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Pharmacia Brasileira - Novembro/Dezembro 200622
ARTIGO
Sistemas de
liberação
controlada
Juliana Sanchez Henrique (jujush03@yahoo.com.br) e Renata Sarnauskas
Falcare(falcare@uol.com.br),formandasdoCursodeFarmáciadaUniversidade
Anhembi Morumbi, em São Paulo, e Patrícia Santos Lopes (pslopes@usp.br),
farmacêutica doutora pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e
professora de Tecnologia Farmacêutica da Universidade Anhembi Morumbi
(http://www.anhembi.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=194&sid=44)
Desde as últimas décadas, uma
atenção considerável esteve voltada
para o desenvolvimento de novos siste-
mas de transporte de drogas, principal-
mente, porque a utilização da maioria
dos compostos terapêuticos é sempre
limitada pela impossibilidade de au-
mento de dosagem. Problemas ineren-
tes à utilização do fármaco em concen-
trações elevadas levaram a um grande
esforço dos pesquisadores, no sentido
de desenvolver sistemas capazes de
transportar o fármaco até um alvo es-
pecífico, diminuindo, assim, os efeitos
indesejáveis resultantes de sua ação em
outros sítios.
Nestes sistemas, o fármaco está
ligado a um transportador (carreador),
que é o responsável por contornar as
propriedades físico-químicas limitan-
tes dos fármacos encapsulados, melho-
rando, desta forma, a farmacodinâmica
(potencialização do efeito terapêutico),
farmacocinética (controle da absorção e
distribuição tecidual) e os efeitos toxi-
cológicos (redução da toxicidade local e
sistêmica) dos mesmos.
Os primeiros estudos realizados
para a obtenção de sistemas carreado-
res eficazes tiveram como base o encap-
sulamento de moléculas. O primeiro es-
tudo data do início do século XX, quan-
do Paul Ehrlich propôs o seu modelo,
que ficou conhecido por “Bala Mágica
de Ehrlich” (Ehrlich’s Magic Bullet). Hoje,
seguindo a mesma idéia, existem sis-
temas carreadores, como lipossomas,
niossomas, aquassomas, transfersso-
mas, nanocáspulas, microcápsulas, ci-
clodextrinas, microesponjas, entre ou-
tros. Os dispositivos são frequentemen-
te feitos sob medida e desenvolvidos
tão cuidadosamente, quanto o fármaco
que eles pretendem conter.
A natureza e a composição dos
carreadores são muito variadas e não
há predomínio de mecanismos de ins-
tabilidade e decomposição do fármaco,
sendo sua administração segura (sem
causar reações inflamatórias locais) e
conveniente ao paciente (menor núme-
ro de doses). Além disso, tanto subs-
tâncias hidrofílicas, quanto lipofílicas
podem ser incorporadas aos mesmos.
Os sistemas de liberação con-
trolada possuem dois objetivos princi-
pais: manter constante a concentração
sanguínea de uma determinada droga,
assegurando uma maior biodisponibi-
lidade, e reduzir os efeitos colaterais,
realçando, assim, a adesão do paciente
ao tratamento com um menor número
de dosagens requeridas.
Quando comparados aos siste-
mas convencionais de administração
de fármacos, os sistemas de liberação
controlada oferecem a grande vantagem
de manter a concentração do fármaco
constante na faixa terapêutica por um
período prolongado, utilizando-se de
uma única dosagem, o que não acon-
tece nos sistemas convencionais, onde
a concentração do fármaco na corrente
sangüínea apresenta um pico máximo
e, então, declina. Do ponto de vista
clínico, o controle de concentração te-
rapêutica é importante, pois aumenta a
eficácia terapêutica e diminui significa-
tivamente a toxicidade.
Existem vários dispositivos en-
contrados, no mercado, atualmente, que
diferem entre si com relação a tamanho,
composição, incompatibilidades, vias
de administração, entre outros. Ao con-
trário do desejo de vários formuladores,
não existe um dispositivo ideal. Cada
substância, em cada concentração, re-
quer um único dispositivo para otimizar
a terapia.
Apesar de todas as vantagens dis-
cutidas anteriormente, é necessário que
haja consciência de que não existem
soluções mágicas para melhorar a ad-
ministração de uma substância nova ou
antiga. Apenas um pleno entendimento
do problema, uma clara definição dos
objetivos e um esforço multidisciplinar
nos levarão ao sucesso.
Alémdisto,existemalgunspontos
nesta nova tecnologia que precisam ser
amadurecidos e considerados com cui-
dado. Por exemplo, existe a dificuldade
de interrupção da ação farmacológica
de um medicamento administrado por
estes dispositivos, além do alto custo
dos polímeros biodegradáveis. Há, tam-
bém, o risco de nanopatologia, ou seja,
a presença de nanopartículas de natu-
reza inorgânica em tecidos humanos,
que não são metabolizadas e têm ex-
creção dificultada, levando a sintomas,
como febre, hepatomegalia e acidose
metabólica, o que nos obriga a rever os
conceitos de biodisponibilidade nestes
sistemas.
Existem, ainda, questões éticas
relacionadas à nanotecnologia e à na-
nociência, pois estes sistemas pode-
riam fugir ao nosso controle, resultan-
do, por exemplo, nas armas biológicas
mais destrutivas que poderiam ser
construídas sob esta metodologia (bio-
terrorismo).
O correto é que os pesquisadores
deixem a boa ciência e não o zelo em-
presarial ser o guia na determinação das
direções futuras no que diz respeito ao
transporte de fármacos. Os sistemas de
liberação controlada têm muito a ofere-
cer em prol da humanidade em relação
à qualidade de vida.
Juliana Sanchez Henrique
jujush03@yahoo.com.br
Renata Sarnauskas Falcare
falcare@uol.com.br
Patrícia Santos Lopes
pslopes@usp.br

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  • 1. Pharmacia Brasileira - Novembro/Dezembro 200622 ARTIGO Sistemas de liberação controlada Juliana Sanchez Henrique (jujush03@yahoo.com.br) e Renata Sarnauskas Falcare(falcare@uol.com.br),formandasdoCursodeFarmáciadaUniversidade Anhembi Morumbi, em São Paulo, e Patrícia Santos Lopes (pslopes@usp.br), farmacêutica doutora pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e professora de Tecnologia Farmacêutica da Universidade Anhembi Morumbi (http://www.anhembi.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=194&sid=44) Desde as últimas décadas, uma atenção considerável esteve voltada para o desenvolvimento de novos siste- mas de transporte de drogas, principal- mente, porque a utilização da maioria dos compostos terapêuticos é sempre limitada pela impossibilidade de au- mento de dosagem. Problemas ineren- tes à utilização do fármaco em concen- trações elevadas levaram a um grande esforço dos pesquisadores, no sentido de desenvolver sistemas capazes de transportar o fármaco até um alvo es- pecífico, diminuindo, assim, os efeitos indesejáveis resultantes de sua ação em outros sítios. Nestes sistemas, o fármaco está ligado a um transportador (carreador), que é o responsável por contornar as propriedades físico-químicas limitan- tes dos fármacos encapsulados, melho- rando, desta forma, a farmacodinâmica (potencialização do efeito terapêutico), farmacocinética (controle da absorção e distribuição tecidual) e os efeitos toxi- cológicos (redução da toxicidade local e sistêmica) dos mesmos. Os primeiros estudos realizados para a obtenção de sistemas carreado- res eficazes tiveram como base o encap- sulamento de moléculas. O primeiro es- tudo data do início do século XX, quan- do Paul Ehrlich propôs o seu modelo, que ficou conhecido por “Bala Mágica de Ehrlich” (Ehrlich’s Magic Bullet). Hoje, seguindo a mesma idéia, existem sis- temas carreadores, como lipossomas, niossomas, aquassomas, transfersso- mas, nanocáspulas, microcápsulas, ci- clodextrinas, microesponjas, entre ou- tros. Os dispositivos são frequentemen- te feitos sob medida e desenvolvidos tão cuidadosamente, quanto o fármaco que eles pretendem conter. A natureza e a composição dos carreadores são muito variadas e não há predomínio de mecanismos de ins- tabilidade e decomposição do fármaco, sendo sua administração segura (sem causar reações inflamatórias locais) e conveniente ao paciente (menor núme- ro de doses). Além disso, tanto subs- tâncias hidrofílicas, quanto lipofílicas podem ser incorporadas aos mesmos. Os sistemas de liberação con- trolada possuem dois objetivos princi- pais: manter constante a concentração sanguínea de uma determinada droga, assegurando uma maior biodisponibi- lidade, e reduzir os efeitos colaterais, realçando, assim, a adesão do paciente ao tratamento com um menor número de dosagens requeridas. Quando comparados aos siste- mas convencionais de administração de fármacos, os sistemas de liberação controlada oferecem a grande vantagem de manter a concentração do fármaco constante na faixa terapêutica por um período prolongado, utilizando-se de uma única dosagem, o que não acon- tece nos sistemas convencionais, onde a concentração do fármaco na corrente sangüínea apresenta um pico máximo e, então, declina. Do ponto de vista clínico, o controle de concentração te- rapêutica é importante, pois aumenta a eficácia terapêutica e diminui significa- tivamente a toxicidade. Existem vários dispositivos en- contrados, no mercado, atualmente, que diferem entre si com relação a tamanho, composição, incompatibilidades, vias de administração, entre outros. Ao con- trário do desejo de vários formuladores, não existe um dispositivo ideal. Cada substância, em cada concentração, re- quer um único dispositivo para otimizar a terapia. Apesar de todas as vantagens dis- cutidas anteriormente, é necessário que haja consciência de que não existem soluções mágicas para melhorar a ad- ministração de uma substância nova ou antiga. Apenas um pleno entendimento do problema, uma clara definição dos objetivos e um esforço multidisciplinar nos levarão ao sucesso. Alémdisto,existemalgunspontos nesta nova tecnologia que precisam ser amadurecidos e considerados com cui- dado. Por exemplo, existe a dificuldade de interrupção da ação farmacológica de um medicamento administrado por estes dispositivos, além do alto custo dos polímeros biodegradáveis. Há, tam- bém, o risco de nanopatologia, ou seja, a presença de nanopartículas de natu- reza inorgânica em tecidos humanos, que não são metabolizadas e têm ex- creção dificultada, levando a sintomas, como febre, hepatomegalia e acidose metabólica, o que nos obriga a rever os conceitos de biodisponibilidade nestes sistemas. Existem, ainda, questões éticas relacionadas à nanotecnologia e à na- nociência, pois estes sistemas pode- riam fugir ao nosso controle, resultan- do, por exemplo, nas armas biológicas mais destrutivas que poderiam ser construídas sob esta metodologia (bio- terrorismo). O correto é que os pesquisadores deixem a boa ciência e não o zelo em- presarial ser o guia na determinação das direções futuras no que diz respeito ao transporte de fármacos. Os sistemas de liberação controlada têm muito a ofere- cer em prol da humanidade em relação à qualidade de vida. Juliana Sanchez Henrique jujush03@yahoo.com.br Renata Sarnauskas Falcare falcare@uol.com.br Patrícia Santos Lopes pslopes@usp.br