Introdução geral ao Evangelho de Marcos. Esta introdução ao Evangelho de Marcos trata dos seguinte temas:
1)Autor
2) Lugar
3) Data
4) Situação da comunidade
5) Composição - Estruturação
6) Fontes
7) Formgeschichte.
Seguindo esta introdução, o leitor terá acesso também a introdução à teologia deste primeiro evangelho escrito.
2. EVANGELHO DE
MARCOS
1. Autor
• O evangelho não traz o nome do seu autor nem mostra
com clareza um “eu literário” do redator. A obra é
anônima, mas, obviamente, o autor era conhecido pela
comunidade para a qual escreve.
• Posteriormente, Pápias (± 120-130), conservando o
testemunho de certo João (“presbítero”), atribui o
segundo evangelho a Marcos, “intérprete de Pedro”
(e`rmhneuth,j). Assim, o autor seria um judeu-cristão.
• As catequeses petrinas seriam a fonte da teologia
marcana: tendência apologética – autoridade apostólica.
3. EVANGELHO DE
MARCOS
1. Autor: Testemunho de Pápias transmitido por Eusébio
E o presbítero dizia que este Marcos, que
era intérprete de Pedro, escreveu com exatidão,
segundo ele se recordava, embora não tão
ordenadamente, as coisas ditas e feitas pelo
Senhor. Ele, com efeito, não havia escutado o
Senhor nem havia caminhado com Ele. Contudo,
mais tarde, como disse, esteve com Pedro. Este
dava as instruções segundo exigiam as
circunstâncias, porém, sem tentar fazer um
relato ordenado das sentenças do Senhor. Assim,
Marcos não incorreu em erro algum, escrevendo
certas coisas tal como as recordava, pois só uma
coisa lhe importava: não omitir nada do que havia
escutado, e não entregar nada do que não fosse
4. EVANGELHO DE
MARCOS
AUTOR MC RELACIONAMENTO
COM PEDRO
LUGAR OCASIÃO
Pápias
(Morte: ±155)
S Intérprete e companheiro - Durante a vida
de Pedro
Irineu
(140-202)
S Discípulo e intérprete - Depois da morte
de Pedro
Clemente
(150-215)
S Companheiro Roma Durante a vida
de Pedro
Tertuliano
(160-220)
S Intérprete - -
Orígenes
(185-253)
S Intérprete - -
5. EVANGELHO DE
MARCOS
AUTOR MC RELACIONAMENTO
COM PEDRO
LUGAR OCASIÃO
Eusébio
(263-339)
S Conhecido e
discípulo
- -
Epifânio
(315-403)
S Convertido por
Pedro
Roma Durante a
vida de Pedro
Crisóstomo
(354-407)
S Discípulo - -
Jerônimo
(347-419)
S Discípulo e
intérprete
- Durante a
vida de Pedro
Fonte: J. L. Sicre, O Quadrante. A Busca. Introdução aos Evangelhos. p. 57.
6. EVANGELHO DE
MARCOS
1. Autor: Testemunho de Pápias transmitido por Eusébio
• Do presbítero João provém somente a primeira frase; o restante é
interpretação de Pápias.
• Pano de fundo histórico-eclesiástico: caráter apologético -
disputas com falsas doutrinas que afirmavam possuir as legítimas
tradições.
• Marcos é identificado com João Marcos (At 12,12.25; 13,5.13;
15,36-40; Cl 4,10; Fm 24; 2Tm 4,11; 1Pd 5,13): judeu-cristão de
Jerusalém; acompanhante de Paulo; parente (avneyio,j) de
Barnabé; discípulo de Pedro.
• Mesmo existindo alguma relação de Marcos com Paulo e algum
“paulinismo” em Mc (fé, cruz, etc.), não há argumentos suficientes
para se defender um “evangelho de caráter paulino”.
7. EVANGELHO DE
MARCOS
1. Autor: Testemunho de Pápias transmitido por Eusébio
• A vinculação com Pedro também não é totalmente segura, mas tem
plausibilidade. A Escola Anglicana tentou demonstrar o material
petrino em Mc:
a. Presença de material vividamente oral e cheio de pequenos detalhes
(reminiscências de uma testemunha ocular) suprimidos por Mt e Lc;
b. Papel marcante de Pedro em Mc;
c. Transfiguração, Getsêmani e negações;
d. O evangelho pode ter ganhado autoridade e se tornado fonte para Mt e Lc.
• Segundo vários exegetas, Pápias depende de 1Pd 5,13, ou seja, não
é uma tradição historicamente atestada.
• Os testemunhos sucessivos dependem de Pápias: da tradição,
possuímos uma única fonte.
• Que significa e`rmhneuth,j? a) Intérprete (do aramaico ao grego);
b) Secretário; c) Compilador
8. EVANGELHO DE
MARCOS
1. Autor
• Nos últimos anos: atribuição a um étnico-cristão
anônimo: certa ignorância da geografia da Palestina (5,1;
7,31; 10,1) e costumes/leis judaicos (7,3s; 10,11s)
• Contudo, se alguém tivesse que atribuir um evangelho a
um outro autor (pseudepigrafia), certamente escolheria
uma grande autoridade apostólica e não Marcos, visto que
ele não era um grande expoente na Igreja Primitiva.
• Assim, assumimos que não há motivos graves para não
se aceitar Marcos como autor do evangelho, mas a
identificação com João Marcos, seu paulinismo e
petrinismo ainda merecem aprofundamentos.
9. EVANGELHO DE
MARCOS
1. Autor
• Emerge um quadro geral: um coletor de
antigas tradições referentes a Cristo; de
origem judaica helenista (aramaísmos); ligado
à missão aos gentios.
• Não há argumentos sólidos contra a antiga
tradição.
• Devemos compreender o conceito de autoria
diverso do copyright atual. Há uma dimensão
comunitária na construção da obra, fruto das
tradições catequéticas da primeira geração
cristã.
10. EVANGELHO DE
MARCOS
2. Lugar: Roma
• Conta com o apoio da tradição e da maioria dos exegetas modernos. Citações
mais antigas: obras de Roma (1Clem 15,2; Past. Her 5,2)
a. Uso de expressões latinas transcritas em letras gregas: dhna,rion –
denarius (6,37; 12,15; 14,5); kenturi,wn – centurio (15,39.44.45); kh/nsoj –
census [imposto] (12,14); kodra,nthj – quadrans (12,42); kra,battoj –
grabatus [maca] (2,4.9.11.12; 6,55); legiw,n – legio (5,9.15); xe,sthj –
sextarius [vasilha] (7,4); spekoula,twr – spiculator [carrasco] (6,27). Supõe a
legislação romana no caso do divórcio (10,11s).
b. Termos gregos explicados com expressões latinas: dois lepta,, isto é, um
kodra,nthj (12,42); Jesus foi conduzido para dentro do palácio (auvlh,), isto
é, o praitw,rion (15,16).
c. A referência a Simão de Cirene, “pai de Alexandre e de Rufo” (15,21), foi
relacionada com o Rufo de Rm 16,13.
d. O contexto de perseguição e cruz presente no Evangelho.
e. A profissão paradigmática de fé do centurião romano (15,39)
11. EVANGELHO DE
MARCOS
2. Lugar: Antioquia da Síria
• Antioquia: cidade importante para a Igreja Primitiva; aí se
situa a primeira Cathedra Petri.
a. Presença de vários semitismos no estilo e no léxico:
boanhrge,j (3,17); toi/j ui`oi/j tw/n avnqrw,pwn (3,28);
taliqa koum (5,41); korba/n (7,11); evffaqa (abre-te –
7,34); avbba, (14,36); Golgoqa/ (15,22); elwi elwi lema
sabacqani (15,34); etc.
b. Poucos anos depois já era usado por Mt e Lc.
c. Objeções:
• Segundo Flávio Josefo, os cristãos não foram perseguidos em
Antioquia no período de Nero;
• Pesquisas recentes revelam o caráter “judaico” (prosélitos e
tementes) dos cristãos de Roma.
• A necessidade da explicação dos termos semíticos em grego e dos
costumes judaicos (7,3 - lavar; 14,2 - ázimos; 15,42 – Parasceve).
12. EVANGELHO DE
MARCOS
2. Lugar: Galileia
• Galileia: É uma hipótese recente defendida por alguns
exegetas. Argumentos:
a. Presença de vários semitismos no estilo e no léxico;
b. “Galileia” – mais que um lugar geográfico é tema
teológico fortíssimo em Mc (especialmente 3,7s; 16,7). É o
lugar da parusia iminente – tema escatológico: reunião
das comunidades cristãs na Galileia.
c. É possível que um evangelho tão marcadamente galileu
não tenha sido escrito na Galileia?
d. Objeções: A fé paradigmática do centurião romano
(15,39); como explicar a experiência do conflito, da
perseguição e da cruz?; falta de provas materiais e de
dados tradicionais; por que explicar os semitismos e os
costumes judaicos?
13. EVANGELHO DE
MARCOS
3. Data
• A maioria dos autores situa a redação final de Mc
antes do ano 70 d.C., mas há um expressivo grupo de
exegetas que propõe uma data posterior à destruição
de Jerusalém.
• Há ainda teorias – por exemplo, a de Boismard – que
supõem uma influência de um Mt int. e de um Proto-
Lc à redação final de Mc. Isto se dá antes ou depois do
ano 70?
• O discurso apocalíptico de Mc, especialmente 13,14-
20, dá margem às duas interpretações, mas é mais
provável que ele não conheça a ruína de Jerusalém e
do Templo; rumores de guerra (13,7); vos conduzirão
diante de governadores e reis (13,9).
14. EVANGELHO DE
MARCOS
3. Data
• Há um texto obscuro e cifrado, de difícil
interpretação (Mc 13,14):
{Otan de. i;dhte to. bde,lugma (n) th/j
evrhmw,sewj
Quando virdes a abominação da desolação
e`sthko,ta (vppfams de i[sthmi) o[pou ouv dei/(
colocada onde não deveria -
o` avnaginw,skwn noei,tw( aquele que lê, entenda -
to,te oi` evn th/| VIoudai,a|
então, os que estiverem na Judeia
15. EVANGELHO DE
MARCOS
3. Data - interpretações
• O particípio masculino não concorda com o substantivo
neutro: a abominação é um homem?
• Seria somente uma construção literária a partir de
Daniel (9,27; 12,11) e das muitas opressões vividas da
parte de exércitos estrangeiros?
• Referir-se-ia a um fato do passado um pouco remoto,
quando Calígula ameaçou colocar sua estátua no
Templo (ano 40)? Mas, por que se deve fugir?
• Referir-se-ia à destruição do templo no fim da 1ª
Guerra Judaica (ano 70) comandada por Tito? Mas,
como fugir, se Jerusalém está sitiada?
16. EVANGELHO DE
MARCOS
3. Data - conclusão
• A data da redação é situada entre os anos 65 e 66, ou
seja, nos momentos imediatamente anteriores ao
início da Primeira Guerra Judaica (66-70) e
concomitantes à perseguição de Nero (64-68), mas
posteriores à morte de Pedro.
• Mc parece não conhecer a destruição de Jerusalém.
Isso é também perceptível a partir da comparação
sinótica.
• A proposta de José O’Callagan de identificar textos de
um papiro da Gruta 7 de Qumran com trechos de Mc,
o que exigiria uma datação muito mais antiga do
evangelho (ano 53), encontrou pouquíssima acolhida
entre os estudiosos.
17. EVANGELHO DE
MARCOS
4. Situação da comunidade marcana
• Quatro fatos marcantes:
• processo gradativo de desaparecimento da primeira
geração (testemunhas apostólicas);
• perseguição aos cristãos no reinado de Nero;
• o acolhimento de gentios no seio das comunidades
cristãs, o que é motivo de conflitos e crises;
• anos em torno da Primeira Guerra Judaica e da
destruição de Jerusalém.
18. EVANGELHO DE
MARCOS
4. Situação da comunidade marcana
• Comunidade marcadamente gentia, daí a necessidade
de traduzir os semitismos e explicar os costumes
judaicos. Não aparecem as problemáticas
palestinenses e há cenas favoráveis aos gentios, como o
episódio da siro-fenícia ou a frase de 11,17 (Is 56,7) .
• Crise: a situação de conflito colocou em crise a fé da
comunidade no senhorio de Cristo - “ele parece um
fantasma” (6,49), ou seja, há falta de clareza sobre a
presença de Cristo ressuscitado no seio da
comunidade e sobre a identidade do cristão.
19. EVANGELHO DE
MARCOS
4. Situação da comunidade marcana
• Ao mesmo tempo, a linguagem de Mc é concreta,
narrativa e paratática: é um modo peculiar de se
contrapor ao perigo de um Cristo gnóstico, desencarnado e
sem relação com a história.
• Mc deseja dar uma resposta sobre o drama da perseguição
romana: teologia do discipulado e da cruz. É preciso
compreender novamente o senhorio de Cristo e que o
evangelho se faz presente na fraqueza.
• As comunidades marcanas não apresentam elaborações
teológicas mais refinadas como os grandes discursos de
Mt e Jo, as aparições do ressuscitado, o evangelho da
infância de Mt e Lc ou a cristologia do prólogo de João.
20. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
a. Critério geográfico (1)
a) 1,1-7,23: Galileia
b) 7,24-8,26: Adjacências da Galileia
c) 8,27-10,52: De Cesareia de Filipe a
Jerusalém (subida)
d) 11,1-16,8: Ministério e Paixão, Morte e
Ressurreição em Jerusalém
21. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
a. Critério geográfico (2): CBI –
Howard-Peabody
a) 1,1-8,26: Galileia e arredores
b) 8,27-10,52: No caminho: Cesareia de
Filipe – Subida a Jerusalém
c) 11,1-16,8: Em Jerusalém
22. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
Observações:
• Os critérios utilizados para demarcar a passagem
entre Galileia e adjacências são bastante diversos. Em
4,35 e 5,1, apesar de estar em torno do lago, Jesus se
encontra em território pagão.
• Antes de 1,14, Jesus está fora da Galileia.
• Jesus só começa, de fato, a viagem para Jerusalém em
10,1.
• Conclusão: a geografia marcana é bastante confusa.
Este critério, devido as suas ambiguidades (ver, por
exemplo, 7,31), não pode ser utilizado isoladamente.
23. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
b. Critério geográfico-teológico (1):
a) 1,1-8,26: Atividade de Jesus: sucessos e
conflitos
b) 8,27-13,37: De Cesareia de Filipe a
Jerusalém (subida): instruções aos
discípulos
c) 14,1-16,8: Paixão/Morte/Ressurreição em
Jerusalém
24. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
Observações
• Ponto frágil deste esquema é o fato de
desvincular a Paixão/Morte e
Ressurreição das partes anteriores.
• Além de não levar em conta
suficientemente os elementos literários
que ajudam a estruturar as partes.
25. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
c. Critério narrativo: Brown
a) 1,1-8,26: ministério de cura e anúncio na Galileia
• 1,1-3,6: apresentado por João Batista; dia inaugural; controvérsias
• 3,7-6,6: escolha dos 12; educa-os por meio de parábolas e milagres;
conflitos com os parentes
• 6,7-8,26: missão dos 12; 2 milagres do pão; caminha sobre as águas;
incompreendido
b) 8,27-16,8 + 16,9-20: sofrimento predito; morte em Jerusalém;
ressurreição
• 8,27-10,52: predições da paixão; confissão de Pedro; transfiguração; e
ensinamento de Jesus
• 11,1-13,37: ministério em Jerusalém; entrada; ações no templo; oposição;
discurso escatológico
• 14,1-16,8: unção; ceia; paixão; crucifixão; sepultamento; túmulo vazio
• 16,9-20: segundo final – descreve aparições do ressuscitado acrescentado
por um copista posterior
26. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
d. Critério geográfico-teológico-literário (1):
Harrington (NJBC)
a) 1,1-15: prólogo
b) 1,16-3,6: autoridade revelada na Galileia
c) 3,7-6,6a: rejeitado na Galileia
d) 6,6b-8,21: mal-compreendido na Galileia
e) 8,22-10,52: instrução aos discípulos
f) 11-13: 1ª parte da semana da paixão
g) 14-16: morte e ressurreição em Jerusalém
27. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
d. Critério geográfico-teológico-literário: Van Iersel
1,1: título
A: 1,2-13: no deserto
y: 1,14-15: primeira dobradiça
B: 1,16-8,21: na Galileia
z: 8,22-26: cura do cego
C: 8,27-10,45: a caminho
z’: 10,46-52: cura do cego
B’: 11,1-15,39: em Jerusalém
y’: 15,40-41: segunda dobradiça
A’: 15,42-16,8: no sepulcro
28. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
Observações críticas:
• Na primeira parte de Mc, há três sumários:
1,14-15; 3,7-12; e 6,6b. Por que van Iersel
prioriza somente o primeiro?
• Depois destes sumários, há três textos sobre os
discípulos: 1,16-20; 3,13-19; 6,7-13.
• Como conclusão de cada seção, há sempre um
texto sobre a cegueira ou dureza de coração
daqueles que o escutam: 3,3-5; 6,1-6a; 8,22-26.
29. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
Observações críticas:
• Na segunda parte de Mc, a organização
geográfico-teológica é bastante evidente: 8,27-
10,52 (de Cesareia a Jericó); 11-13 (ministério
público em Jerusalém); 14,1-16,8 (paixão/morte
e ressurreição).
• Como conclusão de cada seção, há sempre um
texto sobre a cegueira, a sonolência ou o torpor
dos discípulos: 10,46-52; 13,33-37; 16,7-8.
30. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
d. Critério retórico: Benoit Standaert
1,1: título
A: 1,2-13: no deserto
y: 1,14-15: primeira dobradiça
B: 1,16-8,21: na Galileia
z: 8,22-26: cura do cego
C: 8,27-10,45: a caminho
z’: 10,46-52: cura do cego
B’: 11,1-15,39: em Jerusalém
y’: 15,40-41: segunda dobradiça
A’: 15,42-16,8: no sepulcro
31. EVANGELHO DE
MARCOS
5. Composição – “estruturação”
c. Critério geográfico-teológico-literário (2)
1,1: título da obra e antecipa as suas duas partes:
• A revelação de Jesus como Messias > Pedro (8,29)
• A revelação de Jesus como Filho de Deus > Centurião (15,39)
1,2-13: prólogo – trítico introdutório: de João Batista a Jesus
a) 1,14-8,30: progressiva manifestação de Jesus como Messias
• 1,14-3,6: Galileia - autoridade de Jesus – Reino: palavras e portentos – rejeição
• 3,7-6,6a: os de dentro / de fora da casa – parábolas – milagres – incredulidade
• 6,6b-8,30: missão – judeus e gentios – pão – visão turva
b) 8,31-16,8 (+ 16,9-20): mistério do Filho do Homem / Filho de Deus
• 8,31-10,52: instrução aos discípulos – três anúncios da paixão
• 11-13: ministério em Jerusalém – conflitos – eschaton
• 14,1-16,8: paixão – morte – ressurreição
Observação:
1,1 (título) > 1,11 (voz do céu) > 8,29 (Pedro) > 9,7 (voz da nuvem) > 15,39 (centurião)
14,61s: resposta de Jesus ao Sumo Sacerdote
32. EVANGELHO DE
MARCOS
6. Relação entre fontes e redação marcana
• Coleções de materiais da tradição:
• sumários de atividades de Jesus: 1,14-15.21-22.39; 2,13; 3,7-12;
6,6b.12-13.53-56; etc.
• controvérsias: 2,1-3,6 (poder de perdoar pecados; comunhão de
mesa com os pecadores; jejum; trabalho no sábado; cura no
sábado).
• parábolas: 4,1-34 (predominância da temática da semente).
• milagres: 4,35-5,43 (domínio da natureza; exorcismo; cura; e
ressurreição) – não é consensual
• alguns exegetas supõem uma coleção de instruções comunitárias:
9,38-10,31
• os exegetas se perguntam sobre uma possível coleção de disputas
com membros do Sinédrio: 11,27-12,34
• o discurso escatológico: c. 13
• narrativa da paixão: cc. 14-15
33. EVANGELHO DE
MARCOS
6. Relação entre fontes e redação marcana
• O evangelho atual seria uma edição revista e
corrigida de uma obra primitiva? Ou um trabalho de
redação feito pelo autor a partir de suas fontes?
• Há bastante consenso, hoje, sobre o imenso trabalho
redacional de Marcos. Daí resulta um “estilo
marcano”.
• A delimitação do material tradicional (fontes) não é
consensual.
• Ele tem coerência no seu modo de apresentar Jesus e o
seu discípulo.
• Há uma discussão exegética - não resolvida - sobre a
possível utilização da “Fonte Q”. A resposta tende a ser
negativa.
34. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
• Conceitos basilares:
• Perícope: peri (“ao redor de”); cope (do verbo
ko,ptw – “cortar”, na voz ativa): unidade literária
com sentido completo, trecho.
• Crítica: exame acurado marcado pelo rigor científico
e metodológico.
•Gattung: “forma” literária; geralmente utilizada
para uma perícope. Utilizada como sinônimo de
“gênero”: geralmente, utilizado para o livro inteiro.
35. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
• Conceitos basilares:
• Sitz im Leben: “contexto vital” – ambiente em que
nasceram as formas literárias evangélicas. Os Sitze im
Leben evangélicos são principalmente quatro:
• o trabalho missionário / pregação
• a catequese na comunidade cristã
• a liturgia, especialmente o Batismo e a Eucaristia
• as controvérsias com os adversários (judeus e gentios)
•Outros: ordem interna da comunidade, problemas
com autoridades, resolução de conflitos, etc.
36. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
• Objetivos da Formgeschichte:
a. Retomar as fontes e investigar o processo da
formação da tradição evangélica no período pré-
literário, ou seja, em seu estágio de transmissão oral.
b. Estudar a evolução de cada forma até chegar ao seu
contexto vital:
Sitz im Leben der Kirche – contexto vital da Igreja
Sitz im Leben Jesu – contexto vital jesuano
c. Classificar todas as perícopes dos evangelhos
seguindo critérios literários.
37. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
• Principais formas evangélicas:
a. Apoftegma ou sentença encaixada: são pequenas estórias que
servem de ilustração a uma sentença aguda de Jesus (2,1-12;
2,18-20; 2,23-28; 3,1-6; 3,31-35; etc.)
b. Milagres – Wundergeschichte
a. Sumários de milagres: 1,32-34; 3,7-12
b. Ditos sobre milagres: 3,22-27; 6,2-3; 9,38-39
c. Relatos de milagres:
a. Domínio da natureza: Mc 4,35-41; 6,45-52; Jo 2,1-11
b. Exorcismos: Mc 1,21-28; 5,1-20
c. Curas: Mc 1,29-31; 1,40-45; 5,25-34
d. Ressurreições: Mc 5,21-24.35-43; Lc 7,11-17; Jo 11,1-44
e. Concomitantes: fatos maravilhosos acontecidos, por exemplo, no
momento da morte de Jesus (Mt 27,51-54)
38. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
• Milagres:
Tipologia de Gerd Theissen – critério: destinatários
1) Cura – enfermo (Mc 1,40-45)
2) Milagre de legitimação – opositores (Mc 2,3-12 – cura
do paralítico)
3) Relato de salvamento – discípulos (Mc 4,35-41)
4) Exorcismo – demônio (Mc 5,1-20)
5) Doação – multidão (Mc 6,30-44)
6) Epifania – taumaturgo (Mc 6,45-53)
39. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
• Milagres de Cura: há uma tópica ± fixa:
1) Descrição da situação do enfermo
2) Pedido (insinuação) de auxílio
3) Intervenção do taumaturgo
4) Efeito produzido – comprovação da cura
5) Reação: do doente; dos discípulos; dos
opositores; do próprio taumaturgo
40. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
c. Controvérsias ou disputas: A controvérsia apresenta uma
disputa entre Jesus e seus adversários. A utilização das
Escrituras é feita cuidadosamente neste gênero literário.
Conferir: Mt 22,41-46; Mc 12,18-27.
d. Anunciações – Evangelhos da Infância de Mt e Lc
Em geral, encontramos uma tópica em sete partes:
• 1) apresentação do cenário e das personagens;
• 2) saudação do mensageiro;
• 3) reação da pessoa;
• 4) mensagem;
• 5) pergunta da parte da pessoa;
• 6) sinal apresentado;
• 7) o mensageiro se afasta.
41. EVANGELHO DE
MARCOS
7. Formgeschichte – Crítica das Formas
e. Palavras do Senhor: Herrenwörte, sayings, sentenças,
aforismos, etc.
É um material de tal maneira variado que não há clareza
sobre sua classificação. São palavras não revestidas de estórias
que as situem. Em geral, são difíceis de interpretar ou são lidas
em muitos sentidos diversos. Classificação:
Palavras de Sabedoria ou Logía: Mt 5,14b; 12,34b; 6,34b; 24,28; Mc
2,17.19; 4,21;
Palavras proféticas e apocalípticas: ligadas ao Reino de Deus, Filho
do Homem, Juízo, Ressurreição (Mc 13,3-37; 14,62; Mt 24,1-16; Lc
17, 2037; 21,5-33);
Palavras referentes à Lei e à vida da comunidade (Mt 18,1-35; 23,8-
10; Mc 10,11-12; 11,25);
Palavras «Eu»: são palavras construídas, em geral, com o verbo
«ser» ou «vir»; muitas vezes, o sujeito dessas frases é o Filho do
Homem (Mc 2,17; Lc 12,49-50; 19,10; Mt 15,24).
42. EVANGELHO DE
MARCOS
7.Formgeschichte – Crítica das Formas
f. Parábolas
• Conceito não unívoco: A análise detalhada do material parabólico
é extremamente complexa. Um indicador é, por exemplo, o número
de parábolas: alguns exegetas asseguram a existência de umas
trinta parábolas; outros, de mais de cem. Isto indica que o conceito
de parábola não é unívoco.
• Genialidade jesuana: Todos são da opinião de que as parábolas são
aquilo que mais nos coloca em contato com Jesus, são a «rocha
firme da tradição», na linguagem de J. Jeremias. São os textos que
menos têm problemas de autenticidade. Eles nos colocam diante da
genialidade de Jesus de Nazaré.
• Gênero hebraico “mashal”: Muitos exegetas fazem outras
distinções internas: imagens, metáforas, comparações, parábolas,
relatos exemplares, provérbios... Todo esse material está dentro do
gênero hebraico “mashal”.
43. EVANGELHO DE
MARCOS
7.Formgeschichte – Crítica das Formas
f. Parábolas
• Força imaginativa: A parábola é figurativa, nunca evidente,
sempre deixa algo de dúvida que conduz à reflexão. Ela evita o
caráter impositivo e positivista do discurso. O sentido da parábola
nunca pode ser meramente reduzido a idéias: há uma força
imaginativa, artística, que possui a própria dinâmica.
• Três exegetas contribuíram enormemente para o bom
entendimento das parábolas: Adolf Jülicher, Charles Harold Dodd
e Joachim Jeremias. Para o sentido das parábolas, ver J. Jeremias
(pg. 7-15).
• No caso de Mc, o discurso em parábolas está em 4,1-34 e gira em
torno do tema da “semente”