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Aluna sob anonimato<br />Caminho do inferno<br />Ainda me lembro de um céu… foi quando fingimos que nos conhecemos, que nos tocámos pela primeira vez. A primeira vez em que a confiança se apoderou de mim e do meu corpo, que tomou controlo sobre o teu movimento. De repente, mais nada se ouviu, a não ser o toque, e o sabor dos teus lábios. Essa manhã, parecida com uma vida… Lembro-me eu que não gostavas de música, de dança, de arte, de literatura, da noite, dos jantares, do anoitecer, do silêncio… Eras fria, só sabias lidar com uma vida caótica. <br />Eu odiava as coisas mais simples como o sol ao encontro dos meus olhos, os pés molhados, o cheiro do leite, o resto de comida infiltrada dos tachos que se tinham de lavar… No entanto, nenhuma de nós se encontrava nestes ódios diários. Assim, não te importavas do fumo que me invadia os pulmões e eu fingia que não me importava com os comprimidos que te tornavam calma. <br />Facilmente cheguei ao purgatório. Passaram dias sem te ver desde aquela manhã, dias de insegurança, dias de medo que me lembravam a perdição da adolescência. Até à tarde chuvosa em que nos encontrámos no Carmo. Evitaste-me. Fizeste daquela manhã uma noite tua, e daquele encontro um anoitecer. Eu também vi a noite, mas gosto dela. <br />Por tal, apaixonei-me. Mas sabia que nunca desceria uma rua de mão dada contigo, sabia que nunca iria ter o casamento que os meus pais projectaram, sabia que nunca iria ter uma barriga engravidada. Tu não… A insegurança assombrava-te. O medo da sociedade afectou-te. Mas, mesmo assim, olhaste-me e senti que chamaste pela manhã. Vieste ter comigo e sentámo-nos. Eu estava apaixonada. Tu não o sabias. Nem conhecias o amor. <br />Passaram semanas e aí descobriste que a noite era bonita. Apaixonaste-te. <br />Conheci o Inferno. Conheci-te. Viveste comigo. A tua loucura cada vez mais me apaixonou. Eras possessivamente tua e de mais ninguém, mas querias-me também na tua posse. A tua obsessão, a tua loucura, a tua depressão, a tua visão egoísta e o teu desequilíbrio matou-me e apercebi-me do que era odiar a noite. Passei a odiar-te e aí amavas-me. Deixei-te, desculpa. Internaste-te. Sabias que estavas condenada, pois também eras mulher. <br />Não me sinto mal, mas vivo na incerteza da beleza da noite, do timbre da música, do volume do silêncio, da inspiração da literatura… Assim, perdi-me também. <br />

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