O documento discute a aparente contradição entre a ordem e o caos na criação. Aponta que, ao longo da história, foram propostas várias explicações para conciliar esses opostos, como a natureza sem propósito, duas divindades (uma do bem e outra do mal), ou múltiplos deuses. Defende que a solução está em observar as leis da natureza, especialmente a doação à sociedade.
2. A Paz
(Extratos)
Uma pesquisa científica empírica sobre a necessidade da obra de Deus
CONTRADIÇÕES NA PROVIDÊNCIA
Toda a pessoa sensata que examina a realidade a nossa frente, descobre nela dois opostos completos.
Ao examinar a Criação, sua realidade e condutas, há uma aparente e reconhecida liderança de grande
sabedoria e habilidade, tanto com relação à formação da realidade quanto à garantia de sua existência
em geral.
Tomemos a criação de um ser humano como exemplo: o amor e prazer de seus progenitores é a sua
primeira razão, garantida a executar seu dever. E quando a gota essencial é extraída do cérebro do pai,
a Providência garante muito sabiamente um lugar seguro para ela, que a qualifica a receber a vida. A
Providência também lhe dá o seu pão diário na quantia exata, e também prepara uma base maravilhosa
para ela no ventre da mãe, para que nenhum estranho a possa prejudicar.
Ela tende a sua necessidade como uma serva treinada que nunca a esquecerá sequer por um momento,
até que tenha adquirido a força para emergir no nosso mundo. Nessa altura, a Providência, por curto
espaço de tempo, lhe empresta apenas a força suficiente para quebrar as paredes que a rodeiam, e
como um guerreiro treinado e armado ela rompe uma abertura e emerge no mundo.
Então, também, a Providência não a abandona. Como uma mãe amorosa, ela lhe leva a pessoas
amáveis e leais com as quais ela possa confiar, chamadas "Mãe" e "Pai", para assistí-la durante seus
dias de fraqueza, até que ela cresça e seja capaz de se sustentar sozinha. Tal como o homem, também
são os animais, plantas, e objetos; todos são sábia e misericordiosamente assistidos para garantir sua
própria existência e a continuação da sua espécie.
Mas os que examinam essa realidade da perspectiva da provisão e persistência da existência podem ver
de forma clara uma grande desordem e confusão, como se não houvesse líder e orientação. Todos
fazem o que é certo aos seus próprios olhos, construindo-se a si mesmos sobre a ruína dos outros; o
mal prospera e os justos são pisoteados sem misericórdia.
Tenha em mente que esta contrariedade, apresentada perante os olhos de toda a pessoa sensível e
educada, preocupou a humanidade até na antiguidade. E há muitos métodos para explicar estes dois
aparentes opostos na Providência, que ocupam o mesmo mundo.
PRIMEIRO MÉTODO: NATUREZA
Este método é um da antiguidade. Dado que eles não descobriram uma maneira e um canal de fazer
estes dois notáveis opostos próximos, eles vieram a assumir que o Criador, que criou todos estes, que
observa poderosamente sobre Sua realidade para que nada dela seja cancelado, é sem mente e sem
sentido.
Então, embora Ele proteja a existência da realidade com maravilhosa sabedoria, todavia Ele Próprio é
sem mente, e faz tudo sem sentido. Se tivesse havido qualquer razão e sentimento Nele, Ele certamente
não deixaria tais avarias na provisão da realidade, sem piedade e compaixão pelos atormentados. Por
esta razão, eles nomearam-nO "Natureza," isto é um supervisor sem mente e sem coração. E por essa
razão eles acreditam que não há ninguém para com quem nos zangarmos, ou para quem orarmos, ou
para quem nos justificarmos.
SEGUNDO MÉTODO: DUAS AUTORIDADES
3. Outros foram mais espertos. Eles acharam difícil de aceitar a suposição da supervisão da Natureza,
dado que eles viram que a supervisão sobre a realidade, de assegurar sua existência, é uma sabedoria
muito mais profunda que qualquer culminação humana. Eles não conseguiram concordar que o que
supervisiona tudo que seja Ele Mesmo sem mente, pois como pode um dar o que ele não possui? E
como pode um ensinar ao seu amigo quando ele próprio é um tolo?
Como pode você dizer sobre Ele que executa perante nós tais astuciosas e sábias ações que ele não
saiba o que Ele está a fazer, e que Ele o faz por acaso? É claramente evidente que o acaso não pode
organizar qualquer ação ordeira, concebida em sabedoria, muito menos assegurar a sua existência
eterna.
Em consequência, eles chegaram a uma segunda suposição que havia dois supervisores aqui: um cria e
sustenta o bom, e o outro cria e sustenta o mau. E eles elaboraram grandemente esse método com
evidência e prova ao longo do caminho.
TERCEIRO MÉTODO: DEUSES MÚLTIPLOS
Este método nasceu do seio do método de duas autoridades. Isto é porque eles dividiram e separaram
cada uma das ações gerais por si mesma, isto é força, riqueza, dominação, beleza, fome, morte,
desordem, e tudo o mais. Eles nomearam a cada uma seu próprio supervisor, e expandiram o sistema
como lhes apeteceu.
QUARTO MÉTODO: ABANDONOU SUA OPERAÇÃO
Recentemente, quando conhecimento aumentou e eles viram a estreita ligação entre todas as partes da
Criação, eles reconheceram o conceito de deuses múltiplos como sendo completamente impossível.
Então, a questão da contrariedade sentida na Criação voltou a despertar.
Isto os levou a uma nova suposição: que o Supervisor da realidade é certamente sábio e amável.
Todavia, devido à Sua exaltação, que está além da concepção, o nosso mundo é considerado um grão
de areia, nada aos Seus olhos. Não vale a pena para Ele se incomodar com nossos assuntos
mesquinhos, e é por isso que a nossa subsistência está tão desordenada e cada homem faz o que é
certo aos seus próprios olhos.
Paralelamente a estes métodos, existiram métodos religiosos de união Divina. Mas este não é o lugar
para examiná-los, pois eu queria apenas examinar as origens das quais tomaram lugar os métodos
falhados e suposições intrigantes que dominaram largamente e se expandiram em tempos diferentes e
lugares.
Nós descobrimos que a base sobre a qual todos os métodos acima nasceram e emergiram da
contradição entre os dois tipos de Providência detectáveis no mundo, e todos estes métodos vieram a
ser apenas para remendar esse grande rasgão.
Todavia, não há nada por baixo do sol. E não só não foi o grande rasgão remendado; em vez disso, ele
cresce e se expande perante nossos olhos num terrível abismo, sem ver ou ter esperança de uma
maneira de lhe escapar. E quando eu olho para todas essas tentativas que a humanidade tem estado a
fazer há vários milhares de anos sem qualquer proveito, eu imagino se não deveríamos procurar o
remendar deste grande rasgão do ponto de vista do Supervisor de todo, mas em vez disso aceitar que
esta grande correção está nas nossas próprias mãos.
A NECESSIDADE DE SE AGIR COM CUIDADO COM AS LEIS DA NATUREZA
Todos nós podemos ver claramente que a espécie humana deve levar uma vida social, o que significa
que não pode existir e se sustentar sem a ajuda dos outros. Portanto, imagine um evento onde a pessoa
4. se retira da sociedade para um local solitário e vive lá uma vida de miséria e muita dor, devido à sua
incapacidade de prover as suas próprias necessidades. Essa pessoa não teria o direito de reclamar da
Providência sobre o seu destino. E se a pessoa fizesse isso, ou seja, reclamar e amaldiçoar o destino
amargo, ela só demonstraria sua insensatez.
Isto porque, enquanto a Providência preparou para essa pessoa um lugar confortável e conveniente na
sociedade, esta não teria nenhuma justificação para retirar-se dela para um lugar desolado. Essa pessoa
não deve ser lamentada, já que está indo contra a natureza da Criação. E já que ela tem a opção de
viver como a Providência ordenou, ela não deve ser lamentada. Essa frase é aceita por toda a
humanidade, sem controvérsia.
E eu posso acrescentar e estabelecer isso sobre uma base religiosa, e dar-lhe essa forma: já que a
Providência se estende do Criador, que sem dúvida tem um propósito em Suas ações, uma vez que não
há ato sem propósito, vemos que quem quebra uma das leis da Natureza que Ele imprimiu em nós,
corrompe a meta estabelecida.
Porque o objetivo está, sem dúvida, construído sobre todas as leis da Natureza, sem nenhuma exceção,
assim como o trabalhador hábil não acrescentaria ou subtrairia sequer um fio de cabelo daquilo que é
necessário para atingir a meta. Assim, aquele que altera até mesmo uma lei simples, danifica e prejudica
o propósito da meta que o Criador estabeleceu, e, portanto, será punido pela Natureza. Portanto, nós
também, criaturas do Senhor, não devemos lamentar isso, porque é o objetivo do Senhor o que ele
mancha e profana. Isso, creio eu, é a forma da sentença.
E eu acredito que não é uma boa ideia que alguém contrarie minhas palavras, a forma que eu tenho
dado à sentença, porque as palavras da sentença são um. Pois, qual é a diferença se dissermos que o
supervisor é chamado de "Natureza", isto é, sem inteligência nem propósito, ou dissermos que o
supervisor é sábio, maravilhoso, isto é, que conhece, sente e tem um propósito em suas ações?
No final, todos nós admitimos e concordamos que depende de nós observarmos os mandamentos da
Providência, ou seja, as leis da Natureza, e todos nós admitimos que quem viola os mandamentos da
Providência, ou seja, as leis da natureza, deve ser punido pela Natureza, e não deve ser lamentado por
ninguém. Assim, a Natureza da sentença é uniforme, e a única diferença está no motivo: aqueles que
afirmam que este é necessário, e eu afirmo que isso está decidido.
E de agora em diante, eu não terei que usar ambas as linguagens, isto é, referir-me à Natureza e a um
Supervisor, entre os quais, como já demonstrei, não há nenhuma diferença com relação ao cumprimento
das leis; e é melhor para nós encontrarmos a metade do caminho e aceitar as palavras dos Cabalistas
que HaTeva (a Natureza) tem o mesmo valor numérico (em hebraico) que Elokim (Deus): oitenta e seis.
Então, eu serei capaz de chamar as leis de Deus de "mandamentos (Mitzvot) da Natureza", ou vice-
versa, já que eles são um e o mesmo, e não precisamos mais discutir isso.
Agora, é de vital importância para nós, examinar a natureza das Mitzvot da Natureza, para saber o que
ela exige de nós e não nos castigue sem piedade. Nós temos dito que a Natureza obriga a humanidade
a uma vida social, e isso é simples. Mas nós precisamos analisar as Mitzvot que a Natureza nos obriga a
manter, ou seja, no que diz respeito à vida em sociedade.
Quando analisamos de forma geral, verificamos que só existem duas Mitzvot a serem observadas na
sociedade. Estas podem ser chamadas de "recepção" e "doação". Isto significa que cada membro deve,
por natureza, receber suas necessidades da sociedade e deve beneficiar a sociedade através de seu
trabalho para o bem estar desta. E se alguém violar uma destas duas Mitsvot, este será impiedosamente
castigado.
Nós não precisamos analisar excessivamente a Mitzva (singular para Mitsvot) da recepção, uma vez que
o castigo é realizado imediatamente, o que impede qualquer negligência. Mas na outra Mitzvá, a da
doação à sociedade, não só a punição não é imediata, mas é dada de forma indireta. Portanto, essa
Mitzvá não é devidamente observada.
Assim, a humanidade é levada a destruir-se em uma atroz confusão, onde os conflitos e a fome, e suas
consequências, não param até os dias de hoje. E a maravilha disso é que a Natureza, como um juiz
5. hábil, nos pune segundo nosso desenvolvimento, para que possamos ver que na medida em que a
Humanidade evolui, as dores e os sofrimentos que cercam e provém nossa existência também se
multiplicam.
Assim, você tem diante de si uma base emírica e científica de que Sua Providência ordenou-nos a
observarmos com todas as nossas forças a Mitzva de doação aos outros com completa precisão, de tal
modo que nenhum membro de nossa sociedade trabalhe menos do que a medida necessária para
garantir a felicidade da sociedade e seu êxito. Embora estejamos ociosos em cumpri-la ao máximo, a
Natureza não deixará de castigar-nos e ter a sua vingança.
Além disso, com os golpes que sofremos hoje, também devemos considerar ter a espada preparada
para o futuro; e devemos tirar a conclusão correta, de que finalmente a Natureza acabará por derrotar-
nos e seremos todos obrigados a juntar as mãos no cumprimento de suas Mitzvot, com todas as
medidas exigidas.
A PROVA DE SEU TRABALHO ATRAVÉS DA EXPERIÊNCIA
Mas quem pretende criticar as minhas palavras ainda pode perguntar: "Embora eu tenha provado até
agora que se deve trabalhar para ajudar as pessoas, onde está a prova de que isso deve ser feito para o
Criador?".
Na verdade, a história tem se confundido a nosso favor e preparado para nós um fato comprovado, que
é suficiente para uma apreciação completa deste assunto e uma conclusão inequívoca: qualquer um
pode ver como uma sociedade de grande porte como o Estado da Rússia, com centenas de milhões de
pessoas, que têm a sua disposição mais terra que toda a Europa, com uma riqueza sem igual em
matérias-primas, que já concordou em levar uma vida comunitária e praticamente aboliu a propriedade
privada, onde cada um se preocupa somente com o bem-estar da sociedade, incluise quando
aparentemente adquiriu a medida completa da virtude da doação aos outros em toda a sua essência,
tanto quanto a mente humana pode compreender.
Ainda assim, nós vemos o que aconteceu com eles: em vez de crescer e superar as conqusitas dos
países capitalistas, deterioraram-se cada vez mais, de modo que não só falharam em beneficiar a vida
dos trabalhadores, que trabalham mais duro do que nos países capitalistas, como nem sequer
conseguem garantir o pão de cada dia e as roupas. Na verdade, esse fato nos desorienta, porque a
julgar pela riqueza desse país, não deveriam ter chegado a tal estado.
Mas eles só cometeram um pecado, pelo qual o Senhor não os perdoará: que todo esse trabalho
precioso e exaltado, ou seja, doar aos outros, que começaram a realizar, deve ser para o Criador e não
para a humanidade. E como eles fazem o seu trabalho não em Seu nome, do ponto de vista da
Natureza, eles não têm o direito de existir.
...
Quando, por exemplo, uma pessoa move sua mão da cadeira para a mesa, é porque pensa que
colocando a mão sobre a mesa ela receberá maior prazer. Se ela não pensasse assim, deixaria a mão
sobre a cadeira para o resto de sua vida sem jamais mexê-la; e mais ainda quando se trata de grandes
esforços.
E se a pessoa diz que não existe uma solução para colocá-los sob a supervisão, de modo que quem
estiver ocioso em seu trabalho será punido com a privação do salário, eu perguntaria: "Diga-me de onde
os próprios supervisores tiram a motivação para este movimento?". Porque estar parado em um lugar e
vigiar as pessoas, e motivá-las a trabalhar também constitui um grande esforço, talvez maior do que o
próprio trabalho. Portanto, é como se a pessoa quisesse ligar uma máquina sem abastecê-la com
combustível.