Políticos e empresas: a promiscuidade que enriquece alguns
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As verdadeiras reformas de alguns políticos não são as
que aparecem nos jornais
Daniel Oliveira (www.expresso.pt)
hoje às 8:00 Última atualização há 20 minutos
Andamos todos a falar das reformas vitalícias dos políticos. Assunto interessante e simbolic amente revelador da
ausênc de étic de uma parte (e não de toda) da nossa c
ia a lasse polític Mas, se me é permitido, ac que se falha no
a. ho
ponto. E que esta indignação compreensível pode ac abar por servir c omo cortina de fumo para esconder o que
realmente nos devia escandalizar. Não é no que os polític recos ebem em reformas - medido em pouc milhares de
os
euros - que enc ontramos o assalto feito ao Estado e aos seus rec ursos. É nas polític que estes polític impõem ao
as os
país. No preço que pagamos por elas. E na rec ompensa que os dec isores recebem por desprezar de forma tão grosseira
o interesse público.
Ac onselho, por isso, a leitura de "Como os políticos enriquecem em Portugal", do jornalista António Sérgio Azenha
e prefaciado por Henrique Neto. Pego aqui apenas nos números rec olhidos junto do Tribunal Constitucional e
reproduzidos neste trabalho de investigação. Deixo para um outro texto a análise mais pormenorizada do envolvimento
destes ex-governantes em dec isões c retas que podem explic o interesse do sec privado por eles. Pego em
onc ar tor
apenas seis exemplos dos 15 analisados.
Joaquim Pina Moura ganhava, em 1994, 23 mil euros por ano. Entrou no governo e os seus rendimentos mais do que
duplicaram. Natural, as suas responsabilidades também. Mas foi depois de sair da polític que mudou de vida. Em 2003,
a
um ano depois de sair do governo, ainda só rec ebia 172 mil euros por ano. Mas, em 2006, já como presidente da
Iberdrola (depois de ter a pasta da economia, onde tomou dec isões fundamentais para as empresas de energia), os seus
rendimentos anuais eram de 700 mil euros por ano. Em doze anos aumentaram 2956%.
Jorge Coelho rec ebia 41 mil euros por ano, em 1994. Quando oc upou c argos exec utivos, passou a rec eber menos do
dobro. Saiu em 2001 do governo. No iníc a c
io, oisa não se sentiu muito. Só mais c inquenta mil euros por ano. Mas,
passados uns anos, em 2009, já rec ebia 710 mil euros por ano, à frente da Mota-Engil. Isto, depois de ter sido ministro do
Equipamento Soc O ministério que tratava dos negóc c as c
ial. ios om onstrutoras. Em 14 anos, o seu rendimento
aumentou 1604%.
Armando Vara rec ebia 59 mil euros por ano em 1994. No governo, aumentou um pouc Chegou aos c mil euros em
o. em
2000. Saiu do governo e, inicialmente, fic a perder. Mas só no primeiro ano. Subiu um pouc até 2004. Em 2007, já
ou o
recebia 240 mil. Em 2009, 520 mil. E em 2010, como administrador do BCP - depois de estar, por nomeação polític na
a,
administração do banc do Estado -, 822 mil euros. Em 16 anos, os seus rendimentos aumentaram 1282%.
o
Não se sabe quanto recebia Dias Loureiro antes de oc upar cargos governativos. Não era, na altuea, obrigatória essa
declaração. Mas sabe-se que estava muito longe de ser um homem abastado. Como ministro rec ebia, em 1994, 65 mil
euros. Em 2001 já recebia 861 mil euros. Os seus rendimentos c aíram depois. Já o que custou ao País, c omo se sabe,
mede-se em muitos zeros à direita. Em sete anos, os seus rendimentos aumentaram 1225%.
Fernando Gomes rec ebia, como presidente da Câmara do Porto, 47 mil euros, em 1998. Como ministro, 78 mil euros.
Foi em 2009, na GALP, que se deu uma súbita ascensão soc 515 mil euros anuais. E, no ano seguinte, 437 mil. Em
ial:
12 anos, o seu rendimento aumentou 975%.
António Vitorino recebia, antes de entrar no governo, 36 mil euros. Como ministro, 71 mil. Depois de sair do governo,
371 mil. Rendimentos que, c altos e baixos, foi mantendo: em 2005, rec
om ebia 383 mil euros. Em 11 anos, os seus
rendimentos aumentaram 962%. Um c aso de súbita competênc na advoc ia.
ia ac
Aumentos desta amplitude só poderiam ser explic ados por extraordinários casos de sorte ou por, como polític estes
os,
senhores terem revelado invulgares c apac idades de gestão. Quando se repete um padrão torna-se difíc falar de sorte.
il
Quanto à c ompetênc c
ia, ada um fará a avaliação que entender da maioria dos ministros que tivemos. Inc luindo os casos
referidos. E note-se que na maioria dos casos o currículo anterior à entrada num governo não chegaria sequer para
ocupar um lugar de quadro intermédio nas empresas que acabam por dirigir.
A verdade é esta: em cargos governativos os ministros criam redes de contactos. Muitas delas alimentadas pelas
dec isões que tomaram e que lhes garantiram a simpatia de futuros empregadores. Fosse o c ontrário e dificilmente
franqueariam as portas dos maiores grupos económic os.
Nunc devemos esquec o c
a er aso de Joaquim Ferreira do Amaral que, depois de negoc a ruinosa parc
iar eria para a
construção e exploração da ponte Vasc da Gama, foi dirigir a empresa c essionária, a Lusoponte. Em 15 anos,
o onc
aumentou os seus rendimentos anuais em 328%. Ainda assim um número humilde, quando c omparado c alguns
om
dos seus c olegas. Há c asos c omo os de Armando Vara ou Fernando Gomes, em que é o seu partido a colocá-los
diretamente nas empresas, sejam elas privadas, públic ou c partic
as om ipação do Estado. Há outros em que se dedic am
ao puro tráfic de influênc
o ias. E outros em que recebem a recompensa do dinheiro que fizeram o Estado perder em
favor de interesses privados.
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Os nossos políticos não são nem mais nem menos honestos do que os de outros países. Como sempre, é a ocasião que
faz o "ladrão". O problema é estrutural. E ele tem a ver com uma cultura de promiscuidade entre as empresas
privadas e o Estado. Que tem dois sentidos. Um Estado permeável a todas as pressões - veja-se o tratamento de
exceção fiscal que continua a ser dado à banca - e um sector empresarial pendurado no Estado. Se lermos os
contratos das Parcerias Público-Privadas - recomendo mais uma vez a leitura de "Como o Estado gasta o nosso
dinheiro", do juíz do Tribunal de Contas Carlos Moreno - e se analisarmos os processos de privatizações (sobretudo
a de empresas que detêm monopólios naturais), percebemos como a nossa elite económica mantém a sua tradicional
cultura rentista. Nunca quiseram menos Estado. E não é agora que o vão querer. Querem é o Estado fraco, permeável a
pressões e anorético para os cidadãos.
Em tempo de vacas magras isto vai piorar. Se há menos para distribuir ficarão eles com tudo. Razão pela qual, mais do
que estar atento às moralmente escandalosas - mas insignificantes para os valores de que falei neste texto - reformas
dos políticos, devemos estar atentos às decisões que eles tomam. E não nos deixarmos perder com o acessório. O
dinheiro que perdemos agora não será pago a quem nos rouba em reformas ou mordomias do Estado. Será pago
com salários milionários em grupos empresariais privados para quem vende a nossa democracia em troca de
carreiras interessantes. Os nomes destas pessoas interessam. Mas interessa mais saber o que torna isto possível.
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