Este documento descreve as tentativas frustradas de várias pessoas em ensinar uma menina a ler, incluindo futuras professoras, um professor de gramática e uma professora de sociolinguística. Apenas um vendedor de cocadas teve sucesso em ler uma história para a menina.
7. Puxando um caderninho da bolsa, a
moça escreveu Elisabete e deu à
criança.
Aqui está o seu nome:ELISABETE.
Vamos ver apontando com o dedinho.
Apontando as nove letras, a menina
leu: Elisabete Maria de Oliveira.
A jovem ficou embatucada e anotou a
resposta para ir perguntar como
interpretála à professora de
psicogênese da língua escrita.
Tchau, querida! Outro dia eu te ensino,
ok?
8. Não demorou muito, passou outra jovem
simpática e a criança lhe pediu:
Me conta a história!
Que gracinha! Eu conto se você me responder
umas perguntas.
A criança olhou ressabiada.
Você já sabe as letras do alfabeto?
Não.
Você conhece as famílias silábicas?
Quê?
Deixa pra lá. Me diga uma palavra que começa
com pa. Por exemplo: pato, papai, palácio.
Rei, princesa.
Quê?
9. Palácio, rei, princesa.
A futura professora suspirou. Saiu dali
muito triste, achando que a menina era
muito bonitinha, mas não tinha
discriminação auditiva.
Daí a meia hora, passou um professor
de gramática, cansado e meio calvo,
andando devagar. A menina resolveu
tentar a sorte.
11. A menina fechou o livro com força e fez
uma careta de nojo para o gramático. Ele
respondeu:
Atrevida! Analfabeta! Iletrada! Anômala!
Anojosa! Anacoluto! E retirouse, muito
satisfeito de possuir um vasto vocabulário
para qualificar a pirralha.
Passou um tempinho, veio pela calçada
uma professora de sociolinguística, com
seu gravador a tiracolo, e a menina
resolveu tentar a sorte:
Tia, me conta a história?
12. Fala de novo meu bem, disse a professora
e ligou o gravador. Estava fazendo uma
pesquisa sobre dialetos das classes
populares do subúrbio do Rio, de modo que
não podia perder a chance de gravar a fala
de uma criança.
Que que é isso?
Um gravador. Vou gravar o que você
falar. Vamos conversar. Quantos anos você
tem?
Me conta a história?
Depois eu conto. Converse um pouco
comigo.
15. Não, lê pra mim? Disse a menina sem
muita esperança de ser atendida.
Hum, deixa eu ver.
O rapaz abriu o livro. Foi lendo devagar,
como possível, pois tinha aprendido a ler
mal e mal há muito tempo atrás.
Era uma vez, uma menina chamada
Chapeuzinho Vermelho. Um dia, a mãe
dela chachamoua e disse...