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Futuro da humanidade
                      demanda ecumenismo da tolerância
SAN JUAN, Abril 8, 2004 (alc). Quem aspirar ser cristão não deve esquecer que o Jesus
 dos evangelhos nunca fez da adesão a dogmas, hierarquias eclesiásticas ou prescrições
   rituais o decisivo de sua mensagem, disse o teólogo porto-riquenho Luis N. Rivera
                                        Pagán.

    "Jesus sempre foi muito heterodoxo em suas predileções: preferiu o solidário e
  compassivo samaritano ao piedoso levita ou o devoto sacerdote. Seu desafio radical
 conduz antes a assumir plenamente a solidariedade e a compaixão com os condenados
  da terra", argumentou Rivera em conferência que apresentou, em março, na Cátedra
             Unesco de Educação para a Paz, na Universidade de Porto Rico.

   O conferencista reportou-se a guerras e conflitos que fizeram do século XX o mais
 mortífero da história, com aproximadamente 187 milhões de vítimas, e o abandono da
   diferenciação entre militares e civis. Rivera afirmou que muitas vezes a guerra foi
 conflagrada com a pretensão de terminar com a guerra, parodiando o mito religioso de
                   que o horror ao inferno conduz ao umbral do céu.

Nesse século de grandes descobertas científicas e técnicas, do triunfo da racionalidade e
  da suposta "morte de Deus", proclamada por Friedrich Nietzche, a paixão ideológica
 contribuiu para o carnaval homicida. No final do século, piedosos adoradores de Javé,
  Jesus Cristo e Alá proclamaram a cólera divina com a declaração de guerras santas,
arrolou Rivera, que é professor no Seminário Teológico de Princeton, Estados Unidos.

   Os que acreditavam que com a Paz da Westfália (1648) "teríamos nos livrado das
   guerras religiosas, mostram-se perplexos com o retorno da belicosidade sagrada",
   anotou. O fundamentalismo norte-americano conjuga a ideolatria da letra sagrada,
arcaicos milenarismos, com a tradição nacional do "destino manifesto" e a repressão da
           alteridade. Renasce por todas as latitudes a paixão religiosa, disse.

Segundo José Casanova, disse, essa irrupção da mentalidade religiosa no âmbito público
   é a "desprivatização" da religião; a rejeição do reclamo secular a restringir o credo
   religioso à interioridade das almas e dos templos. Teologias radicais de libertação,
    integralismos reacionários ou teologias reformistas se irmanam em sua pretensão
                         comum de protagonismo político e social.

O central, o decisivo, o definitivo nas grandes tradições religiosas é a reverência perante
 o sagrado, a afirmação da vida humana em todas as manifestações e a preservação da
                       natureza como criação divina e lar humano.

  A genuína religiosidade tende a re-ligar os seres humanos com o próximo, em busca
  esperançosa de um significado que lhes confere dignidade perdurável, apesar de sua
                                   fragilidade, disse.

  Assim, a simpatia recíproca é tão natural entre almas profundamente espirituais como
Isaías, Jesus, Thomas Merton, Martin Luther King Jr., Mahatma Gandhi, Desmond Tutu
    e o Dalai Lama, apesar de suas grandes diferenças doutrinais e culturais, arrolou.
Pode-se, sem dúvida, encontrar nas escrituras canônicas das diversas religiões imagens
tenebrosas de repúdio e violência contra os que contaminam a integridade da identidade
cúltica. Mas esses "textos do terror" não são decisivos nem predominantes nas tradições
            religiosas que a humanidade forjou ao longo da história, anotou.

O central, prosseguiu, nas imagens transhistóricas das escrituras sagradas não é o terror
nem a violência do Deus zeloso e excludente, mas antes a visão de um "novo céu e uma
 nova terra", onde os seres humanos possam semear trigo e comer pão em paz, colher
                    uva e tomar vinho com regozijo compartilhado.

   Conjugar a denúncia profética e o reclamo de reconciliação entre povos inimigos é
 tarefa complexa, mas necessária e possível. Há uma junção considerável de reflexões
 teóricas e estratégicas de ação que vinculam a denúncia profética e a resistência civil
  não violenta, que pode assumir-se a partir de diferentes óticas políticas, filosóficas e
                               teológicas, afirmou Rivera.

 A tese do "conflito de civilizações", da hostilidade entre o ocidente cristão e o oriente
    muçulmano, é uma variante do anacrônico receio contra o islam e não consegue
   desfazer-se do preconceito da superioridade da civilização ocidental. Intelectual e
politicamente estéril, não é senão o reverso do amargo anti-ocidentalismo de Osama bin
                              Laden e da Al Qaeda, apontou.

"Tampouco pequemos de ingênuo", emendou. Já Erasmo mostrou com muita agudeza,
    no século XVI, que depois das piedosas proclamas da guerra contra otomanos
muçulmanos, tidos como "inimigos de Cristo", prevalecia em muitas ocasiões o afã de
 riquezas. As épocas variam, mas a ambição de poder, prestígio e pecúlio continuam
                          escudadas na devoção religiosa.

Impõe-se como necessidade vital para a paz e o bem-estar da humanidade promover o
    diálogo intercultural e inter-religioso, e silenciar as confrontações estridentes e
degradantes. Nada menos que o futuro da humanidade está em jogo. De outra maneira,
  como com sua habitual graça escreve Leonardo Boff, os humanos "podem sofrer o
                        destino dos dinossauros", citou Rivera.

"É acaso ilusório pensar num futuro no que finalmente Jerusalém, a cidade sagrada que
 durante milênios presenciou tanta violência e agressão, faça honra à etimologia de seu
                          nome, "cidade da paz"? - indagou.

  O vínculo da urgência profética pela justiça e a compaixão pela dor humana que se
expressa intensamente em seres tão díspares e, ao mesmo tempo, tão irmanados como
Isaías, Jesus, e Buda constitui um sacramento de esperança para um mundo atribulado
pela violência, despotismo, discriminação nacional, étnica e cultural, pelo patriarcado
                        androcêntrico e a homofobia, assinalou.

Esse ecumenismo da compaixão pode nutrir-se da virada voltada à aflição humana que
se manifestou em diferentes sensibilidades religiosas do final do século XX e que pode
     servir, ao largo, de contrapeso à paixão homicida dos "guerreiros de Deus".

  O desafio é superar a mera tolerância e aprender a estimar e apreciar a "dignidade da
diferença", como a chama o rabino Jonathan Sacks. A raiz latina do vocábulo tolerância
sugere que seu alcance semântico se limita a suportar ou sofrer a diversidade. Só assim,
   quem vive entre o terror e a esperança podem entoar o hino bíblico à paz: "Quão
  formosos são sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz", concluiu.

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Futuro da humanidade demanda ecumenismo da tolerância

  • 1. Futuro da humanidade demanda ecumenismo da tolerância SAN JUAN, Abril 8, 2004 (alc). Quem aspirar ser cristão não deve esquecer que o Jesus dos evangelhos nunca fez da adesão a dogmas, hierarquias eclesiásticas ou prescrições rituais o decisivo de sua mensagem, disse o teólogo porto-riquenho Luis N. Rivera Pagán. "Jesus sempre foi muito heterodoxo em suas predileções: preferiu o solidário e compassivo samaritano ao piedoso levita ou o devoto sacerdote. Seu desafio radical conduz antes a assumir plenamente a solidariedade e a compaixão com os condenados da terra", argumentou Rivera em conferência que apresentou, em março, na Cátedra Unesco de Educação para a Paz, na Universidade de Porto Rico. O conferencista reportou-se a guerras e conflitos que fizeram do século XX o mais mortífero da história, com aproximadamente 187 milhões de vítimas, e o abandono da diferenciação entre militares e civis. Rivera afirmou que muitas vezes a guerra foi conflagrada com a pretensão de terminar com a guerra, parodiando o mito religioso de que o horror ao inferno conduz ao umbral do céu. Nesse século de grandes descobertas científicas e técnicas, do triunfo da racionalidade e da suposta "morte de Deus", proclamada por Friedrich Nietzche, a paixão ideológica contribuiu para o carnaval homicida. No final do século, piedosos adoradores de Javé, Jesus Cristo e Alá proclamaram a cólera divina com a declaração de guerras santas, arrolou Rivera, que é professor no Seminário Teológico de Princeton, Estados Unidos. Os que acreditavam que com a Paz da Westfália (1648) "teríamos nos livrado das guerras religiosas, mostram-se perplexos com o retorno da belicosidade sagrada", anotou. O fundamentalismo norte-americano conjuga a ideolatria da letra sagrada, arcaicos milenarismos, com a tradição nacional do "destino manifesto" e a repressão da alteridade. Renasce por todas as latitudes a paixão religiosa, disse. Segundo José Casanova, disse, essa irrupção da mentalidade religiosa no âmbito público é a "desprivatização" da religião; a rejeição do reclamo secular a restringir o credo religioso à interioridade das almas e dos templos. Teologias radicais de libertação, integralismos reacionários ou teologias reformistas se irmanam em sua pretensão comum de protagonismo político e social. O central, o decisivo, o definitivo nas grandes tradições religiosas é a reverência perante o sagrado, a afirmação da vida humana em todas as manifestações e a preservação da natureza como criação divina e lar humano. A genuína religiosidade tende a re-ligar os seres humanos com o próximo, em busca esperançosa de um significado que lhes confere dignidade perdurável, apesar de sua fragilidade, disse. Assim, a simpatia recíproca é tão natural entre almas profundamente espirituais como Isaías, Jesus, Thomas Merton, Martin Luther King Jr., Mahatma Gandhi, Desmond Tutu e o Dalai Lama, apesar de suas grandes diferenças doutrinais e culturais, arrolou.
  • 2. Pode-se, sem dúvida, encontrar nas escrituras canônicas das diversas religiões imagens tenebrosas de repúdio e violência contra os que contaminam a integridade da identidade cúltica. Mas esses "textos do terror" não são decisivos nem predominantes nas tradições religiosas que a humanidade forjou ao longo da história, anotou. O central, prosseguiu, nas imagens transhistóricas das escrituras sagradas não é o terror nem a violência do Deus zeloso e excludente, mas antes a visão de um "novo céu e uma nova terra", onde os seres humanos possam semear trigo e comer pão em paz, colher uva e tomar vinho com regozijo compartilhado. Conjugar a denúncia profética e o reclamo de reconciliação entre povos inimigos é tarefa complexa, mas necessária e possível. Há uma junção considerável de reflexões teóricas e estratégicas de ação que vinculam a denúncia profética e a resistência civil não violenta, que pode assumir-se a partir de diferentes óticas políticas, filosóficas e teológicas, afirmou Rivera. A tese do "conflito de civilizações", da hostilidade entre o ocidente cristão e o oriente muçulmano, é uma variante do anacrônico receio contra o islam e não consegue desfazer-se do preconceito da superioridade da civilização ocidental. Intelectual e politicamente estéril, não é senão o reverso do amargo anti-ocidentalismo de Osama bin Laden e da Al Qaeda, apontou. "Tampouco pequemos de ingênuo", emendou. Já Erasmo mostrou com muita agudeza, no século XVI, que depois das piedosas proclamas da guerra contra otomanos muçulmanos, tidos como "inimigos de Cristo", prevalecia em muitas ocasiões o afã de riquezas. As épocas variam, mas a ambição de poder, prestígio e pecúlio continuam escudadas na devoção religiosa. Impõe-se como necessidade vital para a paz e o bem-estar da humanidade promover o diálogo intercultural e inter-religioso, e silenciar as confrontações estridentes e degradantes. Nada menos que o futuro da humanidade está em jogo. De outra maneira, como com sua habitual graça escreve Leonardo Boff, os humanos "podem sofrer o destino dos dinossauros", citou Rivera. "É acaso ilusório pensar num futuro no que finalmente Jerusalém, a cidade sagrada que durante milênios presenciou tanta violência e agressão, faça honra à etimologia de seu nome, "cidade da paz"? - indagou. O vínculo da urgência profética pela justiça e a compaixão pela dor humana que se expressa intensamente em seres tão díspares e, ao mesmo tempo, tão irmanados como Isaías, Jesus, e Buda constitui um sacramento de esperança para um mundo atribulado pela violência, despotismo, discriminação nacional, étnica e cultural, pelo patriarcado androcêntrico e a homofobia, assinalou. Esse ecumenismo da compaixão pode nutrir-se da virada voltada à aflição humana que se manifestou em diferentes sensibilidades religiosas do final do século XX e que pode servir, ao largo, de contrapeso à paixão homicida dos "guerreiros de Deus". O desafio é superar a mera tolerância e aprender a estimar e apreciar a "dignidade da diferença", como a chama o rabino Jonathan Sacks. A raiz latina do vocábulo tolerância
  • 3. sugere que seu alcance semântico se limita a suportar ou sofrer a diversidade. Só assim, quem vive entre o terror e a esperança podem entoar o hino bíblico à paz: "Quão formosos são sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz", concluiu. Comente esse artigo: http://alcnoticias.org/addcomments.asp?artCode=2063&lanCode=3&maxSize=1500 ------------------------ Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicaçao (ALC) Apartado 14-225 Lima 14 Perú Tel. (51 1) 462-0189 Telefax (51 1) 463 2496 Serviço de notícias em português : edelbehs@alcnoticias.org Visite nosso sitio web: http://www.alcnoticias.org/portugues Para cancelar o envio das notícias visite http://www.alcnoticias.org/StopNews.asp?lanCode=3