SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 7
Baixar para ler offline
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 1
Dívida, deusa sem altar mas com um clero poderoso
Que tal anular a dívida através de uma imensa
redução da dimensão do sistema financeiro
que se apresenta como credor da Humanidade
e que para nada serve no capítulo da
satisfação das necessidades humanas ?
Sumário
1 - Nem sempre quem contrai dívida é quem a paga
2 - O dominante sistema financeiro
oooooooooo ---------- oooooooooo
1 - Nem sempre quem contrai dívida é quem a paga
Como as classes políticas procuram apenas cuidar da sua notoriedade
mediática para garantirem o acesso a fundos públicos e se mesclarem com o
mundo dos negócios, toda a sua atuação se fixa na propaganda, nas questões
conjunturais e, muito pouco nas questões estruturais e de longo prazo que
afetam as sociedades. A questão da dívida é pois, tomada como trivialidade
que não merece grande relevo; apenas importa a sua utilização como parte da
pirotecnia inter-partidária em que se integram também os subservientes
plumitivos.
Não se considera nem se procura incutir nas pessoas e nas famílias que
evitem o enclausuramento das suas vidas no pagamento de dívidas, no sufoco
de longos períodos de prestações, mesmo para aqueles que têm trabalho;
muitas vezes para satifazer caprichos, modas e vaidades. E o sistema
financeiro é muito competente em animar o endividamento.
As empresas, colocadas no caldo da concorrência selvagem que enforma os
“mercados” endividam-se muitas vezes de forma exagerada tornando-se
presas e dependentes dos bancos, que garantem o ressarcimento e a usura no
património das empresas ou dos seus sócios. Por isso, empresas e
empresários são comuns praticantes da burla fiscal, de fórmulas agilizadas de
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 2
fuga de capital, também usadas pelos escalões elevados da classe política,
sendo esta, peça essencial no traçado dos caminhos da evasão; trata-se de
uma estrada que empresários, advogados e classe política trilham, sem
percalços e em alegre convívio.
Os Estados, tendem a ser entes mal geridos e encabeçados por governos que
se revezam, todos se queixando dos buracos financeiros, dos actos de gestão
danosa que herdaram do governo anterior; um teatro de fantoches. Esquece-se
a plebe que uns anos antes, a chamada oposição de hoje, que brama contra o
governo, terá procedido de igual modo, anos atrás. No seu conjunto, a classe
política gestora do “pote” vai montando o carrossel eleitoral para gerar um
movimento que mantém tudo no mesmo sítio e com o mesmo pendor para a
desestruturação e o compadrio, tudo conduzido com a ligeireza que resulta de
os membros dos governos nunca serem responsabilizados materialmente pelos
danos que causam. Assim como são lestos a contrair dívida que irá onerar a
plebe e tendo como prestimosos parceiros, a banca, sabendo todos que,
enquanto houver populações de gente desatenta, mansa e disposta a pagar,
tudo correrá bem.
2 - O dominante sistema financeiro
A dívida, em geral, é um instrumento do sistema financeiro para ancorar as
suas redes de especulação, de criar e acumular capital de uma forma expedita.
Numa primeira instância, como parcela do sistema financeiro mais próxima e
sentida pelas pesosas, surgem os bancos.
Os bancos comuns procuram entidades físicas, com localização definida,
património e uma atividade consumidora, produtora de bens ou prestadora de
serviços; daí surgirá a formação de rendimentos e necessidades financeiras
correntes ou relativas à expansão de capacidade produtiva, de reestruturações,
sanemanto financeiro, etc. Essas entidades, porque não têm poupanças
acumuladas para esses fins ou porque não as querem aplicar em aquisições
que lhes esgotariam essas poupanças, recorrem ao crédito bancário. Isto tanto
se aplica a empresas, como a pessoas e famílias, procedendo estas, também
ao crédito para efeitos de consumo duradouro (habitação) ou, menos
duradouro (veículos, viagens, pagamento de outras dívidas, etc).
Também o Estado ou outros entes públicos recorrem ao crédito, para
investimento, saneamento financeiro, reestruturação de dívidas ou apenas
porque sim, uma vez que os mandarins gozam de uma enorme
desresponsabilização pelos seus actos de gestão, deixando para o gang
partidário seguinte as sequelas dos seus actos. E sobretudo, porque sabem
que existe uma mole de gente desorganizada, ignorante, distraída ou
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 3
distanciada da gestão , que paga impostos, sofre outros tipos de exação, sem
que se verifique qualquer ação punitiva ou sequer, preventiva, face aos
membros da classe política pelos desmandos cometidos.
A plebe, levianamente, considera o Estado, em geral, como ente fiável e
benfeitor ainda que promova corrupção e desvarios administrativos e
financeiros, tomados como desvios ocasionais, a… corrigir; porém, numa
sequência que, de facto, nunca finda e que é tão velha quanto o Estado. Na
realidade, passa-se o contrário, a excepção vigora como regra; os mandarins
utilizam o aparelho de Estado como plataforma para a concessão de favores a
capitalistas para se locupletarem com contrapartidas corruptas, mantendo os
serviços públicos em permanente estado de desorganização e penúria. Em
contrapartida, cuidam de vigiar o grau de insatisfação da plebe, para evitar
penalizações nos circos eleitorais ou, na pior das hipóteses, cuidando de enviar
matilhas de polícias bem armados para impor a “lei e a ordem”.
Os bancos não ficam sentados à espera que os seus devedores reembolsem o
dinheiro emprestado, embora vá contabilizando os juros. Por outro lado, os
meios financeiros na posse e sob a responsabilidade dos bancos, na sua
grande maioria pertencem aos seus depositantes (devedores ou não) que
utilizam o dinheiro nos seus actos de compra e venda, pagamentos de salários,
impostos, etc; como muito desse dinheiro circula entre as contas dos
depositantes, na realidade não sai fora da órbita do sistema bancário e
mantém-se num montante global relativamente estável – ainda que circulem
em grande velocidade muitos milhões de transações - excepto em situações
excepcionais de crise. Nessas crises o prestimável Estado mostrará o seu
poder majestático reduzindo o volume e a dimensão dos levantamentos das
contas (Grécia, 2015) ou encerrando os próprios bancos, com polícias e tropa à
porta (Argentina, 2001).
Assim, se consolida o mecanismo do multiplicador do crédito. Como é estável o
volume de dinheiro depositado, os bancos podem utilizar parte substancial
desse dinheiro – que não lhes pertence - para a concessão de novos créditos.
Neste contexto, um depósito num banco é utilizado numa pluralidade de
créditos concedidos, todos ancorados nesse mesmo banco. Na realidade, o
que se constrói habilidosamente, é um crescente castelo de cartas que uma
brisa menos branda pode mandar abaixo, ficando um encadeado de dívidas,
imbrincadas umas nas outras, sem sustentação; ou, se preferirem, com uma
sustentação que permitirá se diga “no hay pan para tanto chorizo”.
A globalização, acelerada com a liberalização do sistema financeiro tornou
este, de facto, um sistema mundial e um campo de atuação não regulada. Esse
entrosamento de transações internacionais desenvolve-se em poucas moedas,
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 4
por intermédio de densas redes de informação e cálculos efetuados por
poderosos computadores; e daí que fiquem facilitadas as operações de
titularização, como todos os aspetos relativos a algo tão imaterial como os
circuitos financeiros.
Estas operações de titularização consistem, não no desenvolvimento de vários
créditos baseados nas reservas monetárias ou equiparadas de um banco mas
na emissão de títulos de dívida junto do “mercado” e que têm na base um
conjunto de empréstimos concedidos aos seus clientes – empresas,
particulares, créditos hipotecários – que não saberão sequer que as suas
dívidas estão na base daqueles títulos. As titularizações correspondem á
agregação de grande volume de créditos e, constituem a base para outras
emissões de títulos de dívida, em cascata. A instituição emissora continua com
direitos creditícios sobre as entidades às quais procedeu a empréstimos mas,
ao proceder a uma emissão de (outros) títulos que terão os primeiros como
base, reaveem antecipadamente um volume de capital mutuado. Por outro
lado, o banco que lançou a emissão de títulos, obriga-se, naturalmente a pagar
uma taxa de juro aos aceitantes daqueles títulos.
Acontece que nos mercados financeiros, ontologicamente especulativos, a taxa
de juro é pouco relevante e ninguém fica com títulos guardados à espera do
pagamento dos juros. Ali, o importante é a contração do tempo, a rapidez da
decisão, a rendabilidade medida pela mais ínfima unidade de tempo; ou, se se
preferir, a maximização do lucro por unidade de tempo. Para o comprador dos
títulos emitidos na operação de titularização, surgem duas hipóteses.
a) Uma, é esperar que surja uma oportunidade para os venderem com um
valor superior ao de compra e, uma vez que as taxas de juro andam muito
baixas, uma venda com um valor pouco cima do de compra compensará
o tempo que decorreria até ao momento do exercício do direito a receber
os juros a pagar pela entidade emissora dos títulos;
b) Outra, é esse comprador juntar aqueles títulos a outros que tenha em
carteira e proceder, por seu turno, a uma titularização; um processo que
pode surgir em cascata, perdendo-se rapidamente a noção de quem são
os devedores iniciais, a sua localização ou situação financeira. Esse
desconhecimento desenvolveu toda a crise dita dos subprimes, em finais
de 2007; subprimes esses que eram dívidas da classe média baixa
americana, incentivada pelos bancos a contrair novos empréstimos
ancorados na valorização (irreal ou fugaz) das suas casas… até que
chegou a insolvência a muitos famílias, com impactos alargados, em
espiral, por quantas instituições que detinham títulos baseados nas
dívidas originais, assumidas por famílias insolventes.
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 5
Algumas instituições ou particulares terão um interesse muito particular em
subscrever títulos de dívida pública que funcionarão como garantias (colaterais)
prestadas ao banco central (o BCE na zona euro, o FED nos EUA, o Banco de
Inglaterra…) que em contrapartida entregará moeda/crédito ao sistema
financeiro de base; … alegadamente para que o dinheiro seja injetado na
economia, procurando que esta progrida, que promova emprego,
investimento,“crescimento”, bla, bla, bla...
Os bancos centrais – em regra, impedidos de financiarem os Estados
diretamente e de colmatarem os seus deficits – aceitam que entidades do
sistema financeiro subscrevam emissões de títulos feitas pelos Estados,
alimentando assim, indiretamente, os deficits, na presunção keynesiana de que
um deficit público induz crescimento na economia (?). E aceitam, com toda a
tranquilidade, porque sabem que, em cada Estado há uma classe política que
se encarregará de onerar a população - mormente a que trabalha - com os
rigores da austeridade, da punção fiscal, de polícias e tribunais contra os mais
pobres ou os menos mansos.
Assim, nos leilões de dívida pública observa-se animada concorrência para a
aquisição de títulos, de imediato entregues ao banco central como garantia de
empréstimos concedidos pela autoridade monetária. De seguida e com alta
probabilidade incorporam esses empréstimos no carossel da especulação de
títulos e de toda a variedade de operações no mercado financeiro global –
produtos derivados, swaps, futuros, entre outros.
Claro que a autoridade monetária dirá que com essa injeção de dinheiro no
“mercado” irá verificar-se um acréscimo do… investimento; o que é uma
redonda mentira. A lógica económica capitalista exige um relativo equilíbrio
entre as poupanças existentes, disponibilizadas pelas famílias, compensadas
pelo ganho em juros e as necessidades de investimento, de criação de meios
técnicos geradores de bens e serviços destinados ao bem-estar geral. O que
há é uma criação artificial de dinheiro, em larga medida absorvida pelos
mercados financeiros globais, cuja finalidade é a especulação e não o
apregoado investimento em bem-estar das populações.
O valor calculado para o sistema financeiro, a nível global, embora muito volátil,
é muitas vezes superior ao valor dos bens materiais (terras, imobiliário, ações
de empresas) existentes no planeta; e, muito mais face ao montante do PIB
global que representa os rendimentos contabilizados a nível mundial, num ano.
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 6
O sistema financeiro precisa incessantemente de expansão de novas
responsabilidades assumidas por Estados, empresas e famílias, para
desenvolver, para ampliar os seus mecanismos de multiplicação de capital. E
vem gerando fórmulas tão criativas quanto arriscadas para promover essa
maior acumulação de capital. A Humanidade é envolvida nesse jogo
diretamente, em cada pessoa, como indiretamente através da atuação das
empresas e dos Estados. Nesse delírio, há sempre uma bolha financeira em
crescimento, com rebentamente anunciado para um momento indeterminado e
não previsível e que pode ter uma causa localizada e com um peso ínfimo no
contexto global. Tanto pode acontecer, como em 2007 com os subprimes,
como a partir de um conflito militar algures, como pelo acto de um Gavrilo
Princip que decidiu abater um arquiduque austríaco, despoletando a I Guerra.
Neste contexto…
 Os Estados e os governos, financiam os seus deficits e aumentam
impostos para pagar os juros da dívida, subindo regularmente os degraus
da austeridade;
 As oposições aceitam a parada exigindo brandamente reestruturações
impossíveis, nunca colocando em causa o mecanismo de constituição da
dívida, artificial e opressivo.
 Neste contexto, o sistema financeiro delega as funções de cobrança nas
classes políticas nacionais, um género de guildas de carcereiros dos
povos.
que atitudes se nos deparam ?
Que tal anular a dívida através de uma imensa redução da
dimensão do sistema financeiro que se apresenta como credor
grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 7
da Humanidade e que para nada serve no capítulo da satisfação
das necessidades humanas ?
(continua)
Este e outros textos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
https://pt.scribd.com/uploads

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a Dívida, deusa sem altar mas com um clero poderoso

Dívida pública – cancro não se trata com paracetamol
Dívida pública – cancro não se trata com paracetamolDívida pública – cancro não se trata com paracetamol
Dívida pública – cancro não se trata com paracetamolGRAZIA TANTA
 
Neoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororoba
Neoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororobaNeoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororoba
Neoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororobaGRAZIA TANTA
 
Porque não é pagável a dívida pública portuguesa
Porque não é pagável a dívida pública portuguesaPorque não é pagável a dívida pública portuguesa
Porque não é pagável a dívida pública portuguesaGRAZIA TANTA
 
O sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atual
O sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atualO sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atual
O sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atualGRAZIA TANTA
 
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 2
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    2Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    2
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 2GRAZIA TANTA
 
O volátil domínio da riqueza financeira
O volátil domínio da riqueza financeiraO volátil domínio da riqueza financeira
O volátil domínio da riqueza financeiraGRAZIA TANTA
 
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 3
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    3Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    3
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 3GRAZIA TANTA
 
Capitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicos
Capitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicosCapitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicos
Capitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicosGRAZIA TANTA
 
Seres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiroSeres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiroGRAZIA TANTA
 
Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?
Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?
Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?GRAZIA TANTA
 
A dívida de pessoas e empresas – a dependência eterna
A dívida de pessoas e empresas – a dependência eternaA dívida de pessoas e empresas – a dependência eterna
A dívida de pessoas e empresas – a dependência eternaGRAZIA TANTA
 
Dívida pública beneficiários e pagadores 1ª parte-
Dívida pública   beneficiários e pagadores  1ª parte-Dívida pública   beneficiários e pagadores  1ª parte-
Dívida pública beneficiários e pagadores 1ª parte-GRAZIA TANTA
 
Grécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ue
Grécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ueGrécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ue
Grécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ueGRAZIA TANTA
 
3 D deficits, dívida, desigualdades
3 D   deficits, dívida, desigualdades3 D   deficits, dívida, desigualdades
3 D deficits, dívida, desigualdadesGRAZIA TANTA
 
Os dez anos de crise – ganhadores e perdedores
Os dez anos de crise – ganhadores e perdedoresOs dez anos de crise – ganhadores e perdedores
Os dez anos de crise – ganhadores e perdedoresGRAZIA TANTA
 
2002 Como se consolidam as desigualdades através do tempo
2002   Como se consolidam as desigualdades através do tempo2002   Como se consolidam as desigualdades através do tempo
2002 Como se consolidam as desigualdades através do tempoGRAZIA TANTA
 
Mais um perdâo fiscal. Peres é a sua graça
Mais um perdâo fiscal.  Peres é a sua graçaMais um perdâo fiscal.  Peres é a sua graça
Mais um perdâo fiscal. Peres é a sua graçaGRAZIA TANTA
 
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuroCapitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuroGRAZIA TANTA
 
Decrescimento, capitalismo e democracia de mercado
Decrescimento, capitalismo e democracia de mercadoDecrescimento, capitalismo e democracia de mercado
Decrescimento, capitalismo e democracia de mercadoGRAZIA TANTA
 

Semelhante a Dívida, deusa sem altar mas com um clero poderoso (20)

Dívida pública – cancro não se trata com paracetamol
Dívida pública – cancro não se trata com paracetamolDívida pública – cancro não se trata com paracetamol
Dívida pública – cancro não se trata com paracetamol
 
Neoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororoba
Neoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororobaNeoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororoba
Neoliberalismo e keynesianismo, dois pratos da mesma gororoba
 
Porque não é pagável a dívida pública portuguesa
Porque não é pagável a dívida pública portuguesaPorque não é pagável a dívida pública portuguesa
Porque não é pagável a dívida pública portuguesa
 
O sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atual
O sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atualO sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atual
O sistema financeiro como elemento dominante no capitalismo atual
 
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 2
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    2Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    2
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 2
 
O volátil domínio da riqueza financeira
O volátil domínio da riqueza financeiraO volátil domínio da riqueza financeira
O volátil domínio da riqueza financeira
 
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 3
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    3Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida    3
Como o sistema financeiro captura a humanidade através da dívida 3
 
Capitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicos
Capitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicosCapitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicos
Capitalismo hoje. caracterização, crises e eixos estratégicos
 
Seres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiroSeres humanos, servos do sistema financeiro
Seres humanos, servos do sistema financeiro
 
Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?
Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?
Se falta uma politica de habitação onde está a justificação para o IMI ?
 
A dívida de pessoas e empresas – a dependência eterna
A dívida de pessoas e empresas – a dependência eternaA dívida de pessoas e empresas – a dependência eterna
A dívida de pessoas e empresas – a dependência eterna
 
Dívida pública beneficiários e pagadores 1ª parte-
Dívida pública   beneficiários e pagadores  1ª parte-Dívida pública   beneficiários e pagadores  1ª parte-
Dívida pública beneficiários e pagadores 1ª parte-
 
Grécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ue
Grécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ueGrécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ue
Grécia, vítima da gula dos bancos e das desigualdades dentro da ue
 
3 D deficits, dívida, desigualdades
3 D   deficits, dívida, desigualdades3 D   deficits, dívida, desigualdades
3 D deficits, dívida, desigualdades
 
Os dez anos de crise – ganhadores e perdedores
Os dez anos de crise – ganhadores e perdedoresOs dez anos de crise – ganhadores e perdedores
Os dez anos de crise – ganhadores e perdedores
 
2002 Como se consolidam as desigualdades através do tempo
2002   Como se consolidam as desigualdades através do tempo2002   Como se consolidam as desigualdades através do tempo
2002 Como se consolidam as desigualdades através do tempo
 
Mais um perdâo fiscal. Peres é a sua graça
Mais um perdâo fiscal.  Peres é a sua graçaMais um perdâo fiscal.  Peres é a sua graça
Mais um perdâo fiscal. Peres é a sua graça
 
Conhecimentos bancarios
Conhecimentos bancariosConhecimentos bancarios
Conhecimentos bancarios
 
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuroCapitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
Capitalismo e o espírito naif para a construção do futuro
 
Decrescimento, capitalismo e democracia de mercado
Decrescimento, capitalismo e democracia de mercadoDecrescimento, capitalismo e democracia de mercado
Decrescimento, capitalismo e democracia de mercado
 

Mais de GRAZIA TANTA

Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdfUcrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdfGRAZIA TANTA
 
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.docAs desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.docGRAZIA TANTA
 
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdfBalofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdfGRAZIA TANTA
 
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdfAs balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdfGRAZIA TANTA
 
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdfUnião Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdfGRAZIA TANTA
 
As desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na EuropaAs desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na EuropaGRAZIA TANTA
 
A BideNato flight over
A BideNato flight overA BideNato flight over
A BideNato flight overGRAZIA TANTA
 
Um sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdfUm sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdfGRAZIA TANTA
 
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdfNATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdfGRAZIA TANTA
 
USA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdfUSA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdfGRAZIA TANTA
 
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdfEUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdfGRAZIA TANTA
 
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdfA NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdfGRAZIA TANTA
 
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UENato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UEGRAZIA TANTA
 
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxiGRAZIA TANTA
 
Speculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EUSpeculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EUGRAZIA TANTA
 
Eleições em portugal o assalto à marmita
Eleições em portugal   o assalto à marmitaEleições em portugal   o assalto à marmita
Eleições em portugal o assalto à marmitaGRAZIA TANTA
 
Os especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ueOs especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ueGRAZIA TANTA
 
Human beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial systemHuman beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial systemGRAZIA TANTA
 
Textos de circunstância - 10
Textos de circunstância  - 10Textos de circunstância  - 10
Textos de circunstância - 10GRAZIA TANTA
 
Glasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the looseGlasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the looseGRAZIA TANTA
 

Mais de GRAZIA TANTA (20)

Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdfUcrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
Ucrânia – Uma realidade pobre e volátil.pdf
 
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.docAs desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
As desigualdades entre mais pobres e menos pobres.doc
 
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdfBalofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
Balofas palavras em dia de fuga para as praias.pdf
 
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdfAs balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
As balas da guerra parecem beliscar pouco as transações de energia.pdf
 
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdfUnião Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
União Europeia – diferenciações nos dinamismos sectoriais.pdf
 
As desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na EuropaAs desigualdades provenientes da demografia na Europa
As desigualdades provenientes da demografia na Europa
 
A BideNato flight over
A BideNato flight overA BideNato flight over
A BideNato flight over
 
Um sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdfUm sobrevoo do BideNato.pdf
Um sobrevoo do BideNato.pdf
 
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdfNATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
NATO in the wake of Hitler - Drang nach Osten.pdf
 
USA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdfUSA – A huge danger to Humanity.pdf
USA – A huge danger to Humanity.pdf
 
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdfEUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
EUA – Um perigo enorme para a Humanidade.pdf
 
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdfA NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
A NATO na senda de Hitler – Drang nach Osten.pdf
 
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UENato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
Nato, Ucrânia e a menoridade política dos chefes da UE
 
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi2201   a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
2201 a precariedade suprema no capitalismo do século xxi
 
Speculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EUSpeculative electricity prices in the EU
Speculative electricity prices in the EU
 
Eleições em portugal o assalto à marmita
Eleições em portugal   o assalto à marmitaEleições em portugal   o assalto à marmita
Eleições em portugal o assalto à marmita
 
Os especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ueOs especulativos preços da energia elétrica na ue
Os especulativos preços da energia elétrica na ue
 
Human beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial systemHuman beings, servants of the financial system
Human beings, servants of the financial system
 
Textos de circunstância - 10
Textos de circunstância  - 10Textos de circunstância  - 10
Textos de circunstância - 10
 
Glasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the looseGlasgow – guinness mugs on the loose
Glasgow – guinness mugs on the loose
 

Dívida, deusa sem altar mas com um clero poderoso

  • 1. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 1 Dívida, deusa sem altar mas com um clero poderoso Que tal anular a dívida através de uma imensa redução da dimensão do sistema financeiro que se apresenta como credor da Humanidade e que para nada serve no capítulo da satisfação das necessidades humanas ? Sumário 1 - Nem sempre quem contrai dívida é quem a paga 2 - O dominante sistema financeiro oooooooooo ---------- oooooooooo 1 - Nem sempre quem contrai dívida é quem a paga Como as classes políticas procuram apenas cuidar da sua notoriedade mediática para garantirem o acesso a fundos públicos e se mesclarem com o mundo dos negócios, toda a sua atuação se fixa na propaganda, nas questões conjunturais e, muito pouco nas questões estruturais e de longo prazo que afetam as sociedades. A questão da dívida é pois, tomada como trivialidade que não merece grande relevo; apenas importa a sua utilização como parte da pirotecnia inter-partidária em que se integram também os subservientes plumitivos. Não se considera nem se procura incutir nas pessoas e nas famílias que evitem o enclausuramento das suas vidas no pagamento de dívidas, no sufoco de longos períodos de prestações, mesmo para aqueles que têm trabalho; muitas vezes para satifazer caprichos, modas e vaidades. E o sistema financeiro é muito competente em animar o endividamento. As empresas, colocadas no caldo da concorrência selvagem que enforma os “mercados” endividam-se muitas vezes de forma exagerada tornando-se presas e dependentes dos bancos, que garantem o ressarcimento e a usura no património das empresas ou dos seus sócios. Por isso, empresas e empresários são comuns praticantes da burla fiscal, de fórmulas agilizadas de
  • 2. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 2 fuga de capital, também usadas pelos escalões elevados da classe política, sendo esta, peça essencial no traçado dos caminhos da evasão; trata-se de uma estrada que empresários, advogados e classe política trilham, sem percalços e em alegre convívio. Os Estados, tendem a ser entes mal geridos e encabeçados por governos que se revezam, todos se queixando dos buracos financeiros, dos actos de gestão danosa que herdaram do governo anterior; um teatro de fantoches. Esquece-se a plebe que uns anos antes, a chamada oposição de hoje, que brama contra o governo, terá procedido de igual modo, anos atrás. No seu conjunto, a classe política gestora do “pote” vai montando o carrossel eleitoral para gerar um movimento que mantém tudo no mesmo sítio e com o mesmo pendor para a desestruturação e o compadrio, tudo conduzido com a ligeireza que resulta de os membros dos governos nunca serem responsabilizados materialmente pelos danos que causam. Assim como são lestos a contrair dívida que irá onerar a plebe e tendo como prestimosos parceiros, a banca, sabendo todos que, enquanto houver populações de gente desatenta, mansa e disposta a pagar, tudo correrá bem. 2 - O dominante sistema financeiro A dívida, em geral, é um instrumento do sistema financeiro para ancorar as suas redes de especulação, de criar e acumular capital de uma forma expedita. Numa primeira instância, como parcela do sistema financeiro mais próxima e sentida pelas pesosas, surgem os bancos. Os bancos comuns procuram entidades físicas, com localização definida, património e uma atividade consumidora, produtora de bens ou prestadora de serviços; daí surgirá a formação de rendimentos e necessidades financeiras correntes ou relativas à expansão de capacidade produtiva, de reestruturações, sanemanto financeiro, etc. Essas entidades, porque não têm poupanças acumuladas para esses fins ou porque não as querem aplicar em aquisições que lhes esgotariam essas poupanças, recorrem ao crédito bancário. Isto tanto se aplica a empresas, como a pessoas e famílias, procedendo estas, também ao crédito para efeitos de consumo duradouro (habitação) ou, menos duradouro (veículos, viagens, pagamento de outras dívidas, etc). Também o Estado ou outros entes públicos recorrem ao crédito, para investimento, saneamento financeiro, reestruturação de dívidas ou apenas porque sim, uma vez que os mandarins gozam de uma enorme desresponsabilização pelos seus actos de gestão, deixando para o gang partidário seguinte as sequelas dos seus actos. E sobretudo, porque sabem que existe uma mole de gente desorganizada, ignorante, distraída ou
  • 3. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 3 distanciada da gestão , que paga impostos, sofre outros tipos de exação, sem que se verifique qualquer ação punitiva ou sequer, preventiva, face aos membros da classe política pelos desmandos cometidos. A plebe, levianamente, considera o Estado, em geral, como ente fiável e benfeitor ainda que promova corrupção e desvarios administrativos e financeiros, tomados como desvios ocasionais, a… corrigir; porém, numa sequência que, de facto, nunca finda e que é tão velha quanto o Estado. Na realidade, passa-se o contrário, a excepção vigora como regra; os mandarins utilizam o aparelho de Estado como plataforma para a concessão de favores a capitalistas para se locupletarem com contrapartidas corruptas, mantendo os serviços públicos em permanente estado de desorganização e penúria. Em contrapartida, cuidam de vigiar o grau de insatisfação da plebe, para evitar penalizações nos circos eleitorais ou, na pior das hipóteses, cuidando de enviar matilhas de polícias bem armados para impor a “lei e a ordem”. Os bancos não ficam sentados à espera que os seus devedores reembolsem o dinheiro emprestado, embora vá contabilizando os juros. Por outro lado, os meios financeiros na posse e sob a responsabilidade dos bancos, na sua grande maioria pertencem aos seus depositantes (devedores ou não) que utilizam o dinheiro nos seus actos de compra e venda, pagamentos de salários, impostos, etc; como muito desse dinheiro circula entre as contas dos depositantes, na realidade não sai fora da órbita do sistema bancário e mantém-se num montante global relativamente estável – ainda que circulem em grande velocidade muitos milhões de transações - excepto em situações excepcionais de crise. Nessas crises o prestimável Estado mostrará o seu poder majestático reduzindo o volume e a dimensão dos levantamentos das contas (Grécia, 2015) ou encerrando os próprios bancos, com polícias e tropa à porta (Argentina, 2001). Assim, se consolida o mecanismo do multiplicador do crédito. Como é estável o volume de dinheiro depositado, os bancos podem utilizar parte substancial desse dinheiro – que não lhes pertence - para a concessão de novos créditos. Neste contexto, um depósito num banco é utilizado numa pluralidade de créditos concedidos, todos ancorados nesse mesmo banco. Na realidade, o que se constrói habilidosamente, é um crescente castelo de cartas que uma brisa menos branda pode mandar abaixo, ficando um encadeado de dívidas, imbrincadas umas nas outras, sem sustentação; ou, se preferirem, com uma sustentação que permitirá se diga “no hay pan para tanto chorizo”. A globalização, acelerada com a liberalização do sistema financeiro tornou este, de facto, um sistema mundial e um campo de atuação não regulada. Esse entrosamento de transações internacionais desenvolve-se em poucas moedas,
  • 4. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 4 por intermédio de densas redes de informação e cálculos efetuados por poderosos computadores; e daí que fiquem facilitadas as operações de titularização, como todos os aspetos relativos a algo tão imaterial como os circuitos financeiros. Estas operações de titularização consistem, não no desenvolvimento de vários créditos baseados nas reservas monetárias ou equiparadas de um banco mas na emissão de títulos de dívida junto do “mercado” e que têm na base um conjunto de empréstimos concedidos aos seus clientes – empresas, particulares, créditos hipotecários – que não saberão sequer que as suas dívidas estão na base daqueles títulos. As titularizações correspondem á agregação de grande volume de créditos e, constituem a base para outras emissões de títulos de dívida, em cascata. A instituição emissora continua com direitos creditícios sobre as entidades às quais procedeu a empréstimos mas, ao proceder a uma emissão de (outros) títulos que terão os primeiros como base, reaveem antecipadamente um volume de capital mutuado. Por outro lado, o banco que lançou a emissão de títulos, obriga-se, naturalmente a pagar uma taxa de juro aos aceitantes daqueles títulos. Acontece que nos mercados financeiros, ontologicamente especulativos, a taxa de juro é pouco relevante e ninguém fica com títulos guardados à espera do pagamento dos juros. Ali, o importante é a contração do tempo, a rapidez da decisão, a rendabilidade medida pela mais ínfima unidade de tempo; ou, se se preferir, a maximização do lucro por unidade de tempo. Para o comprador dos títulos emitidos na operação de titularização, surgem duas hipóteses. a) Uma, é esperar que surja uma oportunidade para os venderem com um valor superior ao de compra e, uma vez que as taxas de juro andam muito baixas, uma venda com um valor pouco cima do de compra compensará o tempo que decorreria até ao momento do exercício do direito a receber os juros a pagar pela entidade emissora dos títulos; b) Outra, é esse comprador juntar aqueles títulos a outros que tenha em carteira e proceder, por seu turno, a uma titularização; um processo que pode surgir em cascata, perdendo-se rapidamente a noção de quem são os devedores iniciais, a sua localização ou situação financeira. Esse desconhecimento desenvolveu toda a crise dita dos subprimes, em finais de 2007; subprimes esses que eram dívidas da classe média baixa americana, incentivada pelos bancos a contrair novos empréstimos ancorados na valorização (irreal ou fugaz) das suas casas… até que chegou a insolvência a muitos famílias, com impactos alargados, em espiral, por quantas instituições que detinham títulos baseados nas dívidas originais, assumidas por famílias insolventes.
  • 5. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 5 Algumas instituições ou particulares terão um interesse muito particular em subscrever títulos de dívida pública que funcionarão como garantias (colaterais) prestadas ao banco central (o BCE na zona euro, o FED nos EUA, o Banco de Inglaterra…) que em contrapartida entregará moeda/crédito ao sistema financeiro de base; … alegadamente para que o dinheiro seja injetado na economia, procurando que esta progrida, que promova emprego, investimento,“crescimento”, bla, bla, bla... Os bancos centrais – em regra, impedidos de financiarem os Estados diretamente e de colmatarem os seus deficits – aceitam que entidades do sistema financeiro subscrevam emissões de títulos feitas pelos Estados, alimentando assim, indiretamente, os deficits, na presunção keynesiana de que um deficit público induz crescimento na economia (?). E aceitam, com toda a tranquilidade, porque sabem que, em cada Estado há uma classe política que se encarregará de onerar a população - mormente a que trabalha - com os rigores da austeridade, da punção fiscal, de polícias e tribunais contra os mais pobres ou os menos mansos. Assim, nos leilões de dívida pública observa-se animada concorrência para a aquisição de títulos, de imediato entregues ao banco central como garantia de empréstimos concedidos pela autoridade monetária. De seguida e com alta probabilidade incorporam esses empréstimos no carossel da especulação de títulos e de toda a variedade de operações no mercado financeiro global – produtos derivados, swaps, futuros, entre outros. Claro que a autoridade monetária dirá que com essa injeção de dinheiro no “mercado” irá verificar-se um acréscimo do… investimento; o que é uma redonda mentira. A lógica económica capitalista exige um relativo equilíbrio entre as poupanças existentes, disponibilizadas pelas famílias, compensadas pelo ganho em juros e as necessidades de investimento, de criação de meios técnicos geradores de bens e serviços destinados ao bem-estar geral. O que há é uma criação artificial de dinheiro, em larga medida absorvida pelos mercados financeiros globais, cuja finalidade é a especulação e não o apregoado investimento em bem-estar das populações. O valor calculado para o sistema financeiro, a nível global, embora muito volátil, é muitas vezes superior ao valor dos bens materiais (terras, imobiliário, ações de empresas) existentes no planeta; e, muito mais face ao montante do PIB global que representa os rendimentos contabilizados a nível mundial, num ano.
  • 6. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 6 O sistema financeiro precisa incessantemente de expansão de novas responsabilidades assumidas por Estados, empresas e famílias, para desenvolver, para ampliar os seus mecanismos de multiplicação de capital. E vem gerando fórmulas tão criativas quanto arriscadas para promover essa maior acumulação de capital. A Humanidade é envolvida nesse jogo diretamente, em cada pessoa, como indiretamente através da atuação das empresas e dos Estados. Nesse delírio, há sempre uma bolha financeira em crescimento, com rebentamente anunciado para um momento indeterminado e não previsível e que pode ter uma causa localizada e com um peso ínfimo no contexto global. Tanto pode acontecer, como em 2007 com os subprimes, como a partir de um conflito militar algures, como pelo acto de um Gavrilo Princip que decidiu abater um arquiduque austríaco, despoletando a I Guerra. Neste contexto…  Os Estados e os governos, financiam os seus deficits e aumentam impostos para pagar os juros da dívida, subindo regularmente os degraus da austeridade;  As oposições aceitam a parada exigindo brandamente reestruturações impossíveis, nunca colocando em causa o mecanismo de constituição da dívida, artificial e opressivo.  Neste contexto, o sistema financeiro delega as funções de cobrança nas classes políticas nacionais, um género de guildas de carcereiros dos povos. que atitudes se nos deparam ? Que tal anular a dívida através de uma imensa redução da dimensão do sistema financeiro que se apresenta como credor
  • 7. grazia.tanta@gmail.com 25/05/2019 7 da Humanidade e que para nada serve no capítulo da satisfação das necessidades humanas ? (continua) Este e outros textos em: http://grazia-tanta.blogspot.com/ http://www.slideshare.net/durgarrai/documents https://pt.scribd.com/uploads