O documento discute os riscos da proposta de autonomia do Banco Central brasileiro. Argumenta que isso levaria a uma maior influência do setor financeiro sobre decisões econômicas, em detrimento dos interesses da sociedade. Defende maior controle social sobre a política econômica, inclusive por meio de uma reforma política ampla e uma Assembleia Constituinte exclusiva.
Carta Pastoral da Câmara dos Bispos da IEAB sobre eleições
Banco central autônomo um cheque em branco!
1. Um dos polêmicos pontos que está sendo levantado na campanha para a Presidência da
República é a questão da autonomia do Banco Central. É o tipo de proposta que vem
revestida de uma linguagem aparentemente técnica, mas que esconde uma perigosa
submissão de uma sociedade já desprovida de autonomia suficiente para fiscalizar coisas
que mexem com o bolso e com o cotidiano das pessoas.
Em recente artigo que escrevi para a Christian Aid, onde tratamos do tema entre Tributos e
Ética, destaquei que o Brasil vive hoje sob o império da financialização da economia, no
qual, como simples cidadãos, não temos nenhum controle sobre as decisões
macro-econômicas tomadas nos gabinetes dos que mexem com a economia nacional.
Por isso, defendo cada vez mais uma proposta de controle social da política econômica que
não deve e nem pode ser assunto privado de uma dezena de economistas e tributaristas
investidos de um poder de alterar - segundo os ventos de mercado - taxas, juros e outros
índices que afetam diretamente os salários, o crédito e as dívidas tanto públicas
(entendendo-se aqui as dívidas dos entes federativos) quanto privadas - aquelas que o
assalariado comum contrai para garantir seu consumo básico e sua sobrevivência.
Todos nós sabemos que bancos e instituições financeiras vivem e lucram com o manejo do
capital de forma implacável, inexorável, beneficiando os mais abastados e sacrificando a
base da pirâmide social. O Brasil virou um paraíso dos bancos. O setor financeiro tem agido
- sob o dogma do livre mercado - com liberdade e qualquer iniciativa de controle de seu
apetite é imediatamente rechaçada a partir do poder que seus ativos tem sobre empresas,
governos e mesmo indivíduos.
Mas tudo isso acontece ainda num país onde o Banco Central ainda tem alguma orientação
técnico-política do Governo Federal.
Agora imaginem um Banco Central autônomo, regendo suas políticas e decisões por critérios
completamente desvinculados de qualquer orientação política. Sabe quem vai mandar muito
mais do que já manda? O setor financeiro. Como se sabe, a derrocada dos chamados bancos
estatais, na onda privaticista que infectou os gestores brasileiros dos últimos 30 anos,
fragilizou e internacionalizou o capital financeiro do país. Hoje, as regulações do capital
brasileiro não são definidas por interesses brasileiros, mas sim ao sabor do mercado
internacional onde estão as matrizes dos principais grupos financeiros que atuam no país.
Um Banco Central independente estará ainda mais suscetível a esse controle que é muito
mais perigoso do que o modelo atual. A financialização da economia será ainda mais voraz e
numa selva de feras em busca de mais lucro, a sociedade brasileira estará à mercê do
capital especulativo em detrimento do capital produtivo. Salários, juros, índices de
indexação, divida pública e privada, investimento social, entre outros pilares da complexa
estrutura econômica e da relação entre agentes econômicos serão regulados perigosamente
2. pelas nervosas agencias de regulação financeira, pelos bancos e, sempre, sob perspectiva
tecnocrata.
A sociedade brasileira não pode abrir mão da sua soberania. Precisamos ampliar o poder de
monitoramento da sociedade através de uma reforma política ampla. Esta proposta tem
mobilizado as pessoas em torno do projeto de uma Constituinte exclusiva que altere a
configuração do Estado brasileiro, superando os limites de uma simples democracia
representativa. Os vícios do Estado brasileiro tem apenas contribuído para excluir das
esferas decisórias a sociedade civil, transferindo à representação política uma procuração
em branco. Ou, usando a analogia do que se pretende com a autonomia do Banco central,
um cheque em branco. A conta, lembremos, é paga pelo cidadão comum!
++Francisco de Assis da Silva