para a terceira e assim por diante. Vá anotando os resultados. Espera-se
que os resultados sejam bem próximos uns dos outros, ou seja, a razão entre a distância percorrida DS
e o quadrado do tempo é constante:
∆
∆
S
t
S t2
2
= constante constante.⇒ =
A segunda lei de Newton nos diz que a força resultante deve ser igual ao produto da massa pela
aceleração.
F ma∑ = .
A força resultante nesse caso é a força peso na direção tangencial (Pt
= P senq), cujo ângulo
calculamos na parte 1.
P mat = .
Assim, podemos encontrar a aceleração do cilindro conforme:
P sen
m
a
. θ
=
Onde a é a aceleração, e m a massa.
Após calcular a aceleração utilizando a última expressão , podemos notar que a aceleração do cilindro
é o dobro da constante observada na divisão feita anteriormente.
2
2
.Constante=
Constante
a
a
=
Logo, a expressão matemática procurada é:
∆
∆
S t
S
a
t
=
=
Constante.
.
2
2
2
Resultado esperado na parte 3:
Espera-se que a relação matemática continue a mesma, não importando a massa do cilindro utilizado.
25
GRAVITAÇÃO
Devemos destacar que, para obter o resultado da parte 2, nós trapaceamos um pouco. Isso porque
Galileu não conhecia a segunda lei de Newton. Na verdade Newton nasceu em 1643, um ano depois
da morte de Galileu. Como Galileu teria feito então para descobrir que a constante relatada aqui era
igual a a/2? Para responder a tal questão, teremos de introduzir o conceito de velocidade instantânea,
definida por Galileu.
2.3 Velocidade instantânea
Em seu livro Diálogo sobre os dois Principais Sistemas do Mundo, Galileu discutiu o fato de ter obtido
distâncias percorridas proporcionais ao quadrado dos tempos. Ele afirma que, nesse caso, a velocidade v
do corpo deve ser proporcional à primeira potência do tempo.
∆S t v at= → =constante. 2
.
Isso não é difícil de supor se pensarmos que as velocidades são uma espécie de razão entre as
distâncias e tempos. Se pegarmos alguma grandeza x que é proporcional a t2
e dividirmos por t, vamos
obter algo proporcional a t (denominado A na expressão a seguir).
A
x
t
A t= → ∝
Galileu também poderia ter notado em seus resultados que as distâncias percorridas aumentavam
proporcionalmente a cada segundo. Ou seja, se subtrairmos a distância percorrida após 2 s pela distância
percorrida após 1 s e fizermos o mesmo procedimento com as distâncias percorridas após 3 s e 2 s, 4 s
e 3 s e assim por diante, verificaremos um crescimento proporcional.
Considerando uma velocidade proporcional ao tempo, teremos:
v = a.t
onde a é a aceleração.
Agora, considere o gráfico da velocidade em função do tempo. Se v = a.t, o gráfico deve ser
desenhado assim:
v
t
∆t
Figura 10 – Gráfico teórico da velocidade em função do tempo para um objeto esférico descendo um plano inclinado
26
Unidade I
Galileu já havia percebido que as velocidades dos corpos aumentavam durante o movimento de
queda livre. Entretanto, não sabia como definir a velocidade exatamente em um determinado instante
do percurso. Para solucionar tal questão, Galileu imaginou o movimento como sendo composto de
pequenos intervalos de tempo Dt, que poderiam ser tão pequenos quanto necessários. Para valores
realmente muito pequenos, a velocidade do objeto não deveria mudar significativamente e, portanto, um
cálculo de velocidade média era satisfatório. Desse modo, a velocidade instantânea é definida conforme:
v
dS
dt
=
onde dS é o espaço percorrido durante o infinitésimo de tempo dt, ou seja, um intervalo de tempo
Dt tendendo a zero.
Observação
Podemos sempre adotar um intervalo de tempo dt suficientemente
pequeno para que a relação anterior seja válida.
A distância total percorrida pelo cilindro no experimento do plano inclinado seria o resultado da soma
de todos os dS realizados durante o percurso. Para cada intervalo de tempo, no entanto, a velocidade é
considerada constante, o que garante que podemos obter o espaço dS pelo simples cálculo da área do
retângulo, formado por dt e v.
v
dS
dt
v dt dS
=
=.
Assim, o espaço percorrido é obtido pela soma das áreas dos diversos retângulos que compõem o
triângulo. O espaço percorrido total, por outro lado, deve ser igual à área do triângulo, que é calculada
segundo a equação:
∆S
v t.
= =área do triângulo =
altura.base
2 2
Substituindo v por at nesta expressão, encontramos finalmente:
∆S
at
=
2
2
O método de dividir figuras geométricas em um grande número de pequenas partes já era utilizado
desde a Grécia Antiga. No século III a.C., Arquimedes o usou para deduzir expressões para o volume de
um cone e de outras figuras geométricas. Galileu foi o primeiro a aplicar esse tipo de método à resolução
de problemas mecânicos. Mais tarde, Newton usaria e desenvolveria essa abordagem, dando origem a
uma das mais importantes disciplinas em ciências exatas – o cálculo diferencial e integral.
27
GRAVITAÇÃO
2.4 Composição dos movimentos
Outra valiosa contribuição de Galileu para a mecânica foi a elaboração do princípio de composição
e decomposição do movimento. Esse princípio é o que está por trás, por exemplo, da noção de analisar
os movimentos de pêndulos ou objetos descendo planos inclinados.
A ideia, como foi explicada aqui, é que uma das partes que compõem o movimento seja associada
a um movimento de queda livre. A outra parte complementaria a descrição do movimento, sendo
particular para cada caso analisado.
Noplanoinclinado,porexemplo,realizamosadecomposiçãonadireçãotangencialaoplanoinclinado
e na direção normal a ele. Isso ocorre porque, nesse caso, o movimento se dá na direção tangencial.
Sendo a descida do plano resultado apenas da ação da força peso, podemos relacionar o componente
tangencial ao movimento de queda livre.
θ
Psenθ
Pcosθ
P
θ
Figura 11 – Esquema ilustrativo dos componentes do vetor peso na análise de uma esfera descendo um plano inclinado
Para o movimento de pêndulo, é comum separar o vetor da força peso em um componente
tangencial à trajetória e na direção do fio que sustenta o massor. A diferença entre a tração no fio e
a componente radial do peso representa a força centrípeta, que é responsável por manter o objeto na
trajetória em forma de arco. Já a componente tangencial é que executa o movimento de vaivém em si,
sendo produzida apenas pela força peso e sendo relacionada ao movimento de queda livre.
Psenθ
Pcosθ
P
θ
θ
Figura 12 – Esquema demonstrativo dos componentes do vetor peso
na análise do movimento de um pêndulo simples
28
Unidade I
Dois componentes de um mesmo movimento são chamados de independentes se cada um deles
puder ser representado por um vetor e estes forem perpendiculares entre si. O procedimento de separação
de um vetor em dois componentes independentes é chamado de decomposição de vetores.
Do mesmo modo que podemos separar um movimento em componentes independentes, é possível
combinar os efeitos daqueles que atuam em direções distintas, obtendo um efeito resultante. O
procedimento de combinar vetores que apontam em direções distintas ou iguais para obter um vetor
que indica o efeito resultante é chamado soma de vetores. Note que a palavra “soma” aqui é usada com
um significado completamente diferente daquele que expressa o conceito usual de soma algébrica, que
é a soma entre números. A soma de vetores é uma operação de combinação ou composição de vetores
para obter um vetor resultante.
Para somar dois vetores, suponha que tenhamos os seguintes vetores:
A B
Figura 13
Então, pegamos um deles, sem rodá-lo, e colocamos a ponta dele na parte de trás do outro:
A
B
Figura 14
Depois, desenhamos um novo vetor ligando o início do primeiro vetor e o fim do segundo vetor. Este
será o vetor resultante!
A
B
R
Figura 15
29
GRAVITAÇÃO
Exemplo de Aplicação
Consideremos o exemplo da representação vetorial de deslocamentos. Suponhamos que um
carro anda em uma avenida no sentido norte e, depois de andar 2 km, ele vira à direita em uma rua
perpendicular a essa avenida. Então, ele anda por mais 1 km ao longo dessa rua no sentido leste.
Desenhe os vetores que representam o deslocamento do carro na avenida e o deslocamento do carro
na rua.
∆S1
∆S2
Figura 16
Depois elabore o vetor que expresse o deslocamento vetorial total do carro.
∆S1
∆S2
∆S
Figura 17
Note que o deslocamento vetorial total designa a distância entre o ponto de partida e o ponto de
chegada. O sentido da seta, por sua vez, permite-nos saber de onde o carro veio e para onde ele foi.
Podemos usar essa informação para olhar o desenho e distinguir entre a posição inicial e a posição final
do carro. Vale ressaltar que o deslocamento vetorial não denota a distância percorrida de fato pelo
carro, afinal ele anda mais do que o vetor resultante, pois está restrito a andar na avenida e na rua. O
que o deslocamento vetorial representa é uma medida do quão longe o carro chegou, e não da distância
que ele percorreu.
30
Unidade I
2.5 Lançamentos oblíquos: o movimento dos projéteis
2.5.1 Queda livre e lançamento vertical
Queda livre é o termo utilizado para classificar o movimento de corpos que são sujeitos apenas à
força da gravidade, estando ou não em movimento prévio. Podemos citar como exemplos uma faca
caindo no chão, a órbita da Lua ao redor da Terra, entre outras. Note que não obrigatoriamente as
trajetórias precisam ser retilíneas, pois a Lua descreve uma trajetória elíptica ao redor da Terra.
É importante notar que nenhum tipo de força resistiva significante pode atuar sobre o corpo. Por
exemplo, os paraquedistas, ao abrirem os braços e pernas, não expressam movimento de queda livre,
pois a resistência do ar é considerável no caso. Do mesmo modo, um objeto estático sob o solo apresenta
a reação normal devido ao chão e, logo, não se enquadra na definição.
Outro ponto essencial é que o movimento de queda livre não necessariamente parte a partir do
repouso. É possível lançar um corpo com certa velocidade inicial não nula para cima ou para baixo.
Nesta situação, teríamos um lançamento vertical seguido de queda livre.
Conforme foi mostrado no experimento do plano inclinado, durante a queda livre, um objeto
descreve um movimento uniformemente acelerado com aceleração para baixo. Assim, as equações do
movimento ficariam do seguinte modo:
y y v t
gt
v v gt
a g
y
y y
y
–= +
= −
= −
0 0
2
0
2
Onde y é a altura do corpo no instante t, medida de baixo para cima, y0
a altura inicial do corpo, v0y
o componente vertical da velocidade inicial, vy
o componente da velocidade vertical no instante t e g a
aceleração imposta pela força da gravidade.
Note que a aceleração, no caso, é negativa porque convencionamos a medida da posição
de baixo para cima. Desse modo, a aceleração da gravidade atua promovendo a diminuição dos
valores da posição vertical.
2.5.2 Movimento horizontal
A força gravitacional atua sempre na vertical, que é perpendicular à direção horizontal. Sendo
perpendiculares, essas duas direções são independentes entre si. O movimento de um corpo na horizontal
não é afetado pela gravidade.
Por exemplo, se pudéssemos fazer um disco deslizar sobre uma superfície horizontal sem nenhum
tipo de atrito, este deslizaria com a mesma velocidade inicial para sempre (ou pelo menos até chegar
31
GRAVITAÇÃO
ao fim da superfície). Entretanto, na prática, mesmo superfícies muito lisas apresentam algum tipo de
atrito e, por isso, os corpos tendem a parar depois de algum tempo.
Corpos com rodas estão limitados por algum tipo de atrito em seus rolamentos. E mesmo que
os corpos em si sejam redondos, como as esferas ou os cilindros, dificilmente terão uma forma
perfeitamente circular, o que pode impor uma resistência ao movimento. Ainda que o corpo tivesse uma
forma perfeitamente circular, tanto ele como a superfície de apoio não seriam perfeitamente rígidos.
Deformações relativas entre eles poderiam mudar momentaneamente a posição do centro de massa do
corpo, permitindo o surgimento de um torque resistivo que retardaria o movimento. Isso tudo sem falar
na resistência do ar, que provavelmente vai causar a desaceleração do corpo antes mesmo de qualquer
um dos efeitos citados.
Numa situação idealizada, em que tanto a resistência do ar como qualquer outro tipo de força dissipativa
não atua de maneira significativa, podemos assumir que um corpo colocado em movimento na horizontal
permanecerá em movimento retilíneo e uniforme até que encontre um obstáculo em seu caminho. Isso é o
que afirma a primeira lei de Newton: “Um corpo tende a permanecer em seu estado de repouso ou movimento
retilíneo e uniforme a menos que alguma força resultante não nula atue sobre ele.”
Salvas então as condições ideais supracitadas, um corpo em movimento horizontal irá satisfazer às
equações a seguir:
x x v t
v v
a
x
x x
x
= +
=
=
0
0
onde x é a posição do corpo no instante de tempo t, x0
a sua posição inicial e vx
o componente
horizontal da velocidade.
2.5.3 Lançamentos oblíquos
Um lançamento oblíquo consiste no lançamento de um corpo em uma direção arbitrária: nem na
horizontal nem na vertical. A ideia é lançá-lo impondo uma velocidade inicial v0
não nula e que forme
um ângulo q entre 0º e 90º com a horizontal. O objeto lançado é comumente denominado projétil.
hmáx
y
x
v0
θ
Figura 18 – Ilustração esquemática da trajetória de um projétil durante um lançamento oblíquo
32
Unidade I
A abordagem de Galileu para tratar esse problema consiste em decompor o movimento em um
componente vertical e outro horizontal. Para analisar esse procedimento de maneira simplificada,
podemos desprezar o efeito dissipativo da resistência do ar. Isso equivale a considerar o projétil com
uma forma razoavelmente aerodinâmica.
Lembremosagoraqueagravidadenãoatuanadireçãohorizontal.Portanto,ocomponentehorizontal
descreve movimento retilíneo e uniforme. Em outras palavras, se lançarmos um corpo obliquamente
num dia claro com o Sol a pino, observaremos o movimento da sombra do corpo no chão em linha reta
e com velocidade constante.
O componente vertical do movimento é equivalente ao de um lançamento vertical. Um movimento
de lançamento vertical é um movimento retilíneo uniformemente variado que se dá com aceleração
– g neste caso.
θ
v0 senθ
v0 cosθ
v0
Figura 19 – Componentes da decomposição do vetor velocidade
Em um dado instante de tempo t, a velocidade do projétil pode ser decomposta em um componente
horizontal e um componente vertical também. Observando a figura anterior, vemos facilmente que no
instante inicial teremos:
.cos
.
v v
v v sen
x
y
=
=



0
0 0
θ
θ
Como a força gravitacional não atua na direção horizontal, o componente x da velocidade
permanecerá inalterado ao longo do movimento. Com base nessas equações, pode-se analisar o
movimento do projétil determinando uma série de características, como o tempo de voo, a forma da
trajetória e o alcance horizontal.
Tempo de voo
Em um lançamento cuja altura da posição inicial é a mesma do ponto de pouso, o tempo de subida
será idêntico ao tempo de queda. Para calcular o tempo de voo neste caso, basta que seja determinado o
tempo de subida ou o de descida. A partir de então, dobra-se o valor obtendo o tempo de voo. O tempo
de subida é calculado impondo a condição de que, quando atinge a altura máxima, sua velocidade vai a
zero. Usando a fórmula da velocidade para um lançamento vertical:
v v gty y= −0
33
GRAVITAÇÃO
Considerando o projétil no ponto mais alto da trajetória, vy
=0:
0 0= −v gty subida
Que leva ao tempo de subida:
t
v
g
subida
y
=
0
Portanto, o tempo de voo será dado por:
t
v
g
voo
y
=
2 0
Lembrando que a velocidade inicial na direção y é dada por v0y
= v0
.senq, obtemos por fim:
t
v sen
g
voo =
2 0 θ
Alcance máximo
Também podemos calcular o alcance horizontal máximo do projétil. Para isso, basta calcular o
deslocamento horizontal DS = x – x0
que o projétil realiza durante o tempo de voo. Utilizando a equação
da posição para o movimento horizontal, temos:
x x v tx= + .0
Substituindo o tempo pelo tempo total de voo, teremos:
x x v t
x x v
v
g
sen
x voo
x
-
-
.0
0
02
=
=
θ
Por fim, substitui-se a velocidade inicial horizontal v0x
, obtendo:
cos
∆S
v sen
g
=
2 0
2
θ θ
Que é equivalente a:
∆S
v sen
g
= 0
2
2θ
34
Unidade I
Observação
Na expressão anterior, a relação trigonométrica a seguir foi utilizada:
sen sen( ) . .cos2 2θ θ θ=
Forma da trajetória
A forma da trajetória é obtida pela correlação do deslocamento na horizontal com a vertical. Para
fazê-lo, isolemos a variável tempo na equação da posição horizontal.
x x v tx= + .0
Para simplificar o trabalho matemático, considere as posições iniciais x0
e y0
como zero, ou seja, na
origem do sistema de referência. Com isso, indicamos a seguinte equação:
x v t t
x
v
x
x
= ⇒ =
Substituindo o tempo na equação para posição vertical, temos:
y v t
gt
y
v
v
x
g
v
x
y
y
x x
= −
= −
0
2
0
2
2
2
2
Essa equação é chamada de equação da trajetória do lançamento oblíquo, que é uma equação de
parábola com concavidade voltada para baixo. Vejamos:
y bx ax= − 2
Temos quatro excelentes exemplos para ilustrar o que estamos estudando. Tente resolvê-los sem
consultar as resoluções.
Exemplo de aplicação
Um campo de futebol tem entre 90 e 120 m de comprimento. Frequentemente vemos os goleiros
recolocando a bola em jogo após o tiro de meta de modo que ela ultrapasse o meio de campo. A
pequena área tem cerca de 5,5 m, portanto não seria exagero dizer que o alcance do chute dos goleiros é
de aproximadamente 55 m. Supondo que um jogador chute a bola imprimindo velocidade a um ângulo
de 400
com a horizontal no momento do chute, qual seria a velocidade imposta? Suponha desprezível a
resistência do ar. Considere a aceleração da gravidade como g = 10m/s2
.
35
GRAVITAÇÃO
Agora vejamos a resposta ao problema:
A bola de futebol é lançada obliquamente após o chute do goleiro. Conforme a equação obtida,
neste capítulo, para o alcance máximo nestas condições, temos:
∆S
v sen
g
= 0
2
2θ
Substituindo as informações fornecidas pelo exercício, obtemos:
55
80
10
0
2 0
=
v sen
Que leva a:
,
,
558 48
23 63
0
2
0
=
=
v
v m/s
Ou, em km/h:
v
m
s
0 23 63
1
1000
3600
1
85 07, . . ,= =
km
m
s
h
km/h
E se desejássemos determinar a altura máxima da bola, como seria realizado o cálculo?
Resposta:
Especificamentenestecaso,comojáconhecemosavelocidadedabolanomomentodochute,pode-se
determinar o tempo de subida conforme:
t
v
g
subida
y
=
0
Lembrando que o componente vertical é dado por:
v v seny0 0.= θ
Assim, teremos:
t
v
g
sen
subida
.
= 0 θ
36
Unidade I
Substituindo as informações conhecidas, obtemos:
t
t
sen
subida
subida
,
,
.
=
=
23 63
10
151
400
s
A partir do tempo de subida, pode-se calcular a altura máxima utilizando a equação de posição para
lançamento vertical. Assim:
y y v t
gt
y
Max y Subida
Subida
Max
–
, .
= +
= +
0 0
2
2
0 23 63 1,, –
. ,
,
51
10 151
2
24 53
2
yMax = m
Repare a diferença no alcance máximo horizontal e vertical. O deslocamento no componente vertical
é muito inferior devido à desaceleração produzida pela força da gravidade. Além disso, note que durante
metade do tempo de voo a bola descia, enquanto o deslocamento horizontal era progressivo.
Para a mesma situação anterior, qual seria o ângulo que produziria o maior alcance para a bola?
Resposta:
Considere a fórmula obtida para o alcance máximo. O ângulo que permitirá o maior deslocamento
da bola é aquele tal que
sen2 1θ =
Pois este é o valor máximo da função seno. Logo:
2 1
2 90
45
0
0
θ
θ
θ
=
=
=
arcsen( )
Na vida real, teríamos os efeitos devido à resistência do ar. Reflita a respeito de como os resultados
descritos mudariam caso considerássemos esta contribuição.
37
GRAVITAÇÃO
3 A MAÇÃ E A LUA
3.1 Newton e a queda da maçã
Isaac Newton foi um cientista inglês que viveu entre os séculos XVII e XVIII. É o responsável pela
teoria clássica da gravitação, a lei da gravitação universal. O modelo foi apresentado em seu livro
Philosophiae Naturalis Principia Mathematica (do latim: “Princípios Matemáticos da Filosofia Natural”),
popularmente conhecido como Principia. Publicado em 1687, a história da concepção do livro começa
mais de uma década antes.
Em 1666, por causa de uma epidemia de peste negra, o Trinity College, que é parte da Universidade
de Cambridge, onde Newton estudava, foi fechado. Com isso, ele foi para a casa de sua mãe, uma
fazenda próxima do vilarejo de Woolsthorpe, município de Lincolnshire, Inglaterra. Ele passou cerca de
um ano isolado nesse local quando tinha apenas 24 anos de idade.
Nesse ano de retiro, Newton elaborou os fundamentos de quatro de seus principais trabalhos:
o teorema binomial, o cálculo diferencial e integral, a lei da gravitação universal e o estudo sobre
a natureza das cores. Embora as versões completas de algumas dessas teorias só viessem a ser
concluídas e divulgadas cerca de 20 anos depois, com a publicação do Principia, os preceitos delas
foram formulados num período de um único ano de reclusão, constituindo uma das principais
quebras de paradigma e mais importantes contribuições à ciência de todos os tempos. Não é
pouco chamar Newton de gênio. A lei da gravitação universal é uma teoria tão bela e funcional
que permaneceu absoluta e inquestionável por mais de 200 anos. Alguém que tivesse habilidade
suficiente para formular uma concepção da gravitação capaz de superar ou contradizer qualquer
aspecto da teoria newtoniana com certeza mereceria grande destaque e reconhecimento por sua
genialidade. Essa pessoa foi Albert Einstein, com a teoria moderna da gravitação, a relatividade
geral, de 1916.
Aindaqueessaleisemostreincorretanaprevisãodedeterminadosaspectosespecíficosdanatureza,
como será discutido mais adiante, devemos destacar que, para praticamente todas as aplicações
cotidianas e para uma ampla gama de fenômenos astronômicos, sua teoria funciona extremamente
bem. Por causa disso, ainda hoje ela é uma das principais ferramentas teóricas em diversos campos da
ciência e engenharia, como na astronomia, astronáutica e engenharia aeroespacial.
Existe uma famosa lenda a respeito da descoberta da lei da gravitação universal, a lenda da maçã.
A história diz que, numa determinada tarde, durante seu ano de retiro na fazenda, Newton se sentou
embaixo de uma macieira para tirar um cochilo. Uma maçã caiu dessa árvore e atingiu diretamente a
cabeça dele, sendo este o fato que o teria inspirado a pensar sobre a queda dos corpos e formular sua
teoria da gravitação.
38
Unidade I
Saiba mais
Um interessante artigo discutindo a veracidade dessa lenda pode ser
encontrado em:
UPTON, E. Did an inspirational apple really fall on Newton’s head?
TodayIFoundOut.com, 23 out. 2016. Disponível em: <http://gizmodo.com/
did-an-inspirational-apple-really-fall-on-newtons-head-1450597571>.
Acesso em: 23 nov. 2016.
3.2 O movimento da Lua e de outros corpos celestes
De acordo com relatos do próprio Newton, durante seu ano de retiro, ele começou a pensar que a
mesma gravidade que levava os corpos a caírem na Terra podia se estender cada vez mais alto e chegar
até a Lua. Ele passou a pensar em quais seriam os requisitos necessários para manter a Lua em órbita ao
redor da Terra, visto que a força gravitacional atrairia a Lua.
Em seus argumentos, posteriormente publicados no Principia, Newton diz:
Se estivermos no alto de uma montanha e dispararmos uma bala na direção
horizontal, o movimento será composto de dois componentes:
a) Um movimento horizontal, com mesma velocidade que na saída do cano
da arma e;
b) Um movimento de queda livre, acelerado sob a ação da força da gravidade.
Como resultado da composição desses dois movimentos, a bala irá
descrever uma trajetória parabólica e atingirá o solo a alguma distância a
partir dali. Se a Terra fosse plana, a bala sempre atingiria o chão, mesmo
que a arma disparasse cada vez mais longe. Porém, como a Terra é redonda,
sua superfície se curva continuamente embaixo do caminho da bala e,
para uma certa velocidade, a trajetória curva da bala irá seguir a curvatura
do globo terrestre. Então, se não houvesse resistência do ar, a bala jamais
cairia no chão, mas continuaria a circular a Terra a uma altitude constante
(NEWTON, 2010).
A ideia ilustrada é a primeira teoria que se conhece de um satélite artificial. É claro que
ainda demoraria muito para se construí-lo, mas o princípio de funcionamento é justamente
esse imaginado por Newton. Além disso, os satélites não são lançados horizontalmente do alto
de montanhas, é claro. Eles são lançados praticamente na vertical até ultrapassar os limites da
39
GRAVITAÇÃO
atmosfera terrestre e então são manobrados até ganharem a velocidade horizontal necessária
para permanecer em órbita.
Considerando o movimento da Lua como um movimento de queda contínua, que nunca atinge
a Terra, Newton foi capaz de calcular a força gravitacional que atua na Lua. A ideia deste cálculo é
expressa na imagem a seguir.
Terra
C
Lua
A
B
B’
Figura 20 – Esquema mostrando a órbita da Lua em relação à Terra
Considere a Lua se movendo em uma órbita aproximadamente circular ao redor da Terra. Sua posição
em certo instante é A e o componente de sua velocidade tangencial é v. Se a Lua não fosse atraída pela
Terra, ela seguiria uma linha reta e, depois de um curto intervalo de tempo Dt, chegaria à posição B’.
Desse modo, a distância entre A e B’ é dada por:
AB’ = .v t∆
Lembrete
No caso relatado, a Lua descreve um movimento uniforme porque
realiza um movimento horizontal, logo:
∆ ∆S = .v t
40
Unidade I
Evidenciados os aspectos iniciais, é preciso destacar que há outro componente influenciando o
movimento da Lua, ou seja, que produz a queda livre em direção à Terra. Por isso, sua trajetória se curva
e, em vez de chegar ao ponto B’, ela alcança o ponto B. Pode-se imaginar que o segmento BB’ representa
quanto a Lua caiu na direção da Terra durante o intervalo de tempo Dt.
Considere agora o triângulo retângulo CAB’ onde C é o centro da Terra. Usando o teorema de
Pitágoras, pode-se equacionar:
CB’ =CA AB’
2 2 2
+
Note que o segmento CB’ é igual à soma CB + BB’. Portanto, a fórmula do teorema de Pitágoras
anterior é expresso assim:
CB+BB’ =CA +AB’( )
2 2 2
Abrindo o produto notável que destacamos, temos:
CB CBBB’ BB’ =CA +AB’
2 2 2 2
2+ +. .
Como CB = CA, pois são medidas do raio da órbita, eles são cancelados nos dois lados da equação
anterior. Depois de fazer isso, os dois lados da equação são divididos por 2.CB, obtendo:
BB’
BB’
2.CB
AB’
CB
+ =
2 2
2.
Se um intervalo de tempo Dt pequeno for considerado, a distância BB’ vai ser pequena também.
Quando um número pequeno é elevado ao quadrado, o resultado é um número ainda menor. Por
exemplo, pegue 0,01 e eleve ao quadrado. O resultado é 0,0001, que é 100 vezes menor do que 0,01.
Seguindo esse raciocínio, podemos escolher um intervalo de tempo Dt tão pequeno quanto quisermos
até que a distância BB’ seja muito pequena. Isso é equivalente a pensar que se não tiver passado muito
tempo desde que começamos a olhar a Lua, então não vai ter dado tempo à trajetória dela de desviar
muito do que seria uma linha reta.
Agora, olhando para o lado esquerdo da última equação, note que a distância BB’ aparece
nos dois termos, mas no segundo ele aparece elevado ao quadrado. Conforme discutido, o termo
elevado ao quadrado é muito pequeno em comparação com o outro e, nesse caso, pode ser
desprezado. Com isso:
BB’
AB’
CB
=
2
2.
41
GRAVITAÇÃO
Tendo em vista que AB’ = v.∆r, que BB’ é o espaço percorrido pela Lua durante a queda livre, e sendo
CB’ o raio da trajetória que a Lua realiza ao redor da Terra, temos:
BB’ =
( )
=






v t
R
v
R
tS
∆
∆∆
2
2
2
2
1
2
Se compararmos a última equação com a relação matemática obtida por Galileu para o movimento
de queda livre, veremos que o termo v2
/R é a aceleração com a qual a Lua cai em direção à Terra. É claro
que, devido ao seu componente horizontal do movimento, a Lua sempre erra o alvo, permanecendo
em órbita.
Galileu↔↔ Newton
∆ ∆ ∆ ∆S a t S
v
R
t
a
v
R
= ⇔ =






=
1
2
1
2
2
2
2
2
Por definição, a velocidade angular w de um corpo em uma trajetória circular é:
ω
π
= =
v
R T
2
Onde T é o período da órbita, ou seja, o tempo que a Lua leva para dar uma volta completa ao redor
da Terra. Pode-se isolar a velocidade v na equação anterior para determiná-la apenas considerando o
raio e o período:
v
R
T
=
2π
Substituindo a velocidade na fórmula da aceleração encontrada por Newton, expressamos o seguinte:
a
R
T
R
R
T
=
( ) =
.
2
4
2
2
2
π
π
A equação obtida permite o cálculo da aceleração imposta à Lua pela atração gravitacional exercida
pela Terra. Para o cálculo ser executado, é necessário o prévio conhecimento do período T e da distância
42
Unidade I
da Terra à Lua – R. O período já era conhecido e é dado por T = 27,3 dias = 2,36 x 106
s. O valor de R,
por sua vez, é a soma do raio da Terra com a distância até o centro da Lua. O raio da Terra, conforme já
discutido, havia sido definido por Eratóstenes no século III a.C. A distância da Terra até o centro da Lua
já havia sido determinada por diferentes astrônomos, como Hiparco e Aristarco. Entretanto, utilizaremos
os valores mais aceitos e precisos da atualidade, ou seja, R = 384402 e km = 384402000 m.
Substituindo os dados na equação exposta, temos:
a
a m s
=
( )
=
.
, .
, /
4 384402000
2 36 10
0 0027
2
6 2
2
π
Obtém-se a aceleração da Lua em relação à Terra. Note que este valor é bem menor que os 9,8 m/s2
que medimos para a queda livre de objetos próximos da Terra. De fato, é cerca de 3.600 vezes menor!
Observação
Nos cálculos realizados por Newton, devido à diferente estimativa da
distância até a Lua, ele obteve como resultado uma aceleração 3.640 vezes
menor que a verificada na Terra.
Confrontado com esse fato, Newton imaginou que se a força que mantinha a Lua orbitando ao
redor da Terra era a mesma que fazia os objetos caírem no chão, ela deveria diminuir com a distância.
Por exemplo, uma maçã que cai de uma macieira cai de uma distância a partir do centro da Terra, que é
aproximadamente igual ao raio do planeta, ou seja, 6.371 km. A Lua, por outro lado, está a 384.402 km,
60 vezes mais longe.
Newton percebeu o seguinte: enquanto a aceleração da Lua é cerca de 3.640 vezes menor do que
a aceleração da maçã, a distância do centro da Terra até a Lua é cerca de 60 vezes maior. Além disso,
notou que, ao elevar 60 ao quadrado, obtemos um número muito próximo de 3.640. Baseado nessas
observações, concluiu não só que o valor da aceleração deveria cair à medida que a distância aumentasse,
mas que deveria ser inversamente proporcional ao quadrado da distância,
F
k
R
= 2
e a constante k ainda deveria ser determinada.
Contudo, de acordo com a segunda lei de Newton, a força que atua sobre um objeto deve ser
diretamente proporcional à massa do objeto, pois F = m.a. Logo, a constante k deve ser diretamente
proporcional à massa m da Lua. De acordo com a terceira lei de Newton, se a Terra exerce uma força de
43
GRAVITAÇÃO
atração sobre a Lua, então a Lua exerce uma força de atração de mesma intensidade sobre a Terra. Neste
caso, esperamos que a constante k também seja diretamente proporcional à massa M da Terra. Portanto,
podemos escrever:
k GMm=
onde G é uma nova constante que não depende das massas dos objetos envolvidos na interação
gravitacional, sendo, portanto, uma característica da natureza em si.
Nesse ponto, podemos perceber que se a gravidade é a força que faz os objetos caírem na Terra e
mantém a Lua em órbita ao redor do nosso planeta, provavelmente deve ser responsável por manter a
Terra em órbita ao redor do Sol.
De fato, ela é responsável não só por manter as órbitas dos planetas e de seus satélites naturais, bem
como do movimento orbital do Sol e de todas as outras estrelas ao redor do centro da Via Láctea. Além
disso, da mesma forma que existe uma força de atração gravitacional entre o Sol e os planetas ou entre
os planetas e suas luas, deve haver uma força de atração entre quaisquer objetos que tenham massa. É
razoável supor que, mesmo com uma intensidade muito pequena, duas maçãs em cima de uma mesa
estão se atraindo gravitacionalmente. Isso vale para maçãs, para pessoas e para qualquer outro objeto
que tenha massa. Em última análise, as trajetórias dos planetas em seus movimentos orbitais ao redor
do Sol são perturbadas pela presença de outros planetas. De fato, foi exatamente assim que o planeta
Netuno foi descoberto.
Após a descoberta de Urano em 1781, o astrônomo francês Jean Baptiste Joseph Delambre passou
a observar com cautela seu movimento orbital e acabou descobrindo que esse movimento não seguia
exatamente a trajetória prevista pela teoria newtoniana. Uma das propostas para se explicar tal fato era
que devia haver outro planeta, até então nunca observado, perturbando gravitacionalmente a órbita de
Urano. Já no século XIX, os astrônomos John Couch Adams e Urbain Le Verrier, de modo independente,
provaram matematicamente que era possível a existência desse outro planeta. A partir daí, diversos
astrônomos passaram a procurar o tal planeta desconhecido nos locais onde ele poderia estar de acordo
com as previsões matemáticas, até que, em 1846, Netuno foi finalmente observado.
Figura 21 – Netuno realizada pela Voyager2, Nasa
44
Unidade I
3.3 A lei da gravitação universal
Combinando as duas equações apresentadas anteriormente, podemos finalmente escrever a forma
matemática da lei da gravitação universal:
F
GMm
R
= 2
Exploremos a expressão obtida por Newton. Suponha um objeto abandonado em queda livre
próximo à superfície da Terra. A única força que atuará nele será a exercida pela ação da gravidade – se
desprezarmos a resistência do ar. Nesse caso, conforme a segunda lei de Newton:
F ma
F mg
∑
∑
=
=
.
.
onde a é a aceleração de queda e m a massa do objeto. É comum a substituição da letra “a” pela letra
“g” quando se analisa um movimento de queda livre. Neste caso, a aceleração de queda é chamada de
aceleração da gravidade local. Substituindo na última expressão a força gravitacional prevista pela lei
da gravitação universal, chegamos a:
.
GMm
R
mg2
=
Neste caso, M é a massa da Terra. Simplificando a equação ao cortar a massa do objeto nas duas
expressões, obtemos:
g
GM
R
= 2
Os valores já conhecidos da aceleração da gravidade local e do raio da Terra poderiam ser utilizados
na expressão anterior. Então, teríamos como resultado o produto GM. A partir daí, para determinar o
valor da massa da Terra, seria necessário saber o valor de G. Para indicar o valor de G, precisaríamos
conhecer a massa da Terra, o que parece um beco sem saída.
3.4 O experimento de Cavendish e a determinação de G
Newton não chegou a viver o suficiente para testemunhar a especificação do valor de G ou da massa
da Terra. Isso ocorreu somente mais tarde, em 1797, quando Henry Cavendish realizou um experimento
para definir a massa da Terra. Conforme destacamos, conhecendo o valor da massa M da Terra e o valor
do produto GM, seria possível expressar o valor de G.
Cavendish construiu uma balança de torção composta de um bastão de madeira com cerca de 1,8 m
de comprimento suspenso a partir do seu centro por um fio. Em cada uma das extremidades do bastão
foram penduradas esferas de chumbo, com cerca de 5 cm de diâmetro e 700 g de massa cada. Perto
45
GRAVITAÇÃO
de cada uma dessas esferas, foram posicionadas esferas maiores, cada uma com 30 cm de diâmetro e
massa de aproximadamente 158 kg. As esferas maiores foram posicionadas a 23 cm de distância das
esferas menores e ficavam presas a um sistema de suspensão independente, que as mantinha fixas no
lugar. Todo o aparato ficava lacrado dentro de uma grande caixa de madeira a fim de evitar qualquer
perturbação proveniente de correntes de ar externas. O deslocamento relativo entre as esferas podia ser
observado de fora por lunetas encaixadas em pequenos buracos nas paredes da caixa.
m
m
M’
M’
F’
F’
R’
Figura 22 – Esquema ilustrativo da balança de torção utilizada por Henry Cavendish
A ideia do experimento era medir a atração gravitacional entre uma esfera grande e uma esfera
pequena por meio da observação da distância entre elas. As esferas grandes atraíam as pequenas
fazendo a balança de torção rodar, até que a torção no fio contrabalanceasse a força gravitacional.
Quando isso acontecia, a haste parava de girar, sendo possível medir o ângulo de desvio e a distância R’
entre as esferas. Nessa condição, necessariamente, a força de resistência à torção pelo fio é exatamente
igual à força gravitacional entre as esferas, chamada aqui de F’. Este valor foi determinado por Cavendish
de acordo com o ângulo de torção do fio, que era previamente caracterizado.
A força gravitacional F da Terra, sobre uma das esferas pequenas, podia ser medida diretamente,
simplesmente pesando-a em uma balança comum. Da mesma forma, era possível definir a massa M de
uma das esferas grandes.
Conforme a lei da gravitação de Newton, a força entre a esfera pequena e a Terra é:
F
GM m
R
Terra
= 2
onde m é a massa da esfera pequena e R o raio da Terra.
A força entre a esfera grande e a esfera pequena é dada por:
F
GM m
R
Grande
’
’
= 2
46
Unidade I
onde R’ é a distância relativa entre uma esfera grande e uma pequena.
A razão entre essas duas forças é dada por:
F
F
GM m
R
GM m
R
Terra
Grande’
’
=
2
2
que permite a simplificação dos termos comuns, obtendo:
F
F
M
M
R
R
Terra
Grande’ ’
=




2
A expressão anterior pode ser manipulada de modo a isolarmos a massa da Terra na expressão:
M M
F
F
R
R
Terra Grande
’
’
=




2
Perceba agora os termos do lado direito da expressão. A massa da esfera grande foi medida com
o auxílio de uma balança analítica. A força F é o peso da esfera pequena, também determinada com
a balança. A força F’ é definida pelo ângulo de torção do fio, a distância R’ é medida na condição de
equilíbrio, e, por fim, o raio da Terra, uma grandeza conhecida. Assim, Cavendish foi capaz de precisar a
massa da Terra. O valor aceito atualmente para a massa da Terra é:
M x kg,=5 97 1024
Com isso, conhecendo o valor do produto GM, é possível indicar o valor da constante da gravitação
universal G, que é:
G x m kg s, - - -
=6 67 10 11 3 1 2
O valor fornecido por Cavendish apresentou um desvio de apenas 1% em relação ao conhecido atualmente.
Exemplo de aplicação
No experimento de Cavendish, esferas de diferentes massas foram utilizadas, sendo uma de 700 g
e uma de 158 kg. Com base na constante gravitacional determinada por ele, calcule a força de atração
entre as esferas, quando mantidas separadas por 10 cm.
47
GRAVITAÇÃO
Vamos solucionar o problema.
Conforme a lei da gravitação universal, a força atrativa pode ser calculada segundo a seguinte
expressão:
F
GMm
R
= 2
Substituindo a constante universal G, as massas das esferas e a distância entre elas, obtemos:
F
F
GMm
R
F
, . . . ,
, .
,
=
=
=
−
−
6 67 10 158 0 7
7 4 10
0 1
11
2
2
7
N
É uma força extremamente pequena, mostrando a precisão do aparato montado por Cavendish.
Se a força calculada no exercício anterior fosse aplicada sob a esfera pequena livre de qualquer
resistência, qual seria a aceleração produzida?
Conforme a segunda lei de Newton:
F ma
a
a
∑ =
=
=
−
−
.
, . , .
.
7 4 10 0 7
1 10
7
6
m/s2
Devido à ínfima aceleração no sistema e aos efeitos de oscilação produzidos, Cavendish chegava a
esperar mais de 20 minutos entre cada medição.
Pensemos na seguinte proposição: se levássemos a esfera pequena para uma distância três vezes
maior do que no primeiro problema, quantas vezes a força gravitacional diminuiria?
Num primeiro momento, a força gravitacional é dada por:
F
GMm
R
1
1
2
=
onde R1
é a distância inicial antes de deslocarmos a segunda esfera.
48
Unidade I
Quando levada a uma distância que é o triplo da primeira, teremos a condição matemática a seguir
satisfeita:
R R2 13= .
E a força gravitacional será:
F
GMm
R
2
2
2
=
Ao substituir a condição matemática descrita na lei da gravitação pelo segundo caso, obtém-se:
F
GMm
R
F
GMm
R
F
GMm
R
F
( . )
.
.
2
1
2
2
1
2
2
1
2 1
3
9
1
9
1
9
=
=
= =
A força cai 9 vezes ao triplicarmos a distância.
Observação
Note que os parênteses são necessários na substituição da distância
feita na expressão anterior.
Como foi indicado, a força gravitacional depende da massa dos corpos. Assim, por que um objeto
mais pesado não cai mais rápido do que um mais leve?
Para um objeto em queda livre, a única força que atua sobre ele é a força peso (desconsiderando a
resistência do ar). Desse modo, conforme a segunda lei de Newton.
F = m.a
Onde m é a massa do objeto, e a é a aceleração experimentada pelo corpo. Substituindo a força pela
lei da gravitação universal, obtemos a seguinte expressão:
GMm
R
ma
. .
.2
=
49
GRAVITAÇÃO
Onde M é a massa da Terra e R a distância do centro de massa da Terra até o objeto.
Essa expressão pode ser fatorada ao anular a massa do objeto nos dois lados da equação:
GM
R
a
.
2
=
O produto desses termos é exatamente o que chamamos de aceleração da gravidade e ele independe
da massa dos corpos. Para fins ilustrativos, na tabela a seguir são mostrados os valores da massa da
Terra, do raio médio da Terra e da constante gravitacional.
Tabela 1
Grandeza Valor
G (N.m/kg2
) 6,67408. 10-11
M (kg) 5,9723. 1024
R (m) 6371000
Ao substituir esses valores na equação obtida anteriormente, teremos:
a
a m s
=
=
−
6 67408 10 5 9742 10
6371000
9 82
11 24
2
2
, . . , .
, /
O resultado é uma excelente aproximação para a aceleração da gravidade já conhecida. Note que a
aceleração da gravidade muda ligeiramente de acordo com a posição no globo terrestre.
4 CÁLCULO
Como foi comentado, Newton apresentou em seu livro Principia, de 1687, muitas de suas principais
ideias. Juntamente com a lei da gravitação universal e as leis para análise do movimento, reportou ainda
toda uma formulação matemática necessária para comprovar formalmente seus modelos. Naquela
época, a matemática ainda não era suficientemente desenvolvida para que ele pudesse registrar e, a
partir daí, discutir em detalhes todas as consequências de suas descobertas.
Por exemplo, no tratamento do problema da interação gravitacional entre a Terra e a Lua, que
descrevemosaqui,Newtonfoiobrigadoaassumirinicialmentequeaforçagravitacionalerainversamente
proporcional ao quadrado da distância entre os centros dos dois corpos envolvidos. Contudo, quando
uma maçã é atraída pela Terra, a força que a faz cair é formada por inúmeros componentes. Estes
têm origens completamente diferentes, como as pedras sob o solo em profundidades dissemelhantes,
as raízes da macieira de onde a maçã caiu, as rochas das montanhas das cordilheiras dos Andes e do
Himalaia, a água do Oceano Pacífico, o núcleo de ferro líquido do Planeta Terra. Enfim, uma infinidade
de diferentes objetos de diferentes massas dispersos por todas as regiões do planeta Terra. Então, para
50
Unidade I
provar que sua lei matemática sobre a gravitação estava correta, Newton teve que demonstrar que a
soma vetorial das forças gravitacionais oriundas de todas as infinitas possíveis contribuições fornecia
um vetor resultante que era equivalente ao que se teria se fosse considerado que toda a massa da Terra
estava concentrada num único ponto, em seu centro.
O problema em questão é similar ao do estudo de Galileu, em que ele teve de definir a velocidade
instantânea do corpo, porém é muito mais complicado. Como Newton não tinha à disposição as
ferramentas matemáticas essenciais para o completo desenvolvimento de sua análise, ele precisou,
por si próprio, elaborar a teoria matemática necessária. Essa teoria é o cálculo diferencial e integral,
que constitui um dos principais ramos da matemática, com aplicações nas mais diversas áreas da
ciência e tecnologia.
4.1 Aproximações e limites
O cálculo difere de outras áreas da matemática por utilizar um método no qual as linhas, superfícies
e volumes da geometria clássica são divididos em um grande número de partes muito pequenas. A partir
daí, por meio da análise do que acontece individualmente a cada uma dessas pequenas partes, métodos
de generalização permitem tirar conclusões sobre o comportamento coletivo delas e, portanto, sobre os
todos que formam.
O processo de tomar partes muito pequenas de um todo e de considerar essas partes tão pequenas
quanto se possa imaginar ou uma quantidade qualquer arbitrariamente próxima de um determinado
valor é chamado em matemática de limite.
Vejamos o seguinte exemplo.
Considere a razão:
x
x
2
9
3
−( )
−( )
Se tomarmos o valor de x muito próximo de 3, qual será o valor dessa expressão?
É fácil ver que tanto a expressão do numerador quanto a do denominador resultam em números
muito próximos de zero se x for muito próximo de 3.
A tendência natural nessa situação é que as pessoas pensem:
“Se eu tenho um número muito próximo de zero e divido por outro número muito próximo de
zero, então estou dividindo uma coisa por outra muito próxima dela mesma. Ora, quando eu divido
um número por ele mesmo, o resultado é 1. Então, o número que resulta da razão entre aquelas duas
expressões quando x é próximo de 3 deve ser um número muito próximo de 1. Certo?”
51
GRAVITAÇÃO
Errado!
Veja o porquê:
•	 parte 1:
—	Considere a expressão matemática (x-3). Que valor essa expressão assume quando x é um
número muito próximo de 3, mas diferente de 3?
—	Para saber a resposta, basta substituir x por, digamos, 3,00000001 na expressão anterior e fazer
a conta. O resultado é 0,00000001, que é um número muito próximo de zero.
—	É claro que, intuitivamente, já sabíamos que se x estivesse muito próximo de 3, a expressão
(x-3) deveria resultar em um número bem próximo de zero.
•	 parte 2:
—	Agora use a expressão (x2
– 9). Que valor essa outra expressão assume se x for muito
próximo de 3?
—	Novamente, nossa intuição nos diz que o resultado deve ser um número muito próximo de
zero, mas, mesmo assim, vamos fazer a conta e ver o que acontece.
—	Avaliando que podemos substituir x por 3,00000001 outra vez e fazer o cálculo, pode ser um
pouco desgastante elevar esse x ao quadrado. Simplifiquemos a expressão primeiro. Note que:
	
x x x2
9 3 3–( )= +( ) −( )
—	O segundo fator do lado direito da última expressão é justamente o que tínhamos calculado na
parte 1, ou seja, 0,00000001. Já o primeiro fator do lado direito é 3,00000001 + 3 = 6,00000001.
	
x
x
2
2
9 6 00000001 0 00000001
9 0 000000061
– , . ,
– ,
( )=
( )=
—	Fazendo a multiplicação entre os números 0,00000001 x 6,00000001, concluímos que o
resultado deve ser: 0,0000000600000001, que ainda é um número muito próximo de zero,
como nossa intuição dizia.
•	 parte 3:
—	Agora uma pergunta capciosa: Se tomarmos a razão entre a expressão da parte 2 e a expressão
da parte 1, ou seja, (x2
– 9)/(x - 3), que resultado obteremos?
52
Unidade I
—	Observe que, embora o resultado da parte 2 seja um número muito próximo de zero, ele é um
número próximo de zero e cerca de 6 vezes maior que o do resultado da parte 1. Então, se
usarmos o resultado da parte 2 e dividirmos pelo resultado da parte 1, a resposta deve ser 6.
—	A notação matemática aplicada para expressar essa ideia é:
	
lim
x
x
x→
−( )
−( )
=
3
2
9
3
6
Isso significa que, se tomarmos x cada vez mais próximo de 3, isto é, se tomarmos o limite em que
x tende a 3 para aquela razão (x2
– 9)/(x - 3), o resultado da conta deve ser um número cada vez mais
próximo de 6.
Nós já havíamos deparado com problemas envolvendo limites no início deste livro-texto. Quando
Galileu precisou encontrar a relação matemática para a velocidade instantânea, ele teve de dividir o
movimento em diversos pequenos intervalos de tempo. Isso corresponde a tomar um limite no qual o
tamanho dos intervalos de tempo Dt tendem a zero.
Da mesma forma, quando Newton analisou o movimento orbital da Lua, a validade de seus
argumentos se apoiou em uma passagem matemática na qual um termo que aparecia elevado
ao quadrado foi desprezado. Para poder desprezar esse termo, foi considerado que o quadrado
de um número pequeno é muito pequeno em comparação com o número em si. Esse número
pequeno, por sua vez, correspondia a uma distância percorrida pela Lua. Acontece que essa
distância só poderia ser considerada pequena se o intervalo de tempo entre a posição inicial e
final fosse tão pequeno quanto necessário. Isso corresponde, mais uma vez, a tomar o limite em
que Dt tende a zero.
4.2 Velocidades e taxas de variação
4.2.1 Derivadas e taxas de variação
Nesse momento vamos nos dedicar ao seguinte problema: dada uma determinada função x(t),
descobrir o quão rápido ela cresce ou decresce em um ponto específico. Para utilizarmos termos precisos,
observe o gráfico mais adiante. O objetivo seria indicar uma grandeza associada ao quão rápido a função
cresce no ponto t = t0
.
Para verificar o comportamento da função, será necessário tomarmos outro ponto, como t1
, e
traçarmos uma reta ligando esses pontos. A partir da inclinação da reta, podemos analisar se a função
cresce em média no intervalo adotado. Perceba que, quanto maior o crescimento da função, mais
inclinada essa reta seria.
53
GRAVITAÇÃO
x
t
t0 t1
Figura 23 – Esquema indicando o crescimento médio de função entre dois pontos t
Ocorre, porém, que os pontos tomados no último gráfico não determinam se a função cresce no
ponto t0
, pois ela poderia estar diminuindo em t0
e logo depois começar a subir até o ponto t1
. Além do
mais, a função cresce mais rapidamente próxima a t1
do que t0
, superestimando a inclinação da reta.
Então, como poderíamos prosseguir para obtermos estimativas melhores do crescimento em t0
?
O procedimento consiste em diminuir a distância entre o segundo ponto e t0
, mas mantendo t0
na mesma posição, pois é o ponto cujo comportamento estamos interessados em avaliar. No gráfico
a seguir, são mostradas duas retas, uma em verde, definida no exemplo anterior, e uma em vermelho,
obtida pela aproximação entre t1
e t2
.
t0 t2 t1
Figura 24 – Esquema indicando que a diminuição do intervalo Dt torna a inclinação
da reta mais próxima do real crescimento da função no ponto t0
Uma sensível melhora na estimativa de crescimento já é verificada, mas pensar que esta já é uma
boa expressão da inclinação da função no ponto t0
é errado. Se aproximarmos a imagem de novo,
veremos que era possível ter adotado outro ponto ainda mais próximo de t0
e que, nessa situação, a
reta traçada indicaria ainda melhor a inclinação da função naquele ponto. Esse procedimento poderia
ser repetido indefinidamente. Cada vez que olharmos mais de perto a função, notamos que poderíamos
ter adotado um ponto ainda mais próximo de t0
. Isso corresponde a um processo de limite. Observe o
seguinte: se adotarmos o segundo ponto com coordenadas logo após t0
, com distância Dt tendendo a
zero, obteremos a inclinação mais representativa possível. Nesse caso, pode-se mostrar que a reta obtida
pela utilização do limite é a chamada reta tangente ao gráfico da função.
54
Unidade I
Analisemos esse procedimento do ponto de vista formal na matemática. Para se determinar o ângulo
que uma reta faz com o eixo horizontal, geralmente utilizamos a expressão dada a seguir para o cálculo
do coeficiente angular:
tanθ = = =
−
−
a
y
x
y y
x x
∆
∆
2 1
2 1
onde a é o coeficiente angular de uma reta qualquer e q o ângulo formado por ela com a horizontal
no sentido anti-horário. Nesse caso específico, no entanto, o eixo y é a posição x(t) e o eixo x é o tempo
t. Assim, o coeficiente angular ficaria definido como:
tan
( ) ( )
θ = =
−
−
a
x t x t
t t
2 0
2 0
onde apenas foram trocados os eixos y por x(t) e o eixo x por t. Poderíamos ainda escrever o instante
t2
como:
t t t2 0= + ∆
onde Dt é o intervalo de tempo adotado entre t2
e t0
.
Observação
Observe o intervalo Dt no gráfico para não tornar o cálculo apenas
mecânico e sem sentido.
Substituindo essa relação na expressão indicada para o cálculo da inclinação da reta, temos:
tan
( ) ( )
θ = =
+ −
+ −
a
x t t x t
t t t
0 0
0 0
∆
∆
que se reduz a:
tan
( ) ( )
θ = =
+ −
a
x t t x t
t
0 0∆
∆
Isso ocorre porque o termo no denominador é simplificado.
Por fim, tomar um intervalo de tempo tão pequeno quanto necessário significa tomar um intervalo
de tempo tendendo a zero. Nessa hipótese, a inclinação seria exatamente a da reta tangente ao ponto t
= t0
, como foi comentado. Sua equação ficaria estabelecida como:
tan lim :θ =
+ ∆( )− ( )
∆
= ( )→” t
x t t x t
t
x t
0
0 0
0
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Livro texto unidade i

  • 1. Autor: Prof. Rafael Morgado Batista Colaboradoras: Profa. Ana Carolina Bueno Borges Profa. Thaís Cavalheri Gravitação
  • 2. Professor conteudista: Rafael Morgado Batista É bacharel em Física com habilitação em Pesquisa Básica desde 2007 pelo Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP). É mestre (2010) e doutor (2014) em Ciências pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, cujo programa de pós-graduação é filiado à Universidade de São Paulo (USP). É professor titular na Universidade Paulista (UNIP), onde ministra disciplinas nas áreas de Mecânica, Termodinâmica e Eletromagnetismo desde 2012. Desenvolve pesquisas científicas na área de sinterização de materiais cerâmicos e condutores iônicos. Possui publicações em periódicos internacionais e em anais de congressos nacionais e internacionais. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) B333g Batista, Rafael Morgado. Gravitação. / Rafael Morgado Batista. – São Paulo: Editora Sol, 2017. 120 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIII, n. 2-034/17, ISSN 1517-9230. 1. Gravitação. 2. Cálculo. 3. Teoria da gravidade. I. Título. CDU 53
  • 3. Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Vitor Andrade Giovanna Oliveira
  • 4.
  • 5. Sumário Gravitação APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................8 Unidade I 1 O UNIVERSO OBSERVÁVEL...........................................................................................................................11 1.1 A noção de “em cima” e “embaixo”................................................................................................11 1.2 A determinação do raio da Terra....................................................................................................13 1.3 Aristóteles e Ptolomeu: o geocentrismo.....................................................................................15 1.4 Copérnico e o heliocentrismo..........................................................................................................16 1.5 Evidências a favor do sistema heliocêntrico..............................................................................16 2 COMO AS COISAS CAEM...............................................................................................................................18 2.1 O experimento do pêndulo e a Torre de Pisa.............................................................................18 2.2 O experimento do plano inclinado.................................................................................................21 2.3 Velocidade instantânea.......................................................................................................................25 2.4 Composição dos movimentos..........................................................................................................27 2.5 Lançamentos oblíquos: o movimento dos projéteis...............................................................30 2.5.1 Queda livre e lançamento vertical....................................................................................................30 2.5.2 Movimento horizontal...........................................................................................................................30 2.5.3 Lançamentos oblíquos...........................................................................................................................31 3 A MAÇÃ E A LUA..............................................................................................................................................37 3.1 Newton e a queda da maçã..............................................................................................................37 3.2 O movimento da Lua e de outros corpos celestes...................................................................38 3.3 A lei da gravitação universal.............................................................................................................44 3.4 O experimento de Cavendish e a determinação de G............................................................44 4 CÁLCULO..............................................................................................................................................................49 4.1 Aproximações e limites.......................................................................................................................50 4.2 Velocidades e taxas de variação......................................................................................................52 4.2.1 Derivadas e taxas de variação............................................................................................................52 4.2.2 Velocidade...................................................................................................................................................55 4.2.3 Aceleração e derivadas segundas......................................................................................................57 4.2.4 Regra do tombo........................................................................................................................................59 4.3 Deslocamentos e áreas........................................................................................................................64 4.3.1 Áreas de regiões curvas.........................................................................................................................64 4.3.2 Integrais.......................................................................................................................................................67 4.3.3 Cálculo de deslocamentos...................................................................................................................68
  • 6. 4.4 Teorema fundamental do cálculo...................................................................................................68 4.4.1 Regra do tombo inversa........................................................................................................................70 4.5 A força gravitacional exercida pela Terra....................................................................................75 Unidade II 5 ÓRBITA PLANETÁRIA.......................................................................................................................................80 5.1 Leis de Kepler..........................................................................................................................................80 5.1.1 Primeira lei de Kepler.............................................................................................................................80 5.1.2 Segunda lei de Kepler............................................................................................................................81 5.1.3 Terceira lei de Kepler...............................................................................................................................82 5.2 A concordância entre a teoria da gravitação de Newton e as leis de Kepler...............84 5.3 O movimento de precessão...............................................................................................................87 6 O FENÔMENO DAS MARÉS .........................................................................................................................89 7 FUGINDO DA GRAVIDADE............................................................................................................................96 7.1 Potencial gravitacional........................................................................................................................96 7.2 Velocidade de escape...........................................................................................................................98 8 TEORIA DA GRAVIDADE DE EINSTEIN: PROBLEMAS NÃO SOLUCIONADOS DA GRAVITAÇÃO....................................................................................................103
  • 7. 7 APRESENTAÇÃO Caro aluno, Neste livro-texto estudaremos a gravitação e suas concepções desde a Antiguidade até os dias atuais. A força gravitacional ocupa um papel central no funcionamento da natureza. Ela é o mecanismo que mantém todas as coisas na Terra, incluindo a nós mesmos. A própria atmosfera e o ar que respiramos não se acumulariam ao redor do planeta e escapariam para o espaço se não fosse a atração gravitacional. Além disso, a gravidade é também responsável pelas órbitas dos planetas. Sem ela, a Terra não giraria ao redor do Sol. Se a Terra não estivesse próxima do Sol, a vida aqui não seria possível. A origem e a existência do Sol, bem como de todas as outras estrelas, deve-se à atração gravitacional. Ao longo do texto, vamos elucidar aspectos gerais da concepção do mundo e do fenômeno da gravitação. Especial destaque será dado à concepção do método científico e sua prevalência sobre a especulação e o dogmatismo. Se, num primeiro instante, a descrição dos fenômenos era guiada pela mitologia e pelo misticismo, depois a filosofia e a razão passaram a desempenhar papéis cada vez mais importantes no processo de descrição do mundo. Entretanto, é essencial salientar que nem uma visão mítica e nem uma visão racional podem substituir a experimentação como mecanismo de validação. Nesse sentido, cabe destacar o trabalho de Galileu e o desenvolvimento e uso do método científico. Enquanto a proposta de Copérnico de um sistema heliocêntrico se apoiava muito mais na beleza dos argumentos em si, Galileu seria capaz de demonstrar a veracidade dessas ideias por meio da observação. O trabalho de Galileu sobre o movimento e a queda dos corpos constitui a base para a formulação da mecânica newtoniana. Muitas vezes a prevalência de dogmatismos ou simplesmente o medo e a preguiça de pensar de maneira profunda impõem obstáculos à evolução científica. Esses entraves podem ter consequências catastróficas ou extremamente duradouras. O geocentrismo permaneceu por mais de 1500 anos incontestado, desde Ptolomeu até Copérnico. Isto aconteceu porque era o padrão mais tradicional e mais aceito até então. Ao defender o modelo heliocêntrico, Galileu se tornou alvo da Inquisição e foi perseguido por defender uma visão tida como revolucionária. No entanto, seu legado se propagou através do tempo. Galileu representa um marco na transição de um mundo em que as ponderações científicas passavam por um julgamento de acordo com a crença em vigor para uma época na qual a compatibilidade com a observação seria a responsável por determinar aquilo em que se deve acreditar. Sem essa trajetória, Newton, que, curiosamente, nasceu no ano seguinte ao da morte de Galileu, não teria desfrutado da liberdade de pensamento para promover seu trabalho. A teoria da gravitação de Newton, que também será abordada nesta obra, é uma obra notável. Ela foi desenvolvida no século XVII e permaneceu absoluta e intocável por mais de 200 anos. Ainda hoje é uma excelente ferramenta para descrever a maior parte dos fenômenos gravitacionais que experimentamos no nosso cotidiano ou que notamos no movimento dos corpos celestes. Contudo, cabe destacar que em ciência não existe verdade absoluta. As explicações e modelos que construímos necessitam de constante revisão e questionamento. Isto não é uma falha da ciência, mas, ao contrário, uma de suas mais relevantes características.Mesmonummundoondeateorianewtonianadagravitaçãoestavamuitobemestabelecida,
  • 8. 8 havia margem para reformulação. Esse novo princípio da gravitação foi proposto por Einstein em 1916 – tratava-se da teoria da relatividade geral. Com ela, passou a ser possível explicar alguns poucos fenômenos mal-compreendidos até então. À primeira vista, parecia um ganho pequeno, mas isso foi capaz de prever uma série de fenômenos que nem sequer se imaginava que poderiam ocorrer. A janela do questionamento nunca deve ser fechada. Mesmo hoje as teorias instituídas devem ser constantemente testadas, e o estudante é convidado a interrogar e duvidar sempre, inclusive do que está escrito neste livro! A dúvida e a experimentação constituem a principal frente de defesa contra a estagnação e são importantes ferramentas no auxílio ao pensamento e ao desenvolvimento. Boa leitura! INTRODUÇÃO Com o advento da ciência, um alto grau de entendimento da natureza foi atingido. Hoje é possível saber não apenas o que acontece, mas, em muitos casos, como e por que determinado fenômeno acontece. A ciência tem sido capaz de contar uma história coerente sobre como nosso Universo começou e sobre como ele tem evoluído. Na história do Universo, a gravidade ocupa um papel central. Ela é a força da natureza que opera em todos os lugares, controlando os efeitos de todas as outras forças onde quer que elas atuem. Regula inúmeros relógios naturais e a própria passagem do tempo, sejam as órbitas dos planetas, seja o tempo de vida das estrelas. A gravidade é a força que domina em alguns dos locais e eventos mais violentos e poderosos no cosmos, como os buracos negros, quasares, pulsares e supernovas. Ela é responsável por nos manter no chão, por preservar a Lua em órbita ao redor da Terra, a Terra e os outros planetas em órbita ao redor do Sol e também o Sol em sua órbita na nossa galáxia. Ela conserva o vínculo entre as estrelas que formam galáxias inteiras, bem como controla o movimento e a interação que agrupam diferentes galáxias, formando os chamados aglomerados de galáxias. A interação gravitacional entre pequenos átomos de hidrogênio cria gigantescas nuvens, muito maiores que o nosso sistema solar. O colapso gravitacional dessas nuvens, por sua vez, é o evento que dá origem às estrelas e aos sistemas planetários. A gravidade está em todo lugar. Não importa aonde vamos, não podemos escapar dela. Pegando uma pedra na mão, podemos sentir o seu peso. Se levarmos a pedra para dentro de um prédio, continuaremos sentindo o seu peso e não notaremos nenhuma diferença. Se a levarmos para dentro de um carro em movimento, ainda assim não haverá diferença. Essa característica (impossibilidade de escapar da gravidade) a faz diferente de todas as outras forças da natureza. Por exemplo, se levarmos um rádio portátil para dentro de um invólucro de metal, como um carro, teremos sérias dificuldades para sintonizar as estações. Ondas de rádio são ondas eletromagnéticas que propagam informação por meio de forças eletromagnéticas. Esse tipo de força, ao contrário da gravitacional, não é capaz de penetrar em qualquer lugar. Ela pode ser excluída de alguma região desde que escolhamos o material certo para as paredes. Para a gravidade, porém, isso não é verdade. Mesmo que coloquemos a nossa pedra dentro de uma sala cujas paredes sejam extremamente espessas, ela ainda vai pesar o mesmo que antes. A gravidade atua em tudo da mesma maneira.
  • 9. 9 Neste livro apresentaremos os desenvolvimentos realizados pela civilização humana na busca da compreensão da gravidade. Vamos iniciar nosso percurso descrevendo as primeiras ideias a respeito de como o nosso Universo é formado. Ideias de caráter um tanto quanto filosofal, sem grande rigor científico ainda. Depois, estudaremos o excelente trabalho de Galileu Galilei sobre o movimento de corpos sob a ação da gravidade. Daremos ênfase à forma como ele obteve suas conclusões, de modo a apresentar como o desenvolvimento na ciência ocorre de maneira gradual, com recorrentes verificações experimentais de nossas ideias. Subsequentemente, evidenciaremos uma das mais belas teorias já criadas pelo homem, a lei da gravitação universal, de Newton. Além disso, abordaremos as consequências de sua análise, demonstrando uma série de aplicações, discutindo fenômenos naturais e indicando as ferramentas necessárias para a concepção da teoria. Por fim, faremos uma introdução à teoria moderna da gravitação, a relatividade geral de Einstein. Discutiremos por que este modelo suprimiu a teoria newtoniana da gravitação, expondo exemplos de casos em que a concepção newtoniana falhava.
  • 10.
  • 11. 11 GRAVITAÇÃO Unidade I 1 O UNIVERSO OBSERVÁVEL 1.1 A noção de “em cima” e “embaixo” Não é difícil notar que os objetos em geral denotam uma tendência natural de ir de cima para baixo. Se abandonarmos uma pedra no ar, supomos que ela cairá. Se a colocamos sobre uma mesa, esperamos que ela repouse ali indefinidamente. Não seria nem um pouco natural, por exemplo, observar a pedra levantar voo espontaneamente. Alguém poderia dizer que é claro que os pássaros voam e que, portanto, nem tudo na natureza apresenta a tendência de ir para baixo. Contudo, o voo dos pássaros deve ser explicado pelo movimento das asas em relação ao ar. Se não houvesse esse movimento ou se o ar não estivesse presente, o pássaro cairia como qualquer outro objeto. Apesar da proposição de que os objetos caem de cima para baixo parecer simples, os próprios conceitos de “em cima” e “embaixo” não são absolutos. Sua definição requer um conhecimento sobre o mundo que nos cerca. Para um observador na Terra, o sentido que vai do solo para o céu é “para cima”. Já o sentido contrário, que vai do céu contra o chão é “para baixo”, sendo este último a direção de queda dos corpos. Em cima Embaixo Figura 1 – Ilustração mostrando o conceito de “em cima” e “embaixo” para um observador na Terra Por outro lado, alguém que vê a Terra de longe pode notar claramente seu formato esférico. Então, nota que os corpos sempre caem no sentido do centro da Terra. Desse modo, não pode haver um ponto mais “embaixo” do que o centro do planeta, e “em cima” pode ser qualquer direção que se afaste radialmente do centro. Para tal espectador, a proposição de que os objetos caem de cima para baixo já não é a maneira mais precisa de se relatar o que ocorre. Provavelmente, nessa situação, seria melhor dizer simplesmente que os objetos são atraídos no sentido do centro da Terra.
  • 12. 12 Unidade I Em cima Em cima Em cima Em cima Embaixo Embaixo Embaixo Embaixo Figura 2 – Ilustração mostrando o conceito de “em cima” e “embaixo” para um observador fora da Terra É claro que o observador que vê a Terra de fora ocupa uma posição privilegiada, e se não tivéssemos acesso à tecnologia isso seria impossível. Embora atualmente possa parecer muito óbvio que a Terra é de fato esférica, no passado acreditava-se que ela era plana. Dadas às limitações tecnológicas de determinadas épocas e civilizações, não havia meio evidente ou acessível que permitisse destacar razões contrárias a essa hipótese. A defesa da tese de que a Terra seria esférica poderia facilmente encontrar oposição em argumentos como: “Se a Terra fosse redonda, as pessoas do outro lado cairiam no espaço vazio.” “Se a Terra fosse redonda, os oceanos escoariam para a parte de baixo e se esvaziariam.” A ideia de uma Terra esférica começou a surgir na Grécia Antiga – por volta do século VI a.C. – mas, foi superada nos séculos seguintes por inúmeros experimentos, argumentos filosóficos e cálculos astronômicos. As alegações mais simples que evidenciam esse fato são: o desaparecimento dos navios no horizonte e a forma redonda da projeção da sombra da Terra sobre a Lua. Mesmo em tempos atuais, existem correntes ideológicas que defendem ideias notoriamente antiquadas. Algumas dessas divisões sugerem que a Terra na verdade teria o formato de um disco e que a proposição (e todas as respectivas e inúmeras comprovações) de que a Terra seria esférica não passa de uma grande conspiração envolvendo governos, indústria e até mesmo a comunidade científica internacional. Não acredita? Então pesquise na internet: “a Terra é plana”!
  • 13. 13 GRAVITAÇÃO 1.2 A determinação do raio da Terra Um famoso cálculo que veio a corroborar o modelo de uma Terra esférica foi realizado por Eratóstenes no século III a.C. Ele definiu o comprimento da circunferência e, consequentemente, o raio do planeta. Eratóstenes de Cirene foi o diretor da Biblioteca de Alexandria. Em um dos manuscritos da instituição, tomou conhecimento que no solstício de verão (o primeiro dia do verão), seria possível observar ao meio- dia o fundo de um poço na cidade de Siena. Em outras palavras, nesse dia, horário e local específicos, o Sol se encontrava no zênite, no topo da esfera celeste, bem no centro do céu. Por causa disso a luz do Sol chegava àquele local em uma direção perpendicular em relação ao solo e podia incidir diretamente sobre o fundo do poço. Nessa situação, a luz formava um ângulo q=0º em relação à vertical. Em Alexandria, em data e hora equivalente, o mesmo fenômeno não era verificado. Isto é, a luz do Sol não chegava ao fundo de nenhum poço ao meio-dia. Fixando uma estaca verticalmente no chão, Eratóstenes podia medir o ângulo que a luz do Sol formava com a estaca, e assim poderia medir o ângulo q que a luz formava com a vertical. Para realizar o cálculo do ângulo, era necessário o conhecimento prévio da altura h da estaca e medir o tamanho da sombra formada (s). A razão entre o comprimento da sombra e a altura da estaca seria exatamente a tangente do ângulo q. A figura a seguir esquematiza a afirmação. tanθ = h s Terra Siena Alexandria d s Solθ θt hR Figura 3 – Esquema dos ângulos e distâncias envolvidas no experimento de Eratóstenes para determinação do raio da Terra Baseado neste procedimento, Eratóstenes realizou as medidas e encontrou um ângulo de aproximadamente 7,2º. Para a determinação do raio da Terra, Eratóstenes precisaria seguir a distância entre as cidades de Siena e Alexandria. Ele obteve tal informação contratando um itinerante, que contaria o número de passos na viagem. Por mais estranho que possa parecer, esse era um método comum na época para
  • 14. 14 Unidade I medir distâncias. As pessoas que faziam essas medidas eram treinadas para caminhar com passadas muito regulares. A distância obtida com esse método foi de 5.040 estádios. O estádio era uma unidade de medida para distância utilizada naquela época, sendo que 1 estádio = 157,7 metros. Logo, a distância d medida entre as duas cidades foi de 5.040 x 157,7 = 794.808 metros, ou seja, cerca de 795 km. Considerando que os raios de luz do Sol se propagam praticamente paralelos uns aos outros, a distância d entre as cidades corresponde a um arco de circunferência, conforme a figura anterior. Portanto: d R= ( ). . π θ 1800 O ângulo q é dado em graus e R é o raio da Terra. A fórmula destacada permite determinar o raio R da Terra, mas na verdade o que Eratóstenes calculou foi o comprimento da circunferência C. Para repetir o procedimento dele, basta lembrar que uma circunferência possui 360o e definir uma regra de proporção como esta: 7,2º ↔ 795 km 360º ↔ C km Que leva a: C = 39750 km para o comprimento da circunferência da Terra ou R = 6326 km para o raio da Terra Esses valores são muito próximos dos valores reais. O comprimento da circunferência da Terra, por exemplo, é de 40.030 km, que difere em apenas 0,7% do valor obtido por Eratóstenes. Os resultados são importantes e é um feito notável que eles tenham sido obtidos com tamanha precisão já no século III a.C. No entanto, talvez mais notável ainda seja perceber que, mesmo nessa época remota, já se tenha percebido um fato aparentemente não óbvio: a Terra é, de fato, redonda! É surpreendente que na Idade Média o retrocesso cultural tenha levado a sociedade a aceitar como senso comum que a Terra era achatada. Por ocasião das Grandes Navegações, a proposta de que se poderia chegar às Índias navegando para o Ocidente parecia completamente revolucionária e contrassensual.
  • 15. 15 GRAVITAÇÃO 1.3 Aristóteles e Ptolomeu: o geocentrismo A idealização de um Universo geocêntrico, ou seja, com a Terra ocupando o centro do Universo, teve como um dos principais defensores Aristóteles. Ele foi um importante filósofo grego que viveu no século IV a.C. Sua influência se tornou marcante na história da ciência porque diversas de suas ideias foram tidas como corretas por séculos. Segundo sua concepção, o Universo seria uma esfera finita (esfera celeste) cujas estrelas ficariam todas presas. A Terra permaneceria no centro do Universo e os planetas e astros do sistema solar orbitariam ao seu redor. A atração da gravidade seria resultado da tendência que todas as coisas teriam de ir ao seu lugar natural no Universo, o centro, e logo, a Terra. Baseado em sua visão, Ptolomeu criou um modelo planetário preditivo, ou seja, que permitia a previsão de alguns eventos astronômicos. Este foi apresentado em sua principal obra, o Almagesto (que, em grego, significa “grande tratado”). Em seu modelo, assim como proposto por Aristóteles, a Terra permaneceria no centro do Universo e os outros corpos celestes, planetas e estrelas seriam órbitas ao seu redor. As órbitas dos planetas eram relativamente complicadas, resultando de um sistema de epiciclos, que consistem de círculos com centro em outros círculos. A palavra “planeta”, em grego, significa “errante”, que aponta para a observação do comportamento estranho de movimento não padronizado. As estrelas pareciam se mover todas juntas na esfera celeste e o Sol e a Lua representariam órbitas simples ao redor da Terra. A imagem a seguir mostra uma ilustração esquemática do modelo. Epiciclo Figura 4 – Esquema do modelo planetário proposto por Ptolomeu Se avaliarmos a questão com cautela, a visão geocêntrica é uma ideia bastante óbvia do ponto de vista de um observador na Terra. Não há razão a princípio para supor que a Terra, como um todo, possa estar se movendo. Quando olhamos para o céu durante o dia, o Sol se move do Leste para o Oeste. Da mesma forma, todas as estrelas parecem se mover juntas no céu durante a noite. A Lua e os planetas se movem de modo independente, indo e voltando. Ora, se as estrelas andam todas juntas, também é razoável supor que todas elas se encontrem fixas em alguma estrutura. Vem daí a ideia de uma esfera celeste. O modelo ptolomaico foi o modelo consensual até o período renascentista, sendo defendido pela Igreja Católica durante a Idade Média e o Renascimento.
  • 16. 16 Unidade I 1.4 Copérnico e o heliocentrismo NicolauCopérnicofoiumastrônomopolonêsque,noséculoXVI,propôsemseulivroDeRevolutionibus Orbium Coelestium (“Da Revolução de Esferas Celestes“) a teoria heliocêntrica ou heliocentrismo (em grego, helios significa Sol). Essa revolucionária ideia propunha que o Sol, e não a Terra, é que seria o centro do universo. Os planetas, incluindo a Terra, orbitariam ao redor do Sol em trajetórias circulares. Ao contrário do que se pode imaginar, não foram constatadas críticas sistemáticas ao modelo heliocêntrico por parte do clero católico durante a vida de Copérnico. Talvez porque o próprio Copérnico fosse cônego da Igreja Católica. De fato, membros importantes da cúpula da Igreja ficaram positivamente impressionados pela nova proposta e insistiram para que aquelas ideias fossem mais desenvolvidas. Ainda assim, quase um século depois, quando Galileu veio a defender a teoria heliocêntrica, ele acabou deparando com grandes resistências no seio da mesma Igreja Católica. ComoCopérnicotinhaporbaseapenassuasobservaçõesdosastrosaolhonuenãotinhapossibilidade de demonstração de sua hipótese, a comunidade científica da época acolheu suas ideias com bastante ceticismo.Apesardisso,seutrabalhomarcouoiníciodeduasgrandesmudançasdeperspectiva.Aprimeira diz respeito à escala de grandeza do Universo: avanços subsequentes na astronomia demonstraram que o Universo era muito mais vasto do que se imaginava até então. A segunda está relacionada justamente à queda dos corpos. A explicação aristotélica dizia que a Terra era o centro do Universo e, portanto, o lugar natural de todas as coisas. Na teoria heliocêntrica, contudo, a Terra perdia esse status, o que exigia uma revisão das leis que governavam a queda dos corpos. Posteriormente, essa necessidade de revisão conduziria Newton a formular sua lei da gravitação universal. Figura 5 – Esquema do modelo planetário proposto por Copérnico 1.5 Evidências a favor do sistema heliocêntrico Durante o Renascimento diversas evidências foram apresentadas a favor do modelo heliocêntrico, diminuindoaaceitaçãodomodeloptolomaico.Dentreosprincipaisproponentesdomodeloheliocêntrico nesse período, destacam-se Johannes Kepler e Galileu Galilei. Johannes Kepler foi um astrônomo e matemático alemão nascido no ano de 1571. Foi um amplo defensor do modelo heliocêntrico, embora suas convicções fossem baseadas em crenças teológicas. Para ele o Universo representaria Deus; o Sol, o pai; os astros, o filho; e o espaço, o espírito santo. Kepler
  • 17. 17 GRAVITAÇÃO realizou medidas da órbita de planetas e herdou uma extensa coleção de observações feitas por outro astrônomo, Tycho Brahe, que havia falecido precocemente. A partir dos dados da órbita de Marte, ele verificou que os planetas realizavam órbitas elípticas ao redor do Sol, quando este era colocado em um dos focos. Formulou o que chamamos de leis de Kepler, que serão discutidas mais a frente. Seu trabalho foi incluído na lista de livros proibidos pela Igreja Católica, mas foi utilizado por Isaac Newton décadas depois para corroborar seu modelo gravitacional. Galileu Galilei foi um importantíssimo físico e é tido como um dos pais da ciência moderna. Nascido em Pisa em 1564, atuou no campo da astronomia, mecânica, hidráulica e acústica. Foi o primeiro cientista a utilizar telescópios para a observação dos astros. Com essa ferramenta, chegou à conclusão de que o modelo ptolomaico não poderia estar certo. Como importantes resultados, verificou os seguintes aspectos: • Júpiter possuía satélites, o que provava que nem todos os astros giravam em torno da Terra. A publicação desse resultado causou bastante comoção na Europa. • As fases de Vênus, cheia ou nova, e a variação no seu tamanho. Galileu mostrou que somente seria possível obter essas visualizações se Vênus orbitasse ao redor do Sol. A partir de sua publicação, o modelo ptolomaico se tornava racionalmente inconsistente e insustentável. • Manchas solares. Galileu provou a partir de suas observações que o Sol apresentava movimento de rotação, sugerindo que a Terra também poderia estar girando. • Um dos principais argumentos dos defensores do Geocentrismo na época era que deveria ser possível utilizar o método de paralaxe para determinação das distâncias das estrelas caso o modelo copernicano fosse correto. Com suas observações, Galileu mostrou que as distâncias até as estrelas eram grandes demais em relação às suas órbitas. Assim, seria impossível utilizar o método de paralaxe. Com o aumento dos indícios de que o modelo geocêntrico não seria correto, Galileu começou a sofrer severas retaliações por parte da Igreja Católica. Como resultado final, Galileu foi julgado e condenado pela Santa Inquisição em 1633. Foi sentenciado a três penas: • assinar uma declaração relatando que jamais defenderia novamente o modelo heliocêntrico e que o refutava de toda forma; • prisão perpétua, que acabou sendo trocada por prisão perpétua domiciliar; • banimento de seu último escrito, Dialogue, no qual expunha de modo mais claro o modelo heliocêntrico e suas evidências. Tanto os trabalhos de Galileu quanto os de Kepler se difundiram nas décadas seguintes, tornando o heliocentrismo uma ideia bastante popular, contudo, sua aceitação definitiva só veio após a lei da gravitação universal de Newton.
  • 18. 18 Unidade I 2 COMO AS COISAS CAEM Durante séculos a filosofia aristotélica dominou o pensamento humano. As questões científicas eram respondidas com argumentos dialéticos e nenhuma tentativa de verificação experimental direta era feita. Um exemplo clássico é que se acreditava que os corpos mais pesados caíam mais rapidamente que os leves. Mesmo uma afirmação tão simples de ser refutada na prática permaneceu por séculos como verdadeira. O desenvolvimento da metodologia científica, cujo princípio se baseia na comprovação de hipóteses por meio de experimentos previamente planejados, só ocorreu no Renascimento, sendo atribuído principalmente a Galileu. Na História, não se conhece nenhuma tentativa anterior à dele em realizar de estudo sistemático sobre o movimento. 2.1 O experimento do pêndulo e a Torre de Pisa Conta-se que Galileu, quando foi a uma missa na catedral de Pisa, observou um lustre balançar de um lado para o outro devido à ação do vento. Ele notou que apesar da amplitude das oscilações (diminuindo até pararem), o tempo de cada oscilação, isto é, o tempo de cada movimento completo de vaivém, permanecia mais ou menos constante. Voltando à sua casa, ele decidiu tentar checar a veracidade daquela hipótese. Para isso, amarrou uma pedra em um barbante e a pendurou, formando um pêndulo. Na sequência, fez a pedra balançar e passou a medir o período das oscilações. Em pleno século XVII, ele não dispunha de relógios ou cronômetros. Então, para contar o tempo, utilizou como referência a contagem de suas próprias pulsações (tente fazer isso! Você vai notar que exige certa habilidade). Assim, conseguiu verificar que sua hipótese era de fato verdadeira: à medida que o pêndulo oscilava, embora com amplitudes cada vez menores, o tempo de cada oscilação permanecia praticamente constante. θ θ M M L1 L2 Figura 6 – Esquema ilustrativo do experimento de Galileu com pêndulos utilizando barbantes de diferentes comprimentos
  • 19. 19 GRAVITAÇÃO θ θ M1 M2 L L Figura 7 – Esquema ilustrativo do experimento de Galileu com pêndulos utilizando objetos de massas diferentes Não satisfeito, Galileu repetiu o mesmo experimento inúmeras vezes, usando fios mais curtos e mais longos, bem como pedras diferentes, mais leves e mais pesadas. Isso acabou levando-o a no mínimo duas descobertas: • Os períodos de oscilação dependiam do comprimento do fio, de modo que, se o fio era mais longo, o período de oscilação era maior. • Surpreendentemente, os períodos de oscilação pareciam ser independentes do peso das pedras penduradas, ou seja, se ele pendurasse uma pedra mais leve ou mais pesada num fio de mesmo comprimento e a fizesse oscilar a partir da mesma posição, o tempo de cada oscilação seria exatamente o mesmo. A segunda observação relatada representava uma contradição em relação à noção vigente de que os corpos deviam cair mais rápido se fossem mais pesados. De fato, o movimento de balanço de um pêndulo pode ser pensado como um movimento de queda livre, em que a trajetória do objeto é defletida da vertical por uma restrição imposta pela presença do fio. Desse modo, o fio acaba por conduzir o objeto a descrever uma trajetória na forma de um arco de circunferência. Se objetos com pesos diferentes, presos a fios de mesmo comprimento, e abandonados do mesmo ângulo, levam o mesmo tempo para chegar ao ponto mais baixo da trajetória, então deveriam levar o mesmo tempo para atingir o solo ao serem abandonados em queda livre de uma mesma altura. Embora não haja registro oficial desse fato, muitos dizem que, após chegar à conclusão resultante do experimento com os pêndulos, Galileu subiu até o alto da famosa Torre de Pisa. De lá, abandonou dois objetos ao mesmo tempo, um bem mais leve do que o outro. Para surpresa geral, os dois objetos teriam então atingido o solo ao mesmo tempo. Alguém poderia facilmente argumentar que nem todos os corpos abandonados da mesma altura no mesmo instante chegam juntos ao chão. Essa pessoa usaria talvez como fundamento uma folha de papel em comparação com uma pedra. De fato, a folha de papel demora mais para chegar ao solo. Porém, se a amassarmos e repetirmos o experimento, iremos constatar que ambas caem praticamente juntas. Para
  • 20. 20 Unidade I explicar a diferença antes observada, temos que levar em conta a resistência do ar. Amassando a folha, não mudamos sua massa, mas alteramos drasticamente a maneira como a resistência do ar atua. Se, em vez de amassar a folha de papel, tivéssemos uma câmara de vácuo, observaríamos o mesmo tempo de queda tanto para a folha quanto para a pedra. Exemplo de Aplicação Há um experimento muito simples que você pode fazer. Assim, poderá constatar a igualdade nos tempos de queda e ao mesmo tempo anular a resistência do ar. Para realizá-lo, não é preciso amassar a folha de papel nem ter uma câmara de vácuo. O material necessário é um caderno. Procedimento: • parte 1: — arranque uma folha de papel de dentro do caderno; — segure a folha com uma mão e o caderno com a outra; — solte o caderno e a folha ao mesmo tempo e note o que acontece. • parte 2: — coloque a folha de papel em cima do caderno; — certifique-se de que nenhuma borda da folha fique para fora do caderno; — segure o conjunto (caderno + folha); — solte o conjunto e observe o que acontece. Resultado esperado: • parte 1: O caderno chega ao chão antes da folha, pois ela é mais suscetível à ação da resistência do ar. • parte 2: — ao ser posicionado embaixo da folha, o caderno bloqueia o ar, que ofereceria resistência à folha, durante o movimento de queda; — o caderno e a folha caem praticamente juntos.
  • 21. 21 GRAVITAÇÃO 2.2 O experimento do plano inclinado O próximo passo de Galileu no estudo da queda dos corpos foi tentar encontrar uma expressão matemática que relacionasse o tempo de queda e a altura de onde o objeto caía. Ocorre, porém, que o movimento de queda livre é muito rápido para ser acompanhado em detalhe pelo olho humano. Por isso, Galileu resolveu fazer bolas feitas de diferentes materiais descerem um plano inclinado. Quando um corpo desce pelo plano, este o faz somente devido à ação da gravidade, como no movimento de queda livre. A ideia do experimento consiste em utilizar o plano inclinado como um suporte parcial para retardar o movimento de queda. θ Figura 8 – Esquema ilustrativo do experimento com planos inclinados realizado por Galileu Para medir o tempo nesse experimento, Galileu utilizou um relógio d’água. Esse instrumento consiste basicamente num recipiente com um furo por onde a água pode escoar a uma vazão constante. A água é coletada em outra fôrma, que é posteriormente pesada em uma balança. O tempo de descida é proporcional ao peso de água recolhida. Exemplo de Aplicação Podemos facilmente repetir o experimento do plano inclinado de Galileu. O objetivo é medir o tempo de descida de um objeto e relacioná-lo à distância por ele percorrida. Poderíamos construir nossos próprios relógios d’água também. Contudo, para medir o tempo de descida e chegar à conclusão que desejamos, podemos usar um cronômetro. Material necessário: • Uma tábua de madeira suficientemente longa (pelo menos 2 metros). • Um cronômetro (ou pode fazer o seu próprio relógio d’água). • Um ou dois livros (de Física) com pelo menos umas 200 páginas cada ou qualquer outro objeto que possa servir de apoio para a tábua. O ideal é que a altura do objeto que servirá de apoio seja de cerca de 10 cm. • Um cilindro ou esfera que possa rolar pela tábua (um cilindro seria melhor nesse caso, pois é mais difícil para um cilindro do que para uma esfera rolar para o lado e sair da tábua).
  • 22. 22 Unidade I • Uma trena. • Uma caneta marcadora. • Uma balança de precisão. Procedimento: — parte 1: - posicione uma das extremidades da tábua sobre a pilha de livros ou suporte e a outra extremidade no chão, formando um plano inclinado; - use a trena para medir o comprimento da tábua e a altura da extremidade elevada. Então, temos a seguinte questão: Qual será a fração da força gravitacional que irá contribuir com o movimento de descida do objeto no plano? — parte 2: - Inicialmente tire a medida da massa do cilindro que irá utilizar. - Coloque o cilindro no topo do plano inclinado de modo que ele possa rolar descendo o plano. Abandone-o a partir dessa posição. - Conte 1 segundo no cronômetro a partir do instante em que o cilindro começou a descer e então observe com atenção a posição onde ele se encontra. - Use a caneta marcadora para fixar na tábua a posição do cilindro no instante t = 1 s. - Repita o procedimento várias vezes a fim de determinar a posição do cilindro com a maior precisão possível. Depois de decidir qual o ponto da tábua que melhor representa a posição do cilindro no instante t = 1 s, marque aquela posição com a caneta e anote “t = 1 s” perto dela. - Repita todos os passos desde o início da parte 2, mas agora para um tempo de 2 segundos. - Repita novamente, mas agora para 3 segundos. - Continue a repetir as medidas enquanto o intervalo de tempo permitir a realização das marcações no plano. - Meça as distâncias entre o ponto de partida do cilindro e os pontos por onde ele passa em t = 1 s, 2 s, 3 s etc.
  • 23. 23 GRAVITAÇÃO - Monte uma tabela relacionando os tempos e as distâncias percorridas. Desenhe uma coluna para as distâncias e uma coluna para os tempos. Depois, faça uma terceira coluna e coloque nela os valores dos tempos elevados ao quadrado. Nesse instante, pergunte-se: qual a relação matemática conectando distância e tempo? — parte 3: - repita a parte anterior (2) com cilindros de massas diferentes. A relação matemática encontrada muda? Resultado esperado na parte 1: A força produzida pela ação da gravidade é denominada força peso e sempre atua verticalmente no sentido do centro da Terra. Neste experimento, entretanto, devido à presença do plano inclinado, apenas a componente tangencial Pt = P sen q irá contribuir com o movimento de descida. θ Psenθ Pcosθ P θ Figura 9 – Ilustração dos componentes vetoriais da força peso atuando na esfera que desce o plano inclinado O ângulo de inclinação q pode ser calculado através das medidas do comprimento c da tábua e da altura h de onde o corpo é abandonado. A equação utilizada para essa finalidade é: sen h c θ = A partir da inclinação, podemos calcular qual a fração da força peso que contribui com o movimento de descida do cilindro. Basta lembrar que somente a força peso na direção tangencial produz o movimento: F P P P sen P sen h c t . = = = = θ θ Ou seja, a fração da força peso que produz o movimento depende apenas da inclinação do plano. Esse é um problema típico envolvendo a decomposição de vetores (que estudaremos mais adiante). Resultado esperado na parte 2:
  • 24. 24 Unidade I Ao construir a tabela, faça o seguinte: - Pegue a primeira linha da tabela e divida a distância medida pelo quadrado do tempo. Depois faça o mesmo para a segunda linha, para a terceira e assim por diante. Vá anotando os resultados. Espera-se que os resultados sejam bem próximos uns dos outros, ou seja, a razão entre a distância percorrida DS e o quadrado do tempo é constante: ∆ ∆ S t S t2 2 = constante constante.⇒ = A segunda lei de Newton nos diz que a força resultante deve ser igual ao produto da massa pela aceleração. F ma∑ = . A força resultante nesse caso é a força peso na direção tangencial (Pt = P senq), cujo ângulo calculamos na parte 1. P mat = . Assim, podemos encontrar a aceleração do cilindro conforme: P sen m a . θ = Onde a é a aceleração, e m a massa. Após calcular a aceleração utilizando a última expressão , podemos notar que a aceleração do cilindro é o dobro da constante observada na divisão feita anteriormente. 2 2 .Constante= Constante a a = Logo, a expressão matemática procurada é: ∆ ∆ S t S a t = = Constante. . 2 2 2 Resultado esperado na parte 3: Espera-se que a relação matemática continue a mesma, não importando a massa do cilindro utilizado.
  • 25. 25 GRAVITAÇÃO Devemos destacar que, para obter o resultado da parte 2, nós trapaceamos um pouco. Isso porque Galileu não conhecia a segunda lei de Newton. Na verdade Newton nasceu em 1643, um ano depois da morte de Galileu. Como Galileu teria feito então para descobrir que a constante relatada aqui era igual a a/2? Para responder a tal questão, teremos de introduzir o conceito de velocidade instantânea, definida por Galileu. 2.3 Velocidade instantânea Em seu livro Diálogo sobre os dois Principais Sistemas do Mundo, Galileu discutiu o fato de ter obtido distâncias percorridas proporcionais ao quadrado dos tempos. Ele afirma que, nesse caso, a velocidade v do corpo deve ser proporcional à primeira potência do tempo. ∆S t v at= → =constante. 2 . Isso não é difícil de supor se pensarmos que as velocidades são uma espécie de razão entre as distâncias e tempos. Se pegarmos alguma grandeza x que é proporcional a t2 e dividirmos por t, vamos obter algo proporcional a t (denominado A na expressão a seguir). A x t A t= → ∝ Galileu também poderia ter notado em seus resultados que as distâncias percorridas aumentavam proporcionalmente a cada segundo. Ou seja, se subtrairmos a distância percorrida após 2 s pela distância percorrida após 1 s e fizermos o mesmo procedimento com as distâncias percorridas após 3 s e 2 s, 4 s e 3 s e assim por diante, verificaremos um crescimento proporcional. Considerando uma velocidade proporcional ao tempo, teremos: v = a.t onde a é a aceleração. Agora, considere o gráfico da velocidade em função do tempo. Se v = a.t, o gráfico deve ser desenhado assim: v t ∆t Figura 10 – Gráfico teórico da velocidade em função do tempo para um objeto esférico descendo um plano inclinado
  • 26. 26 Unidade I Galileu já havia percebido que as velocidades dos corpos aumentavam durante o movimento de queda livre. Entretanto, não sabia como definir a velocidade exatamente em um determinado instante do percurso. Para solucionar tal questão, Galileu imaginou o movimento como sendo composto de pequenos intervalos de tempo Dt, que poderiam ser tão pequenos quanto necessários. Para valores realmente muito pequenos, a velocidade do objeto não deveria mudar significativamente e, portanto, um cálculo de velocidade média era satisfatório. Desse modo, a velocidade instantânea é definida conforme: v dS dt = onde dS é o espaço percorrido durante o infinitésimo de tempo dt, ou seja, um intervalo de tempo Dt tendendo a zero. Observação Podemos sempre adotar um intervalo de tempo dt suficientemente pequeno para que a relação anterior seja válida. A distância total percorrida pelo cilindro no experimento do plano inclinado seria o resultado da soma de todos os dS realizados durante o percurso. Para cada intervalo de tempo, no entanto, a velocidade é considerada constante, o que garante que podemos obter o espaço dS pelo simples cálculo da área do retângulo, formado por dt e v. v dS dt v dt dS = =. Assim, o espaço percorrido é obtido pela soma das áreas dos diversos retângulos que compõem o triângulo. O espaço percorrido total, por outro lado, deve ser igual à área do triângulo, que é calculada segundo a equação: ∆S v t. = =área do triângulo = altura.base 2 2 Substituindo v por at nesta expressão, encontramos finalmente: ∆S at = 2 2 O método de dividir figuras geométricas em um grande número de pequenas partes já era utilizado desde a Grécia Antiga. No século III a.C., Arquimedes o usou para deduzir expressões para o volume de um cone e de outras figuras geométricas. Galileu foi o primeiro a aplicar esse tipo de método à resolução de problemas mecânicos. Mais tarde, Newton usaria e desenvolveria essa abordagem, dando origem a uma das mais importantes disciplinas em ciências exatas – o cálculo diferencial e integral.
  • 27. 27 GRAVITAÇÃO 2.4 Composição dos movimentos Outra valiosa contribuição de Galileu para a mecânica foi a elaboração do princípio de composição e decomposição do movimento. Esse princípio é o que está por trás, por exemplo, da noção de analisar os movimentos de pêndulos ou objetos descendo planos inclinados. A ideia, como foi explicada aqui, é que uma das partes que compõem o movimento seja associada a um movimento de queda livre. A outra parte complementaria a descrição do movimento, sendo particular para cada caso analisado. Noplanoinclinado,porexemplo,realizamosadecomposiçãonadireçãotangencialaoplanoinclinado e na direção normal a ele. Isso ocorre porque, nesse caso, o movimento se dá na direção tangencial. Sendo a descida do plano resultado apenas da ação da força peso, podemos relacionar o componente tangencial ao movimento de queda livre. θ Psenθ Pcosθ P θ Figura 11 – Esquema ilustrativo dos componentes do vetor peso na análise de uma esfera descendo um plano inclinado Para o movimento de pêndulo, é comum separar o vetor da força peso em um componente tangencial à trajetória e na direção do fio que sustenta o massor. A diferença entre a tração no fio e a componente radial do peso representa a força centrípeta, que é responsável por manter o objeto na trajetória em forma de arco. Já a componente tangencial é que executa o movimento de vaivém em si, sendo produzida apenas pela força peso e sendo relacionada ao movimento de queda livre. Psenθ Pcosθ P θ θ Figura 12 – Esquema demonstrativo dos componentes do vetor peso na análise do movimento de um pêndulo simples
  • 28. 28 Unidade I Dois componentes de um mesmo movimento são chamados de independentes se cada um deles puder ser representado por um vetor e estes forem perpendiculares entre si. O procedimento de separação de um vetor em dois componentes independentes é chamado de decomposição de vetores. Do mesmo modo que podemos separar um movimento em componentes independentes, é possível combinar os efeitos daqueles que atuam em direções distintas, obtendo um efeito resultante. O procedimento de combinar vetores que apontam em direções distintas ou iguais para obter um vetor que indica o efeito resultante é chamado soma de vetores. Note que a palavra “soma” aqui é usada com um significado completamente diferente daquele que expressa o conceito usual de soma algébrica, que é a soma entre números. A soma de vetores é uma operação de combinação ou composição de vetores para obter um vetor resultante. Para somar dois vetores, suponha que tenhamos os seguintes vetores: A B Figura 13 Então, pegamos um deles, sem rodá-lo, e colocamos a ponta dele na parte de trás do outro: A B Figura 14 Depois, desenhamos um novo vetor ligando o início do primeiro vetor e o fim do segundo vetor. Este será o vetor resultante! A B R Figura 15
  • 29. 29 GRAVITAÇÃO Exemplo de Aplicação Consideremos o exemplo da representação vetorial de deslocamentos. Suponhamos que um carro anda em uma avenida no sentido norte e, depois de andar 2 km, ele vira à direita em uma rua perpendicular a essa avenida. Então, ele anda por mais 1 km ao longo dessa rua no sentido leste. Desenhe os vetores que representam o deslocamento do carro na avenida e o deslocamento do carro na rua. ∆S1 ∆S2 Figura 16 Depois elabore o vetor que expresse o deslocamento vetorial total do carro. ∆S1 ∆S2 ∆S Figura 17 Note que o deslocamento vetorial total designa a distância entre o ponto de partida e o ponto de chegada. O sentido da seta, por sua vez, permite-nos saber de onde o carro veio e para onde ele foi. Podemos usar essa informação para olhar o desenho e distinguir entre a posição inicial e a posição final do carro. Vale ressaltar que o deslocamento vetorial não denota a distância percorrida de fato pelo carro, afinal ele anda mais do que o vetor resultante, pois está restrito a andar na avenida e na rua. O que o deslocamento vetorial representa é uma medida do quão longe o carro chegou, e não da distância que ele percorreu.
  • 30. 30 Unidade I 2.5 Lançamentos oblíquos: o movimento dos projéteis 2.5.1 Queda livre e lançamento vertical Queda livre é o termo utilizado para classificar o movimento de corpos que são sujeitos apenas à força da gravidade, estando ou não em movimento prévio. Podemos citar como exemplos uma faca caindo no chão, a órbita da Lua ao redor da Terra, entre outras. Note que não obrigatoriamente as trajetórias precisam ser retilíneas, pois a Lua descreve uma trajetória elíptica ao redor da Terra. É importante notar que nenhum tipo de força resistiva significante pode atuar sobre o corpo. Por exemplo, os paraquedistas, ao abrirem os braços e pernas, não expressam movimento de queda livre, pois a resistência do ar é considerável no caso. Do mesmo modo, um objeto estático sob o solo apresenta a reação normal devido ao chão e, logo, não se enquadra na definição. Outro ponto essencial é que o movimento de queda livre não necessariamente parte a partir do repouso. É possível lançar um corpo com certa velocidade inicial não nula para cima ou para baixo. Nesta situação, teríamos um lançamento vertical seguido de queda livre. Conforme foi mostrado no experimento do plano inclinado, durante a queda livre, um objeto descreve um movimento uniformemente acelerado com aceleração para baixo. Assim, as equações do movimento ficariam do seguinte modo: y y v t gt v v gt a g y y y y –= + = − = − 0 0 2 0 2 Onde y é a altura do corpo no instante t, medida de baixo para cima, y0 a altura inicial do corpo, v0y o componente vertical da velocidade inicial, vy o componente da velocidade vertical no instante t e g a aceleração imposta pela força da gravidade. Note que a aceleração, no caso, é negativa porque convencionamos a medida da posição de baixo para cima. Desse modo, a aceleração da gravidade atua promovendo a diminuição dos valores da posição vertical. 2.5.2 Movimento horizontal A força gravitacional atua sempre na vertical, que é perpendicular à direção horizontal. Sendo perpendiculares, essas duas direções são independentes entre si. O movimento de um corpo na horizontal não é afetado pela gravidade. Por exemplo, se pudéssemos fazer um disco deslizar sobre uma superfície horizontal sem nenhum tipo de atrito, este deslizaria com a mesma velocidade inicial para sempre (ou pelo menos até chegar
  • 31. 31 GRAVITAÇÃO ao fim da superfície). Entretanto, na prática, mesmo superfícies muito lisas apresentam algum tipo de atrito e, por isso, os corpos tendem a parar depois de algum tempo. Corpos com rodas estão limitados por algum tipo de atrito em seus rolamentos. E mesmo que os corpos em si sejam redondos, como as esferas ou os cilindros, dificilmente terão uma forma perfeitamente circular, o que pode impor uma resistência ao movimento. Ainda que o corpo tivesse uma forma perfeitamente circular, tanto ele como a superfície de apoio não seriam perfeitamente rígidos. Deformações relativas entre eles poderiam mudar momentaneamente a posição do centro de massa do corpo, permitindo o surgimento de um torque resistivo que retardaria o movimento. Isso tudo sem falar na resistência do ar, que provavelmente vai causar a desaceleração do corpo antes mesmo de qualquer um dos efeitos citados. Numa situação idealizada, em que tanto a resistência do ar como qualquer outro tipo de força dissipativa não atua de maneira significativa, podemos assumir que um corpo colocado em movimento na horizontal permanecerá em movimento retilíneo e uniforme até que encontre um obstáculo em seu caminho. Isso é o que afirma a primeira lei de Newton: “Um corpo tende a permanecer em seu estado de repouso ou movimento retilíneo e uniforme a menos que alguma força resultante não nula atue sobre ele.” Salvas então as condições ideais supracitadas, um corpo em movimento horizontal irá satisfazer às equações a seguir: x x v t v v a x x x x = + = = 0 0 onde x é a posição do corpo no instante de tempo t, x0 a sua posição inicial e vx o componente horizontal da velocidade. 2.5.3 Lançamentos oblíquos Um lançamento oblíquo consiste no lançamento de um corpo em uma direção arbitrária: nem na horizontal nem na vertical. A ideia é lançá-lo impondo uma velocidade inicial v0 não nula e que forme um ângulo q entre 0º e 90º com a horizontal. O objeto lançado é comumente denominado projétil. hmáx y x v0 θ Figura 18 – Ilustração esquemática da trajetória de um projétil durante um lançamento oblíquo
  • 32. 32 Unidade I A abordagem de Galileu para tratar esse problema consiste em decompor o movimento em um componente vertical e outro horizontal. Para analisar esse procedimento de maneira simplificada, podemos desprezar o efeito dissipativo da resistência do ar. Isso equivale a considerar o projétil com uma forma razoavelmente aerodinâmica. Lembremosagoraqueagravidadenãoatuanadireçãohorizontal.Portanto,ocomponentehorizontal descreve movimento retilíneo e uniforme. Em outras palavras, se lançarmos um corpo obliquamente num dia claro com o Sol a pino, observaremos o movimento da sombra do corpo no chão em linha reta e com velocidade constante. O componente vertical do movimento é equivalente ao de um lançamento vertical. Um movimento de lançamento vertical é um movimento retilíneo uniformemente variado que se dá com aceleração – g neste caso. θ v0 senθ v0 cosθ v0 Figura 19 – Componentes da decomposição do vetor velocidade Em um dado instante de tempo t, a velocidade do projétil pode ser decomposta em um componente horizontal e um componente vertical também. Observando a figura anterior, vemos facilmente que no instante inicial teremos: .cos . v v v v sen x y = =    0 0 0 θ θ Como a força gravitacional não atua na direção horizontal, o componente x da velocidade permanecerá inalterado ao longo do movimento. Com base nessas equações, pode-se analisar o movimento do projétil determinando uma série de características, como o tempo de voo, a forma da trajetória e o alcance horizontal. Tempo de voo Em um lançamento cuja altura da posição inicial é a mesma do ponto de pouso, o tempo de subida será idêntico ao tempo de queda. Para calcular o tempo de voo neste caso, basta que seja determinado o tempo de subida ou o de descida. A partir de então, dobra-se o valor obtendo o tempo de voo. O tempo de subida é calculado impondo a condição de que, quando atinge a altura máxima, sua velocidade vai a zero. Usando a fórmula da velocidade para um lançamento vertical: v v gty y= −0
  • 33. 33 GRAVITAÇÃO Considerando o projétil no ponto mais alto da trajetória, vy =0: 0 0= −v gty subida Que leva ao tempo de subida: t v g subida y = 0 Portanto, o tempo de voo será dado por: t v g voo y = 2 0 Lembrando que a velocidade inicial na direção y é dada por v0y = v0 .senq, obtemos por fim: t v sen g voo = 2 0 θ Alcance máximo Também podemos calcular o alcance horizontal máximo do projétil. Para isso, basta calcular o deslocamento horizontal DS = x – x0 que o projétil realiza durante o tempo de voo. Utilizando a equação da posição para o movimento horizontal, temos: x x v tx= + .0 Substituindo o tempo pelo tempo total de voo, teremos: x x v t x x v v g sen x voo x - - .0 0 02 = = θ Por fim, substitui-se a velocidade inicial horizontal v0x , obtendo: cos ∆S v sen g = 2 0 2 θ θ Que é equivalente a: ∆S v sen g = 0 2 2θ
  • 34. 34 Unidade I Observação Na expressão anterior, a relação trigonométrica a seguir foi utilizada: sen sen( ) . .cos2 2θ θ θ= Forma da trajetória A forma da trajetória é obtida pela correlação do deslocamento na horizontal com a vertical. Para fazê-lo, isolemos a variável tempo na equação da posição horizontal. x x v tx= + .0 Para simplificar o trabalho matemático, considere as posições iniciais x0 e y0 como zero, ou seja, na origem do sistema de referência. Com isso, indicamos a seguinte equação: x v t t x v x x = ⇒ = Substituindo o tempo na equação para posição vertical, temos: y v t gt y v v x g v x y y x x = − = − 0 2 0 2 2 2 2 Essa equação é chamada de equação da trajetória do lançamento oblíquo, que é uma equação de parábola com concavidade voltada para baixo. Vejamos: y bx ax= − 2 Temos quatro excelentes exemplos para ilustrar o que estamos estudando. Tente resolvê-los sem consultar as resoluções. Exemplo de aplicação Um campo de futebol tem entre 90 e 120 m de comprimento. Frequentemente vemos os goleiros recolocando a bola em jogo após o tiro de meta de modo que ela ultrapasse o meio de campo. A pequena área tem cerca de 5,5 m, portanto não seria exagero dizer que o alcance do chute dos goleiros é de aproximadamente 55 m. Supondo que um jogador chute a bola imprimindo velocidade a um ângulo de 400 com a horizontal no momento do chute, qual seria a velocidade imposta? Suponha desprezível a resistência do ar. Considere a aceleração da gravidade como g = 10m/s2 .
  • 35. 35 GRAVITAÇÃO Agora vejamos a resposta ao problema: A bola de futebol é lançada obliquamente após o chute do goleiro. Conforme a equação obtida, neste capítulo, para o alcance máximo nestas condições, temos: ∆S v sen g = 0 2 2θ Substituindo as informações fornecidas pelo exercício, obtemos: 55 80 10 0 2 0 = v sen Que leva a: , , 558 48 23 63 0 2 0 = = v v m/s Ou, em km/h: v m s 0 23 63 1 1000 3600 1 85 07, . . ,= = km m s h km/h E se desejássemos determinar a altura máxima da bola, como seria realizado o cálculo? Resposta: Especificamentenestecaso,comojáconhecemosavelocidadedabolanomomentodochute,pode-se determinar o tempo de subida conforme: t v g subida y = 0 Lembrando que o componente vertical é dado por: v v seny0 0.= θ Assim, teremos: t v g sen subida . = 0 θ
  • 36. 36 Unidade I Substituindo as informações conhecidas, obtemos: t t sen subida subida , , . = = 23 63 10 151 400 s A partir do tempo de subida, pode-se calcular a altura máxima utilizando a equação de posição para lançamento vertical. Assim: y y v t gt y Max y Subida Subida Max – , . = + = + 0 0 2 2 0 23 63 1,, – . , , 51 10 151 2 24 53 2 yMax = m Repare a diferença no alcance máximo horizontal e vertical. O deslocamento no componente vertical é muito inferior devido à desaceleração produzida pela força da gravidade. Além disso, note que durante metade do tempo de voo a bola descia, enquanto o deslocamento horizontal era progressivo. Para a mesma situação anterior, qual seria o ângulo que produziria o maior alcance para a bola? Resposta: Considere a fórmula obtida para o alcance máximo. O ângulo que permitirá o maior deslocamento da bola é aquele tal que sen2 1θ = Pois este é o valor máximo da função seno. Logo: 2 1 2 90 45 0 0 θ θ θ = = = arcsen( ) Na vida real, teríamos os efeitos devido à resistência do ar. Reflita a respeito de como os resultados descritos mudariam caso considerássemos esta contribuição.
  • 37. 37 GRAVITAÇÃO 3 A MAÇÃ E A LUA 3.1 Newton e a queda da maçã Isaac Newton foi um cientista inglês que viveu entre os séculos XVII e XVIII. É o responsável pela teoria clássica da gravitação, a lei da gravitação universal. O modelo foi apresentado em seu livro Philosophiae Naturalis Principia Mathematica (do latim: “Princípios Matemáticos da Filosofia Natural”), popularmente conhecido como Principia. Publicado em 1687, a história da concepção do livro começa mais de uma década antes. Em 1666, por causa de uma epidemia de peste negra, o Trinity College, que é parte da Universidade de Cambridge, onde Newton estudava, foi fechado. Com isso, ele foi para a casa de sua mãe, uma fazenda próxima do vilarejo de Woolsthorpe, município de Lincolnshire, Inglaterra. Ele passou cerca de um ano isolado nesse local quando tinha apenas 24 anos de idade. Nesse ano de retiro, Newton elaborou os fundamentos de quatro de seus principais trabalhos: o teorema binomial, o cálculo diferencial e integral, a lei da gravitação universal e o estudo sobre a natureza das cores. Embora as versões completas de algumas dessas teorias só viessem a ser concluídas e divulgadas cerca de 20 anos depois, com a publicação do Principia, os preceitos delas foram formulados num período de um único ano de reclusão, constituindo uma das principais quebras de paradigma e mais importantes contribuições à ciência de todos os tempos. Não é pouco chamar Newton de gênio. A lei da gravitação universal é uma teoria tão bela e funcional que permaneceu absoluta e inquestionável por mais de 200 anos. Alguém que tivesse habilidade suficiente para formular uma concepção da gravitação capaz de superar ou contradizer qualquer aspecto da teoria newtoniana com certeza mereceria grande destaque e reconhecimento por sua genialidade. Essa pessoa foi Albert Einstein, com a teoria moderna da gravitação, a relatividade geral, de 1916. Aindaqueessaleisemostreincorretanaprevisãodedeterminadosaspectosespecíficosdanatureza, como será discutido mais adiante, devemos destacar que, para praticamente todas as aplicações cotidianas e para uma ampla gama de fenômenos astronômicos, sua teoria funciona extremamente bem. Por causa disso, ainda hoje ela é uma das principais ferramentas teóricas em diversos campos da ciência e engenharia, como na astronomia, astronáutica e engenharia aeroespacial. Existe uma famosa lenda a respeito da descoberta da lei da gravitação universal, a lenda da maçã. A história diz que, numa determinada tarde, durante seu ano de retiro na fazenda, Newton se sentou embaixo de uma macieira para tirar um cochilo. Uma maçã caiu dessa árvore e atingiu diretamente a cabeça dele, sendo este o fato que o teria inspirado a pensar sobre a queda dos corpos e formular sua teoria da gravitação.
  • 38. 38 Unidade I Saiba mais Um interessante artigo discutindo a veracidade dessa lenda pode ser encontrado em: UPTON, E. Did an inspirational apple really fall on Newton’s head? TodayIFoundOut.com, 23 out. 2016. Disponível em: <http://gizmodo.com/ did-an-inspirational-apple-really-fall-on-newtons-head-1450597571>. Acesso em: 23 nov. 2016. 3.2 O movimento da Lua e de outros corpos celestes De acordo com relatos do próprio Newton, durante seu ano de retiro, ele começou a pensar que a mesma gravidade que levava os corpos a caírem na Terra podia se estender cada vez mais alto e chegar até a Lua. Ele passou a pensar em quais seriam os requisitos necessários para manter a Lua em órbita ao redor da Terra, visto que a força gravitacional atrairia a Lua. Em seus argumentos, posteriormente publicados no Principia, Newton diz: Se estivermos no alto de uma montanha e dispararmos uma bala na direção horizontal, o movimento será composto de dois componentes: a) Um movimento horizontal, com mesma velocidade que na saída do cano da arma e; b) Um movimento de queda livre, acelerado sob a ação da força da gravidade. Como resultado da composição desses dois movimentos, a bala irá descrever uma trajetória parabólica e atingirá o solo a alguma distância a partir dali. Se a Terra fosse plana, a bala sempre atingiria o chão, mesmo que a arma disparasse cada vez mais longe. Porém, como a Terra é redonda, sua superfície se curva continuamente embaixo do caminho da bala e, para uma certa velocidade, a trajetória curva da bala irá seguir a curvatura do globo terrestre. Então, se não houvesse resistência do ar, a bala jamais cairia no chão, mas continuaria a circular a Terra a uma altitude constante (NEWTON, 2010). A ideia ilustrada é a primeira teoria que se conhece de um satélite artificial. É claro que ainda demoraria muito para se construí-lo, mas o princípio de funcionamento é justamente esse imaginado por Newton. Além disso, os satélites não são lançados horizontalmente do alto de montanhas, é claro. Eles são lançados praticamente na vertical até ultrapassar os limites da
  • 39. 39 GRAVITAÇÃO atmosfera terrestre e então são manobrados até ganharem a velocidade horizontal necessária para permanecer em órbita. Considerando o movimento da Lua como um movimento de queda contínua, que nunca atinge a Terra, Newton foi capaz de calcular a força gravitacional que atua na Lua. A ideia deste cálculo é expressa na imagem a seguir. Terra C Lua A B B’ Figura 20 – Esquema mostrando a órbita da Lua em relação à Terra Considere a Lua se movendo em uma órbita aproximadamente circular ao redor da Terra. Sua posição em certo instante é A e o componente de sua velocidade tangencial é v. Se a Lua não fosse atraída pela Terra, ela seguiria uma linha reta e, depois de um curto intervalo de tempo Dt, chegaria à posição B’. Desse modo, a distância entre A e B’ é dada por: AB’ = .v t∆ Lembrete No caso relatado, a Lua descreve um movimento uniforme porque realiza um movimento horizontal, logo: ∆ ∆S = .v t
  • 40. 40 Unidade I Evidenciados os aspectos iniciais, é preciso destacar que há outro componente influenciando o movimento da Lua, ou seja, que produz a queda livre em direção à Terra. Por isso, sua trajetória se curva e, em vez de chegar ao ponto B’, ela alcança o ponto B. Pode-se imaginar que o segmento BB’ representa quanto a Lua caiu na direção da Terra durante o intervalo de tempo Dt. Considere agora o triângulo retângulo CAB’ onde C é o centro da Terra. Usando o teorema de Pitágoras, pode-se equacionar: CB’ =CA AB’ 2 2 2 + Note que o segmento CB’ é igual à soma CB + BB’. Portanto, a fórmula do teorema de Pitágoras anterior é expresso assim: CB+BB’ =CA +AB’( ) 2 2 2 Abrindo o produto notável que destacamos, temos: CB CBBB’ BB’ =CA +AB’ 2 2 2 2 2+ +. . Como CB = CA, pois são medidas do raio da órbita, eles são cancelados nos dois lados da equação anterior. Depois de fazer isso, os dois lados da equação são divididos por 2.CB, obtendo: BB’ BB’ 2.CB AB’ CB + = 2 2 2. Se um intervalo de tempo Dt pequeno for considerado, a distância BB’ vai ser pequena também. Quando um número pequeno é elevado ao quadrado, o resultado é um número ainda menor. Por exemplo, pegue 0,01 e eleve ao quadrado. O resultado é 0,0001, que é 100 vezes menor do que 0,01. Seguindo esse raciocínio, podemos escolher um intervalo de tempo Dt tão pequeno quanto quisermos até que a distância BB’ seja muito pequena. Isso é equivalente a pensar que se não tiver passado muito tempo desde que começamos a olhar a Lua, então não vai ter dado tempo à trajetória dela de desviar muito do que seria uma linha reta. Agora, olhando para o lado esquerdo da última equação, note que a distância BB’ aparece nos dois termos, mas no segundo ele aparece elevado ao quadrado. Conforme discutido, o termo elevado ao quadrado é muito pequeno em comparação com o outro e, nesse caso, pode ser desprezado. Com isso: BB’ AB’ CB = 2 2.
  • 41. 41 GRAVITAÇÃO Tendo em vista que AB’ = v.∆r, que BB’ é o espaço percorrido pela Lua durante a queda livre, e sendo CB’ o raio da trajetória que a Lua realiza ao redor da Terra, temos: BB’ = ( ) =       v t R v R tS ∆ ∆∆ 2 2 2 2 1 2 Se compararmos a última equação com a relação matemática obtida por Galileu para o movimento de queda livre, veremos que o termo v2 /R é a aceleração com a qual a Lua cai em direção à Terra. É claro que, devido ao seu componente horizontal do movimento, a Lua sempre erra o alvo, permanecendo em órbita. Galileu↔↔ Newton ∆ ∆ ∆ ∆S a t S v R t a v R = ⇔ =       = 1 2 1 2 2 2 2 2 Por definição, a velocidade angular w de um corpo em uma trajetória circular é: ω π = = v R T 2 Onde T é o período da órbita, ou seja, o tempo que a Lua leva para dar uma volta completa ao redor da Terra. Pode-se isolar a velocidade v na equação anterior para determiná-la apenas considerando o raio e o período: v R T = 2π Substituindo a velocidade na fórmula da aceleração encontrada por Newton, expressamos o seguinte: a R T R R T = ( ) = . 2 4 2 2 2 π π A equação obtida permite o cálculo da aceleração imposta à Lua pela atração gravitacional exercida pela Terra. Para o cálculo ser executado, é necessário o prévio conhecimento do período T e da distância
  • 42. 42 Unidade I da Terra à Lua – R. O período já era conhecido e é dado por T = 27,3 dias = 2,36 x 106 s. O valor de R, por sua vez, é a soma do raio da Terra com a distância até o centro da Lua. O raio da Terra, conforme já discutido, havia sido definido por Eratóstenes no século III a.C. A distância da Terra até o centro da Lua já havia sido determinada por diferentes astrônomos, como Hiparco e Aristarco. Entretanto, utilizaremos os valores mais aceitos e precisos da atualidade, ou seja, R = 384402 e km = 384402000 m. Substituindo os dados na equação exposta, temos: a a m s = ( ) = . , . , / 4 384402000 2 36 10 0 0027 2 6 2 2 π Obtém-se a aceleração da Lua em relação à Terra. Note que este valor é bem menor que os 9,8 m/s2 que medimos para a queda livre de objetos próximos da Terra. De fato, é cerca de 3.600 vezes menor! Observação Nos cálculos realizados por Newton, devido à diferente estimativa da distância até a Lua, ele obteve como resultado uma aceleração 3.640 vezes menor que a verificada na Terra. Confrontado com esse fato, Newton imaginou que se a força que mantinha a Lua orbitando ao redor da Terra era a mesma que fazia os objetos caírem no chão, ela deveria diminuir com a distância. Por exemplo, uma maçã que cai de uma macieira cai de uma distância a partir do centro da Terra, que é aproximadamente igual ao raio do planeta, ou seja, 6.371 km. A Lua, por outro lado, está a 384.402 km, 60 vezes mais longe. Newton percebeu o seguinte: enquanto a aceleração da Lua é cerca de 3.640 vezes menor do que a aceleração da maçã, a distância do centro da Terra até a Lua é cerca de 60 vezes maior. Além disso, notou que, ao elevar 60 ao quadrado, obtemos um número muito próximo de 3.640. Baseado nessas observações, concluiu não só que o valor da aceleração deveria cair à medida que a distância aumentasse, mas que deveria ser inversamente proporcional ao quadrado da distância, F k R = 2 e a constante k ainda deveria ser determinada. Contudo, de acordo com a segunda lei de Newton, a força que atua sobre um objeto deve ser diretamente proporcional à massa do objeto, pois F = m.a. Logo, a constante k deve ser diretamente proporcional à massa m da Lua. De acordo com a terceira lei de Newton, se a Terra exerce uma força de
  • 43. 43 GRAVITAÇÃO atração sobre a Lua, então a Lua exerce uma força de atração de mesma intensidade sobre a Terra. Neste caso, esperamos que a constante k também seja diretamente proporcional à massa M da Terra. Portanto, podemos escrever: k GMm= onde G é uma nova constante que não depende das massas dos objetos envolvidos na interação gravitacional, sendo, portanto, uma característica da natureza em si. Nesse ponto, podemos perceber que se a gravidade é a força que faz os objetos caírem na Terra e mantém a Lua em órbita ao redor do nosso planeta, provavelmente deve ser responsável por manter a Terra em órbita ao redor do Sol. De fato, ela é responsável não só por manter as órbitas dos planetas e de seus satélites naturais, bem como do movimento orbital do Sol e de todas as outras estrelas ao redor do centro da Via Láctea. Além disso, da mesma forma que existe uma força de atração gravitacional entre o Sol e os planetas ou entre os planetas e suas luas, deve haver uma força de atração entre quaisquer objetos que tenham massa. É razoável supor que, mesmo com uma intensidade muito pequena, duas maçãs em cima de uma mesa estão se atraindo gravitacionalmente. Isso vale para maçãs, para pessoas e para qualquer outro objeto que tenha massa. Em última análise, as trajetórias dos planetas em seus movimentos orbitais ao redor do Sol são perturbadas pela presença de outros planetas. De fato, foi exatamente assim que o planeta Netuno foi descoberto. Após a descoberta de Urano em 1781, o astrônomo francês Jean Baptiste Joseph Delambre passou a observar com cautela seu movimento orbital e acabou descobrindo que esse movimento não seguia exatamente a trajetória prevista pela teoria newtoniana. Uma das propostas para se explicar tal fato era que devia haver outro planeta, até então nunca observado, perturbando gravitacionalmente a órbita de Urano. Já no século XIX, os astrônomos John Couch Adams e Urbain Le Verrier, de modo independente, provaram matematicamente que era possível a existência desse outro planeta. A partir daí, diversos astrônomos passaram a procurar o tal planeta desconhecido nos locais onde ele poderia estar de acordo com as previsões matemáticas, até que, em 1846, Netuno foi finalmente observado. Figura 21 – Netuno realizada pela Voyager2, Nasa
  • 44. 44 Unidade I 3.3 A lei da gravitação universal Combinando as duas equações apresentadas anteriormente, podemos finalmente escrever a forma matemática da lei da gravitação universal: F GMm R = 2 Exploremos a expressão obtida por Newton. Suponha um objeto abandonado em queda livre próximo à superfície da Terra. A única força que atuará nele será a exercida pela ação da gravidade – se desprezarmos a resistência do ar. Nesse caso, conforme a segunda lei de Newton: F ma F mg ∑ ∑ = = . . onde a é a aceleração de queda e m a massa do objeto. É comum a substituição da letra “a” pela letra “g” quando se analisa um movimento de queda livre. Neste caso, a aceleração de queda é chamada de aceleração da gravidade local. Substituindo na última expressão a força gravitacional prevista pela lei da gravitação universal, chegamos a: . GMm R mg2 = Neste caso, M é a massa da Terra. Simplificando a equação ao cortar a massa do objeto nas duas expressões, obtemos: g GM R = 2 Os valores já conhecidos da aceleração da gravidade local e do raio da Terra poderiam ser utilizados na expressão anterior. Então, teríamos como resultado o produto GM. A partir daí, para determinar o valor da massa da Terra, seria necessário saber o valor de G. Para indicar o valor de G, precisaríamos conhecer a massa da Terra, o que parece um beco sem saída. 3.4 O experimento de Cavendish e a determinação de G Newton não chegou a viver o suficiente para testemunhar a especificação do valor de G ou da massa da Terra. Isso ocorreu somente mais tarde, em 1797, quando Henry Cavendish realizou um experimento para definir a massa da Terra. Conforme destacamos, conhecendo o valor da massa M da Terra e o valor do produto GM, seria possível expressar o valor de G. Cavendish construiu uma balança de torção composta de um bastão de madeira com cerca de 1,8 m de comprimento suspenso a partir do seu centro por um fio. Em cada uma das extremidades do bastão foram penduradas esferas de chumbo, com cerca de 5 cm de diâmetro e 700 g de massa cada. Perto
  • 45. 45 GRAVITAÇÃO de cada uma dessas esferas, foram posicionadas esferas maiores, cada uma com 30 cm de diâmetro e massa de aproximadamente 158 kg. As esferas maiores foram posicionadas a 23 cm de distância das esferas menores e ficavam presas a um sistema de suspensão independente, que as mantinha fixas no lugar. Todo o aparato ficava lacrado dentro de uma grande caixa de madeira a fim de evitar qualquer perturbação proveniente de correntes de ar externas. O deslocamento relativo entre as esferas podia ser observado de fora por lunetas encaixadas em pequenos buracos nas paredes da caixa. m m M’ M’ F’ F’ R’ Figura 22 – Esquema ilustrativo da balança de torção utilizada por Henry Cavendish A ideia do experimento era medir a atração gravitacional entre uma esfera grande e uma esfera pequena por meio da observação da distância entre elas. As esferas grandes atraíam as pequenas fazendo a balança de torção rodar, até que a torção no fio contrabalanceasse a força gravitacional. Quando isso acontecia, a haste parava de girar, sendo possível medir o ângulo de desvio e a distância R’ entre as esferas. Nessa condição, necessariamente, a força de resistência à torção pelo fio é exatamente igual à força gravitacional entre as esferas, chamada aqui de F’. Este valor foi determinado por Cavendish de acordo com o ângulo de torção do fio, que era previamente caracterizado. A força gravitacional F da Terra, sobre uma das esferas pequenas, podia ser medida diretamente, simplesmente pesando-a em uma balança comum. Da mesma forma, era possível definir a massa M de uma das esferas grandes. Conforme a lei da gravitação de Newton, a força entre a esfera pequena e a Terra é: F GM m R Terra = 2 onde m é a massa da esfera pequena e R o raio da Terra. A força entre a esfera grande e a esfera pequena é dada por: F GM m R Grande ’ ’ = 2
  • 46. 46 Unidade I onde R’ é a distância relativa entre uma esfera grande e uma pequena. A razão entre essas duas forças é dada por: F F GM m R GM m R Terra Grande’ ’ = 2 2 que permite a simplificação dos termos comuns, obtendo: F F M M R R Terra Grande’ ’ =     2 A expressão anterior pode ser manipulada de modo a isolarmos a massa da Terra na expressão: M M F F R R Terra Grande ’ ’ =     2 Perceba agora os termos do lado direito da expressão. A massa da esfera grande foi medida com o auxílio de uma balança analítica. A força F é o peso da esfera pequena, também determinada com a balança. A força F’ é definida pelo ângulo de torção do fio, a distância R’ é medida na condição de equilíbrio, e, por fim, o raio da Terra, uma grandeza conhecida. Assim, Cavendish foi capaz de precisar a massa da Terra. O valor aceito atualmente para a massa da Terra é: M x kg,=5 97 1024 Com isso, conhecendo o valor do produto GM, é possível indicar o valor da constante da gravitação universal G, que é: G x m kg s, - - - =6 67 10 11 3 1 2 O valor fornecido por Cavendish apresentou um desvio de apenas 1% em relação ao conhecido atualmente. Exemplo de aplicação No experimento de Cavendish, esferas de diferentes massas foram utilizadas, sendo uma de 700 g e uma de 158 kg. Com base na constante gravitacional determinada por ele, calcule a força de atração entre as esferas, quando mantidas separadas por 10 cm.
  • 47. 47 GRAVITAÇÃO Vamos solucionar o problema. Conforme a lei da gravitação universal, a força atrativa pode ser calculada segundo a seguinte expressão: F GMm R = 2 Substituindo a constante universal G, as massas das esferas e a distância entre elas, obtemos: F F GMm R F , . . . , , . , = = = − − 6 67 10 158 0 7 7 4 10 0 1 11 2 2 7 N É uma força extremamente pequena, mostrando a precisão do aparato montado por Cavendish. Se a força calculada no exercício anterior fosse aplicada sob a esfera pequena livre de qualquer resistência, qual seria a aceleração produzida? Conforme a segunda lei de Newton: F ma a a ∑ = = = − − . , . , . . 7 4 10 0 7 1 10 7 6 m/s2 Devido à ínfima aceleração no sistema e aos efeitos de oscilação produzidos, Cavendish chegava a esperar mais de 20 minutos entre cada medição. Pensemos na seguinte proposição: se levássemos a esfera pequena para uma distância três vezes maior do que no primeiro problema, quantas vezes a força gravitacional diminuiria? Num primeiro momento, a força gravitacional é dada por: F GMm R 1 1 2 = onde R1 é a distância inicial antes de deslocarmos a segunda esfera.
  • 48. 48 Unidade I Quando levada a uma distância que é o triplo da primeira, teremos a condição matemática a seguir satisfeita: R R2 13= . E a força gravitacional será: F GMm R 2 2 2 = Ao substituir a condição matemática descrita na lei da gravitação pelo segundo caso, obtém-se: F GMm R F GMm R F GMm R F ( . ) . . 2 1 2 2 1 2 2 1 2 1 3 9 1 9 1 9 = = = = A força cai 9 vezes ao triplicarmos a distância. Observação Note que os parênteses são necessários na substituição da distância feita na expressão anterior. Como foi indicado, a força gravitacional depende da massa dos corpos. Assim, por que um objeto mais pesado não cai mais rápido do que um mais leve? Para um objeto em queda livre, a única força que atua sobre ele é a força peso (desconsiderando a resistência do ar). Desse modo, conforme a segunda lei de Newton. F = m.a Onde m é a massa do objeto, e a é a aceleração experimentada pelo corpo. Substituindo a força pela lei da gravitação universal, obtemos a seguinte expressão: GMm R ma . . .2 =
  • 49. 49 GRAVITAÇÃO Onde M é a massa da Terra e R a distância do centro de massa da Terra até o objeto. Essa expressão pode ser fatorada ao anular a massa do objeto nos dois lados da equação: GM R a . 2 = O produto desses termos é exatamente o que chamamos de aceleração da gravidade e ele independe da massa dos corpos. Para fins ilustrativos, na tabela a seguir são mostrados os valores da massa da Terra, do raio médio da Terra e da constante gravitacional. Tabela 1 Grandeza Valor G (N.m/kg2 ) 6,67408. 10-11 M (kg) 5,9723. 1024 R (m) 6371000 Ao substituir esses valores na equação obtida anteriormente, teremos: a a m s = = − 6 67408 10 5 9742 10 6371000 9 82 11 24 2 2 , . . , . , / O resultado é uma excelente aproximação para a aceleração da gravidade já conhecida. Note que a aceleração da gravidade muda ligeiramente de acordo com a posição no globo terrestre. 4 CÁLCULO Como foi comentado, Newton apresentou em seu livro Principia, de 1687, muitas de suas principais ideias. Juntamente com a lei da gravitação universal e as leis para análise do movimento, reportou ainda toda uma formulação matemática necessária para comprovar formalmente seus modelos. Naquela época, a matemática ainda não era suficientemente desenvolvida para que ele pudesse registrar e, a partir daí, discutir em detalhes todas as consequências de suas descobertas. Por exemplo, no tratamento do problema da interação gravitacional entre a Terra e a Lua, que descrevemosaqui,Newtonfoiobrigadoaassumirinicialmentequeaforçagravitacionalerainversamente proporcional ao quadrado da distância entre os centros dos dois corpos envolvidos. Contudo, quando uma maçã é atraída pela Terra, a força que a faz cair é formada por inúmeros componentes. Estes têm origens completamente diferentes, como as pedras sob o solo em profundidades dissemelhantes, as raízes da macieira de onde a maçã caiu, as rochas das montanhas das cordilheiras dos Andes e do Himalaia, a água do Oceano Pacífico, o núcleo de ferro líquido do Planeta Terra. Enfim, uma infinidade de diferentes objetos de diferentes massas dispersos por todas as regiões do planeta Terra. Então, para
  • 50. 50 Unidade I provar que sua lei matemática sobre a gravitação estava correta, Newton teve que demonstrar que a soma vetorial das forças gravitacionais oriundas de todas as infinitas possíveis contribuições fornecia um vetor resultante que era equivalente ao que se teria se fosse considerado que toda a massa da Terra estava concentrada num único ponto, em seu centro. O problema em questão é similar ao do estudo de Galileu, em que ele teve de definir a velocidade instantânea do corpo, porém é muito mais complicado. Como Newton não tinha à disposição as ferramentas matemáticas essenciais para o completo desenvolvimento de sua análise, ele precisou, por si próprio, elaborar a teoria matemática necessária. Essa teoria é o cálculo diferencial e integral, que constitui um dos principais ramos da matemática, com aplicações nas mais diversas áreas da ciência e tecnologia. 4.1 Aproximações e limites O cálculo difere de outras áreas da matemática por utilizar um método no qual as linhas, superfícies e volumes da geometria clássica são divididos em um grande número de partes muito pequenas. A partir daí, por meio da análise do que acontece individualmente a cada uma dessas pequenas partes, métodos de generalização permitem tirar conclusões sobre o comportamento coletivo delas e, portanto, sobre os todos que formam. O processo de tomar partes muito pequenas de um todo e de considerar essas partes tão pequenas quanto se possa imaginar ou uma quantidade qualquer arbitrariamente próxima de um determinado valor é chamado em matemática de limite. Vejamos o seguinte exemplo. Considere a razão: x x 2 9 3 −( ) −( ) Se tomarmos o valor de x muito próximo de 3, qual será o valor dessa expressão? É fácil ver que tanto a expressão do numerador quanto a do denominador resultam em números muito próximos de zero se x for muito próximo de 3. A tendência natural nessa situação é que as pessoas pensem: “Se eu tenho um número muito próximo de zero e divido por outro número muito próximo de zero, então estou dividindo uma coisa por outra muito próxima dela mesma. Ora, quando eu divido um número por ele mesmo, o resultado é 1. Então, o número que resulta da razão entre aquelas duas expressões quando x é próximo de 3 deve ser um número muito próximo de 1. Certo?”
  • 51. 51 GRAVITAÇÃO Errado! Veja o porquê: • parte 1: — Considere a expressão matemática (x-3). Que valor essa expressão assume quando x é um número muito próximo de 3, mas diferente de 3? — Para saber a resposta, basta substituir x por, digamos, 3,00000001 na expressão anterior e fazer a conta. O resultado é 0,00000001, que é um número muito próximo de zero. — É claro que, intuitivamente, já sabíamos que se x estivesse muito próximo de 3, a expressão (x-3) deveria resultar em um número bem próximo de zero. • parte 2: — Agora use a expressão (x2 – 9). Que valor essa outra expressão assume se x for muito próximo de 3? — Novamente, nossa intuição nos diz que o resultado deve ser um número muito próximo de zero, mas, mesmo assim, vamos fazer a conta e ver o que acontece. — Avaliando que podemos substituir x por 3,00000001 outra vez e fazer o cálculo, pode ser um pouco desgastante elevar esse x ao quadrado. Simplifiquemos a expressão primeiro. Note que: x x x2 9 3 3–( )= +( ) −( ) — O segundo fator do lado direito da última expressão é justamente o que tínhamos calculado na parte 1, ou seja, 0,00000001. Já o primeiro fator do lado direito é 3,00000001 + 3 = 6,00000001. x x 2 2 9 6 00000001 0 00000001 9 0 000000061 – , . , – , ( )= ( )= — Fazendo a multiplicação entre os números 0,00000001 x 6,00000001, concluímos que o resultado deve ser: 0,0000000600000001, que ainda é um número muito próximo de zero, como nossa intuição dizia. • parte 3: — Agora uma pergunta capciosa: Se tomarmos a razão entre a expressão da parte 2 e a expressão da parte 1, ou seja, (x2 – 9)/(x - 3), que resultado obteremos?
  • 52. 52 Unidade I — Observe que, embora o resultado da parte 2 seja um número muito próximo de zero, ele é um número próximo de zero e cerca de 6 vezes maior que o do resultado da parte 1. Então, se usarmos o resultado da parte 2 e dividirmos pelo resultado da parte 1, a resposta deve ser 6. — A notação matemática aplicada para expressar essa ideia é: lim x x x→ −( ) −( ) = 3 2 9 3 6 Isso significa que, se tomarmos x cada vez mais próximo de 3, isto é, se tomarmos o limite em que x tende a 3 para aquela razão (x2 – 9)/(x - 3), o resultado da conta deve ser um número cada vez mais próximo de 6. Nós já havíamos deparado com problemas envolvendo limites no início deste livro-texto. Quando Galileu precisou encontrar a relação matemática para a velocidade instantânea, ele teve de dividir o movimento em diversos pequenos intervalos de tempo. Isso corresponde a tomar um limite no qual o tamanho dos intervalos de tempo Dt tendem a zero. Da mesma forma, quando Newton analisou o movimento orbital da Lua, a validade de seus argumentos se apoiou em uma passagem matemática na qual um termo que aparecia elevado ao quadrado foi desprezado. Para poder desprezar esse termo, foi considerado que o quadrado de um número pequeno é muito pequeno em comparação com o número em si. Esse número pequeno, por sua vez, correspondia a uma distância percorrida pela Lua. Acontece que essa distância só poderia ser considerada pequena se o intervalo de tempo entre a posição inicial e final fosse tão pequeno quanto necessário. Isso corresponde, mais uma vez, a tomar o limite em que Dt tende a zero. 4.2 Velocidades e taxas de variação 4.2.1 Derivadas e taxas de variação Nesse momento vamos nos dedicar ao seguinte problema: dada uma determinada função x(t), descobrir o quão rápido ela cresce ou decresce em um ponto específico. Para utilizarmos termos precisos, observe o gráfico mais adiante. O objetivo seria indicar uma grandeza associada ao quão rápido a função cresce no ponto t = t0 . Para verificar o comportamento da função, será necessário tomarmos outro ponto, como t1 , e traçarmos uma reta ligando esses pontos. A partir da inclinação da reta, podemos analisar se a função cresce em média no intervalo adotado. Perceba que, quanto maior o crescimento da função, mais inclinada essa reta seria.
  • 53. 53 GRAVITAÇÃO x t t0 t1 Figura 23 – Esquema indicando o crescimento médio de função entre dois pontos t Ocorre, porém, que os pontos tomados no último gráfico não determinam se a função cresce no ponto t0 , pois ela poderia estar diminuindo em t0 e logo depois começar a subir até o ponto t1 . Além do mais, a função cresce mais rapidamente próxima a t1 do que t0 , superestimando a inclinação da reta. Então, como poderíamos prosseguir para obtermos estimativas melhores do crescimento em t0 ? O procedimento consiste em diminuir a distância entre o segundo ponto e t0 , mas mantendo t0 na mesma posição, pois é o ponto cujo comportamento estamos interessados em avaliar. No gráfico a seguir, são mostradas duas retas, uma em verde, definida no exemplo anterior, e uma em vermelho, obtida pela aproximação entre t1 e t2 . t0 t2 t1 Figura 24 – Esquema indicando que a diminuição do intervalo Dt torna a inclinação da reta mais próxima do real crescimento da função no ponto t0 Uma sensível melhora na estimativa de crescimento já é verificada, mas pensar que esta já é uma boa expressão da inclinação da função no ponto t0 é errado. Se aproximarmos a imagem de novo, veremos que era possível ter adotado outro ponto ainda mais próximo de t0 e que, nessa situação, a reta traçada indicaria ainda melhor a inclinação da função naquele ponto. Esse procedimento poderia ser repetido indefinidamente. Cada vez que olharmos mais de perto a função, notamos que poderíamos ter adotado um ponto ainda mais próximo de t0 . Isso corresponde a um processo de limite. Observe o seguinte: se adotarmos o segundo ponto com coordenadas logo após t0 , com distância Dt tendendo a zero, obteremos a inclinação mais representativa possível. Nesse caso, pode-se mostrar que a reta obtida pela utilização do limite é a chamada reta tangente ao gráfico da função.
  • 54. 54 Unidade I Analisemos esse procedimento do ponto de vista formal na matemática. Para se determinar o ângulo que uma reta faz com o eixo horizontal, geralmente utilizamos a expressão dada a seguir para o cálculo do coeficiente angular: tanθ = = = − − a y x y y x x ∆ ∆ 2 1 2 1 onde a é o coeficiente angular de uma reta qualquer e q o ângulo formado por ela com a horizontal no sentido anti-horário. Nesse caso específico, no entanto, o eixo y é a posição x(t) e o eixo x é o tempo t. Assim, o coeficiente angular ficaria definido como: tan ( ) ( ) θ = = − − a x t x t t t 2 0 2 0 onde apenas foram trocados os eixos y por x(t) e o eixo x por t. Poderíamos ainda escrever o instante t2 como: t t t2 0= + ∆ onde Dt é o intervalo de tempo adotado entre t2 e t0 . Observação Observe o intervalo Dt no gráfico para não tornar o cálculo apenas mecânico e sem sentido. Substituindo essa relação na expressão indicada para o cálculo da inclinação da reta, temos: tan ( ) ( ) θ = = + − + − a x t t x t t t t 0 0 0 0 ∆ ∆ que se reduz a: tan ( ) ( ) θ = = + − a x t t x t t 0 0∆ ∆ Isso ocorre porque o termo no denominador é simplificado. Por fim, tomar um intervalo de tempo tão pequeno quanto necessário significa tomar um intervalo de tempo tendendo a zero. Nessa hipótese, a inclinação seria exatamente a da reta tangente ao ponto t = t0 , como foi comentado. Sua equação ficaria estabelecida como: tan lim :θ = + ∆( )− ( ) ∆ = ( )→” t x t t x t t x t 0 0 0 0