A partir da década de 80, a preocupação em avaliar, monitorar e aprimorar o manejo das
unidades de conservação (UCs) tomou força. Desde então, foram desenvolvidas diversas metodologias de avaliação da efetividade do manejo de UCs. O Brasil, como signatário da Convenção sobre a Diversidade Biológica, assumiu compromissos nessa área. Dessa forma, este estudo analisou como essas avaliações vêm sendo realizadas no Brasil, e se estas experiências têm contribuído para a melhoria das UCs. Para tanto, foi realizado um levantamento bibliográfico sobre as aplicações de ferramentas no Brasil, a sistematização e análise dessas informações, além da realização de entrevistas junto a especialistas. Foram identificadas 12 ferramentas de avaliação da efetividade de manejo utilizadas no Brasil. A comparação entre os resultados dessas diferentes experiências não é confiável, pois as ferramentas são bastante heterogêneas entre si, o que dificulta a criação de um banco de dados único. Foram levantadas 66 experiências de avaliação no Brasil, realizadas entre os anos de 1997 e 2011, por 49 autores, através de 54 publicações. Aproximadamente 860 UCs foram avaliadas. Algumas delas por mais de uma vez, totalizando 1.821 exercícios de avaliação individuais. A maioria das experiências apresentou caráter pontual e desvinculado de uma preocupação com o monitoramento sistemático e o manejo adaptativo das UCs. Seus resultados ainda estão restritos a grupos específicos e muitos nem chegaram a ser divulgados. Há pouca iniciativa dos órgãos ambientais estaduais em avaliar seus sistemas de UCs e não houve nenhuma iniciativa municipal detectada. Essas avaliações são desvinculadas dos processos de monitoramento dos planos de manejo e não integram bancos de dados. Existem poucas experiências onde essas avaliações são adotadas de forma sistemática, contribuindo para o planejamento e aperfeiçoamento das UCs ou sistemas de UCs. Assim, conclui-se que a
avaliação da efetividade de manejo de UCs no Brasil ainda é incipiente e dissociada de uma política pública central.
Avaliação da efetividade do manejo de UCs no Brasil
1. i
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE ESTUDOS GERAIS
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
Pós-Graduação em Ciência Ambiental
AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO MANEJO DE
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO BRASIL
MABEL LUDKA
2012
2. i
MABEL LUDKA
AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO MANEJO DE UNIDADES DE
CONSERVAÇÃO NO BRASIL
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Ciência Ambiental da
Universidade Federal Fluminense, como
requisito parcial para obtenção do Grau de
Mestre. Área de Concentração: Gestão
Ambiental.
Orientador: Prof. Dr. RODRIGO JESUS DE MEDEIROS
Niterói
2012
3. ii
L944 Ludka, Mabel
Avaliação da efetividade do manejo de unidades de conservação
no Brasil / Mabel Ludka. – Niterói: [s.n.], 2012.
154 f.
Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental) – Universidade
Federal Fluminense, 2012.
1. Gestão Ambiental. 2. Unidades de conservação. 3. Proteção
ambiental. 4. Manejo ambiental. I.Título.
CDD 333.720981
4. iii
MABEL LUDKA
AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO MANEJO DE UNIDADES DE
CONSERVAÇÃO NO BRASIL
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Ciência Ambiental da
Universidade Federal Fluminense, como
requisito parcial para obtenção do Grau de
Mestre. Área de Concentração: Gestão
Ambiental.
Aprovada em 27 de janeiro de 2012.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________________________
Prof. Dr. RODRIGO JESUS DE MEDEIROS - Orientador
UFRRJ
______________________________________________________________________________
Prof. Dr. CLAUDIO BELMOTE DE ATHAYDE BOHRER – Membro da CAP
UFF
______________________________________________________________________________
Prof. Dr. VICTOR EDUARDO LIMA RANIERI
USP
Niterói
2012
5. iv
EPÍGRAFE
“Quem é que tá botando dinamite
Na cabeça do século?
Quem é que tá botando tanto piolho
Na cabeça do século?
Quem é que tá botando tanto grilo
Na cabeça do século?
Quem é que arranja um travesseiro
Pra cabeça do século?”
(Tom Zé)
6. v
AGRADECIMENTOS
Ao meu amor e companheiro, pelo seu apoio incondicional para a realização desse
trabalho.
Ao meu filho, minha principal razão de lutar por um mundo melhor.
À minha mãe, pelo apoio e por ter sempre me incentivado a trilhar o caminho
acadêmico.
Ao meu orientador, pelo apoio e palavras amigas que me incentivaram nos piores
momentos.
À minha irmã, que me ajudou como pôde.
À minha avó, que se preocupou com as minhas preocupações.
A todos os entrevistados que colaboraram com a realização desta pesquisa.
Parabenizo a CAPES, pelo reconhecimento do direito de licença-maternidade às
bolsistas mães.
7. vi
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS .............................................................................................................viii
LISTA DE QUADROS .............................................................................................................ix
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ...............................................................................xi
RESUMO.................................................................................................................................xiii
ABSTRACT ............................................................................................................................xiv
1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................1
2. OBJETIVOS ..........................................................................................................................7
2.1. Objetivo Geral..............................................................................................................................7
2.2. Objetivos Específicos..................................................................................................................7
3. METODOLOGIA..................................................................................................................8
4. UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO BRASIL..............................................................10
4.1. Breve Histórico Sobre as Unidades de Conservação.............................................................10
4.2. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC.................................................17
4.3. Desafios Enfrentados pelas Unidades de Conservação Brasileiras......................................26
5. AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DE MANEJO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO .29
5.1. Termos e Definições..................................................................................................................29
5.2. Breve Histórico Sobre a Avaliação da Efetividade do Manejo de Unidades de Conservação32
5.3. O Referencial Metodológico da Comissão Mundial de Áreas Protegidas (WCPA-IUCN).....35
5.4. O Estudo Global sobre Avaliação de Efetividade de Manejo de Áreas Protegidas ...........41
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO.........................................................................................47
6.1. As Ferramentas de Avaliação da Efetividade do Manejo de Unidades de Conservação
Utilizadas no Brasil ...................................................................................................................47
6.1.1. Efetividade de Manejo de Áreas Protegidas – EMAP (FARIA, 1993, 2004;
CIFUENTES et al., 2000)...............................................................................................48
6.1.2. Grau de Implementação e Vulnerabilidade de Áreas Protegidas Federais Brasileiras
(LEMOS DE SÁ et al., 1999, 2000)...............................................................................60
6.1.3.Perfis de Parque (PARKSWATCH, não publicado).......................................................63
8. vii
6.1.4.Ficha de Avaliação de Consolidação de Parques em Perigo (TNC, 2004; TNC e USAID,
1999, 2003) .....................................................................................................................69
6.1.5.Certificação do Manejo de Unidades de Conservação (PADOVAN, 2001, 2002, 2003) ....71
6.1.6.Avaliação Rápida e Priorização do Manejo de Unidades de Conservação ou “RAPPAM”
(ERVIN, 2003)................................................................................................................76
6.1.7.Como Relatar Avanços nas Unidades de Conservação ou “Management Effectiveness
Tracking Tool” (STOLTON et al., 2003, 2007) .............................................................82
6.1.8.Instrumento Metodológico para Análise de Efetividade das Unidades de Conservação
Marinho-Costeiras do Projeto GIUC/SC (SILVA-FORSEBERG, 2003).......................87
6.1.9.Metodologia de Avaliação da Efetividade das Unidades de Conservação Costeiras e
Marinhas no Ambiente Recifal Brasileiro (PRATES, 2003)..........................................91
6.1.10. Ficha de Avaliação do Estado do Manejo (TNC, não publicado)................................94
6.1.11. Indicadores de Efetividade da Implementação de Unidades de Conservação Estaduais
do Amazonas (SDS/SEAPE, 2006).................................................................................97
6.1.12. Ferramenta de Avaliação da Efetividade de Unidades de Conservação – FAUC
(MMA/PROGRAMA ARPA, não publicada) ..............................................................102
6.2. Análise das Características e Estrutura das Ferramentas de Avaliação da Efetividade do
Manejo de Unidades de Conservação Utilizadas no Brasil ..............................................104
6.3. Análise das Experiências de Aplicação das Ferramentas de Avaliação da Efetividade do
Manejo de UCs no Brasil........................................................................................................115
7. CONCLUSÕES .................................................................................................................129
8. RECOMENDAÇÕES........................................................................................................131
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................132
ANEXOS................................................................................................................................149
9. viii
LISTA DE FIGURAS
Página
Figura 1: Evolução do número e extensão de áreas protegidas no mundo.............................. 12
Figura 2: Criação de Unidades de Conservação Federais por década (1930 a 2005)............. 14
Figura 3: Evolução do SNUC em número de unidades de conservação e área (Km²).............23
Figura 4: Número de UCs sob regime de proteção integral e uso sustentável, nas esferas
federal, estaduais, municipais e no total do SNUC. ................................................24
Figura 5: Área de UCs sob regime de proteção integral e uso sustentável, nas esferas federal,
estaduais, municipais e no total do SNUC...............................................................24
Figura 6: Área de UCs sob regime de proteção integral e uso sustentável nos diferentes
biomas brasileiros.....................................................................................................25
Figura 7: Ciclo de Gestão e Avaliação adotado pela WCPA-IUCN.......................................37
Figura 8: Aplicação das diferentes ferramentas nos continentes..............................................44
Figura 9: Distribuição das pontuações médias das avaliações utilizadas no estudo global......46
Figura 10: Proporção de elementos do referencial metodológico da WCPA-IUCN em relação
à quantidade de indicadores das ferramentas.........................................................111
Figura 11: Proporção de elementos do referencial metodológico da WCPA-IUCN entre as
ferramentas analisadas............................................................................................111
Figura 12: Ferramentas utilizadas nas 66 experiências de avaliação da efetividade de manejo
de UCs no Brasil................................................................................................... 116
Figura 13: Número de exercícios individuais de avaliação de UCs através das diferentes
ferramentas, num total de 1.821 UCs.....................................................................117
Figura 14: Proporção entre as categorias UCs de Proteção Integral (PI) e Uso Sustentável
(US), em relação ao total de unidades avaliadas....................................................117
Figura 15: Categorias de proteção integral avaliadas.............................................................118
Figura 16: Categorias de uso sustentável avaliadas................................................................118
Figura 17: Proporção de UCs avaliadas nas diferentes categorias de manejo (incluindo
repetições) em relação ao número de UCs existentes...........................................119
Figura 18: Experiências de avaliação por região....................................................................120
Figura 19: Número de UCs avaliadas por região (total de 1.821 UCs)..................................120
Figura 20: Agentes responsáveis pelas iniciativas das 66 avaliações.....................................121
Figura 21: Agentes responsáveis pelas avaliações das 1.821 UCs.........................................121
Figura 22: Participação do Governo e ONGs nas avaliações institucionais...........................122
Figura 23: Número de avaliações sofridas pelas UCs, num total de 1.821 exercícios de
avaliação individual................................................................................................125
Figura 24: Divulgação das experiências de avaliação............................................................127
10. ix
LISTA DE QUADROS
Página
Quadro 1 - Resumo das categorias de unidades de conservação do SNUC. .......................... 21
Quadro 2 - Resumo do Referencial Metodológico de Avaliação da Efetividade de Manejo de
Áreas Protegidas e Sistemas de Áreas Protegidas da WCPA-IUCN ....................37
Quadro 3 - Diferentes ferramentas de avaliação da efetividade de manejo de UCs existentes
no mundo................................................................................................................41
Quadro 4 - Ferramentas de avaliação aplicadas no Brasil........................................................47
Quadro 5 - Indicadores utilizados na ferramenta EMAP – Faria, 1993....................................51
Quadro 6 - Indicadores utilizados na ferramenta EMAP – Cifuentes et al., 2000...................53
Quadro 7 - Indicadores utilizados na ferramenta EMAP – Faria, 2004....................................55
Quadro 8 - Descritores de qualidade utilizados na ferramenta EMAP – Faria, 1993..............56
Quadro 9 - Escala para qualificação da efetividade de manejo da ferramenta EMAP – Faria,
1993........................................................................................................................57
Quadro 10 - Escala para qualificação da efetividade de manejo da ferramenta EMAP
Cifuentes et al., 2000.............................................................................................57
Quadro 11 - Escala de qualificação da efetividade de manejo da ferramenta EMAP –Faria
2004........................................................................................................................58
Quadro 12 - Temas e questões utilizados pela ferramenta de Lemos de Sá e colaboradores..61
Quadro 13 - Exemplo de pontuação ferramenta de Lemos de Sá e colaboradores...................62
Quadro 14 - Sistema de classificação utilizado pela ferramenta de Lemos de Sá e
colaboradores.........................................................................................................62
Quadro 15 - Indicadores utilizados na ferramenta Perfis de Parques.......................................64
Quadro 16 - Questões de avaliação do indicador “plano de manejo”.......................................66
Quadro 17 - Critérios de pontuação do indicador “plano de manejo”......................................67
Quadro 18 - Sistema de pontuação para a extensão e intensidade das ameaças......................67
Quadro 19 - Sistema de classificação utilizado pela ferramenta Perfis de Parques................68
Quadro 20 - Indicadores utilizados na ferramenta Ficha de Avaliação de Consolidação de
Parques em Perigo..................................................................................................70
Quadro 21 - Pontos de referência do critério “plano de manejo”.............................................70
Quadro 22 - Sistema de classificação utilizado pela ferramenta Ficha de Avaliação de
Consolidação de PeP..............................................................................................71
Quadro 23 - Indicadores utilizados na ferramenta Certificação do Manejo de Unidades de
Conservação...........................................................................................................73
Quadro 24 - Alternativas da escala de valoração da ferramenta Certificação do Manejo de
Unidades de Conservação......................................................................................75
Quadro 25 - Escala de classificação para a avaliação do desempenho do manejo das Unidades
de Conservação......................................................................................................75
Quadro 26 - Indicadores utilizados na ferramenta RAPPAM...................................................78
Quadro 27 - Alternativas de pontuação da ferramenta RAPPAM.............................................80
Quadro 28 - Alternativas de pontuação das questões de pressão e ameaça da ferramenta
RAPPAM................................................................................................................80
11. x
Quadro 29 - Ficha 1 da ferramenta Tracking Tool....................................................................83
Quadro 30 - Ficha 2 da ferramenta Tracking Tool....................................................................83
Quadro 31 - Formulário de avaliação da ferramenta Tracking Tool.........................................85
Quadro 32 - Alternativas de pontuação da ferramenta Tracking Tool......................................86
Quadro 33 - Indicadores utilizados na análise de efetividade do Projeto GIUC/SC................89
Quadro 34 - Alternativas de pontuação utilizadas pela ferramenta do Projeto GIUC/SC........90
Quadro 35 - Escala de qualificação utilizada pela ferramenta do Projeto GIUC/SC................90
Quadro 36 - Indicadores utilizados na Metodologia de Avaliação da Efetividade das Unidades
de Conservação Costeiras e Marinhas no Ambiente Recifal Brasileiro.................92
Quadro 37 - Alternativas de pontuação utilizadas na Metodologia de Avaliação da Efetividade
das Unidades de Conservação Costeiras e Marinhas no Ambiente Recifal
brasileiro.................................................................................................................94
Quadro 38 - Esquema geral da Avaliação Medida do Estado Ecorregional.............................95
Quadro 39 - Indicadores utilizados pela Avaliação do Estado do Manejo...............................96
Quadro 40 - Ponderação das variáveis de classificação............................................................96
Quadro 41 - Indicadores utilizados pela ferramenta Indicadores de Efetividade da
Implementação de Unidades de Conservação Estaduais do
Amazonas...............................................................................................................98
Quadro 42 - Opções de classificação da Ferramenta Indicadores de Efetividade da
Implementação de Unidades de Conservação Estaduais do Amazonas.............101
Quadro 43 - Estrutura do questionário de avaliação com itens de pontuação das ferramentas
analisadas.............................................................................................................108
12. xi
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
a.C. - Antes de Cristo
ANOVA - Análise de Variância
ARPA - Áreas Protegidas da Amazônia
CATIE - Centro Agronômico Tropical de Pesquisa e Ensino da Costa Rica
CDB - Convenção sobre a Diversidade Biológica
CEUC/AM - Centro Estadual de Unidades de Conservação do Amazonas
CNUC - Cadastro Nacional de Unidades de Conservação
CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONABIO - Comissão Nacional de Biodiversidade
COP - Conferência das Partes
DAP - Diretoria de Áreas Protegidas
EMAP - Efetividade de Manejo de Áreas Protegidas
FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (Food and
Agriculture Organization)
FATMA/SC - Fundação de Meio Ambiente de Santa Catarina
FAUC - Ferramenta de Avaliação da Efetividade de Unidades de Conservação
FBCN - Fundação Brasileira para Conservação da Natureza
FF-SP – Fundação Florestal do Estado de São Paulo
FSC - Conselho de Manejo Florestal
FUNATURA - Fundação Pró-Natureza
GEF - Fundo para o Meio Ambiente Global (Global Environment Fund)
GESPÚBLICA - Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização
GIUC - Gestão Integrada de Unidades de Conservação Marinho-Costeiras
GT - Grupo de Trabalho
IAP - Instituto Ambiental do Paraná
IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
IBDF - Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal
ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
IEF-MG - Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais
IF-SP - Instituto Florestal do Estado de São Paulo
IUCN - União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais
(International Union for Conservation of Nature)
KFW - Banco de Desenvolvimento da Alemanha (Kreditanstalt für Wiederaufbau)
MMA - Ministério do Meio Ambiente
ONG - Organização Não-Governamental
PNAP - Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PROBIO - Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica
PROMATA - Projeto de Proteção da Mata Atlântica
13. xii
RAPPAM - Avaliação Rápida e Priorização do Manejo de Unidades de Conservação (Rapid
Assessment and Prioritization of Protected Área Management)
SDS/AM - Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do
Amazonas
SEAPE/AM - Secretaria Executiva Adjunta de Projetos Especiais
SEMA - Secretaria Especial de Meio Ambiente
SIG - Sistema de Informações Geográficas
SIMBIO - Sistema de Monitoramento da Biodiversidade em Unidades de Conservação
Federais
SISARPA- Sistema de Coordenação e Gerenciamento do Programa ARPA
SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação
SUDEPE - Superintendência do Desenvolvimento da Pesca
SUDHEVEA - Superintendência para o Desenvolvimento da Borracha
TCMRJ - Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro
TNC - The Nature Conservancy
UC - Unidade de Conservação
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (United
Nations Educational, Scientific and Cultural Organization)
USAID - Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional (United States Agency
for International Development)
WCMC - Centro Mundial de Monitoramento da Conservação (World Conservation
Monitoring Centre)
WCPA - Comissão Mundial de Áreas Protegidas (World Comission on Protected Areas)
Brasileira
WDPA - Banco de Dados Mundial sobre Áreas Protegidas (World Database on Protected
Areas)
WWF- Fundo Mundial para a Natureza (World Wide Fund for Nature)
14. xiii
RESUMO
A partir da década de 80, a preocupação em avaliar, monitorar e aprimorar o manejo das
unidades de conservação (UCs) tomou força. Desde então, foram desenvolvidas diversas
metodologias de avaliação da efetividade do manejo de UCs. O Brasil, como signatário da
Convenção sobre a Diversidade Biológica, assumiu compromissos nessa área. Dessa forma,
este estudo analisou como essas avaliações vêm sendo realizadas no Brasil, e se estas
experiências têm contribuído para a melhoria das UCs. Para tanto, foi realizado um
levantamento bibliográfico sobre as aplicações de ferramentas no Brasil, a sistematização e
análise dessas informações, além da realização de entrevistas junto a especialistas. Foram
identificadas 12 ferramentas de avaliação da efetividade de manejo utilizadas no Brasil. A
comparação entre os resultados dessas diferentes experiências não é confiável, pois as
ferramentas são bastante heterogêneas entre si, o que dificulta a criação de um banco de dados
único. Foram levantadas 66 experiências de avaliação no Brasil, realizadas entre os anos de
1997 e 2011, por 49 autores, através de 54 publicações. Aproximadamente 860 UCs foram
avaliadas. Algumas delas por mais de uma vez, totalizando 1.821 exercícios de avaliação
individuais. A maioria das experiências apresentou caráter pontual e desvinculado de uma
preocupação com o monitoramento sistemático e o manejo adaptativo das UCs. Seus
resultados ainda estão restritos a grupos específicos e muitos nem chegaram a ser divulgados.
Há pouca iniciativa dos órgãos ambientais estaduais em avaliar seus sistemas de UCs e não
houve nenhuma iniciativa municipal detectada. Essas avaliações são desvinculadas dos
processos de monitoramento dos planos de manejo e não integram bancos de dados. Existem
poucas experiências onde essas avaliações são adotadas de forma sistemática, contribuindo
para o planejamento e aperfeiçoamento das UCs ou sistemas de UCs. Assim, conclui-se que a
avaliação da efetividade de manejo de UCs no Brasil ainda é incipiente e dissociada de uma
política pública central.
Palavras-Chave: Unidades de Conservação, Áreas Protegidas, Gestão Ambiental, Avaliação
da Efetividade de Manejo.
15. xiv
ABSTRACT
Management Effectiveness Assessment of Protected Areas in Brazil
The concern to evaluate, monitor and improve the management of Protected Areas (PAs) was
enforced during the 80’s. Since then, several evaluation methodologies to assess the
management effectiveness of PAs were developed. Brazil, as a member of the Convention on
Biological Diversity, has made commitments in this area. Therefore, this study examined how
these assessments are being undertaken in Brazil, and if these experiences have contributed to
the improvement of PAs. For that purpose, a literature review was conducted on the
application of tools in Brazil, followed by a systematization and analysis of such information,
as well as interviews with experts. Twelve management effectiveness assessment tools were
identified. The comparison among their results is unreliable, because these tools are very
heterogeneous, making it difficult to create a single database. Between 1997 and 2011, 66
assessments experiences by 49 authors over 54 publications were identified. Approximately
860 PAs were evaluated. Some of them have been evaluated more than once, totaling 1821
individual assessment exercises. Most of the experiments were punctual and disconnected
with the preoccupation of a systematic monitoring and adaptive management of protected
areas. Their results are still restricted to specific groups and many were not even disclosed.
There is little initiative of state environmental agencies to evaluate their systems of PAs and
no initiative at municipal level was detected. These assessments are disconnected from
monitoring processes of management plans and do not integrate databases. There are few
experiences where such assessments are adopted in a systematic manner, contributing to the
planning and improvement of PAs or PA systems. Thus, it can be concluded that the
management effectiveness evaluation of protected areas in Brazil is still incipient and
separated from a central policy.
Keywords: Protected areas, Environmental Management, Management Effectiveness
Assessment.
16. 1
1. INTRODUÇÃO
É com grande vigor que se debate a gravidade dos atuais problemas ambientais. Um
dos maiores desafios deste século para a humanidade tem sido evitar a extinção em massa das
espécies, ameaçadas pela crescente expansão das atividades humanas no planeta (PEREIRA
et al., 2010, KUUSSAARI, et al., 2009; DUDGEON et al., 2006;). A partir da revolução
industrial, a capacidade humana de intervenção nos ambientes naturais vem aumentando
exponencialmente. Atualmente, as bilhões1
de pessoas existentes degradam o planeta a um
ritmo muito mais rápido que alguns milhares de pessoas fizeram no passado, com
instrumentos de madeira e pedra, em escala local (DIAMOND, 2007). As atividades
produtivas, como mineração, construção de estradas e barragens, monoculturas de larga
escala, pecuária extensiva, pesca predatória, caça ilegal, expansão urbana etc., são a principal
causa de mudanças no uso do solo e superexploração dos recursos naturais. Geram impactos
como desmatamento, incêndios florestais, fragmentação de hábitats, poluição de água, ar e
solo, propagação de espécies exóticas invasoras, dentre outros. Estes fatores ocasionam uma
acelerada taxa de extinção de espécies, documentada em valores muito superiores aos níveis
pré-humanos, que não aparenta diminuir (BUTCHART et al., 2010; CHAPIN et al., 1998).
Desde o surgimento da primeira forma de vida no planeta, estimada em cerca de 3,8 bilhões
de anos atrás, ocorreram cinco grandes eventos de extinção em massa de espécies. Alguns
cientistas consideram que as atividades humanas configuram o sexto grande evento de
extinção da diversidade biológica no planeta (QUAMMEN, 2008; WAKE e VREDENBURG,
2008).
A diversidade biológica está diretamente ligada à estabilidade no funcionamento dos
ecossistemas e sua resiliência frente às perturbações ambientais. Não por acaso, grandes
desequilíbrios ambientais têm sido enfrentados em todos os continentes, tais como grandes
secas ou enchentes, empobrecimento de solos, desertificação, explosões de pragas,
diminuição no pescado, dentre outros. Muitas vezes, estes são fontes de múltiplos conflitos,
demonstrando como a sobrevivência do ser humano - como espécie - é dependente da
manutenção e integridade de áreas naturais biodiversas. Civilizações inteiras sofreram colapso
no passado, por não superarem seus problemas ambientais. Essas experiências não serviram
1
Population Reference Bureau (2011)
17. 2
como aprendizado para evitarmos destinos igualmente imprudentes no presente (DIAMOND,
2007).
Por milhares de anos os povos reconheceram os valores especiais ligados a espaços
geográficos, suas fontes de recursos naturais, mitos e ocorrências históricas, tomando medidas
para protegê-los, no que hoje conhecemos como áreas protegidas (MILLER, 1997). No
mundo contemporâneo, a delimitação de áreas naturais para proteção tomou força com a
criação do Parque Nacional de Yellowstone em 1872, nos Estados Unidos. A partir desse
marco, estas vêm sendo criadas em número crescente ao longo dos anos em diversos países.
Há cerca de quatro décadas atrás, acadêmicos, políticos, empresários e membros da sociedade
em geral perceberam que os problemas ambientais estavam intimamente ligados às questões
sociais e econômicas. Essa preocupação tornou-se objeto de conferências mundiais acerca do
tema, organizadas pelas Nações Unidas desde 1972. Buscando meios de conciliar o
desenvolvimento socioeconômico com a conservação dos ecossistemas, a Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em 1992, no Rio de
Janeiro, teve como produtos a Agenda 21; a Carta da Terra; a Declaração de Princípios
sobre Florestas; a Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento; a Convenção-
Quadro sobre Mudança do Clima; a Convenção de Combate à Desertificação; e a Convenção
sobre a Diversidade Biológica.
A Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB) é atualmente um dos principais
instrumentos internacionais relacionados ao meio ambiente, possuindo 193 países-membros
(CDB, 2011). Esta assume a manutenção da diversidade biológica como parte integrante do
desenvolvimento sustentável, estabelecendo normas e princípios. Tem como objetivos a
conservação da biodiversidade, seu uso sustentável e a justa repartição dos benefícios
provenientes do uso econômico dos recursos genéticos (CDB, 1992). Como anfitrião do
evento, o Brasil foi um dos primeiros países a assiná-la, tendo sido ratificada pelo Congresso
Brasileiro em 1994 (BRASIL, 1994). A Convenção estabeleceu a importância de proteger a
biodiversidade em três níveis: dentro de espécies (variabilidade genética), entre espécies e de
ecossistemas. Também reconheceu dois tipos principais de conservação: ex situ, em que a
capacidade reprodutiva dos organismos é protegida fora de onde ocorrem naturalmente2
; e in
situ, no qual os ecossistemas e hábitats naturais são preservados e mantêm populações
viáveis. O artigo 8º do texto base da CDB reconhece o papel preponderante das áreas
2
p. ex. jardins botânicos, bancos de germoplasma, jardins zoológicos, aquários, criadouros conservacionistas etc.
18. 3
protegidas para a conservação in situ, ao convocar os países signatários a estabelecerem e
manterem um sistema representativo de áreas protegidas (CDB, 1992).
No Brasil, o termo áreas protegidas engloba as áreas de preservação permanente,
reservas legais, terras indígenas e territórios quilombolas, unidades de conservação e áreas de
reconhecimento internacional (BRASIL, 1965; BRASIL, 2000; BRASIL, 2006; MEDEIROS,
2006). Dentre todas essas tipologias de áreas protegidas, a unidade de conservação (UC) é a
que apresenta maior reconhecimento e visibilidade (MEDEIROS e GARAY, 2006).
Seguindo o compromisso firmado através da CDB, a principal estratégia brasileira de
proteção da diversidade biológica vem sendo o estabelecimento de UCs. Assim, após oito
anos de tramitação no legislativo, nosso Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC) foi oficialmente instituído no ano 2000 (BRASIL, 2000). Dois anos depois, foi criada
a Política Nacional de Biodiversidade, promovendo ações de conservação in situ da
biodiversidade dos ecossistemas em UCs (BRASIL, 2002). Em 2006, em resposta a
compromissos assumidos junto à CDB, foi publicado o Plano Estratégico Nacional de Áreas
Protegidas (PNAP)3
, dando orientações para o estabelecimento de um sistema abrangente de
áreas protegidas, ecologicamente representativo e efetivamente manejado até o ano de 2015
(BRASIL, 2006).
Em função do plano estratégico para 2010 da CDB, a Comissão Nacional de
Biodiversidade (CONABIO) definiu como meta nacional a proteção legal, através de UCs, de
pelo menos 30% da Amazônia e 10% dos outros biomas até 2010 (MMA, 2010a). A criação
da primeira UC no Brasil ocorreu no ano de 18964
, e desde então diversas unidades vêm
sendo criadas pelas três esferas de governo. No entanto, somente nos últimos vinte e cinco
anos houve um aumento considerável em número e extensão de unidades criadas (MMA,
2009). Em 2010, o SNUC contava com 3.060 UCs, dentre federais, estaduais, municipais e
privadas, protegendo cerca de 1.539.416 Km², correspondente a 17,42% do território
continental e 3,14% das áreas costeiras e marinhas5
(MMA, 2010a). Atualmente, o Brasil é o
país com a maior extensão de áreas protegidas terrestres e marinhas (UN STATISTICS
DIVISION, 2010), tendo sido responsável por 74% das áreas protegidas mundiais criadas
entre 2003 e 2008 (JENKINS e JOPPA, 2009). Considerando que a conservação em países de
megadiversidade enfrenta o desafio de evitar a perda de espécies que sequer conhecemos
3
Decreto nº 5.758, de 13 de abril de 2006.
4
Parque Estadual Alberto Löfgren, na cidade de São Paulo, criado pelo Decreto nº 335 de 1896 (FF-SP/IF-SP, 2009).
5
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, esses números são estimados a partir do Cadastro Nacional de Áreas Protegidas,
cujas informações são fornecidas por agências ambientais estaduais e ONGs, podendo haver sobreposições; de dados do IBGE,
podendo estar subestimados; e estimativas do Departamento de Áreas Protegidas do MMA (MMA, 2010).
19. 4
(LEWINSOHN e PRADO, 2005); que o Brasil é o país com a maior diversidade de espécies
do mundo (BRANDON et al., 2005; LEWINSOHN e PRADO, 2005; MMA, 2010), detentor
da maior extensão de florestas tropicais do planeta (UN STATISTICS DIVISION, 2010),
podemos classificar essa meta como acanhada. No entanto, esta ainda não foi totalmente
alcançada, apesar de alguns avanços. Para os biomas Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado
tivemos o cumprimento de 90,33%, 89,91% e 84,27% da meta, respectivamente, mas nos
outros biomas o percentual ficou aquém do desejado (MMA, 2010a). Além disso, na última
conferência das partes da CDB (COP-10), foi lançado o Plano Estratégico para a
Biodiversidade 2011-2020 (Decisão X/2), visando a proteção legal de pelo menos 17% dos
ecossistemas terrestres, e de pelo menos 10% de áreas costeiras e marinhas (CDB, 2010a).
Dessa forma, ainda mais áreas devem ser acrescentadas ao SNUC. Contraditoriamente, mais
do que nunca, tem sido necessário justificar a criação de novas unidades de conservação e o
bom funcionamento das já existentes, visto que os recursos públicos para sua efetiva
implantação e manejo são destinados em níveis muito abaixo do necessário (MILANO, 2002).
E assim, gestores de órgãos ambientais, acadêmicos, membros de Organizações Não-
Governamentais (ONGs) e da sociedade em geral vêm questionando o cumprimento das
políticas de conservação existentes, e a forma em que as unidades de conservação têm sido
criadas e mantidas.
Além de existirem em quantidade insuficiente para a efetiva conservação da
megadiversidade biológica brasileira, nossas UCs ainda não atingiram plenamente seus
objetivos de criação. Sofrem severas ameaças, como invasões, incêndios criminosos ou
exploração inadequada de seus recursos naturais. Assim sendo, a simples decretação de uma
área como UC, com seu posterior abandono, não é o suficiente para garantir sua integridade
ecológica em longo prazo. Contar com UCs como estratégia de conservação da biodiversidade
só faz sentido se houver uma probabilidade razoável de que tais áreas possam ser protegidas
em um futuro próximo (PAVESE et al., 2007).
Tem sido um hábito latino americano criar UCs e abandoná-las à sua própria sorte
(DOUROJEANNI e PÁDUA, 2007), resultando nos chamados “parques de papel”, que nunca
são implementados na prática. A gestão precária das UCs brasileiras tem sido explicada pela
falta de vontade política e de prioridade do governo, entraves financeiros e ausência de
instrumentos adequados de planejamento (DOUROJEANNI e PÁDUA 2007). Para a criação
e efetiva implementação de uma UC, ou de um sistema de UCs, são necessários gastos
consideráveis para cobrir os custos relacionados à pessoal, administração, equipamentos,
planos de manejo, execução de programas de gestão, demarcação, regularização fundiária,
20. 5
entre outros (MUANIS et al., 2009). Um estudo global sobre a efetividade do manejo de UCs
apontou que a grande maioria das UCs se encontra num nível de gestão inadequado a básico
(LEVERINGTON et al., 2008a). No Brasil esta condição não é diferente, conforme apontam
diversos estudos (FARIA, 1997; LEMOS DE SÁ et al., 1999; BRITO, M.A., 2000; UCHÔA
NETO e SILVA, 2002; FARIA 2004; IBAMA, 2007). Porém, o abandono dos “parques de
papel” pode ser evidenciado a partir da iniciativa de se expor metodologicamente as
deficiências do sistema (FARIA, 1997).
Assim, avaliar a efetividade do manejo de unidades de conservação é uma forma de
ponderar como seus gestores e colaboradores desempenham as ações necessárias para o
alcance de seus objetivos de criação (CIFUENTES et al., 2000). Essas avaliações permitem
visualizar o grau de implementação e desenvolvimento das ações de manejo, expondo a
eficiência no uso dos recursos disponíveis e as questões que necessitam de maior atenção
(FARIA, 2004). Dessa forma, são bastante apropriadas para a geração de informações
voltadas às pessoas que tomam decisões e influenciam na gestão das UCs, e, por conseguinte,
na efetividade da conservação da diversidade biológica nelas inseridas (HOCKINGS et al.,
2006).
As primeiras tentativas de avaliar e monitorar a efetividade do manejo de UCs
surgiram na década de 80. Desde então, diversos autores desenvolveram metodologias para
essa finalidade (CIFUENTES et al., 2000). Com a intenção de unificar esses esforços
dispersos, a Comissão Mundial de Áreas Protegidas (WCPA) da União Internacional para a
Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN) lançou, em 2000, um referencial
metodológico, cuja utilização é recomendada aos países para o desenvolvimento de suas
próprias ferramentas de avaliação (HOCKINGS et al., 2000).
Em 2004, durante o sétimo encontro das partes da CDB (COP–7) foi adotado um
programa de trabalho, cujo um dos objetivos tratava da avaliação e aprimoramento da
efetividade do manejo das áreas protegidas (Decisão VII/28) (CDB, 2004). Para o
cumprimento deste, e valendo-se do referencial metodológico da WCPA-IUCN, os países
foram recomendados a desenvolver e adotar métodos adequados para a avaliação da
efetividade do manejo de suas áreas protegidas até 2006, com um banco de dados associado; e
a realizar a avaliação de pelo menos 30% de suas áreas protegidas até 2010, utilizando esses
resultados em seus ciclos de planejamento (CDB, 2004). O Brasil incorporou essas
recomendações no PNAP (BRASIL, 2006), através do objetivo de avaliar e promover a
efetividade, eficácia e eficiência do SNUC. Entretanto, avaliar a efetividade do manejo de
nossas UCs não deve ser uma ação empreendida somente para atender a compromissos
21. 6
internacionais. As organizações públicas têm o dever de apresentar um bom desempenho a
baixo custo em resposta à sociedade, que possui aspirações quanto à qualidade de vida das
gerações atuais e futuras. A situação das unidades de conservação brasileiras, de modo geral,
reflete as profundas raízes no patrimonialismo, carência de transparência pública, de cultura
organizacional, e de articulação entre políticas setoriais na gestão pública como um todo
(ARAÚJO, 2007).
Assim, este estudo pretende analisar a forma com que as avaliações de efetividade de
manejo das UCs têm sido empreendidas no Brasil. Estas vêm sendo realizadas de modo
sistemático nos sistemas federal, estadual e municipal de UCs, e integram o processo de
gestão, permitindo a correção de ações, ou as experiências atuais são um somatório de
esforços individuais e pontuais? De quem partiu a iniciativa de se avaliar? Quais são as
ferramentas de avaliação utilizadas, o que as difere e quais critérios envolveram sua escolha?
Seus resultados são comparáveis e permitem a criação de um banco de dados nacional para
avaliar e monitorar o sistema de UCs como um todo? Essas avaliações têm trazido benefícios
concretos às UCs, ao evidenciarem suas deficiências aos tomadores de decisão? A
identificação destes e de outros aspectos permitirá demonstrar não somente até que ponto o
país internalizou as preocupações internacionais de proteção da biodiversidade, mas também
evidenciar sua responsabilidade na gestão do maior patrimônio de biodiversidade do mundo.
22. 7
2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo Geral
Analisar como as avaliações de efetividade de manejo de unidades de conservação têm
sido empreendidas no Brasil, e qual sua contribuição para o aprimoramento da gestão tanto de
unidades de conservação singulares como do sistema como um todo.
2.2. Objetivos Específicos
Examinar se as avaliações empreendidas a partir de diferentes ferramentas permitem
ser comparadas, buscando o aprofundamento dos conhecimentos a respeito dessas
metodologias;
Identificar as experiências realizadas no Brasil, analisando e comparando suas
características a fim de traçar um perfil brasileiro da avaliação da efetividade de manejo de
UCs;
Verificar junto aos profissionais da área os diferentes entendimentos sobre as
experiências de avaliação da efetividade de manejo de UCs, os motivos que envolveram a
escolha das ferramentas de avaliação, sua funcionalidade, e a influência de seus resultados na
melhoria da gestão das UCs e do sistema de UCs.
23. 8
3. METODOLOGIA
Para o alcance dos objetivos deste estudo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica
sobre o tema avaliação da efetividade de manejo de unidades de conservação. Estas
informações foram obtidas em livros, artigos, dissertações, teses, trabalhos publicados em
eventos relacionados, dispositivos legais, relatórios técnicos institucionais, dentre outros. A
busca foi feita em páginas eletrônicas institucionais, assim como através de bases de dados
eletrônicas, como o portal de periódicos da CAPES, Web of Science, Google Acadêmico,
dentre outras. Também foi realizado contato direto com autores e profissionais da área, que
colaboraram com o envio das publicações solicitadas.
As experiências de avaliação da efetividade de manejo de UCs empreendidas em
território nacional foram então levantadas e selecionadas apenas as que fizeram uso de uma
ou mais ferramentas de avaliação consagradas ou propostas, no caso, com a descrição da
metodologia no corpo do trabalho, explicitando os critérios, indicadores e sistema de
pontuação e classificação utilizados. As experiências selecionadas foram organizadas em uma
matriz, identificando-se quantas e quais UCs foram avaliadas, localização, categorias segundo
o SNUC, ano do estudo, ferramentas de avaliação utilizadas, forma de divulgação da
experiência e os agentes responsáveis pela iniciativa. Esses dados foram sistematizados em
tabelas e gráficos, com o intuito de identificar e demonstrar padrões e tendências.
Para aprofundar os conhecimentos sobre as características das ferramentas de
avaliação da efetividade de manejo utilizadas no Brasil, foi feita uma descrição de seus
objetivos, histórico e metodologia. Para compreender o foco da avaliação de cada uma dessas
ferramentas e investigar a possibilidade de comparação entre seus resultados, efetuou-se uma
análise comparativa utilizando para isso sua relação com os elementos do referencial
metodológico da WCPA-IUCN, como forma de balizar a comparação, conforme proposto no
estudo de Cracco e colaboradores, da IUCN-Andes (2006). Para isso, os indicadores de menor
hierarquia foram classificados de acordo com os elementos do referencial metodológico:
contexto, planejamento, insumos, processos, produtos ou resultados. Após esse passo, cada
elemento foi contabilizado e comparado percentualmente em relação ao total de indicadores
que a ferramenta possui. Quando um mesmo indicador abordava dois elementos diferentes,
foi atribuída uma pontuação parcial a cada um.
24. 9
Com as análises e o panorama das avaliações da efetividade do manejo das UCs
brasileiras em mãos, foram verificados os diferentes entendimentos dos profissionais da área
sobre as experiências de avaliação da efetividade de manejo de UCs, aproveitando-se a
oportunidade para aprofundar algumas questões sobre as ferramentas de avaliação. Para
tanto, optou-se pela realização de entrevistas semi-estruturadas, que permitem flexibilidade na
exploração das questões, adaptação ao entrevistado e introdução de novas questões. Assim,
num roteiro de entrevistas composto por perguntas abertas, os sujeitos têm liberdade total para
abordar o assunto sob seu ponto de vista, permitindo tanto a obtenção de informações
objetivas, como subjetivas, referentes às atitudes, opiniões e valores dos indivíduos
entrevistados (MINAYO 1999 apud KATAOKA 20046
). O roteiro de entrevista (anexo I) foi
então elaborado como um eixo orientador para levantar informações sobre a funcionalidade
dessas ferramentas, os motivos que envolveram sua escolha e utilização, e a contribuição
desses processos de avaliação para a melhoria da gestão das UCs.
A seleção dos participantes ocorreu de acordo com seu protagonismo na área:
pesquisadores que desenvolveram ou adaptaram metodologias; profissionais de instituições
públicas ou ONGs que trabalham com a aplicação dessas ferramentas; e gestores de órgãos
públicos ambientais que fazem uso dessas ferramentas. Foram identificados quinze atores
principais para a realização das entrevistas. As entrevistas ocorreram de modo presencial ou
através de conferência de voz, via internet, utilizando-se o programa Skype. As entrevistas
foram gravadas, com a autorização dos entrevistados, por meio de um gravador digital ou do
programa Skype recorder. Posteriormente, as entrevistas foram transcritas e analisadas quanto
ao conteúdo das respostas, e estas informações contribuíram para a discussão e apresentação
dos resultados.
Todas as informações nesta dissertação foram organizadas da seguinte forma: os
capítulos 4 e 5 apresentam, a título de revisão de literatura, respectivamente, o estado da arte
sobre as unidades de conservação no Brasil e da avaliação de efetividade de manejo de UCs.
O capítulo 6 apresenta os resultados obtidos por esse estudo e sua discussão e, finalmente, os
capítulos 7 e 8 apresentam as conclusões e recomendações, respectivamente.
6
MINAYO, M.C.S. (Org.). Pesquisa Social – teoria, método e criatividade. 14 ed. Petrópolis: Ed. Vozes, 1999. 80 p.
25. 10
4. UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO BRASIL
4.1. Breve Histórico Sobre as Unidades de Conservação
Uma resposta de parte de nossa atual sociedade em face à grave crise ambiental
enfrentada mundialmente é o estabelecimento de unidades de conservação, a estratégia
amplamente disseminada de proteção da diversidade biológica. Estas resguardam não somente
belas paisagens e ambientes com valor histórico-cultural para as futuras gerações, mas
também se justificam por uma série de razões, incluindo: os benefícios econômicos diretos
(exploração madeireira e não-madeireira etc.); a manutenção dos ciclos e serviços ambientais
(água e ciclos de nutrientes); os valores estéticos e bem-estar ligado ao contato com a natureza
(recreação, uso público); e o valor inerente das espécies (direito de existir).
Porém, ao contrário do que muitos pensam, esta não é uma prática exclusiva de nossa
atualidade. Existem registros do estabelecimento de áreas de reservas muito anteriores ao
Parque Nacional de Yellowstone (1872), fazendo parte das sociedades humanas em diferentes
culturas e épocas desde a mais remota antiguidade. Alguns registros remetem a séculos antes
de Cristo, quando a proteção de áreas objetivava a soberania sobre recursos naturais
indispensáveis, como caça, água, madeira para combustível, construção civil ou naval, plantas
medicinais, minérios, além da perpetuação de aspectos religiosos, mitos e ocorrências
históricas. Dourojeanni e Pádua (2007) relatam sobre as reservas estabelecidas pelos povos
Assírios na região do Iraque no ano 700 a.C.; na Índia em 262 a.C.; na ilha de Sumatra no
século VII; e na Inglaterra no século XI. Miller (1997) também menciona a primeira área de
proteção criada na Indonésia no ano de 684 a.C., e a reserva especial de caça criada na Índia
no século XV. Diamond (2007) descreve as medidas legais adotadas no Japão no século XVII
para resguardar os recursos hídricos e madeireiros, dentre outros exemplos.
A partir da Revolução Industrial, muitos ambientes naturais foram drasticamente
alterados no velho mundo. Com o aumento da população nos centros urbanos e as extenuantes
rotinas de trabalho fabril, a procura por espaços para recreação ao ar livre passou a existir. Foi
então que surgiram movimentos mais amplos para proteção de áreas naturais, principalmente
como espaços de uso público (MILANO, 1999; LIMA, 2003). Posteriormente, outros
movimentos preservacionistas surgiram, como nos Estados Unidos, que resultou na criação do
26. 11
Parque Nacional de Yellowstone, em 1872. A criação deste parque nacional motivou diversos
países a criarem os seus, assim como outras áreas protegidas, conforme destacam Milano
(2000), Lima (2003) e Araújo (2007): Canadá, em 1885; Nova Zelândia, em 1894; Austrália,
África do Sul e México, em 1898; Argentina, 1903; Chile em 1926; Equador em 1934;
Venezuela e Brasil em 1937. Portanto, o Brasil foi um dos países que mais tardiamente
sucumbiu à onda internacional de criação de parques (MEDEIROS, 2006).
A iniciativa norte-americana é considerada o marco moderno da criação de áreas
protegidas. No entanto, esta e as outras iniciativas que a sucederam objetivavam a delimitação
de áreas com características naturais excepcionais, criadas para a proteção total de seus
recursos, permitindo apenas o contato humano através de atividades de recreação e lazer.
Configuravam, assim, o ideário de natureza intocada e busca pelo paraíso (DIEGUES, 2000).
No entanto, outras categorias foram surgindo além dos parques. Miller (1997) descreve que,
com o tempo, os conceitos evoluíram, estabelecendo o cenário para os três tipos gerais de
áreas protegidas hoje encontrados: preservação de sítios de valor material, estético, espiritual
e histórico; manejo de sítios que fornecem recursos naturais renováveis; e manutenção de
paisagens que os habitantes nacionais e locais consideram valiosas. A partir do III Congresso
Mundial de Parques Nacionais, realizado em 1982, consolidou-se uma nova estratégia em que
as unidades de conservação só teriam sentido com a melhoria da qualidade de vida da
população dos países em vias de desenvolvimento (VALLEJO, 2003). Esta nova visão
reafirmava os direitos das sociedades tradicionais e colocava em xeque a visão romântica das
áreas de preservação como paraísos protegidos (VALLEJO, 2003). Assim, com o avanço dos
conhecimentos científicos, as áreas protegidas passaram a ser componentes estruturais de um
sistema maior, planejado como um todo (MILANO, 1997).
Desde a criação de Yellowstone, o mundo viu um aumento notável das superfícies
protegidas (figura 1). Ervin (2003a) relata que, de 1975 a 2003, o número de áreas protegidas
no mundo duplicou. Em 2005, Chape e colaboradores (2005) estimaram que cerca de 12% da
superfície de Terra estavam sob proteção legal, através de 100.000 áreas protegidas. Em 2009,
Jenkins e Joppa (2009) apontaram que a área total sob proteção legal havia aumentado para
12,9%, sendo que deste montante, 5,8% se encontravam sob regime de proteção restrita da
biodiversidade.
27. 12
Figura 1: Evolução do número e extensão de áreas protegidas no mundo. Fonte: Leverington et al., 2008a (dados
do WCMC).
No Brasil, os recursos naturais foram intensamente explorados para fins econômicos
desde sua colonização pelos portugueses, em 1500. A Mata Atlântica foi o primeiro bioma a
sofrer as consequências dessa usurpação, restando atualmente entre 11,4% e 16% de sua
cobertura original (RIBEIRO et al., 2009). Essa exploração desenfreada exigiu a adoção de
medidas de controle para determinados recursos naturais já na época do Brasil colônia e
imperial, como a restrição do corte de madeiras nobres para uso exclusivo da coroa, as
chamadas madeiras-de-lei (MEDEIROS, 2006). Entretanto, a maioria dessas medidas não
envolvia a demarcação de áreas ou territórios particulares (MEDEIROS e GARAY, 2006).
Entre os anos de 1862 a 1891, devido às freqüentes crises de abastecimento de água na
capital, o governo imperial investiu no reflorestamento do maciço da Tijuca, após a aquisição
das terras (DEAN, 1996). A floresta da Tijuca se recuperou, e quase cem anos após o início
de seu replantio, foi legalmente protegida através da criação do Parque Nacional da Tijuca7
(1961).
A primeira proposta de criação de unidades de conservação no Brasil surgiu em 1876,
quando o engenheiro André Rebouças, inspirado pelo modelo de Yellowstone, defendia
vigorosamente a necessidade de criar parques nacionais no Brasil, sugerindo a criação de dois
parques: Sete Quedas, no rio Paraná e Ilha do Bananal, no rio Araguaia (PÁDUA, 1997).
7
Decreto Federal n.° 50.923, de 6 de julho de 1961.
ÁreaemKm²
Ano
Númerodesítios
CRESCIMENTO DA COBERTURA DE ÁREAS PROTEGIDAS 1872 - 2006
Área dos sítios
Número de sítios
28. 13
Entretanto, essa proposta não foi contemplada na época, e essas áreas só foram transformadas
em Parques Nacionais em 1961 e 1959, respectivamente. Contudo, o Parque Nacional de Sete
Quedas8
foi submerso em 1981 para dar lugar à hidrelétrica de Itaipu, e o Parque Nacional do
Araguaia9
foi redelimitado em 1971, restando pouco mais de um terço de sua extensão
original (PÁDUA, 2004). Vinte anos após a iniciativa de Rebouças, foi criado em São Paulo o
primeiro parque brasileiro, o Parque Estadual Alberto Löfgren10
(1896), mediante a
desapropriação 187 ha do engenho da Pedra Branca, ao sopé da Serra da Cantareira (BRITO,
M.C.W., 2000; FF-SP/IF-SP, 2009). O parque foi inicialmente criado com denominação de
Horto Botânico, com a função de experimentação, pesquisa e serviço florestal, tendo sido a
base para a criação do Serviço Florestal do Estado (IF-SP, 2010).
Outra experiência significativa de criação de áreas naturais protegidas no Brasil
ocorreu em 1911, quando o geólogo Luis Felipe Gonzaga de Campos também reivindicava a
criação de parques (RYLANDS e BRANDON, 2005). Este realizou um levantamento dos
diferentes biomas e seus estados de conservação, com a expressa intenção de subsidiar as
autoridades brasileiras para a criação de um conjunto de Parques Nacionais (MEDEIROS,
2006). O estudo resultou na criação da Reserva Florestal do Território do Acre11
no mesmo
ano, no sudoeste amazônico. A reserva foi criada com o propósito de conter a devastação
desordenada das matas, proteger e assegurar a navegação fluvial, visto que os efeitos
desastrosos do desmatamento já eram percebidos naquela época (BRASIL, 1911). Sua área
totalizava mais de 37 mil km², e mesmo assim teve sua existência esquecida ao longo da
história (ISA, 2010). Atualmente, 10 UCs federais, 4 estaduais e 20 terras indígenas,
encontram-se em interseção ao menos parcial com sua área original (ISA, 2010).
Quarenta e um anos após a iniciativa paulista houve a criação do primeiro parque
federal, o Parque Nacional do Itatiaia12
(1937), legalmente amparada pelo então recente
código florestal de 1934. A criação do Parque Nacional do Itatiaia é considerada o principal
marco do conservacionismo no Brasil, fruto da luta de diversas personalidades que
defenderam a criação de parques (ARAÚJO, 2007). Esta experiência foi seguida pela criação
do Parque Nacional da Serra dos Órgãos13
e Parque Nacional do Iguaçu14
, ambos em 1939. Já
em 1946, foi criada a primeira Floresta Nacional, no Ceará, a Floresta Nacional de Araripe-
8
Decreto Federal nº 50.665, de 30 de Maio de 1961.
9
Decreto Federal nº 47.570, de 31 de Dezembro de 1959.
10
Decreto Estadual n° 335, de 10 de fevereiro de 1896.
11
Decreto Federal nº 8.843, de 26 de Julho de 1911.
12
Decreto Federal n° 1.713, de 14 de junho de 1937.
13
Decreto-Lei nº 1.822, de 30 de novembro de 1939.
14
Decreto-Lei nº 1.035, de 10 de janeiro de 1939.
29. 14
Apodi15
; e a segunda em 1961, no Pará, a Floresta Nacional de Caxiuanã16
, seguidas por
outras nove reservas florestais na Amazônia (RYLANDS e BRANDON, 2005). Assim sendo,
os governos não tardaram a utilizar a delimitação de áreas protegidas como estratégia para
garantir as fronteiras nacionais, especialmente quando estas eram pouco claras ou litigiosas
(MILLER, 1997). Em 1948, houve a criação das Reservas Florestais Estaduais de Nova
Lombardia17
e Córrego do Veado16
, ambas no Espírito Santo; posteriormente doadas ao
Governo Federal, em 1955, e transformadas em Reservas Biológicas (IBDF/FBCN, 1982).
Rapidamente percebeu-se que apenas algumas categorias de UCs seriam insuficientes para
atingir os objetivos de proteção da biodiversidade (IBDF/FBCN, 1982). Assim, outras
categorias foram sendo criadas, principalmente a partir da década de 1980, com a publicação
do Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil (IBDF/FBCN, 1979;
IBDF/FBCN, 1982); através dos instrumentos de criação de Estações Ecológicas e Áreas de
Proteção Ambiental (lei nº 6.902 de 1981), e de Reservas Ecológicas e Áreas de Relevante
Interesse Ecológico (decreto nº 89.336 de 1984), entre outros.
A partir do estabelecimento da primeira UC federal, o ritmo de criação de novas áreas
seguiu lento, mantendo-se estável nas décadas de 1960 e 1970, ocorrendo um aumento
expressivo a partir da década de 1980 (figura 2). Entretanto, Rylands e Brandon (2005)
ressaltam que é no início deste século que se registra o maior número relativo referente à
criação de unidades federais.
Figura 2: Criação de Unidades de Conservação Federais por década (1930 a 2005). Fonte: DRUMMOND et al.
(2006).
15
Decreto Federal nº 9.226, de 02 de maio de 1946.
16
Decreto Federal nº 239, de 28 novembro de 1961.
17
Decreto Estadual nº 55, de 20 de setembro de 1948.
4 2 5
20 11
93
63
79
4 6 11
31 42
135
198
277
0
50
100
150
200
250
300
30 40 50 60 70 80 90 00 a 05
NúmerodeUCs
Anos
Criação de Unidades de Conservação Federais por década
Unidades Criadas Unidades Criadas (N. acumulado)
30. 15
Outro aspecto a ser tratado é que até a década de 70, a escolha das áreas para a criação
de unidades de conservação, tanto no Brasil como em outros países, era feita baseada em
motivos políticos, paisagísticos ou na disponibilidade de terras, ao invés de critérios
científicos, como a representatividade ecológica do local. Como o País não contava com uma
estratégia nacional para selecionar e planejar as unidades de conservação, critérios
importantes, como a riqueza ou raridade dos ecossistemas e a ocorrência de espécies
endêmicas não eram levados em consideração (PÁDUA, 1997; BRITO, M.C.W., 2000). Esta
ausência de planejamento revelou-se inadequada, visto que nenhum dos biomas estava bem
representado através de UCs, e diversos ecossistemas e tipologias vegetacionais importantes
encontravam-se desprotegidos (IBDF/FBCN, 1982; MMA, 1998).
Em 1975, um documento do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF)
intitulado “Projeto de Implantação e Consolidação de Parques Nacionais e Reservas
Equivalentes” declarava a precariedade do sistema nacional de UCs em relação aos outros
países, apresentando o Brasil em 68º lugar quanto à superfície protegida, com apenas 2,2% do
País protegidos em unidades de conservação (DRUMMOND, 1988 apud MORSELLO,
2001). Entretanto, a emergência e evolução dos instrumentos de mapeamento em escala
continental e global, da ciência da ecologia, e do acúmulo de conhecimento sobre as
diferentes paisagens naturais e processos ecológicos, contribuíram para mudar essa situação
(DRUMMOND et al., 2006). Segundo Drummond (1988 apud MORSELLO, 2001), este foi
o primeiro exemplo de um documento altamente técnico e bem informado sobre a situação
das unidades.
Uma das primeiras experiências de seleção e priorização de áreas para proteção no
Brasil foi feita a partir do estudo “Levantamento e Recursos Naturais” realizado no âmbito do
Projeto RADAMBRASIL, do Ministério das Minas e Energia, entre 1975 e 1983, que ajudou
a identificar diversas áreas através do levantamento aéreo das regiões Amazônica e,
posteriormente, Nordeste, expandindo-se para todo o país. Este estudo considerou aspectos
físicos e biológicos, e indicou a criação de 106.700.000 ha de UCs de proteção integral e uso
sustentável na Amazônia, em áreas que não tiveram outra utilização identificada, contudo
(RYLANDS e BRANDON, 2005).
Em 1976, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)18
, a
Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e o IBDF publicaram
18
Criado no início da década de 1960, com o objetivo principal de combate à redução da pobreza no Mundo e a melhoria da
qualidade de vida das pessoas. Seu conceito de desenvolvimento engloba o uso sustentável dos recursos naturais, e a
proteção da biodiversidade.
31. 16
um estudo intitulado “Uma Análise de Prioridades em Conservação da Natureza na
Amazônia”, elaborado por Wetterberg e colaboradores (IBDF/FBCN, 1982). Este era
fundamentado em critérios técnicos e científicos e tinha como objetivo o levantamento de
áreas biologicamente importantes para a conservação da natureza e a proposição de um
programa de conservação do Bioma, dentre outros, produzindo 39 mapas temáticos das áreas
selecionadas (IBDF/FBCN, 1982).
A partir desses e de outros estudos, e também baseado em critérios técnicos e
científicos, o IBDF, em parceria com a Fundação Brasileira para Conservação da Natureza
(FBCN), elaborou o “Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil”, publicado em
duas etapas, em 1979 e 1982 (IBDF/FBCN, 1982). Este tinha como objetivo identificar as
áreas mais importantes para a conservação da natureza no País e propor a criação de um
conjunto integrado de áreas protegidas (MEDEIROS e GARAY, 2006). O Plano propôs a
criação de 13 UCs em sua primeira fase, e 18 UCs na segunda.
Somente no final dos anos 90, o Ministério do Meio Ambiente (MMA), no âmbito do
Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira
(PROBIO), retomou o processo de construção de uma estratégia clara para definição de áreas
de interesse para a conservação. Isto se deu através de diversas oficinas de trabalho, realizadas
entre os anos 1998 a 2000, para a avaliação e identificação de áreas e ações prioritárias para a
conservação da biodiversidade nos biomas brasileiros. Essa seleção levou em consideração o
foco em áreas de grande importância biológica e a priorização de áreas sob fortes pressões
antrópicas (SILVA, 2005). As oficinas de trabalho identificaram 900 áreas prioritárias,
representadas no “Mapa de Áreas Prioritárias para a Conservação e Uso Sustentável da
Biodiversidade Brasileira”, cuja revisão e atualização, em 2006, ampliou para 3.190 áreas
distribuídas por todos os biomas (MMA, 2010a). Esse trabalho foi reconhecido pelo governo
brasileiro como uma política formal, através da Portaria MMA nº 09/2007, sendo utilizado
como instrumento de planejamento e gestão para orientar tanto a criação de novas unidades de
conservação como os investimentos públicos e privados em projetos de desenvolvimento
(MMA, 2011). Assim, a identificação das áreas prioritárias forneceu uma orientação crucial
para se solucionar o desequilíbrio na representação dos ecossistemas nas unidades de
conservação (MMA, 2010a). Entretanto, apesar dos avanços, boa parte ainda não está
legalmente protegida através de UCs, visto que o processo de criação de UCs tem obedecido a
critérios técnicos e envolvido a participação da sociedade, o que torna o processo mais
demorado, sem contar com os entraves políticos e a falta de apoio da sociedade em geral.
32. 17
A gestão das unidades de conservação no Brasil também se modificou muito ao longo
dos anos. Inicialmente, desde a criação dos primeiros parques nacionais, ela era de
responsabilidade do Serviço Florestal do Ministério da Agricultura, até 1967, quando foi
transferido para o Departamento de Parques Nacionais e Reservas Equivalentes do IBDF
(RYLANDS e BRANDON, 2005). Em 1973, foi criada a Secretaria Especial de Meio
Ambiente (SEMA), vinculada ao Ministério do Interior, que também ganhou competências
para gestão das UCs federais. Assim, houve a duplicação de funções entre o IBDF e a SEMA,
coexistindo dois diferentes sistemas de UCs sem coordenação entre si (BRITO, M.C.W.,
2000). Buscando unificar a política ambiental brasileira e corrigir as ambivalências,
principalmente em relação à administração e manejo das unidades de conservação, foi criado
o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), em 1989,
a partir da fusão de quatro entidades: SEMA, IBDF, Superintendência do Desenvolvimento da
Pesca (SUDEPE) e a Superintendência para o Desenvolvimento da Borracha (SUDHEVEA)
(MITTERMEIER et al., 2005). O IBAMA era inicialmente vinculado ao Ministério do
Interior, passando ao Ministério do Meio Ambiente a partir de sua criação, em 1992
(RYLANDS e BRANDON, 2005). Em 2007, foi criado o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio)19
, configurando o primeiro órgão federal criado
especificamente para a gestão de UCs, fruto de antigos debates entre ambientalistas e
governo. A criação desse novo órgão ocorreu a partir da divisão de parte da estrutura do
IBAMA, cabendo ao ICMBio as diretorias responsáveis pela gestão de UCs e parte de seus
centros especializados.
4.2. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC
Após cerca de oito anos de tramitação no Congresso Nacional, em 18 de julho de 2000
foi publicada a Lei Federal 9.985, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC) e estabeleceu critérios e normas para a criação, implementação e gestão
de unidades de conservação. Esta lei, que configura um dos principais instrumentos
executores da política ambiental brasileira, regulamentou alguns incisos do parágrafo 1o
do
artigo 225 da Constituição Federal, que trata sobre o meio ambiente. O Sistema Nacional é
constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais, estaduais e municipais, e
19
Lei nº 11.516, de 28 de Agosto de 2007
33. 18
promove a uniformidade e coerência entre as diferentes esferas administrativas no processo de
gestão do patrimônio natural brasileiro. De acordo com Silva (2005), o SNUC representa uma
política pública de fortalecimento da nossa capacidade de planejar, implementar e manejar
apropriadamente as unidades de conservação.
Entretanto, a proposta do Sistema Nacional de Unidades de Conservação não surgiu da
noite para o dia, visto que resultou de um processo de elaboração que durou cerca de duas
décadas. Antes da aprovação da lei 9.985/2000, a criação e gestão de UCs no País
fundamentavam-se nos seguintes dispositivos:
Código Florestal e Código de Caça e Pesca (Decreto nº 23.793/1934) (MEDEIROS,
2006);
Novo Código Florestal (Lei nº 4.771/1965) (LIMA, 2003; MEDEIROS, 2006);
Lei de Proteção aos Animais (Lei nº 5.197/1967) (LIMA, 2003; MEDEIROS, 2006);
Regulamento de Parques Nacionais Brasileiros (Decreto nº 84.017/1979);
Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil (IBDF/FBCN, 1979;
IBDF/FBCN, 1982) (BRITO, M.C.W., 2000);
Lei de criação das Estações Ecológicas e das Áreas de Proteção Ambiental (Lei nº
6.902/1981) (LIMA, 2003; MEDEIROS, 2006);
Decreto de criação das Reservas Ecológicas e das Áreas de Relevante Interesse
Ecológico (Decreto nº 89.336/1984) (MEDEIROS, 2006);
Decreto de criação de Reservas Extrativistas (Decreto nº 98.897/1990) (LIMA, 2003);
Regulamento das Reservas Particulares do Patrimônio Natural (Decreto nº
98.914/1990) (LIMA, 2003);
Lei de Criação das RPPNs (Lei nº 1.922/1996) (MEDEIROS, 2006).
O Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil foi elaborado a partir de
estudos iniciados em 1976, como já mencionado, incorporando algumas categorias de manejo
propostas pela IUCN em 1978 (BRITO, M.C.W., 2000). O documento propunha 16
categorias de UCs, no intuito de dotar o sistema de uma variedade compatível com a
diversidade dos biomas brasileiros (DRUMMOND et al., 2006). Este apresentou uma revisão
da conceituação geral das UCs, quanto aos objetivos e categorias de manejo, e propôs ações
prioritárias para o estabelecimento, planejamento, manejo e administração desse sistema
(IBDF/FBCN, 1982). Esse plano não foi transformado em lei, devido a incongruências entre o
IBDF e a SEMA, e assim, o sistema brasileiro de unidades de conservação permaneceu com
objetivos confusos e categorias mal definidas entre as diferentes esferas de governo
34. 19
(RYLANDS e BRANDON, 2005). Posteriormente, em 1986, foi criada uma comissão
especial no Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) com o propósito de formular
um sistema nacional de unidades de conservação, chegando a produzir uma série de
categorias, mas sem continuidade (RYLANDS e BRANDON, 2005). Em 1988, o IBDF
encomendou à Fundação Pró-Natureza (FUNATURA) um estudo sobre as categorias de UCs
existentes no País visando à elaboração de um anteprojeto de lei para a criação de um Sistema
Nacional de Unidades de Conservação (MEDEIROS, 2006). Este estudo foi entregue no ano
seguinte ao então recém-criado IBAMA, e somente após longos debates tornou-se projeto de
lei no Congresso Nacional em maio de 1992, um mês antes do início da Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no Brasil e da assinatura da CDB. O
projeto de lei propunha dez categorias de UCs, reunidas em três grupos (BRITO, M.C.W.,
2000). Conforme Medeiros (2006), a longa tramitação deste projeto nas duas casas
legislativas e na casa civil foi fruto de uma feroz batalha entre preservacionistas,
conservacionistas, socioambientalistas e ruralistas, além de fortíssimos lobbys desses grupos
no Congresso.
Assim, a lei do SNUC organizou as categorias de UCs criadas de forma avulsa e
desarticulada ao longo das décadas anteriores, visando o funcionamento de um Sistema
Nacional em consonância. Além disso, normatizou sobre a criação, implantação e gestão das
unidades, padronizando procedimentos entre as três esferas de governo, como alocação de
recursos e regularização fundiária. Outro aspecto relevante desta lei foi a definição de termos
e expressões comuns na área, estabelecendo um referencial jurídico. Foram propostos alguns
modelos de gestão para promover a integração das UCs na paisagem e sua atuação conjunta,
como um verdadeiro sistema, destacando-se o zoneamento das UCs, delimitação de
corredores ecológicos, mosaicos de unidades de conservação, reservas da biosfera e zonas de
amortecimento.
O processo que envolve a criação e o gerenciamento das unidades de conservação
brasileiras modificou-se profundamente com a regulamentação do SNUC, particularmente no
que se refere às comunidades locais e à sociedade em geral (SILVA, 2005). Essas inovações
foram a participação popular no processo de criação, implantação e gestão das UCs, através
de consultas públicas e de conselhos consultivos ou deliberativos das UCs; do
reconhecimento do modo de vida e do conhecimento das populações tradicionais; do estímulo
à criação e gestão de UCs por populações locais e organizações privadas; e de planos de
manejo construídos de forma participativa e que visem a integração da unidade no cotidiano
das comunidades do entorno. Em relação aos planos de manejo, estes se tornaram
35. 20
obrigatórios, devendo ser elaborados num prazo de cinco anos a partir de sua criação. O
SNUC também apresentou importantes instrumentos para a sustentabilidade econômica das
UCs, como a autorização para exploração de bens e serviços, tais como as concessões de
atividades de uso público e recreação, o pagamento pela exploração comercial do uso de
imagem, entre outros; a compensação ambiental por significativo impacto ambiental de
empreendimentos; e a contribuição financeira por pessoas jurídicas usuárias de recursos
hídricos, para abastecimento ou geração de energia, beneficiários dos recursos naturais
protegidos pela unidade de conservação (GUATURA, 2000).
Sob um enfoque internacional, o estabelecimento do SNUC veio a afirmar e
consolidar o compromisso do Brasil com a CDB, ao incorporar os objetivos da convenção ao
longo dos seus:
contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no
território nacional e nas águas jurisdicionais;
proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional;
contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas naturais;
promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais;
promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no
processo de desenvolvimento;
proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica;
proteger as características relevantes de natureza geológica, geomorfológica,
espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural;
proteger e recuperar recursos hídricos e edáficos;
recuperar ou restaurar ecossistemas degradados;
proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos e
monitoramento ambiental;
valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica;
favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a recreação em
contato com a natureza e o turismo ecológico;
proteger os recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais,
respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-as social e
economicamente.
Três órgãos do governo são responsáveis pela gestão do SNUC: o CONAMA, como
órgão consultivo e deliberativo; o MMA, como órgão central, que planeja, coordena e
36. 21
monitora sua aplicação; o ICMBio e os órgãos ambientais estaduais e municipais, que têm a
função de implementar o Sistema, subsidiando as propostas de criação e administrando as
UCs, em suas respectivas esferas de atuação.
O sistema é composto por 12 categorias de UCs, reunidas em dois grupos com
características específicas: as de proteção integral, cujo objetivo básico é a preservação da
natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais; e as de uso
sustentável, cujo objetivo é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável
de parte dos seus recursos naturais. As UCs criadas antes do SNUC, e que não pertenciam às
categorias previstas, deveriam ser reavaliadas e reclassificadas dentro da estrutura proposta,
em até dois anos. Cada categoria cumpre um papel específico dentro da estratégia brasileira
de conservação da natureza, o que permite a implementação de um sistema de unidades de
conservação abrangente, ecologicamente representativo, integrado a paisagens terrestres e
marinhas, conforme o Programa de Áreas Protegidas da Convenção das Nações Unidas sobre
Diversidade Biológica propõe aos países signatários (ICMBio, 2007). As categorias de
manejo presentes no SNUC se enquadram nos critérios definidos pela IUCN, de acordo com
os padrões e normas internacionais, o que facilita o diálogo com as agências internacionais, a
adoção de padrões diferenciados de gestão e a gestão de áreas transfronteiriças
(DRUMMOND et al., 2006). O quadro 1 resume os aspectos inerentes à gestão de cada
categoria de UC.
Quadro 1: Resumo das categorias de unidades de conservação do SNUC.
CATEGORIA OBJETIVOS
POSSE E
DOMÍNIO
VISITAÇÃO PESQUISA
ZONA DE
AMORTECI
MENTO
CONSELHO
CATEGORIA
IUCN
UNIDADES DE PROTEÇÃO INTEGRAL:
Estação
Ecológica
(ESEC)
Preservação da Natureza e
pesquisas científicas
Público
Proibida, exceto
quando com
objetivo
educacional e de
acordo com o
plano de manejo
Depende de
autorização
do órgão
gestor e
sujeita a
restrições
Sim Consultivo Ia
Reserva
Biológica
(REBIO)
Preservação integral da biota,
admitidas intervenções para
sua restauração
Público
Proibida, exceto
quando com
objetivo
educacional e de
acordo com o
plano de manejo
Depende de
autorização
do órgão
gestor e
sujeita a
restrições
Sim Consultivo Ia
Parque
Nacional
(PARNA)
Preservação de ecossistemas
de grande relevância
ecológica e beleza cênica,
realização de pesquisas
científicas, educação e
interpretação ambiental,
recreação e turismo
ecológico
Público
Permitida,
conforme
dispuser o Plano
de Manejo
Depende de
autorização
do órgão
gestor e
sujeita a
restrições
Sim
Consultivo II
37. 22
Fonte: BRASIL, 2000
Monumento
Natural
(MONA)
Preservar sítios naturais
raros, singulares ou de beleza
cênica
Público
e/ou
Privado
Permitida,
conforme
dispuser o Plano
de Manejo
Não
regulamentada
Sim Consultivo III
Refúgio da
Vida Silvestre
(REVIS)
Proteger ambientes naturais
para existência ou
reprodução de espécies ou
comunidades da flora local e
da fauna residente ou
migratória
Público
e/ou
Privado
Permitida,
conforme
dispuser o Plano
de Manejo
Depende de
autorização
do órgão
gestor, sujeita
a restrições
Sim Consultivo III
UNIDADES DE USO SUSTENTÁVEL:
Área de
Proteção
Ambiental
(APA)
Proteger a diversidade
biológica, disciplinar o
processo de ocupação e
assegurar a sustentabilidade
do uso dos recursos naturais
Público
e/ou
Privado
Visitação das
áreas públicas
definidas pelo
plano de manejo
ou órgão gestor
Pesquisas nas
áreas de
domínio
público
reguladas
pelo órgão
gestor
Não Consultivo V
Área de
Relevante
Interesse
Ecológico
(ARIE)
Manter os ecossistemas
naturais de importância
regional ou local e regular o
uso admissível dessas áreas,
compatível com a
conservação da natureza
Público
e/ou
Privado
Não
regulamentada
Depende da
autorização
do órgão
gestor e
sujeita a
restrições
Sim Consultivo IV
Floresta
Nacional
(FLONA)
Uso múltiplo sustentável dos
recursos florestais e a
pesquisa científica com
ênfase em métodos para a
exploração sustentável de
florestas nativas
Público,
admitindo-se
permanência
de pop.
tradicionais
Permitida
conforme
dispuser no
Plano de Manejo
Permitida e
incentivada,
desde que
autorizada,
sujeita a
restrições
Sim Consultivo VI
Reserva
Extrativista
(RESEX)
Proteger os meios de vida e a
cultura das populações
tradicionais e assegurar o uso
sustentável dos recursos
naturais
Público, com
uso
concedido às
pop.
extrativistas
tradicionais
por meio de
contrato
Permitida e
regulada, desde
que compatível
com interesse
local
Permitida e
incentivada,
desde que
autorizada,
sujeita a
restrições
Sim Deliberativo VI
Reserva de
Fauna
(REFAU)
Promover estudos técnico-
científicos sobre o manejo
econômico sustentável de
recursos faunísticos
Público
Permitida
conforme
dispuser no
Plano de Manejo
Permitida e
incentivada,
conforme os
próprios
objetivos da
categoria
Sim Consultivo VI
Reserva de
Desenvolvim
ento
Sustentável
(RDS)
Preservar a natureza e
assegurar condições
necessárias para a melhoria
dos modos e da qualidade de
vida e exploração dos
recursos naturais das
populações tradicionais, bem
como valorizar, conservar e
aperfeiçoar o conhecimento e
as técnicas de manejo do
ambiente desenvolvidos por
aqueles
Público.
A posse será
regulada por
contrato e
regulamenta
-ção
Permitida e
incentivada
Permitida e
incentivada,
conforme os
próprios
objetivos da
categoria
Sim Deliberativo VI
Reserva
Particular do
Patrimônio
Natural
(RPPN)
Área privada gravada com
perpetuidade com objetivo de
conservar a diversidade.
Particular
Se permitida
pelo proprietário
ou plano de
manejo, com
objetivos
turísticos,
recreativos e
educacionais.
Se permitida
pelo
proprietário e
de acordo
com plano de
manejo.
Não Não possui
IV
38. 23
Durante a última conferência das partes da CDB20
, o Brasil foi reconhecido como a
nação que mais criou áreas protegidas nos últimos oito anos. Neste período, a superfície
legalmente protegida por essas áreas no País dobrou (MMA, 2010b). Jenkins e Joppa, (2009)
também constataram que o Brasil foi responsável pela criação de 74% de todas as áreas
protegidas no mundo, durante o período de 2003 a 2008, correspondendo a 703.864 km²,
principalmente devido à criação de UCs na Amazônia. Atualmente, cerca de 1.539.416 km²
do território brasileiro estão sob proteção legal de unidades de conservação, correspondendo a
17,42% do território continental e 3,14% das áreas costeiras e marinhas (MMA, 2010a).
Essas áreas estão protegidas através de 310 unidades de conservação federais, 621
estaduais, 689 municipais e aproximadamente 1.440 privadas21
(MMA, 2010a). A evolução
do SNUC desde sua criação, em relação ao número e área de UCs federais e estaduais, é
apresentada na figura 3. De acordo com os dados, existem mais unidades estaduais do que
federais, entretanto, as áreas estaduais geralmente são menores que as federais.
Figura 3: Evolução do SNUC em número de unidades de conservação e área (Km²). Fonte: Adaptado de MMA,
2009 e MMA, 2011. Segundo o MMA, os dados foram obtidos do CNUC, e nem todas as UCs estaduais fazem
parte do cadastro; o somatório não inclui as áreas de RPPNs; não foram retiradas as sobreposições entre UCs.
20
COP-10, Nagoya, 2010.
21
Segundo o MMA (2010), os números apresentados para parte das unidades de conservação estaduais e municipais e para as
RPPNs são considerados estimados, uma vez que o processo de validação dos dados e cadastramento dessas áreas protegidas
no Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC) ainda está em curso. Também pode haver sobreposição de
algumas UCs.
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
1.200.000
1.400.000
1.600.000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
NúmerodeUCs
Área(Km²)
Ano
Evolução do SNUC em Número de UCs e Área
Nº UC Estadual
Nº UC Federal
Área UC Estadual
Área UC Federal
Área UC Total
39. 24
Segundo dados do MMA (2010), o SNUC é composto por 46,73% de unidades de
proteção integral e 53,27% de uso sustentável, o que representa uma proporção equilibrada.
Este padrão se mantém nos sistemas federal, estaduais e municipais (figura 4).
Figura 4: Número de UCs sob regime de proteção integral e uso sustentável, nas esferas federal, estaduais,
municipais e no total do SNUC. Fonte: Dados retirados de MMA, 2010a. O MMA ressalva que o somatório não
inclui as RPPNs, e que os dados foram compilados do CNUC até agosto de 2010.
Já em relação à área total do SNUC, 33,54% se encontram sob regime de proteção
integral e 66,46% sob uso sustentável. Esse padrão se repete nas UCs estaduais, enquanto nas
federais e municipais ocorre uma proporção relativamente equilibrada entre esses dois
regimes (figura 5).
Figura 5: Área de UCs sob regime de proteção integral e uso sustentável, nas esferas federal, estaduais,
municipais e no total do SNUC. Fonte: Dados retirados de MMA, 2010a. O MMA ressalva que o somatório não
inclui as RPPNs, e que os dados foram compilados do CNUC até agosto de 2010.
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
UCs Federais UCs Estaduais UCs Municipais Total de UCs
NúmerodeUCs
Esfera Administrativa
Proteção Integral
Uso Sustentável
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
1.200.000
UCs Federais UCs Estaduais UCs Municipais Total de UCs
Área(Km²)
Esfera Administrativa
Proteção Integral
Uso Sustentável
40. 25
Baseado no Plano Estratégico da CDB para 2010 (decisão VI/26), com o objetivo de
conter a perda de diversidade biológica, o Brasil estabeleceu, em 2006, através da CONABIO,
as Metas Nacionais de Biodiversidade para 2010 (MMA, 2010a). Dentre estas, almejou a
proteção de pelo menos 30% da Amazônia e 10% dos outros biomas através de unidades de
conservação. Entretanto, apesar de avanços em alguns biomas, a meta não foi alcançada
(MMA, 2010a).
Assim, em relação à distribuição das UCs nos diferentes biomas, a maior extensão de
áreas se encontra no bioma Amazônia (figura 6), por ser também o bioma mais extenso. Além
do grande aporte de recursos de fundos internacionais, esta região é a menos populosa,
possuindo grande ocorrência de terras devolutas, o que facilita a criação de UCs.
Proporcionalmente em relação à extensão de cada bioma, temos 27,10% da Amazônia sob
proteção legal, seguida por 8,99% da Mata Atlântica, 8,43% do Cerrado, 7,33% da Caatinga,
4,79% do Pantanal, 3,5% do Pampa, e 3,14% da Zona Costeira e Marinha (MMA, 2010a).
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (2010), para se alcançar
completamente esta meta, o Brasil precisa criar mais 207.170 km2
de unidades de conservação
continentais e 299.871 km2
de unidades de conservação marinhas, aumentando a área
oficialmente protegida para 19,86% da área continental ou 29,86% da jurisdição nacional.
Figura 6: Área de UCs sob regime de proteção integral e uso sustentável nos diferentes biomas brasileiros. As
áreas das RPPNs não foram computadas. Fonte: Dados retirados de MMA, 2010a. O MMA ressalva que os
dados foram compilados do CNUC até agosto de 2010.
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
1.200.000
Amazônia Caatinga Cerrado Mata Atlântica Pampa Pantanal Costeiro/Marinho
Área(Km²)
Biomas
UCs Uso Sustentável
UCs Proteção Integral
41. 26
Conforme Rylands e Brandon (2005), ainda que o Brasil tenha criado um grande
número de unidades de conservação nas duas últimas décadas, permanecem grandes desafios,
não só para a administração e manejo, mas também para sua proteção em relação ao próprio
governo, já que este continua com seus ambiciosos programas de desenvolvimento nos setores
de energia, infra-estrutura, indústria e agricultura. Para a efetiva implementação e gestão
desse Sistema em um país com dimensões continentais e ampla diversidade de ecossistemas
naturais como o Brasil, é necessário que os recursos financeiros aplicados, especialmente o
recurso público, sejam revistos e adequados à realidade atual (MMA, 2010a).
4.3. Desafios Enfrentados pelas Unidades de Conservação Brasileiras
Passados dez anos após a criação da lei do SNUC, as unidades de conservação
continuam enfrentando diversos obstáculos para sua efetiva implementação e funcionamento.
Conforme observa Pádua (2011), o advento dessa lei não trouxe melhorias para a qualidade
do manejo das UCs, nem a visibilidade necessária para a obtenção de apoio da sociedade em
geral.
Segundo o 4º Relatório Nacional para a CDB (MMA, 2010), as UCs brasileiras ainda
possuem grandes desafios a solucionar, como a insuficiente capacidade institucional, técnica e
financeira dos órgãos ambientais; a situação fundiária das UCs; a criação de novas UCs; a
proteção legal mais equilibrada entre os ecossistemas; e os conflitos com comunidades
presentes no interior e no entorno das UCs. Grande parte dessas UCs se encontram ameaçadas
pela exploração ilegal de seus recursos naturais, incêndios criminosos, invasões e grilagem de
terras, avanço da fronteira agrícola e/ou urbana e obras de infra-estrutura, entre outros. Além
disso, o SNUC ainda não conseguiu ter seus problemas fundiários resolvidos. O fato do
governo não ter o domínio das terras das UCs que assim o exigem, traz grandes entraves ao
efetivo manejo dessas áreas (DOUROJEANNI e PÁDUA, 2007). Em 2005, 89,6% das UCs
federais que exigiam domínio público ainda sofriam de irregularidades fundiárias, e não havia
um único Parque Nacional totalmente regularizado, sendo esta a categoria mais antiga
(DRUMMOND et al., 2006). Para resolver a questão da regularização fundiária seria
necessário o aporte de cerca de um bilhão de reais anuais nos próximos 20 anos, segundo o
MMA (2009), entretanto, existem alternativas de resolução puramente administrativas que
exigem flexibilidade e regulamentação, como a permuta de terras; aquisição de terras para
42. 27
UCs por entidades civis, e posterior doação ao poder público; adjudicação de áreas de
proprietários com grandes débitos com o Estado; incorporação de terrenos de marinha, terras
abandonadas e terras devolutas. Além disso, um passo importante a ser cumprido é a
incorporação dessas terras ao patrimônio público, visto que nem todas as áreas indenizadas
estão inscritas ou em condições de serem inscritas como integrantes do patrimônio público na
Secretaria de Patrimônio da União (DRUMMOND et al., 2006). Outro ponto a ser
aprimorado é com relação aos planos de manejo dessas UCs, que segundo Pádua (2011), tem
sido bastante comum endeusá-los, como se eles pudessem, por si só, resolver os problemas de
uma UC. Em seu estudo, Zeller (2008) apontou que estes planos não estão sendo utilizados
como deveriam, e seu uso é aleatório, sem acompanhamento da execução das propostas,
levando a um baixo grau de execução das atividades previstas; e, além disso, a maioria das
informações contidas nos planos não satisfaz as necessidades práticas enfrentadas pelos
técnicos em campo.
O Brasil é o país com a maior extensão de áreas protegidas terrestres e marinhas (UN
STATISTICS DIVISION, 2010), configurando, atualmente, a oitava economia mundial. Seu
crescimento é baseado principalmente na exploração dos recursos naturais. Apesar disso,
destina menos recursos financeiros para a manutenção dos sistemas de UCs que outros países
com PIB inferior, que o fazem de 5 a 25 vezes mais (MEDEIROS et al., 2011). O Brasil
também é um dos países com menos funcionários por hectare protegido, destinando um
funcionário para cada 18.600 hectares (MEDEIROS et al., 2011). E esse dado é preocupante,
já que, conforme demonstraram Vreugdenhil e colaboradores (2003), a densidade de pessoal
em campo foi um dos fatores mais efetivos para a proteção da integridade de áreas protegidas.
O orçamento dedicado ao MMA é um dos menores entre todos os ministérios, ficando atrás
de dezessete outras pastas, o que representou 0,12% do orçamento da União em 2008,
montante este repartido com outros quatro órgãos22
além do ICMBio (MMA, 2009). Este
recurso se manteve praticamente constante ao longo de 2001 a 2008, assim como a receita
destinada às UCs federais, que aumentou apenas 6,83% nesse período, enquanto a área do
sistema federal de UCs aumentou 78,46% (MMA, 2009). A situação nos estados e municípios
não é muito diferente da federal. Atualmente, estima-se que os custos mínimos anuais para
manter o sistema federal estejam na ordem de R$ 540 milhões e de R$ 360 milhões para os
sistemas estaduais, além de R$ 610 milhões em investimentos necessários em infra-estrutura e
planejamento no sistema federal e de R$ 1,2 bilhão nos sistemas estaduais (MMA, 2009).
22
IBAMA, Agência Nacional de Águas, Serviço Florestal Brasileiro e Instituto de Pesquisas Jardim Botânico
43. 28
Dessa forma, o insuficiente orçamento destinado às UCs é, dentre todos os problemas
enfrentados, o mais urgente e limitante para uma gestão apropriada, capaz de levá-las à
consolidação e ao cumprimento de seus objetivos. Entretanto, as UCs não devem ser vistas
como um investimento a fundo perdido. Um estudo sobre a contribuição das UCs brasileiras
para a economia nacional demonstrou que alguns dos serviços ambientais por elas fornecidos
geram contribuições econômicas que ultrapassam em muito a quantia a elas destinada
(MEDEIROS et al., 2011). Contudo, de acordo com Geluda (2010) e Muanis e colaboradores
(2009), para não depender exclusivamente dos escassos recursos públicos, existem receitas
potenciais orçamentárias e extra-orçamentárias que poderiam aumentar consideravelmente o
montante de recursos destinados à conservação. Porém, estas dependem de priorização
política para serem amplamente utilizadas. Dentre essas receitas, podemos citar as concessões
de serviços, concessões florestais, cobrança efetiva de ingressos e multas, compensações
financeiras pela exploração de recursos hídricos para geração de energia, exploração de
petróleo e minérios.
Em suma, esses problemas apresentados se relacionam em grande parte com o
desconhecimento dos reais benefícios trazidos pela conservação das UCs, que leva à falta de
apoio político e da sociedade em geral.
44. 29
5. AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DO MANEJO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
5.1. Termos e Definições
Para a melhor compreensão do que é a avaliação da efetividade do manejo de unidades
de conservação, ou de áreas protegidas, como é internacionalmente conhecida, é necessário o
esclarecimento de alguns conceitos.
A IUCN define o termo área protegida como: “um espaço geográfico claramente
definido, reconhecido, dedicado e manejado, por meios legais ou outros efetivos, para se
alcançar a conservação da natureza em longo prazo, com serviços ecossistêmicos e valores
culturais associados” (DUDLEY, 2008). O termo unidades de conservação, utilizado no
Brasil, é definido pela lei do SNUC (BRASIL, 2000), em seu artigo 2º, inciso I, como:
“espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com
características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de
conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam
garantias adequadas de proteção”.
O manejo de unidades de conservação, segundo o inciso VIII, do artigo 2º deste
mesmo dispositivo legal, consiste em “todo e qualquer procedimento que vise assegurar a
conservação da diversidade biológica e dos ecossistemas”. Para a IUCN (DUDLEY, 2008), a
utilização do termo manejo (management), assume a adoção de medidas ativas para conservar
os valores naturais (e possivelmente outros) que motivaram a criação da área protegida;
considerando que essas medidas podem incluir a decisão de deixar a área intocada se esta for
a melhor estratégia de conservação. Cifuentes e colaboradores (2000) afirmam que manejo é o
conjunto de ações de caráter legal, político, administrativo, de pesquisa, de planejamento, de
proteção, de coordenação, educacional, entre outros, que resultam no melhor aproveitamento
e permanência de uma área protegida no longo prazo, e no cumprimento de seus objetivos.
As definições apresentadas, entre outras pesquisadas, são bastante convergentes e
complementares. Entretanto, no campo da conservação, é comum encontrarmos tanto na
literatura quanto no uso oral cotidiano, o emprego dos termos manejo, gestão, administração
e gerenciamento de unidades de conservação como sinônimos, apesar de suas nuances.
45. 30
Para Faria (2004), o conceito manejo de UCs, remete à manipulação dos recursos
naturais, tais como manejo de fauna, manejo florestal, manejo de solos, manejo integrado de
pragas, dentre outros, e, assim como Araújo (2007), considera o uso do conceito gestão mais
apropriado, por ser mais amplo e englobar as atividades de manejo de recursos naturais,
atividades gerenciais e administrativas. Ainda segundo Faria (2004), o termo manejo foi
adotado em nosso país e consagrado no restante da América Latina por influência da palavra
inglesa management e manager. Entretanto, em uma busca lexicográfica, encontramos a
palavra management com o significado de manejo, gestão, gerenciamento, administração;
assim como manager: gestor, gerente, gerenciador, administrador (OXFORD, 1999; SILVA
et al., 2001; BUENO DE ABREU et al., 2002). Os dicionários da língua portuguesa
apresentam significados bastante semelhantes para essas quatro palavras, apontando algumas
como sinônimas (FERREIRA, A.B.H., 1988, 2001; WEISZFLOG, 1998; HOUAISS et al.,
2001). O termo manejo tem ainda o sentido de manipulação ou manuseio de instrumentos,
conforme argumenta Faria (2004); e administração também remete ao ato de dirigir os
negócios públicos ou privados. De qualquer forma, todos esses vocábulos exprimem as ações
realizadas no dia-a-dia das unidades de conservação para garantir o cumprimento de seus
objetivos. Desse modo, neste estudo será adotado o termo manejo, conforme a definição dada
pela lei do SNUC, por ser concisa e abrangente.
Outros conceitos importantes de se distinguir são efetividade, eficácia e eficiência,
encontrados nos estudos levantados para a execução deste trabalho e comumente utilizados
como sinônimos ou confundidos entre si. O termo utilizado nos documentos da IUCN, em
inglês, é management effectiveness. A palavra effectiveness é traduzida como efetividade, mas
também é mencionada como sinônima a eficácia (OXFORD, 1999; SILVA et al., 2001;
BUENO DE ABREU et al., 2002). Por sua vez, a palavra eficácia, possui vocábulos
apropriados em inglês: efficacy ou efficaciousness. Entretanto, no campo da ciência da
administração, esses termos são diferenciados.
Aragão (1997), citado por Melo (2008, p.39), esclarece que a “efetividade refere-se à
relação, ao longo do tempo, entre os resultados alcançados e os objetivos pretendidos, sendo,
muitas vezes, descrita como uma dimensão qualitativa do resultado (o valor social do
produto)”. Este ainda relaciona a efetividade ao desempenho externo da organização, ligada
ao grau com que os objetivos e as finalidades do governo são alcançados, e medindo, assim,
seu progresso. De acordo com o Tribunal de Contas do Distrito Federal (2007), a efetividade é
entendida como uma combinação dos parâmetros de eficiência e eficácia no cumprimento da
finalidade que a sociedade espera de uma organização.