Este livro analisa o período da Era Lula no Brasil entre 2002-2010, combinando a experiência do autor como deputado federal com sua perspectiva acadêmica. O livro discute os avanços da democracia brasileira neste período, mas também as limitações persistentes nas instituições e cultura política. Ele argumenta que as políticas de Lula promoveram o desenvolvimento econômico e inclusão social, mas que ainda há desafios como reformas tributária, eleitoral e do estado para aprofundar a democracia e justiça social.
1. Apresentação
Este livro nasceu da combinação de minha experiência acadêmica com a vivência no
Parlamento brasileiro em um período especial de nossa história. O que já podemos
denominar a Era Lula representa um daqueles momentos em que uma nação faz
desabrochar suas potencialidades antes apenas latentes. A eleição de 2002 representou o
renascer da esperança de construção de um Brasil desenvolvido e justo. Energias sociais
antes represadas ou excluídas encontraram espaço para participar na formulação e execução
das políticas públicas. Os empresários perceberam que a responsabilidade na condução da
política macroeconômica e a ênfase na ampliação do mercado de consumo de massas abriam
oportunidades de investimento e crescimento. Os setores populares viram sua renda crescer,
com dezenas de milhões de pessoas ingressando na classe média. A sociedade civil
encontrou canais de participação nos conselhos e conferências setoriais numa dimensão que
não havia conhecido até então. Desde o início do meu primeiro mandato de deputado
federal, em 2003, tive a consciência de estar participando de um daqueles momentos
especiais que a história posteriormente haverá de registrar em todo o seu alcance. Sabia que a
eleição de Lula e as escolhas de seu governo significavam mais que uma rotineira alternância
de poder. Percebia que se estava em curso uma ruptura democrática dos antigos padrões
excludentes da vida pública brasileira. Minha vida acadêmica sempre fora marcada pela
reflexão sobre os caminhos a serem seguidos para que a sociedade seja mais justa. Da mesma
forma que o exercício da advocacia, onde busquei combinar a atividade prática com o
necessário embasamento teórico. Assim também procurei fazer no exercício do mandato de
deputado federal. A ação parlamentar e as difíceis escolhas que temos de fazer em cada voto
ou projeto de lei apresentado devem estar guiadas por uma concepção de sociedade. Sem
uma boa teoria e um bom projeto de sociedade a ação parlamentar corre o risco de se perder
nas inúmeras pressões do dia a dia. Por isto, ao longo desses sete anos, recolhi a experiência
do envolvimento nos debates políticos e procurei embasá-la nas concepções que explicito
nos ensaios que compõem este livro. Entre uma sessão parlamentar e outra, sobretudo nos
recessos, inclusive em períodos como professor visitante em universidades como a de
Oxford, ou servindo-me de bibliotecas como a da Gergetown University, pude pesquisar e
refletir sobre os dilemas vividos pelo Brasil na nova fase inaugurada em 2002. Alguns dos
ensaios ora apresentados foram concebidos em meio ao calor das disputas políticas. Outros
surgiram de uma reflexão um pouco mais distanciada proporcionada pelo ambiente
acadêmico. Combinam-se, todavia, porque explicitam uma concepção específica sobre
desenvolvimento, democracia e cultura política. Buscam imprimir uma direção teórica
comum na abordagem de problemas específicos. A Primeira Parte - Democracia e Cultura
Política na Era Lula - inicia por uma avaliação sobre as debilidades da democracia e da
cultura política na América Latina e no Brasil. Embora registre a consolidação democrática
do continente, realço a persistência de conhecidas insuficiências no funcionamento
democrático das nossas instituições e em nossa cultura política. A análise da política externa
e das escolhas econômicas feitas no início do governo ajudam-nos a avaliar os avanços e
limites da contribuição do PT e do Governo Lula ao aprofundamento da nossa democracia.
Na Parte 2 - A Reforma das Instituições - começo por apresentar um estudo sobre o estágio
das discussões em torno das reformas eleitorais no mundo, focando o dilema brasileiro.
Depois de apresentar o debate específico sobre as fracassadas tentativas de reforma política
nas duas últimas legislaturas, apresento algumas reflexões sobre as reformas sindical,
tributária e judiciária, onde muito ainda há por fazer. Na Parte 3 - Desenvolvimento
2. Sustentável e Mudança Cultural, faço uma crítica ao modelo concentrador de
desenvolvimento até então experimentado no Brasil, sinalizando com novos vetores, como o
ambiental e as lutas emancipatórias, a serem incorporados ao projeto de desenvolvimento
sustentável e inclusionário inaugurado com a Era Lula. Na conclusão, procuro fazer um
balanço dos avanços econômicos e sociais do período, realçando algumas mudanças no
como fazer e na cultura política subjacente às acões do Governo Lula. Neste balanço,
termino por refletir sobre os desafios ainda por enfrentar, registrando a urgência do
enfrentamento da questão tributária, do sistema eleitoral e da reforma tanto estrutural
quanto cultural do estado brasileiro.