1. Orçamento Participativo:
INSTRUMENTO DE COMBATE À POBREZA
E À EXCLUSÃO SOCIAL
Coordenadoria do
Orçamento Participativo
São Paulo – Abril de 2003
2. “A pobreza é a perda dos direitos às opções”.
Ladislau Dowbor
O Orçamento Participativo e a cidade de São Paulo
O Orçamento Participativo (OP) é um processo de democracia direta,
voluntária e universal, no qual a população pode discutir e decidir sobre o
orçamento e as políticas públicas. Nesse processo, o cidadão não encerra sua
participação no ato de votar, na escolha de representantes do Executivo e do
Legislativo, mas também compartilha da decisão sobre as prioridades dos
gastos públicos e exerce maior controle sobre as ações governamentais. Ele
deixa de ser um coadjuvante da política tradicional para ser protagonista
permanente da gestão pública.
O principal objetivo do OP é ser um instrumento de democratização.
Assegurar a participação direta da população na definição das principais
prioridades para os investimentos públicos. Essa nova experiência de
participação popular procura romper com a tradição de apenas os governantes
tomarem as decisões, nem sempre atendendo aos interesses da população.
Ela surge como resposta aos limites da democracia representativa,
combinando características desta com outras da democracia direta,
possibilitando assim uma nova relação entre estado e sociedade e um novo
modelo de gestão democrática.
A experiência de OP na cidade de São Paulo, assim como a de outras
cidades que se inspiram no processo precursor de Porto Alegre, se baseia em
características comuns: “uma estrutura e um processo de participação
baseados em três princípios e em um conjunto de instituições, que funcionam
como mecanismos ou canais que asseguram a participação no processo de
tomada de decisões do governo municipal. Esses princípios são: 1)
participação aberta a todos os cidadãos, sem qualquer status especial
atribuído a qualquer organização, inclusive as comunitárias; 2) combinação da
democracia direta e representativa, cuja dinâmica institucional dê aos próprios
participantes a definição das regras internas; e, 3) a dotação dos recursos
para investimento baseada na combinação de critérios gerais e técnicos, ou
seja, compatibilizando decisões e regras estabelecidas pelos participantes com
2
3. as exigências técnicas e legais da ação governamental, respeitando, ainda, os
limites financeiros1.
Um breve balanço dos anos de 2001 e 2002
Nos dois primeiros anos de implantação e execução do Orçamento
Participativo na cidade de São Paulo, a Coordenadoria Especial do Orçamento
Participativo desenvolveu ações para introduzir a participação popular no
planejamento, na gestão orçamentária e na fiscalização da atuação do poder
público municipal.
O processo do OP, iniciado no ano de 2001, abriu à discussão pública
duas áreas apenas - saúde e educação - e contou com a participação de 33 mil
pessoas. As prioridades escolhidas pela população nas assembléias territoriais
resultaram no Plano de Obras e Serviços para 2002, aprovado integralmente
pela Câmara Municipal.
Nesse Plano de Obras e Serviços destacam-se, na área de educação,
construções de 117 unidades educacionais – creches e escolas de ensino
infantil e fundamental – e expansão de convênios com creches. Na área da
saúde, além da previsão de R$ 142 milhões para a implantação de equipes do
Programa de Saúde da Família (PSF), figuram construções de dois hospitais e
de 23 unidades básicas de saúde. Os investimentos estimados no Plano de
Obras e Serviços foram da ordem de R$ 482 milhões e até 31 de dezembro de
2002 já haviam sido executados 78,6 % do previsto.
Em 2002, a participação no processo do OP atingiu 55 mil pessoas, e
duas inovações foram introduzidas. A primeira delas possibilitou aos
participantes optar, no ciclo territorial, por uma terceira área, além daquelas
de educação e saúde. Programas de Melhoria de Bairro, Cultura, Programas
Sociais e Assistência Social, Habitação, Abastecimento e Transporte e Obras
Viárias compuseram as escolhas possíveis.
Foram realizadas 205 assembléias preparatórias (conforme divisão
interdistrital da pesquisa Origem e Destino do Metrô), para definir essa
terceira área, e 96 assembléias deliberativas (divisão distrital), para escolher
1
SANTOS, Boaventura. “Participatory budgeting in Porto Alegre: toward a redistributive democracy”. In
Politics and Society, Stoneham, 1998, p. 468.
3
4. obras e serviços e eleger delegados(as) regionais.
A segunda inovação foi a introdução do ciclo temático do Orçamento
Participativo, uma dinâmica na qual o poder público propõe ações e políticas
públicas e discute com a população os programas que esta considera
prioritários. Cinco temas abrangentes permitiram o debate sobre diversos
aspectos da cidade: Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos; Transporte e
Circulação; Desenvolvimento Econômico e Geração de Renda; Cidadania,
Inclusão Social e Combate à Pobreza; e Habitação e Desenvolvimento Urbano.
Nesse ciclo, a população elegeu delegados(as) temáticos para
representá-la no acompanhamento do planejamento e da implementação das
ações pelas secretarias e órgãos municipais.
Vale ressaltar que esse processo temático proporcionou, por meio dos
grupos de trabalho intersecretariais responsáveis pelos diagnósticos e pela
proposição das políticas apresentadas à população, uma nova dinâmica de
planejamento do poder público, mais próxima e consonante com a realidade e
aspirações dos cidadãos.
O Orçamento Participativo 2003
O novo Regimento do Orçamento Participativo2 estabelece algumas
mudanças para o processo de 2003, que condizem com a nova realidade
administrativa da cidade, após a criação das subprefeituras.
A primeira delas amplia o universo de deliberação. Diferentemente dos
anos anteriores, todas as áreas de atuação da prefeitura serão alvo de
discussão no ciclo territorial. Neste, as assembléias serão feitas em duas
rodadas deliberativas para definir obras e serviços e eleger delegados(as),
intercaladas por uma etapa de negociação nos Fóruns Regionais de Delegados,
na qual se discutirá com representantes das subprefeituras, governos locais e
secretarias a viabilidade técnica e econômica de cada proposta.
No ciclo temático haverá mudanças quanto à base territorial e ao
formato das assembléias. Estas ocorrerão nas 31 subprefeituras em duas
2
O Regimento do Orçamento Participativo, que institui as regras do processo na cidade de São Paulo, é
elaborado e aprovado anualmente pelo Conselho do Orçamento Participativo, no qual somente os
representantes da população possuem direito a voto.
4
5. rodadas de seminários temáticos: na primeira o tema será “A cidade que
temos”, de caráter informativo; na segunda, “A cidade que queremos”, na
qual os participantes poderão indicar diretrizes para o planejamento de ações
e políticas públicas.
Há, ainda no ciclo temático, uma outra ocasião na qual os cidadãos
poderão discutir temas que ultrapassam os limites territoriais ou nos quais as
ações do governo não estão descentralizadas por razões operacionais ou
estratégicas. Trata-se das Assembléias Temáticas Setoriais, que versarão
sobre os temas: Habitação; Meio Ambiente; Segurança Urbana; e Transporte.
Do ponto de vista da representação popular no processo do OP deste
ano também foram introduzidas várias ações inovadoras. Em São Paulo,
certas parcelas da população são mais discriminadas e marginalizadas que
outras, pois encontram maiores obstáculos para exercer seu pleno direito à
cidadania. É o que chamamos de “segmentos sociais vulneráveis” que, embora
com grande peso numérico na sociedade, não são ouvidas em algumas
instâncias políticas.
Em seu atual funcionamento, o OP previu mecanismos que visam
privilegiar a representação desses setores sociais. Concebidas como as
chamadas “políticas de cotas”, vigoram condições especiais para a eleição de
delegados ou delegadas de cada um dos nove segmentos vulneráveis:
mulheres, negros, crianças e adolescentes, idosos, jovens e GLBTs (gays,
lésbicas, bissexuais e transgêneros) elegem um(a) delegado(a) para cada 5
votantes; já os índios, moradores de rua e pessoas com deficiência têm direito
a um(a) delegado(a) por voto. A título de comparação, para a eleição de
delegados territoriais ou temáticos, a proporção é de um para cada vinte
votantes.
Os(as) delegados(as) de segmento disporão de locus próprio para
eleger seus conselheiros(as), que integrarão o Conselho do Orçamento
Participativo (CONOP): são as plenárias municipais de segmentos, instâncias
que permeiam tanto o ciclo temático como o territorial.
Todo o percurso de escolha de prioridades e de delegados(as) termina
em um órgão máximo: o Conselho do Orçamento Participativo (CONOP).
Renovado a cada ano, sua composição reflete o caráter radicalmente
5
6. democrático do OP: são 113 conselheiros(as) titulares e o mesmo número de
suplentes, dos quais apenas catorze são indicados pelo Poder Executivo. É
importante frisar que os membros que representam o governo no CONOP não
possuem direito a voto.
É papel do CONOP elaborar anualmente o regimento que institui as
regras do OP na cidade de São Paulo. Além disso, o conselho sistematiza e faz
os ajustes finais no Plano de Obras e Serviços, documento que harmoniza as
demandas populares e a capacidade de atendimento do governo. O Plano de
Obras é remetido ao Executivo, incorporado à peça orçamentária principal e,
finalmente, levado à Câmara Municipal para apreciação e votação até 31 de
dezembro de cada ano. Cabe também aos conselheiros e delegados do OP
acompanhar e fiscalizar a execução orçamentária.
Orçamento Participativo:
instrumento de combate à pobreza e à exclusão social
Além do caráter democrático do OP, possibilitando o desenvolvimento
da cidadania ativa, em que “saber escolher, poder escolher e efetivar as
escolhas”3 passam a fazer parte da vida política da cidade, são bastante
relevante seus aspectos distributivo e inclusivo, tanto no que tange aos
investimentos definidos na peça orçamentária, como na expansão de
equipamentos, bens e serviços públicos, favorecendo uma aplicação mais
eficiente das verbas públicas na cidade de São Paulo.
Diferentemente do que predominou em gestões anteriores, nas quais a
alocação dos investimentos nas diferentes regiões da cidade era definida de
forma unilateral, freqüentemente distanciada dos reais problemas que afetam
a população, o Orçamento Participativo, além de estabelecer uma relação de
co-gestão, introduziu novos critérios técnicos e regimentais para distribuir os
recursos entre as regiões: número absoluto de população da região,
porcentagem da população que participou das assembléias do OP e índice de
carência e exclusão social. Os efeitos distributivos da adoção desses princípios
e metodologias podem ser comprovados quando se verifica que as regiões
3
OLIVEIRA, Francisco de. O que é formação para a cidadania. Entrevista para Silvio Caccia Bava, Instituto
Pólis, agosto de 2000 (retirado do site www.polis.org.br/publicacoes/artigos/entrevchico.html)
6
7. mais carentes e populosas da cidade passaram a receber um montante de
investimento maior do que as mais abastadas (ver anexo, mapas 10 e 11).
Isso é de grande relevância, pois são essas as regiões que apresentam
também maior incremento populacional, maior nível de homicídios e maior
porcentagem de população jovem (de 0 a 18 anos).
Para avaliar os impactos das obras e serviços definidos no processo, a
Coordenadoria do Orçamento Participativo vem desenvolvendo uma série de
estudos. O caráter distributivo do OP pode ser percebido quando analisamos
duas áreas que, desde o início de sua implantação, foram alvo de discussão e
deliberação no processo implementado em São Paulo: Educação e Saúde. E é
sobre esse enfoque que apresentamos aqui resultados preliminares desses
estudos sobre o OP, enquanto mecanismo de combate à pobreza e à exclusão
social.
Para dimensionar o impacto das obras e serviços do Orçamento
Participativo nessas duas áreas, confrontou-se os Planos de Obras e Serviços
aprovados em 2001 e 2002 com o Mapa da Exclusão Social (SPOSATI,
Aldaíza.PUC/SP, Inpe e Polis,2000), e com o estudo realizado pelo Instituto
Polis, encomendado pela Coordenadoria do Orçamento Participativo,
retratando a desigualdade, a pobreza e as carências da população da cidade
de São Paulo.
A Tabela 1 apresenta o orçamento total dos Planos de Obras e Serviços
do OP em 2001 e 2002, englobando Saúde, Educação e a terceira área4
escolhida em cada subprefeitura:
4
Referente apenas ao ano de 2003.
7
8. Tabela 1 – Totais orçamentários dos Planos de Obras
e Serviços de 2001 e 2002, por área e subprefeitura
3ª área
Subprefeitura Educação Saúde PSF TOTAL
Melhoria de
Habitação(B) Total
Bairros(A)
Aricanduva 16.660.000 2.400.000 2.570.000 5.108.000 5.108.000 26.738.000
Butantã 19.738.000 5.199.600 1.799.000 1.000 1.000 26.737.600
Campo Limpo 25.732.000 23.168.000 19.789.000 1.890.250 1.890.250 70.579.250
Casa Verde 7.244.000 2.646.000 5.397.000 1.653.968,70 1.653.968,70 16.940.970
Cid. Ademar 18.588.000 13.522.000 7.453.000 1.417.687,50 1.417.687,50 40.980.689
Cid. Tiradentes 22.400.000 6.936.000 5.911.000 6.200.000 6.200.000 41.447.000
Ermelino 4.388.000 3.374.000 4.369.000 1.000 1.000 12.132.000
Freguesia do Ó 35.006.200 440.400 11.520.000 1.400.000 1.400.000 48.366.600
Guaianases 19.044.000 972.000 6.939.000 1.000 1.000 26.956.000
Ipiranga* 33.200.000 0 2.056.000 1.000 1.000 35.257.000
Itaim Paulista 36.000.000 1.936.000 12.079.000 1.653.968,70 1.653.968,70 51.668.970
Itaquera 18.506.000 14.481.000 3.341.000 1.653.968,70 1.653.968,70 37.981.969
Jabaquara 6.000.000 400.000 2.056.000 230.000 230.000 8.686.000
Jaçanã 5.615.200 2.646.000 1.799.000 1.000 1.000 10.061.200
Lapa 4.337.200 3.528.000 2.570.000 1.733.000 1.733.000 12.168.200
M'Boi Mirim 17.907.200 17.746.600 27.242.000 2.126.531,20 2.126.531,20 65.022.331,20
Mooca 8.050.000 11.066.000 2.056.000 1.000 1.000 21.173.000
Socorro* 50.400.000 12.496.000 5.397.000 1.000 1.000 68.294.000
São Miguel 19.550.000 10.760.000 7.710.000 1.000 1.000 38.021.000
Sé 8.115.000 1.876.000 3.084.000 1.000 1.000 13.076.000
Parelheiros 4.394.000 3.862.000 3.598.000 1.000 1.000 11.855.000
(C)
Penha 8.250.000 4.991.000 3.341.000 16.582.000
Perus 21.000.000 6.826.000 2.048.000 1.000 1.000 29.875.000
Pinheiros 559.600 4.188.000 771.000 945.125 1.000 946.125 5.519.600
Pirituba 40.000.000 19.298.000 6.400.000 1.000 1.000 65.699.000
Santana 3.008.000 3.196.000 771.000 1.181.406,20 1.181.406,20 8.156.406,20
Sto Amaro 7.447.600 1.928.000 514.000 1.000 1.000 9.890.600
São Mateus 37.000.000 8.085.000 4.112.000 8.700.000 8.700.000 57.897.000
Vl. Maria 18.732.200 5.918.000 2.056.000 1.417.687,50 1.417.687,50 28.123.887,50
Vl. Mariana 4.607.200 1.380.000 1.028.000 1.181.406,20 1.181.406,20 8.196.606,20
Vl. Prudente 19.722.500 13.992.000 17.476.000 1.000 1.000 51.191.500
TOTAIS 541.201.900 209.257.600 177.252.000 15.123.000 23.385.000 38.508.000 966.219.503
(A)
As verbas destinadas para Melhorias de Bairro, nos lugares onde este tema foi escolhido, estão sob
controle de cada Subprefeitura para investimento na região, podendo ser usados para reformas viárias
locais, pequenas obras, etc. A prerrogativa para a decisão da alocação destes recursos é da população,
sendo que o processo de negociação ocorre no CONOP.
(B)
A quantia de R$1.000,00 (mil reais) destinada para muitas subprefeituras que elegeram Habitação como
prioridade é referente a um primeiro momento de atividades, como pesquisas para levantamentos de dados
e estudos de viabilidade. É um valor inicial para possibilitar, dentro do orçamento, a discussão para
execução de tal obra. Após a definição do valor da obra, há possibilidade de se negociar o restante da verba
diretamente com a Secretaria de Habitação.
(C)
A Subprefeitura da Penha é um caso especial, tendo sido a única a eleger Programas Sociais e Assistência
Social como terceiro tema. Neste caso, a ausência de uma dotação orçamentária para a terceira área, no
Plano de Obras e Serviços, se explica pela necessidade da realização de levantamento de dados para a
aplicação de programas sociais na região, que já terão início em 2003. A Penha passa a ser prioridade para
a implantação gradual dos programas sociais redistributivos – Renda Mínima, Bolsa Trabalho, Operação
Trabalho, Começar de Novo –, emancipatórios e de apoio ao desenvolvimento local.
8
9. O impacto do Orçamento Participativo na saúde
A Constituição brasileira de 1988 refere como fatores determinantes e
condicionantes da saúde, entre outros, a alimentação, a moradia, o
saneamento básico, o ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o
transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.
A área da Saúde é um dos principais problemas da cidade de São Paulo.
Considerada não somente como um direito social, mas como um dever do
Estado, a atenção à saúde requer medidas que almejem garantir os cuidados
com a prevenção e assistência a toda a população.
Segundo estudo realizado pelo instituto Polis5, déficits em equipamentos
de saúde e taxas alarmantes de mortalidade infantil podem ser observadas em
todas as partes da maior cidade do Brasil. À medida que se afastam da região
central, esses índices tendem a piorar, acompanhando o quadro de
degradação social em que se encontra a região periférica da cidade.
Assim sendo, o investimento público é o único mecanismo de reversão
deste quadro. Com um orçamento global restrito, a Prefeitura de São Paulo
retomou, em janeiro de 2001, a construção do Sistema Único de Saúde (SUS)
como diretriz da política de saúde na cidade e adotou o Programa de Saúde da
Família (PSF) como uma de suas prioridades.
Convém ressaltar que grande parte das demandas referentes ao PSF
partiram das discussões que ocorreram no âmbito do OP. O Programa de
Saúde da Família deverá promover uma completa reorganização do acesso da
população aos serviços de saúde na cidade, assumindo, portanto, um papel
estruturante dos conjuntos das ações a serem desenvolvidas pela Secretaria
da Saúde. Por meio da atenção permanente proporcionada pelas equipes de
PSF, bem como das ações de prevenção e promoção, o programa possibilita a
resolução de aproximadamente 80 a 85% dos problemas nas próprias
Unidades Básicas de Saúde, hoje afogadas em filas de pessoas. As equipes são
compostas por um médico, um enfermeiro, dois auxiliares de enfermagem e
cinco ou seis agentes comunitários de saúde, que atendem uma população de
mil famílias.6
5
SEMPLA 2001 e PRO-AIM 2000
6
Dados: Secretaria Municipal de Saúde.
9
10. A implantação do Programa de Saúde da Família pelo Orçamento
Participativo segue a lógica de priorização das áreas com piores índices de
carência, conforme mostram os mapas 1, 2 e 3 que se encontram em anexo.
A seguir, destacam-se alguns casos ilustrativos de Subprefeituras que
apresentam péssimos indicadores na área de saúde e que foram priorizadas
na distribuição dos recursos aprovados no OP:
Cidade Tiradentes é a subprefeitura que apresenta o quarto pior
coeficiente de mortalidade infantil7, o pior índice de mortalidade precoce por
doenças crônicas não transmissíveis da cidade8. Seu déficit em equipamentos
de saúde é gravíssimo em comparação com as outras subprefeituras9. Além
disso, o alto o índice de privação e concentração de jovens10 é combinado com
um altíssimo índice de exclusão social11.
Respondendo a essa situação, a Subprefeitura de Cidade Tiradentes
recebeu a terceira maior dotação orçamentária para o setor da Saúde (Plano
de Obras e Serviços-2002/2003). Foram implantadas 23 unidades de PSF no
ano de 2002, que correspondem à assistência a 23.000 famílias, além da
previsão de construção de uma UBS (Unidade Básica de Saúde) para a região.
Além disso, foi aprovada no Orçamento Participativo, para esta
Subprefeitura, a construção de um hospital. Por se tratar de uma obra de
grande porte, com alta alocação de recursos, prazo mais longo de conclusão e
estrutura capaz de atender altíssimo número de pessoas, é de extrema
importância que tal construção esteja localizada em uma região com índices
de carência tão gritantes.
Outro grande exemplo do impacto dos investimentos do OP em saúde é
o da Subprefeitura de M’Boi Mirim. Um de seus distritos, Jd. São Luis,
apresenta o segundo pior coeficiente de mortalidade infantil da cidade12. O
distrito do Jd. Ângela apresenta déficit crítico em equipamentos de saúde13.
Assim como a Cidade Tiradentes, a subprefeitura do M’boi Mirim tem situação
crítica de exclusão social, altíssima privação e concentração de jovens, o
7
Fundação SEADE
8
PRO-AIM/ CEINFO/ SMS
9
Mapa POLIS- Fonte SEMPLA
10
Mapa da Topografia Social-SAS/ PMSP/ CEM/ CEBRAP)
11
Mapa da Exclusão Social-SPOSATI, Aldaíza.(coord.)PUC/SP, Inpe e Polis,2000
12
Fundação SEADE
13
Mapa POLIS- Fonte SEMPLA
10
11. terceiro pior índice de mortalidade precoce por doenças crônicas não-
transmissíveis da cidade e o pior coeficiente de mortalidade por causas
externas.
Essa subprefeitura foi um dos locais privilegiados para investimentos no
Orçamento Participativo, recebendo a segunda maior dotação orçamentária na
área da saúde (Plano de Obras e Serviços-2002/2003). Nela foi implantada a
maior quantidade de PSFs da cidade de São Paulo, no ano de 2002, com 106
equipes, e também foi prevista a construção de um hospital.
Uma outra subprefeitura que merece destaque é a de Campo Limpo,
que apresenta péssimos indicadores na área da saúde. Faltam equipamentos
de saúde, a taxa de mortalidade infantil é alta e o índice de mortalidade
precoce por doenças crônicas não-transmissíveis está entre os piores
observados na cidade de São Paulo. Tal quadro colocou a região no topo do
ranking de investimentos na área de saúde, previstos pelos Planos de Obras e
Serviços 2002/2003 do Orçamento Participativo. Foram implantadas, em
2002, 77 unidades do Programa Saúde da Família (segundo maior número de
equipes implantas na cidade de São Paulo), oferecendo assistência médica a
77 mil famílias.
Tendo em vista os dados sobre as condições em que vivem as
populações dessas regiões, percebemos que as demandas apresentadas nas
assembléias do OP e as conseguintes obras e serviços aprovadas vêm ao
encontro imediato das necessidades das populações locais, colaborando para
conferir maior equilíbrio na distribuição de recursos entre as subprefeituras e,
inclusive, entre os próprios distritos das mesmas.
O impacto do Orçamento Participativo na Educação
Nos dois anos de Orçamento Participativo, a maior parte dos
investimentos (que acompanha as demandas da população) foi destinada para
a área de educação. Entre as unidades implementadas (escolas já construídas)
e previstas (escolas a serem construídas), as obras abrangem um total de
217.060 vagas - em creches (CEI), escolas de educação infantil (EMEI) e
escolas de educação fundamental (EMEF). Existem outras 20.500 destinadas a
programas como o MOVA (movimento de alfabetização de jovens e adultos),
11
12. suplência e cursos pré-profissionalizantes. Além disso, mais jovens e adultos
serão beneficiados com as reformas e ampliações de escolas demandadas
através do Orçamento Participativo.
A deficiência de vagas em creches na cidade de São Paulo possui
dimensões consideráveis. A urgência desta carência é facilmente percebida
nas demandas da população, os CEIs foram as obras mais requisitadas nos
dois anos (ver anexo, mapas 4 e 5). O impacto das vagas referentes a essa
demanda é menos abrangente do que o das EMEI e EMEF, já que uma creche
proporciona de 120 a 160 vagas, enquanto 1500 são criadas em cada unidade
das escolas municipais.
Porém, é importante ressaltar que o impacto das 160 vagas criadas em
uma CEI não se limita ao número de crianças atendidas, já que como
conseqüência direta se cria a oportunidade de 160 mães trabalharem,
incrementando sua renda familiar. Essa é uma consideração relevante, pois,
conforme atestam estudos do Instituto Pólis, existem distritos com até 7,31%
de mulheres chefe de família que se encontram sem renda.
Um dado interessante a ser observado é a grande demanda por vagas
de creche na região central da cidade. Em princípio, esta é uma região que, se
observarmos cuidadosamente o mapa de Déficit de Vagas, não apresenta altos
indicadores de carência por vagas. No entanto, convém lembrar que é na área
central que está concentrada a maioria dos empregos de São Paulo e é para lá
que se deslocam todos os dias milhares de mães que não têm onde deixar
seus filhos. São mulheres (muitas chefes de família) provenientes das zonas
periféricas da cidade. Logo, as vagas geradas nesta região suprem,
parcialmente, as necessidades da população trabalhadora da região.
Os Centros de Educação Unificados (CEU) englobam CEI, EMEI e EMEF
em uma mesma unidade. Os CEUs oferecem também um conjunto cultural,
um conjunto de lazer esportivo, um Telecentro e um centro comunitário, que
estarão a serviço da população nos fins de semana. Localizados em regiões
carentes e de grande densidade populacional da Capital, os CEUs serão
centros de referências de redes de escolas, que deverão interagir entre si. A
organização dos CEUs prevê uma nova concepção de gestão nas áreas social e
pedagógica e de relação entre as instituições educativas de cada região. A
12
13. ação articulada entre instâncias governamentais e o desenvolvimento de
parcerias com organizações da sociedade civil são a base desse modelo de
gestão educacional.
Figura também entre as demandas do OP, em 2001, como terceira
prioridade, o Projeto Escola Aberta (PEA). No Plano de Obras e Serviços de
2001 estava prevista a implantação do PEA em 400 EMEFs. O projeto tem
como intuito dar incentivo ao protagonismo juvenil, reconhecendo o jovem
como sujeito do seu próprio processo de desenvolvimento. O PEA possibilita a
abertura das escolas durante os finais de semana, feriados, recessos e férias
se apresentando como uma alternativa ao jovem.
Os mapas 6 e 7 (ver anexo) demonstram o impacto das vagas que
serão criadas pelas obras do OP em educação infantil.
Uma Subprefeitura que ilustra esse ajuste entre necessidades e
investimentos é a de Capela do Socorro, que apresenta altos índices de déficit
em vagas educacionais e é responsável pelo distrito de Grajaú, um dos
maiores índices de exclusão e dos piores índices de toda a cidade em relação
ao déficit de vaga em educação infantil e creches. Na Subprefeitura de Capela
do Socorro, como um todo, faltam 23.026 vagas de educação infantil, das
quais aproximadamente 5.700 (¼) serão proporcionadas pelas obras
demandadas no OP. A situação de vagas em creches é ainda mais crítica, um
déficit de 40.556 vagas mostra o contínuo descaso de administrações
anteriores com a região. O número de vagas criadas pelo OP, 1600, pode
neste caso parecer irrisório, mas demonstra uma mudança no padrão do
investimento público, já que representa a construção de cinco CEIs mais as
900 vagas proporcionadas pela construção de 3 CEUs. Essas obras
educacionais totalizam investimentos da ordem de R$ 50,4 milhões.
Em São Mateus, após a construção de todas as EMEIs, o déficit da
subprefeitura cairá de 10.728 para 3.228. Alem disso, mais 3.000 vagas serão
criadas em Ensino Fundamental. Já em Pirituba, foram criadas 17.620 vagas,
significando um investimento de R$ 40.000.000.
M’Boi Mirim é uma das subprefeituras que apresenta alto índice de
exclusão (0,6462), afetando uma população de 480.812 pessoas. É uma
região com um dos mais altos índices de homicídio (207/ 100.000) e com o
13
14. distrito mais crítico da cidade, o Jd. Ângela.
Em educação infantil existe um déficit de 17.599 vagas. Com as obras
aprovadas no OP, cerca de 5.400 vagas serão criadas. Um CEU será
construído dentro da favela Monte Azul.
Em Cidade Tiradentes, após as 2400 vagas que serão criadas com as
obras do OP, o déficit em Educação Infantil será de apenas 1176. Cidade
Tiradentes tem o maior número de mulheres chefes de família que se
encontram sem renda (5,12%), e é a Subprefeitura que teve o maior numero
de vagas em creches criadas (3140 – 6 CEIs mais convênios para 2.000
crianças), incidindo sobre um déficit de 16.829.
Na Subprefeitura de Campo Limpo, foram criadas 15.860 vagas,
incluindo todas as obras educacionais. Paraisópolis, subdistrito de Campo
Limpo, possui as piores porcentagens da subprefeitura – 19,84% de chefes de
família não-alfabetizados, 22.29% de chefes de família sem renda e um nível
muito baixo de total absoluto de emprego. Para esse subdistrito a demanda se
constituiu de um CEI, um EMEI, um EMEF, suplência para 5 mil alunos e
alunas e um curso pré-profissionalizante para outros 200.
O mapa referente às faixas etárias da população (mapa 8) mostra que é
na extrema periferia de São Paulo que a população de 0 a 18 anos se
concentra, representando de 39 a 50% do total de habitantes (IBGE 1996).
São nessas mesmas áreas que se encontram os maiores déficits de vagas em
escolas e índices de analfabetismo entre os chefes de família. A partir do mapa
do investimento direcionado nos dois anos de OP, percebe-se que o montante
de recursos destinados à periferia obedece à lógica da necessidade (mapa 9).
Ou seja, foi para as subprefeituras mais carentes e com maior porcentagem de
jovens que se destinou a grande maioria das obras e serviços.
Conclusão
São Paulo configura-se hoje como uma megalópole repleta de
contradições. Uma cidade que abriga os maiores índices de desigualdades
entre 10,4 milhões de habitantes, população mais numerosa do que a de
muitos paises, como Uruguai, Grécia, Iugoslávia e Cuba. Existe em São Paulo
“um processo agudo de exclusão territorial que condena a maioria dos seus
14
15. moradores a viver em territórios caracterizados pela ilegalidade e pela total
falta de serviços públicos, ao lado de verdadeiros ‘enclaves’ de altíssima
renda, legalidade e total cobertura de serviços públicos. Historicamente, a
ilegalidade dos assentamentos humanos na cidade de São Paulo foi utilizada
como justificativa para a manutenção de um mecanismo perverso de ‘clientela’
política: a extensão da rede de serviços públicos aos mencionados
assentamentos caracterizados pela sua irregularidade e ilegalidade foi motivo
para a troca por votos a apoios políticos com políticos prebendários”.14
A essas características soma-se a peculiaridade da cidade de São Paulo,
que dentro do contexto brasileiro se encontra em sintonia com as dinâmicas
das “cidades-globais”. É esse contexto que “atualiza a importância de políticas
públicas como as do orçamento participativo na medida em que estas se
configuram como mecanismos de combate à fragmentação social e à
vulnerabilidade acentuada de importantes bolsões da população,
principalmente urbana.”15
São reflexões como estas que, mais do que tentar responder às dúvidas
surgidas através de constatações, se propõem a repensar a maneira como
nossa cidade vem se comportando em face de seus desafios cotidianos de
erradicar a miséria e de resgatar os valores de cidadania de sua população.
Usando como subsídio os mapas aqui apresentados, ao agrupar os mais
variados materiais que vêm sendo produzidos sobre o assunto, através da
sobreposição de dados, foi traçado um pequeno esboço do impacto, em um
primeiro momento e no curto prazo de existência do Orçamento Participativo,
no combate aos indicadores cruéis de miséria e discriminação.
Em longo prazo, somos munidos da certeza de que, não só por propor
novas modalidades de garantias a direitos individuais e coletivos, mas por seu
caráter pedagógico, o OP fixará um novo viés na análise sobre a questão da
pobreza, reforçando a territorialidade do problema. E, ao incorporar as
vicissitudes geradas por sua aplicação ao longo dos anos, caminhará no
sentido do estabelecimento de uma lógica mais humana e cidadã para os
investimentos públicos.
14
SÁNCHEZ, Félix. “Orçamento Participativo: Administração democrática e cidadania no século XXI”. São
Paulo, Coordenadoria do Orçamento Participativo, 2003.
15
Ibidem, p. 15.
15
18. Mapa 8 Mapa 9
Mapa da Exclusão Social (SPOSATI, Aldaíza.PUC/SP, Inpe e Polis,2000)
Mapa 10 Mapa 11
Mapa da Exclusão Social (SPOSATI, Aldaíza.PUC/SP, Inpe e Polis,2000)
18
19. Coordenadoria Especial do Orçamento Participativo
Casa das Retortas – Rua da Figueira, 77 – Parque Dom Pedro II
CEP: 03003-000
Tel.: (11) 3315-9077 Ramais: 2092/2554 Fax: 2125
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