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64 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006
Introdução
A
carência de informações
sobre custos logísticos no
Brasil torna freqüente a
utilização de dados defasados. O grande problema é que
esses dados não necessariamente representam a nossa
atual realidade, tornando difícil, entre outras coisas, a
comparação com outros países. Além de tudo, a falta de
um histórico acaba inviabilizando a análise da evolução
do nosso custo logístico.
Diante deste cenário, o Centro de Estudos em Logística
realizou uma pesquisa sobre Custos Logísticos no Brasil,
buscando números e metodologias que respondessem as
principais questões relacionadas ao tema. Assim, em
janeiro de 2005 iniciamos uma pesquisa e logo nos de-
paramos com uma imensa dificuldade de obtenção de da-
dos sobre o País. Além de pouco atualizadas, muitas in-
formações são imprecisas e incompletas. Outras não são
disponíveis, ou mesmo não existem. Isto ocorre não ape-
nas no que se refere aos dados de custos, mas em logísti-
ca em geral.
Para contornar o problema, a pesquisa utilizou mais de
30 diferentes fontes (ABCR, ANP, ANTT, ANTF, ANTAQ,
Banco Mundial, BNDES, CNT, Conab, CVM – Economáti-
ca, CSCMP, DAC, Detran, Fipe, Geipot, IBGE, Infraero,
Ipea, NTC, Sindicom, revistas especializadas, empresas
usuárias de transporte aqüaviário, empresas de navegação,
aéreas e de transportes rodoviários, distribuidoras de com-
bustível e diversos executivos e especialistas do mercado),
trabalhando números, em paralelo, para garantir a acurá-
cia dos resultados.
Além da parte macroeconômica, foi conduzida uma
pesquisa com grandes empresas atuantes no Brasil, buscan-
do saber não apenas a representatividade dos custos logísti-
cos nessas indústrias, mas também como está sendo rea-
lizada a gestão de custos, quais sistemas são utilizados para
suporte e qual a expectativa para evolução desses gastos,
dentre outros resultados. No entanto, devido ao grande vo-
lume de informações, esta parte microeconômica será apre-
sentada, em breve, em uma próxima oportunidade.
O estudo macroeconômico, foco deste texto, pretende
ter seus números atualizados pelo menos a cada dois anos,
permitindo a geração de um evolutivo dos gastos com
logística no Brasil. Costumo comparar a necessidade de
medição de indicadores com o papel de uma balança em
um regime, pois, independentemente do tipo de dieta uti-
lizada para emagrecer, é praticamente inconcebível ima-
giná-la sem a utilização de uma balança para medição do
peso e seu acompanhamento.
Este texto irá abordar a parte da pesquisa referente ao
cálculo do custo logístico do Brasil, incluindo as ativi-
dades de transporte, armazenagem, estoque e a sua admi-
nistração. O escopo deste trabalho é limitado às operações
domésticas, incluindo, no caso de exportações, o trans-
porte até o porto no Brasil e, no caso de importações, o
transporte a partir do porto nacional, incluindo o custo
portuário. Por fim, será apresentado um comparativo en-
tre os valores do Brasil e dos EUA.
Antecedentes
Até a realização desta pesquisa, a estimativa corrente do
nosso custo logístico era de cerca de 17% do PIB. A origem
deste número está ligada a um estudo do Banco Mundial
realizado em 1996 que, focado em transportes, não chega a
mencionar o valor de 17%, mas estima o custo de transporte
no Brasil como sendo entre 9% e 10% do PIB. A partir deste
número, extrapolou-se – a comunidade logística em geral,
não o Banco Mundial –, com base na parcela de custo de
transporte, normalmente em torno de 60% do custo logísti-
co, para se obter o resultado final. Assim, a partir do inter-
valo superior do custo de transporte de 10% do PIB, chegou-
se ao custo logístico nacional de 17%. Diante da falta de outro
número mais preciso, este acabou virando uma referência.
Independentemente da qualidade da estimativa dos
17%, vale observar as transformações ocorridas desde
1996, data-referência do estudo anterior, até 2004, data
dos dados utilizados nesta pesquisa. Nos EUA, por exem-
plo, apesar do aumento do petróleo, o custo logístico
diminuiu em relação ao PIB durante este período, passan-
do de 10,2% para 8,6%, segundo pesquisa de Delaney1
e
CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA
Maurício Pimenta Lima
Custos logísticos
na economia brasileira
coppead.qxd 24/1/2006 11:01 Page 64
Wilson, referência americana, com a qual estarão sendo
comparados os valores encontrados no Brasil. Como a
pesquisa americana considera também parte do trans-
porte internacional, o valor de comparação utilizado do
custo americano foi de 8,3% do PIB, depois de excluídos
os custos de transporte internacional.
As variações do custo logístico americano de 1996 até
2004 mostram que houve uma redução do custo de es-
toque e, em segundo plano, do custo de transporte.
No Brasil, durante este período, o diesel subiu 292%, re-
sultado da elevação do preço do petróleo, o qual também
causou um aumento nos valores dos pneus. Vale ressaltar
que estes itens de custo variável são de grande importância
na formação do preço. Principalmente no Brasil, onde o
frete praticado é em grande parte das vezes inferior ao cus-
to total, principalmente no caso dos autônomos. Nestes ca-
sos, o preço cobre os custos variáveis, porém não remunera
todos os custos fixos, principalmente aqueles ligados ao in-
vestimento, como o de depreciação e o financeiro.
Com o aumento dos custos variáveis, a margem exis-
tente para negociação de preço do autônomo diminui,
pois o custo variável se torna mais significativo. Dados de
uma revista nacional de transporte de 1996 mostram que
o diesel na época representava 16,8% do custo total de
uma carreta. Em um exemplar de 2004 da mesma revista,
o diesel já representava 31,8% do custo total, consideran-
do o mesmo tipo de veículo e operação.
Embora tímida, a boa novidade está relacionada ao au-
mento da parcela da ferrovia na movimentação de carga,
a qual estava na faixa de 20% em 1996 e foi para 24% em
2004. A participação do rodoviário continua elevada, mas
diminuiu um pouco, foi de um patamar de 64% para 59%
no mesmo período.
Quanto ao custo financeiro de estoque, ao compararmos
a taxa básica de juros de 2004 com a de 1996 é possível per-
ceber uma significativa redução. Enquanto em 1996 a taxa
média ficou em 27,15% a.a., em 2004 ela ficou em 16,44%
a.a.. É claro que, em termos comparativos com outros
países, a taxa brasileira continua excessivamente alta. Nos
EUA, no mesmo período, ela passou de 5,27% para 1,38%.
Transporte
Para se chegar ao custo de transporte foi calculado o
custo por modal, conforme é exposto a seguir.
Rodoviário
Apesar de este modal ser responsável pela maior parcela
da carga movimentada no País e pela maior parcela dos
custos, os dados relativos a esta atividade são escassos e
pouco confiáveis.
Assim, a solução encontrada foi calcular o custo de
maneira indireta com base no consumo de diesel e na sua
participação no valor do frete. Os custos de pedágio,
gerenciamento de riscos e o custo de transporte de carga
em veículos sem serem movidos a diesel foram considera-
dos em outras contas e posteriormente adicionados.
O estudo apontou que 55% do total de diesel consumi-
do no Brasil em 2004 foram destinados ao transporte
rodoviário de carga, enquanto os demais 45% foram desti-
nados à agroindústria, ao transporte ferroviário, ao gover-
no, ao transporte rodoviário de passageiros, à navegação, à
pesca, às indústrias, à mineração e aos carros de passeio.
Com base na parcela de 55% e no consumo total de
diesel, chegou-se ao volume destinado ao transporte
rodoviário de carga em 2004, de 21,7 bilhões de litros, o
qual correspondia a R$ 32,3 bilhões. A partir daí, o desafio
foi obter o percentual médio do custo do diesel no frete
no Brasil.
Para chegar a esta média foi necessário fazer uma seg-
mentação considerando os fatores que mais influenci-
avam neste percentual, entre os quais se destacavam: a
distância da rota, o tipo de carga transportada, se a carga
era fechada ou fracionada, a utilização de autônomos e a
existência de frete retorno.
Dessa forma, foi feita uma composição sobre qual seria a
relação entre o custo de combustível e o valor do frete para
cada tipo de perfil de transporte selecionado e a sua respec-
tiva participação dentro do consumo total. Ponderando-se
as diferentes realidades, que variavam de 1,5% para carga
fracionada em curta distância, passando por 24,6% para
carga intra-regional e 28,1% para produtos perigosos inter-
regionais, até 41,8% para carga geral em longa distância,
chegou-se a um percentual médio de 33,6%.
Isto significa dizer que a cada R$ 3,00 gastos com trans-
porte em 2004, em média R$ 1,00 foi referente ao custo
do diesel, enquanto os outros R$ 2,00 foram utilizados
para cobrir os demais custos (motorista, manutenção, de-
preciação, etc.) e ainda, eventualmente, gerar lucro.
Com base neste percentual, chegou-se ao custo de R$
96,3 bilhões para o transporte rodoviário dos veículos a
diesel em 2004.
Então, foi calculado o custo com os veículos que não
utilizam diesel, a conta de pedágio e de gerenciamento de
riscos. O custo dos veículos de transporte de carga que uti-
lizam outros combustíveis foi estimado em R$ 7,0 bilhões,
com base no número de unidades e no custo-padrão. So-
bre o pedágio, por exemplo, não foi encontrada nenhuma
Janeiro/2006 - Revista Tecnologística - 65
coppead.qxd 24/1/2006 11:01 Page 65
66 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006
informação sobre o valor arrecadado com o transporte de
carga. Fez-se, portanto, a conta inversa, subtraindo do va-
lor total de pedágio pago no Brasil em 2004 o valor esti-
mado referente ao transporte de passageiros, obtendo-se
R$ 2,2 bilhões. Quanto ao gerenciamento de riscos, esti-
mamos seu custo em R$ 3,3 bilhões com base na parte mi-
croeconômica da pesquisa.
Assim, obteve-se o custo total do transporte rodoviário
no Brasil de R$ 109,2 em 2004, conforme pode ser visto
no quadro resumo da Figura 1.
Ferroviário
O transporte ferroviário foi o mais simples de ser en-
contrado. Bastou conseguir com a ANTT (Agência Na-
cional de Transporte Terrestre) a receita de todas as con-
cessionárias ferroviárias do País em 2004, dado que este
valor equivale ao custo de todos os embarcadores com re-
lação à ferrovia, no caso R$ 7,5 bilhões.
Aquaviário
O cálculo do transporte aquaviário foi segmentado em:
granel sólido, granel líquido e carga geral, além de tratar
do hidroviário à parte.
No caso de granel líquido, foram consideradas duas rea-
lidades distintas: a de embarcações fretadas no longo pra-
zo e outra na qual é contratado apenas o serviço de trans-
porte. A carga geral também teve que ser segmentada en-
tre contêineres e suporte às operações offshore.
Entre os dados mais difíceis de serem obtidos destacaram-
se os do transporte hidroviário, cujas informações eram
pouco precisas e não estavam consolidadas. No caso, foram
usados valores de frete repassados por alguns embarcadores
e dados de movimentação de outros trabalhos.
Com base nos dados de frete por tipo de carga trans-
portada e seus respectivos volumes de movimentação, foi
calculado o custo do modal aquaviário, cujo resultado foi
de R$ 7,3 bilhões na carga doméstica e mais R$ 5,2 bilhões
referentes ao custo portuário de importações e expor-
tações. Vale destacar, na carga nacional, o transporte de
petróleo cru das plataformas para as refinarias por navio,
devido à sua relevância no volume total.
Dutoviário
As informações de custos foram baseadas nos dados
disponíveis da Transpetro, responsável por mais de 80%
da carga transportada em dutos no Brasil. Estes dados
foram extrapolados, considerando a movimentação total,
e obteve-se o custo de R$ 2,1 bilhões do modal dutoviário.
Aeroviário
No aeroviário também foram utilizados valores médios
de frete e volume de movimentação. Estes dados em
grande parte dependeram da colaboração de muitos exe-
cutivos e especialistas ligados a empresas do setor, dada a
dificuldade de obtê-los. Os valores de frete dos Correios
foram tratados em uma outra conta, dada a sua represen-
tatividade e a tarifa diferenciada. O custo calculado para o
modal aéreo em 2004 foi de R$ 1,9 bilhão.
Custo total de transporte
Considerando o custo de cada modal, conforme pode
ser visto no quadro da Figura 2, o resultado encontrado
para o custo total de transporte no Brasil em 2004 foi de
R$ 133,3 bilhões, valor equivalente a 7,5% do PIB.
Estoque
O custo de estoque foi calculado através de dois mode-
los diferentes para validar o resultado. No primeiro mo-
mento, foi utilizado o valor imobilizado em estoque pu-
blicado pelo IBGE relativo a 2003, porém ajustado para
2004, no valor de R$ 221,6 bilhões. Em seguida, esta in-
formação foi checada com os dados de cobertura de es-
toque de empresas de capital aberto, tendo como fonte
dados da Economática.
Sobre o montante imobilizado de R$ 221,6 bilhões,
foram aplicadas duas taxas. A primeira referente ao custo
financeiro, na qual se utilizou a taxa Selic média de 2004
de 16,25% a.a.. A segunda, referente aos custos de depre-
ciação, obsolescência e seguro. Neste caso, utilizou-se a
metodologia utilizada por Delaney e Alford-Bangs no cál-
CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA
Figura 1:
Custo do
transporte
rodoviário
de carga
em 2004
Figura 2:
Custo do
transporte
de carga
no Brasil
em 2004
coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 66
culo do custo logístico americano com a mesma taxa de
15,25% a.a., visto que não tínhamos nenhum estudo
neste sentido no Brasil e tínhamos o objetivo compará-lo
com o número americano. Aplicando estas duas taxas,
chegamos a um custo de estoque no Brasil de R$ 69,8 bi-
lhões, o que representa 3,9% do nosso PIB.
Armazenagem
O cálculo do custo de armazenagem seguiu a proporção
observada no modelo metodológico americano, resultado de
um percentual do valor de estoque imobilizado. Assim, obte-
ve-se um custo de R$ 11,7 bilhões, o equivalente a 0,7% do PIB.
Administrativo
O custo administrativo também utilizou a metodologia
de Delaney e Wilson dos dados estrangeiros, que consi-
dera um custo administrativo de 4% do total do custo
logístico. Dessa forma, para o Brasil obteve-se R$ 8,5 bi-
lhões, o que corresponde a 0,5% do PIB.
Custo Logístico
A composição de todos estes custos logísticos do Brasil
em 2004 chega a um total de R$ 222 bilhões, o equivalente
a 12,6% do PIB, conforme pode ser visto na Figura 3.
Nos Estados
Unidos, os custos
logísticos (domés-
ticos) equivalem a
8,26% do PIB. En-
tre os custos das
atividades, o de es-
toque é relativa-
mente o que apre-
senta a maior dife-
rença na comparação, 3,9% no Brasil contra 2,1% nos EUA.
A outra parte da diferença é relativa ao custo de transporte,
5,1% e 7,5%, respectivamente. A Figura 4 apresenta o gráfi-
co com esta comparação.
A Figura 5 apresenta uma tabela com os dados de movi-
mentação e custo de transporte no Brasil, em R$ 1.000
ton/km ou seja, o valor médio de se transportar uma
tonelada por uma distância de mil quilômetros. A tabela
fornece estes valores para os diversos modais e a respectiva
parcela de participação no total de cargas movimentadas.
A comparação dos números do Brasil e dos EUA apre-
sentada na Figura 6 foi feita com base no valor do dólar
67 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006
de 2004. Pela grande influência da taxa de câmbio sobre
estes resultados, se fosse utilizado o câmbio de 2005, to-
dos os valores do Brasil sofreriam um aumento de 25%.
Na tabela da Figura 6, pode-se destacar a enorme dife-
rença entre os valores de frete rodoviário do Brasil e dos
EUA. Esta diferença em parte está associada ao perfil de
carga e ao tamanho médio das rotas, mas também às si-
tuações de mercado bastante díspares.
CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA
Figura 4 - Custos logísticos em relação ao PIB
Brasil x EUA em 2004
Figura 5 - Matriz de transporte de cargas do Brasil em 2004
Figura 3:
Custos
logísticos
no Brasil
em 2004
Figura 5 - Matriz de transporte de cargas _ Brasil x EUA
coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 67
Em relação à carga e ao perfil de rotas, enquanto no
Brasil predomina o transporte de produtos agrícolas em
distâncias relativamente longas neste modal, nos EUA ele
está voltado ao transporte de produtos de mais alto valor
agregado e à complementação dos outros modais através
de uma ponta rodoviária de menor distância.
Do ponto de vista do mercado, enquanto no Brasil existe
um excesso de oferta do setor, promovida principalmente
pela baixa regulamentação e pelo grande número de autô-
nomos, nos EUA ocorre uma escassez de motoristas.
O modal aéreo é um pouco mais barato no Brasil, não
sendo significativa a diferença. Já o custo do transporte
dutoviário no Brasil é o dobro do americano, colaboran-
do para este resultado as longas distâncias e o grande vo-
lume transportado por dutos nos EUA, o que permite
grande economia de escala. Além, é claro, do alto custo
do capital no Brasil, que dificulta os elevados investimen-
tos neste modal.
A grande diferença do custo aquaviário entre o Brasil e
os EUA pode em grande parte estar relacionada a dois fa-
tores críticos. O primeiro é relativo à grande utilização da
hidrovia nos EUA, que utiliza grandes composições a um
baixo custo, reduzindo a média americana. O segundo é
relacionado ao grande volume de petróleo transportado
por curta distância na costa do Brasil, que, em conjunto
com um custo portuário relativamente alto, acaba elevan-
do o custo por tonelada quilômetro deste modal.
Já o modal ferroviário aparece mais barato no Brasil por
causa da operação da Vale do Rio Doce, a qual, além do
alto volume e grande produtividade, opera a um preço de
custo para a própria mineradora, influenciando bastante
este resultado. Ao retirá-la do cálculo, este número
aumentaria de US$ 12,44 para US$ 16,93.
Mesmo considerando a composição da matriz de trans-
porte dos dois países, o custo médio de se transportar uma
tonelada por mil quilômetros em 2004 era menor no
Brasil do que nos EUA. Mas por que isso ocorre se, no
Brasil, o custo de transporte equivale a 7,5% do PIB e nos
EUA apenas 5,1%? A resposta está na relação entre a
movimentação de carga e o tamanho da economia.
coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 68
69 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006
CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA
Enquanto a economia americana é praticamente 20 vezes
maior que a nossa, eles só movimentam sete vezes mais car-
ga que o Brasil. Na verdade, o valor agregado da carga movi-
mentada lá é muito mais alto do que a daqui, e destaca-se
também a maior participação de serviços na economia, 79%
lá contra 56% no Brasil.
O grande problema da matriz de transporte brasileira é
que, devido à falta de infra-estrutura adequada, nem sempre
utilizamos o modal mais adequado ao tipo de carga trans-
portado. Assim, em diversos mercados, o embarcador –
diante da falta de disponibilidade de outros modais – acaba
obrigado a utilizar o rodoviário, que apesar dos baixos valo-
res de frete praticados não teria como competir com a fer-
rovia ou hidrovia, principalmente nas longas distâncias.
Conclusão
A dificuldade de se obter informações sobre custos logís-
ticos no Brasil é muito grande, e o estudo desenvolvido pe-
lo CEL/Coppead em 2005 sobre o assunto, embora bastante
completo em algumas áreas, é apenas uma iniciativa. Entre
as áreas em que o estudo deve ser aprofundado destaca-se a
de armazenagem, dado que esta pesquisa apenas replicou
modelos internacionais no cálculo deste custo.
Apesar de suas limitações, relacionadas principalmente à
disponibilidade de dados, a pesquisa pode chegar a impor-
tantes conclusões com relação ao custo logístico nacional,
entre as quais cabe destacar:
• A redução de custo de transporte de 1996 a 2004 nos EUA
e no Brasil em relação ao PIB, apesar da elevação do preço
do petróleo, provavelmente devido a um aumento da efi-
ciência desta operação.
• O elevado custo de estoque brasileiro, que é quase o dobro
do americano devido ao nosso elevadíssimo custo de capital.
• O expressivo aumento da receita do modal ferroviário no
ano de 2004, que pode dar fôlego a novos investimentos,
permitindo aumento do volume de cargas neste modal.
• O motivo do custo logístico no Brasil ser maior que o
americano em termos proporcionais ao PIB está ligado, prin-
cipalmente, à menor participação de serviços na nossa
economia e ao menor valor agregado dos nossos produtos,
além do nosso maior custo de capital.
Para finalizar, vale destacar que os valores de frete
rodoviário praticados no Brasil são bastante baixos; no en-
tanto, a falta de infra-estrutura adequada, aliada a proble-
mas de capacidade e disponibilidade, muitas vezes inviabi-
lizam o transporte de cargas por outros modais, muitas
vezes mais adequados à distância e ao tipo de produto. As-
sim, o resultado acaba sendo um frete alto para quem paga,
mas baixo para quem recebe.
Bibliografia
The World Bank. Brazil Multimodal Freight Transport: Se-
lected Regulatory Issues. Relatório nº. 16361-BR. Out, 1997.
Wilson, R.. 16th Annual State of Logistics Report. CSCPM.
Jun, 2005.
Bowersox, D. J.; Calantone, R.J.; Rodrigues, A. M.. Esti-
mation of Global Logistics Expenditures Using Neural Net-
works. Michigan State University. JBL. Vol.24, nº2, 2003.
Castro, N.R.. Logistic Costs and Brazilian Regional Deve-
lopment. The World Bank. Aug, 2004.
1
Embora Delaney tenha falecido, Wilson continua atualizando o trabalho
Maurício Pimenta Lima
Pesquisador e coordenador da área de Cursos do Centro de Estudos
em Logística – CEL – do Coppead/UFRJ.
Fone: (21) 2598-9812
mplima@coppead.ufrj.br
coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 69

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EFEITOS DOS CUSTOS TRANSACIONAIS NA IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROGRAMA DE GOVERNO
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Aula 3 custos logísiticos na economia brasileira

  • 1. 64 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006 Introdução A carência de informações sobre custos logísticos no Brasil torna freqüente a utilização de dados defasados. O grande problema é que esses dados não necessariamente representam a nossa atual realidade, tornando difícil, entre outras coisas, a comparação com outros países. Além de tudo, a falta de um histórico acaba inviabilizando a análise da evolução do nosso custo logístico. Diante deste cenário, o Centro de Estudos em Logística realizou uma pesquisa sobre Custos Logísticos no Brasil, buscando números e metodologias que respondessem as principais questões relacionadas ao tema. Assim, em janeiro de 2005 iniciamos uma pesquisa e logo nos de- paramos com uma imensa dificuldade de obtenção de da- dos sobre o País. Além de pouco atualizadas, muitas in- formações são imprecisas e incompletas. Outras não são disponíveis, ou mesmo não existem. Isto ocorre não ape- nas no que se refere aos dados de custos, mas em logísti- ca em geral. Para contornar o problema, a pesquisa utilizou mais de 30 diferentes fontes (ABCR, ANP, ANTT, ANTF, ANTAQ, Banco Mundial, BNDES, CNT, Conab, CVM – Economáti- ca, CSCMP, DAC, Detran, Fipe, Geipot, IBGE, Infraero, Ipea, NTC, Sindicom, revistas especializadas, empresas usuárias de transporte aqüaviário, empresas de navegação, aéreas e de transportes rodoviários, distribuidoras de com- bustível e diversos executivos e especialistas do mercado), trabalhando números, em paralelo, para garantir a acurá- cia dos resultados. Além da parte macroeconômica, foi conduzida uma pesquisa com grandes empresas atuantes no Brasil, buscan- do saber não apenas a representatividade dos custos logísti- cos nessas indústrias, mas também como está sendo rea- lizada a gestão de custos, quais sistemas são utilizados para suporte e qual a expectativa para evolução desses gastos, dentre outros resultados. No entanto, devido ao grande vo- lume de informações, esta parte microeconômica será apre- sentada, em breve, em uma próxima oportunidade. O estudo macroeconômico, foco deste texto, pretende ter seus números atualizados pelo menos a cada dois anos, permitindo a geração de um evolutivo dos gastos com logística no Brasil. Costumo comparar a necessidade de medição de indicadores com o papel de uma balança em um regime, pois, independentemente do tipo de dieta uti- lizada para emagrecer, é praticamente inconcebível ima- giná-la sem a utilização de uma balança para medição do peso e seu acompanhamento. Este texto irá abordar a parte da pesquisa referente ao cálculo do custo logístico do Brasil, incluindo as ativi- dades de transporte, armazenagem, estoque e a sua admi- nistração. O escopo deste trabalho é limitado às operações domésticas, incluindo, no caso de exportações, o trans- porte até o porto no Brasil e, no caso de importações, o transporte a partir do porto nacional, incluindo o custo portuário. Por fim, será apresentado um comparativo en- tre os valores do Brasil e dos EUA. Antecedentes Até a realização desta pesquisa, a estimativa corrente do nosso custo logístico era de cerca de 17% do PIB. A origem deste número está ligada a um estudo do Banco Mundial realizado em 1996 que, focado em transportes, não chega a mencionar o valor de 17%, mas estima o custo de transporte no Brasil como sendo entre 9% e 10% do PIB. A partir deste número, extrapolou-se – a comunidade logística em geral, não o Banco Mundial –, com base na parcela de custo de transporte, normalmente em torno de 60% do custo logísti- co, para se obter o resultado final. Assim, a partir do inter- valo superior do custo de transporte de 10% do PIB, chegou- se ao custo logístico nacional de 17%. Diante da falta de outro número mais preciso, este acabou virando uma referência. Independentemente da qualidade da estimativa dos 17%, vale observar as transformações ocorridas desde 1996, data-referência do estudo anterior, até 2004, data dos dados utilizados nesta pesquisa. Nos EUA, por exem- plo, apesar do aumento do petróleo, o custo logístico diminuiu em relação ao PIB durante este período, passan- do de 10,2% para 8,6%, segundo pesquisa de Delaney1 e CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA Maurício Pimenta Lima Custos logísticos na economia brasileira coppead.qxd 24/1/2006 11:01 Page 64
  • 2. Wilson, referência americana, com a qual estarão sendo comparados os valores encontrados no Brasil. Como a pesquisa americana considera também parte do trans- porte internacional, o valor de comparação utilizado do custo americano foi de 8,3% do PIB, depois de excluídos os custos de transporte internacional. As variações do custo logístico americano de 1996 até 2004 mostram que houve uma redução do custo de es- toque e, em segundo plano, do custo de transporte. No Brasil, durante este período, o diesel subiu 292%, re- sultado da elevação do preço do petróleo, o qual também causou um aumento nos valores dos pneus. Vale ressaltar que estes itens de custo variável são de grande importância na formação do preço. Principalmente no Brasil, onde o frete praticado é em grande parte das vezes inferior ao cus- to total, principalmente no caso dos autônomos. Nestes ca- sos, o preço cobre os custos variáveis, porém não remunera todos os custos fixos, principalmente aqueles ligados ao in- vestimento, como o de depreciação e o financeiro. Com o aumento dos custos variáveis, a margem exis- tente para negociação de preço do autônomo diminui, pois o custo variável se torna mais significativo. Dados de uma revista nacional de transporte de 1996 mostram que o diesel na época representava 16,8% do custo total de uma carreta. Em um exemplar de 2004 da mesma revista, o diesel já representava 31,8% do custo total, consideran- do o mesmo tipo de veículo e operação. Embora tímida, a boa novidade está relacionada ao au- mento da parcela da ferrovia na movimentação de carga, a qual estava na faixa de 20% em 1996 e foi para 24% em 2004. A participação do rodoviário continua elevada, mas diminuiu um pouco, foi de um patamar de 64% para 59% no mesmo período. Quanto ao custo financeiro de estoque, ao compararmos a taxa básica de juros de 2004 com a de 1996 é possível per- ceber uma significativa redução. Enquanto em 1996 a taxa média ficou em 27,15% a.a., em 2004 ela ficou em 16,44% a.a.. É claro que, em termos comparativos com outros países, a taxa brasileira continua excessivamente alta. Nos EUA, no mesmo período, ela passou de 5,27% para 1,38%. Transporte Para se chegar ao custo de transporte foi calculado o custo por modal, conforme é exposto a seguir. Rodoviário Apesar de este modal ser responsável pela maior parcela da carga movimentada no País e pela maior parcela dos custos, os dados relativos a esta atividade são escassos e pouco confiáveis. Assim, a solução encontrada foi calcular o custo de maneira indireta com base no consumo de diesel e na sua participação no valor do frete. Os custos de pedágio, gerenciamento de riscos e o custo de transporte de carga em veículos sem serem movidos a diesel foram considera- dos em outras contas e posteriormente adicionados. O estudo apontou que 55% do total de diesel consumi- do no Brasil em 2004 foram destinados ao transporte rodoviário de carga, enquanto os demais 45% foram desti- nados à agroindústria, ao transporte ferroviário, ao gover- no, ao transporte rodoviário de passageiros, à navegação, à pesca, às indústrias, à mineração e aos carros de passeio. Com base na parcela de 55% e no consumo total de diesel, chegou-se ao volume destinado ao transporte rodoviário de carga em 2004, de 21,7 bilhões de litros, o qual correspondia a R$ 32,3 bilhões. A partir daí, o desafio foi obter o percentual médio do custo do diesel no frete no Brasil. Para chegar a esta média foi necessário fazer uma seg- mentação considerando os fatores que mais influenci- avam neste percentual, entre os quais se destacavam: a distância da rota, o tipo de carga transportada, se a carga era fechada ou fracionada, a utilização de autônomos e a existência de frete retorno. Dessa forma, foi feita uma composição sobre qual seria a relação entre o custo de combustível e o valor do frete para cada tipo de perfil de transporte selecionado e a sua respec- tiva participação dentro do consumo total. Ponderando-se as diferentes realidades, que variavam de 1,5% para carga fracionada em curta distância, passando por 24,6% para carga intra-regional e 28,1% para produtos perigosos inter- regionais, até 41,8% para carga geral em longa distância, chegou-se a um percentual médio de 33,6%. Isto significa dizer que a cada R$ 3,00 gastos com trans- porte em 2004, em média R$ 1,00 foi referente ao custo do diesel, enquanto os outros R$ 2,00 foram utilizados para cobrir os demais custos (motorista, manutenção, de- preciação, etc.) e ainda, eventualmente, gerar lucro. Com base neste percentual, chegou-se ao custo de R$ 96,3 bilhões para o transporte rodoviário dos veículos a diesel em 2004. Então, foi calculado o custo com os veículos que não utilizam diesel, a conta de pedágio e de gerenciamento de riscos. O custo dos veículos de transporte de carga que uti- lizam outros combustíveis foi estimado em R$ 7,0 bilhões, com base no número de unidades e no custo-padrão. So- bre o pedágio, por exemplo, não foi encontrada nenhuma Janeiro/2006 - Revista Tecnologística - 65 coppead.qxd 24/1/2006 11:01 Page 65
  • 3. 66 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006 informação sobre o valor arrecadado com o transporte de carga. Fez-se, portanto, a conta inversa, subtraindo do va- lor total de pedágio pago no Brasil em 2004 o valor esti- mado referente ao transporte de passageiros, obtendo-se R$ 2,2 bilhões. Quanto ao gerenciamento de riscos, esti- mamos seu custo em R$ 3,3 bilhões com base na parte mi- croeconômica da pesquisa. Assim, obteve-se o custo total do transporte rodoviário no Brasil de R$ 109,2 em 2004, conforme pode ser visto no quadro resumo da Figura 1. Ferroviário O transporte ferroviário foi o mais simples de ser en- contrado. Bastou conseguir com a ANTT (Agência Na- cional de Transporte Terrestre) a receita de todas as con- cessionárias ferroviárias do País em 2004, dado que este valor equivale ao custo de todos os embarcadores com re- lação à ferrovia, no caso R$ 7,5 bilhões. Aquaviário O cálculo do transporte aquaviário foi segmentado em: granel sólido, granel líquido e carga geral, além de tratar do hidroviário à parte. No caso de granel líquido, foram consideradas duas rea- lidades distintas: a de embarcações fretadas no longo pra- zo e outra na qual é contratado apenas o serviço de trans- porte. A carga geral também teve que ser segmentada en- tre contêineres e suporte às operações offshore. Entre os dados mais difíceis de serem obtidos destacaram- se os do transporte hidroviário, cujas informações eram pouco precisas e não estavam consolidadas. No caso, foram usados valores de frete repassados por alguns embarcadores e dados de movimentação de outros trabalhos. Com base nos dados de frete por tipo de carga trans- portada e seus respectivos volumes de movimentação, foi calculado o custo do modal aquaviário, cujo resultado foi de R$ 7,3 bilhões na carga doméstica e mais R$ 5,2 bilhões referentes ao custo portuário de importações e expor- tações. Vale destacar, na carga nacional, o transporte de petróleo cru das plataformas para as refinarias por navio, devido à sua relevância no volume total. Dutoviário As informações de custos foram baseadas nos dados disponíveis da Transpetro, responsável por mais de 80% da carga transportada em dutos no Brasil. Estes dados foram extrapolados, considerando a movimentação total, e obteve-se o custo de R$ 2,1 bilhões do modal dutoviário. Aeroviário No aeroviário também foram utilizados valores médios de frete e volume de movimentação. Estes dados em grande parte dependeram da colaboração de muitos exe- cutivos e especialistas ligados a empresas do setor, dada a dificuldade de obtê-los. Os valores de frete dos Correios foram tratados em uma outra conta, dada a sua represen- tatividade e a tarifa diferenciada. O custo calculado para o modal aéreo em 2004 foi de R$ 1,9 bilhão. Custo total de transporte Considerando o custo de cada modal, conforme pode ser visto no quadro da Figura 2, o resultado encontrado para o custo total de transporte no Brasil em 2004 foi de R$ 133,3 bilhões, valor equivalente a 7,5% do PIB. Estoque O custo de estoque foi calculado através de dois mode- los diferentes para validar o resultado. No primeiro mo- mento, foi utilizado o valor imobilizado em estoque pu- blicado pelo IBGE relativo a 2003, porém ajustado para 2004, no valor de R$ 221,6 bilhões. Em seguida, esta in- formação foi checada com os dados de cobertura de es- toque de empresas de capital aberto, tendo como fonte dados da Economática. Sobre o montante imobilizado de R$ 221,6 bilhões, foram aplicadas duas taxas. A primeira referente ao custo financeiro, na qual se utilizou a taxa Selic média de 2004 de 16,25% a.a.. A segunda, referente aos custos de depre- ciação, obsolescência e seguro. Neste caso, utilizou-se a metodologia utilizada por Delaney e Alford-Bangs no cál- CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA Figura 1: Custo do transporte rodoviário de carga em 2004 Figura 2: Custo do transporte de carga no Brasil em 2004 coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 66
  • 4. culo do custo logístico americano com a mesma taxa de 15,25% a.a., visto que não tínhamos nenhum estudo neste sentido no Brasil e tínhamos o objetivo compará-lo com o número americano. Aplicando estas duas taxas, chegamos a um custo de estoque no Brasil de R$ 69,8 bi- lhões, o que representa 3,9% do nosso PIB. Armazenagem O cálculo do custo de armazenagem seguiu a proporção observada no modelo metodológico americano, resultado de um percentual do valor de estoque imobilizado. Assim, obte- ve-se um custo de R$ 11,7 bilhões, o equivalente a 0,7% do PIB. Administrativo O custo administrativo também utilizou a metodologia de Delaney e Wilson dos dados estrangeiros, que consi- dera um custo administrativo de 4% do total do custo logístico. Dessa forma, para o Brasil obteve-se R$ 8,5 bi- lhões, o que corresponde a 0,5% do PIB. Custo Logístico A composição de todos estes custos logísticos do Brasil em 2004 chega a um total de R$ 222 bilhões, o equivalente a 12,6% do PIB, conforme pode ser visto na Figura 3. Nos Estados Unidos, os custos logísticos (domés- ticos) equivalem a 8,26% do PIB. En- tre os custos das atividades, o de es- toque é relativa- mente o que apre- senta a maior dife- rença na comparação, 3,9% no Brasil contra 2,1% nos EUA. A outra parte da diferença é relativa ao custo de transporte, 5,1% e 7,5%, respectivamente. A Figura 4 apresenta o gráfi- co com esta comparação. A Figura 5 apresenta uma tabela com os dados de movi- mentação e custo de transporte no Brasil, em R$ 1.000 ton/km ou seja, o valor médio de se transportar uma tonelada por uma distância de mil quilômetros. A tabela fornece estes valores para os diversos modais e a respectiva parcela de participação no total de cargas movimentadas. A comparação dos números do Brasil e dos EUA apre- sentada na Figura 6 foi feita com base no valor do dólar 67 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006 de 2004. Pela grande influência da taxa de câmbio sobre estes resultados, se fosse utilizado o câmbio de 2005, to- dos os valores do Brasil sofreriam um aumento de 25%. Na tabela da Figura 6, pode-se destacar a enorme dife- rença entre os valores de frete rodoviário do Brasil e dos EUA. Esta diferença em parte está associada ao perfil de carga e ao tamanho médio das rotas, mas também às si- tuações de mercado bastante díspares. CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA Figura 4 - Custos logísticos em relação ao PIB Brasil x EUA em 2004 Figura 5 - Matriz de transporte de cargas do Brasil em 2004 Figura 3: Custos logísticos no Brasil em 2004 Figura 5 - Matriz de transporte de cargas _ Brasil x EUA coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 67
  • 5. Em relação à carga e ao perfil de rotas, enquanto no Brasil predomina o transporte de produtos agrícolas em distâncias relativamente longas neste modal, nos EUA ele está voltado ao transporte de produtos de mais alto valor agregado e à complementação dos outros modais através de uma ponta rodoviária de menor distância. Do ponto de vista do mercado, enquanto no Brasil existe um excesso de oferta do setor, promovida principalmente pela baixa regulamentação e pelo grande número de autô- nomos, nos EUA ocorre uma escassez de motoristas. O modal aéreo é um pouco mais barato no Brasil, não sendo significativa a diferença. Já o custo do transporte dutoviário no Brasil é o dobro do americano, colaboran- do para este resultado as longas distâncias e o grande vo- lume transportado por dutos nos EUA, o que permite grande economia de escala. Além, é claro, do alto custo do capital no Brasil, que dificulta os elevados investimen- tos neste modal. A grande diferença do custo aquaviário entre o Brasil e os EUA pode em grande parte estar relacionada a dois fa- tores críticos. O primeiro é relativo à grande utilização da hidrovia nos EUA, que utiliza grandes composições a um baixo custo, reduzindo a média americana. O segundo é relacionado ao grande volume de petróleo transportado por curta distância na costa do Brasil, que, em conjunto com um custo portuário relativamente alto, acaba elevan- do o custo por tonelada quilômetro deste modal. Já o modal ferroviário aparece mais barato no Brasil por causa da operação da Vale do Rio Doce, a qual, além do alto volume e grande produtividade, opera a um preço de custo para a própria mineradora, influenciando bastante este resultado. Ao retirá-la do cálculo, este número aumentaria de US$ 12,44 para US$ 16,93. Mesmo considerando a composição da matriz de trans- porte dos dois países, o custo médio de se transportar uma tonelada por mil quilômetros em 2004 era menor no Brasil do que nos EUA. Mas por que isso ocorre se, no Brasil, o custo de transporte equivale a 7,5% do PIB e nos EUA apenas 5,1%? A resposta está na relação entre a movimentação de carga e o tamanho da economia. coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 68
  • 6. 69 - Revista Tecnologística - Janeiro/2006 CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA Enquanto a economia americana é praticamente 20 vezes maior que a nossa, eles só movimentam sete vezes mais car- ga que o Brasil. Na verdade, o valor agregado da carga movi- mentada lá é muito mais alto do que a daqui, e destaca-se também a maior participação de serviços na economia, 79% lá contra 56% no Brasil. O grande problema da matriz de transporte brasileira é que, devido à falta de infra-estrutura adequada, nem sempre utilizamos o modal mais adequado ao tipo de carga trans- portado. Assim, em diversos mercados, o embarcador – diante da falta de disponibilidade de outros modais – acaba obrigado a utilizar o rodoviário, que apesar dos baixos valo- res de frete praticados não teria como competir com a fer- rovia ou hidrovia, principalmente nas longas distâncias. Conclusão A dificuldade de se obter informações sobre custos logís- ticos no Brasil é muito grande, e o estudo desenvolvido pe- lo CEL/Coppead em 2005 sobre o assunto, embora bastante completo em algumas áreas, é apenas uma iniciativa. Entre as áreas em que o estudo deve ser aprofundado destaca-se a de armazenagem, dado que esta pesquisa apenas replicou modelos internacionais no cálculo deste custo. Apesar de suas limitações, relacionadas principalmente à disponibilidade de dados, a pesquisa pode chegar a impor- tantes conclusões com relação ao custo logístico nacional, entre as quais cabe destacar: • A redução de custo de transporte de 1996 a 2004 nos EUA e no Brasil em relação ao PIB, apesar da elevação do preço do petróleo, provavelmente devido a um aumento da efi- ciência desta operação. • O elevado custo de estoque brasileiro, que é quase o dobro do americano devido ao nosso elevadíssimo custo de capital. • O expressivo aumento da receita do modal ferroviário no ano de 2004, que pode dar fôlego a novos investimentos, permitindo aumento do volume de cargas neste modal. • O motivo do custo logístico no Brasil ser maior que o americano em termos proporcionais ao PIB está ligado, prin- cipalmente, à menor participação de serviços na nossa economia e ao menor valor agregado dos nossos produtos, além do nosso maior custo de capital. Para finalizar, vale destacar que os valores de frete rodoviário praticados no Brasil são bastante baixos; no en- tanto, a falta de infra-estrutura adequada, aliada a proble- mas de capacidade e disponibilidade, muitas vezes inviabi- lizam o transporte de cargas por outros modais, muitas vezes mais adequados à distância e ao tipo de produto. As- sim, o resultado acaba sendo um frete alto para quem paga, mas baixo para quem recebe. Bibliografia The World Bank. Brazil Multimodal Freight Transport: Se- lected Regulatory Issues. Relatório nº. 16361-BR. Out, 1997. Wilson, R.. 16th Annual State of Logistics Report. CSCPM. Jun, 2005. Bowersox, D. J.; Calantone, R.J.; Rodrigues, A. M.. Esti- mation of Global Logistics Expenditures Using Neural Net- works. Michigan State University. JBL. Vol.24, nº2, 2003. Castro, N.R.. Logistic Costs and Brazilian Regional Deve- lopment. The World Bank. Aug, 2004. 1 Embora Delaney tenha falecido, Wilson continua atualizando o trabalho Maurício Pimenta Lima Pesquisador e coordenador da área de Cursos do Centro de Estudos em Logística – CEL – do Coppead/UFRJ. Fone: (21) 2598-9812 mplima@coppead.ufrj.br coppead.qxd 24/1/2006 11:02 Page 69