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INSTITUCIONAL
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO DO ESTADO DA BAHIA
Diretoria Executiva:
Fabrício Castro Oliveira - Presidente
Ana Patrícia Dantas Leão - Vice-Presidente
Marilda Sampaio Miranda Santana - Secretária-Geral
Maurício Silva Leahy - Secretário-Geral Adjunto
Hermes Hilarião Teixeira Neto - Tesoureiro
Realização:
Comissão da Mulher Advogada OAB-BA
Daniela Portugal - Presidenta
Camila Trabuco - Vice-Presidenta
Fernanda Cardoso - Secretária Geral
Equipe Técnica:
Daniela Portugal - Coordenação de Pesquisa
Ronaldo Bispo Lima - Gerente de Informática da OAB-BA
Guilherme Mendonça Jr - Técnico de Informática da OAB-BA
Bruno Luis Santana dos Santos - Técnico de Informática da OAB-BA
Relatórios:
Daniela Portugal
Camila Trabuco
Filipe Garbelotto
Vander Costa
Vinícius Assumpção
2
Membros da Comissão da Mulher Advogada:
Daniela Portugal – Presidenta
Camila Trabuco – Vice-presidenta
Fernanda Cardoso - Secretária Geral
Ajucinéa Matos
Aline Vieira
Carolina Blanco
Cristina Rios
Daniela Barbosa
Fábia Rodrigues
Fernanda Cardoso
Graziele Souza
Karen Baraúna
Karen Kuentzer
Karina Ferreira
Leila Ifá
Laís Teles
Lorena Macedo
Luana Libório
Luciana Santiago
Luise Reis
Luzia Vicente
Márcia Regina
Maria Neide
Maria Zélia
Milena Monstans
Neuma Jesus
Raquel Dortas
Rita Ifá
Samantha Carvalho
Vanessa Carrilho
Ylla Guimarães
Colaboradoras:
Ana Luísa Hiltner
Angela Prazeres
Cídia Dayara
Helaine Teixeira
Jéssica Berenguer
Joana Araújo
Jorgete Pinheiro
Juana Sarno
Laís Santos
Lize Borges
Luana de Oliveira
Maiana Alves
Sabrina Telles
Tatiana Hipólito
3
SUMÁRIO
1. APRESENTAÇÃO........................................................................................................ 5
2. METODOLOGIA......................................................................................................... 7
3. ADVOCACIA E INTERSECCIONALIDADE...................................................................... 8
4. PRINCIPAIS RESULTADOS........................................................................................ 10
4.1. INFORMAÇÕES GERAIS ........................................................................................ 10
4.2. RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA............................................................. 14
4.3. ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA.................................................. 19
4.4. ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA ...... 23
4.5. ADVOCACIA E DIREITOS LGBTQI+......................................................................... 30
4.6. A JOVEM ADVOCACIA .......................................................................................... 37
4
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1: IDENTIDADE DE GÊNERO
GRÁFICO 2: RENDA MENSAL
GRÁFICO 3: REGIÃO DE CONCENTRAÇÃO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL
GRÁFICO 4: JOVEM ADVOCACIA
GRÁFICO 5: PERFIL RACIAL DOS ENTREVISTADOS
GRÁFICO 6: ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS) QUE FORAM VÍTIMAS DE
RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
GRÁFICO 7: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS)
QUE FORAM VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
GRÁFICO 8: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADOS E ADVOGADAS NEGROS(AS)
GRÁFICO 9: VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
GRÁFICO 10: HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO
GRÁFICO 11: ASSÉDIO MORAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL
GRÁFICO 12: VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
GRÁFICO 13: PERCENTUAL DE HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E
IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
GRÁFICO 14: VÍTIMAS DE ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS POR GÊNERO
GRÁFICO 15: PRÁTICAS DE ASSÉDIO MAIS COMUNS
GRÁFICO 16: O PERFIL DO ASSEDIADOR
GRÁFICO 17: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS VÍTIMAS DE ASSÉDIO OU
IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
GRÁFICO 18: ADVOCACIA E CISNORMATIVIDADE
GRAFICO 19: ADVOCACIA E HETERONORMATIVIDADE
GRÁFICO 20: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+
GRÁFICO 21: ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+ E ASSÉDIO MORAL
GRÁFICO 22: ADVOGADAS LGBTQI+ E ASSÉDIO SEXUAL
GRÁFICO 23: LGBTFOBIA
GRÁFICO 24: QUEM JÁ PRESENCIOU ATO LGBTFÓBICO
GRÁFICO 25: REMUNERAÇÃO INFERIOR A R$ 1.000,00 NA JOVEM ADVOCACIA
GRÁFICO 26: ASSÉDIO MORAL NA JOVEM ADVOCACIA
GRÁFICO 27: ASSÉDIO MORAL ENTRE JOVENS ADVOGADAS E JOVENS ADVOGADOS
GRÁFICO 28: ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NA JOVEM ADVOCACIA
5
1. APRESENTAÇÃO
Nobres colegas advogados e advogadas,
Foi com o objetivo de conhecer melhor o perfil da nossa advocacia que a Ordem dos
Advogados do Brasil, Seccional Bahia, por meio de iniciativa da Comissão da Mulher
Advogada - BA, iniciou projeto de coleta de dados acerca dos profissionais vinculados ao
nosso sistema OAB. O objetivo é utilizar a compilação para pautar de maneira mais
adequada as políticas de valorização da advocacia no âmbito estadual. A coleta de dados
foi pensada e projetada a partir de uma análise interseccional, avaliando informações
relativas a gênero, raça e classe, agregando, também, outros elementos de extrema
importância, tais como identidade de gênero, orientação sexual, região de concentração
da atividade profissional e tempo de exercício da advocacia. Colher informações a partir
de tais fatores certamente nos auxiliará a pensar nossas políticas institucionais de
maneira ainda mais participativa e colaborativa além de consciente da realidade
enfrentada pelos nossos colegas no exercício da profissão.
Dentre os quesitos aplicados, reunimos informações sobre advogados e advogadas
vítimas de racismo, com atenção especial para os obstáculos profissionais
experimentados pela mulher negra advogada. Também foram reunidas informações
referentes a assédio moral, quando se pode ter uma noção mais precisa da elevada
incidência da referida prática, vitimando, sobretudo, a jovem advocacia e,
especialmente, as mulheres com menos de cinco anos de inscrição junto à OAB. Na
avaliação das práticas de assédio moral sofridas no exercício profissional, também se
identificou a orientação sexual como fator de maior vulneração, razão pela qual o tema
também foi objeto de especial dedicação no relatório de pesquisa. Foram compilados,
ainda, dados sobre violência de gênero, identificando percentual de profissionais que já
foram vítimas de assédio sexual ou importunação sexual no exercício da advocacia.
Pudemos identificar, com maior precisão, os obstáculos enfrentados pela mulher
advogada, vítima preferencial de práticas de abuso sexual, o que nos permitirá o
aperfeiçoamento do nosso sistema interno de proteção.
6
A OAB-Bahia é consciente do seu dever de conhecer de perto as dificuldades vivenciadas
pela nossa classe, que é tão plural, e, com isso, estabelecer diálogos e direcionar
projetos futuros. O presente diagnóstico é apenas um exemplo de diversas outras
políticas que vêm sendo objeto de inovação pela atual gestão, simbolizando um convite
à reflexão conjunta sobre a realidade da advocacia de hoje e, especialmente, sobre
aquela que queremos construir.
Fabrício Castro e Daniela Portugal
7
2. METODOLOGIA
O presente relatório compila dados colhidos a partir de pesquisa quantitativa descritiva.
Portanto, trata-se de estudo feito a partir de amostra do universo de advogadas e
advogados cadastrados junto ao sistema OAB-Bahia, com o objetivo de registrar
informações relevantes relacionadas a gênero, raça, classe, orientação sexual, região de
exercício da advocacia e tempo de inscrição.
Como instrumento principal de obtenção de informações, utilizou-se questionário
estruturado fechado, com quesitos pensados a partir de perspectiva interseccional, para
o fim de levantamento estatístico dos elementos coletados. O questionário foi aplicado
por meio do “OAB Pesquisas”, software de consultas e pesquisas desenvolvido pela
MOBTEX Softwares sob encomenda da OAB-Bahia, integrado à base de dados do próprio
sistema OAB, vinculado a mecanismos de privacidade e segurança de dados.
Inicialmente, foi gerado um link para aplicação de pré-teste do questionário, com o
objetivo de correção de erros e de aperfeiçoamento dos quesitos e, após duas fases de
teste, validou-se a versão final. Em seguida, o link de acesso foi enviado para o e-mail
de todos os advogados e advogadas inscritos na OAB, Seccional Bahia, utilizando-se o
endereço eletrônico cadastrado pelo próprio profissional junto à OAB. A divulgação da
campanha se deu por e-mail, boletim informativo e também por intermédio das redes
sociais do sistema OAB.
O ingresso no link era iniciado mediante digitação do número de inscrição junto à OAB.
A resposta aos questionamentos era feita de modo progressivo, sendo que somente a
resposta ao quesito aplicado acionava o acesso ao questionamento subsequente, não
se disponibilizando a opção de voltar para modificação das informações já armazenadas.
Responderam ao questionário 1.356 advogados e advogadas, número amostral
relativamente pequeno diante do total de 48.667 inscritos para os quais foi
encaminhado o link de acesso. Espera-se que, com a divulgação dos primeiros resultados
de pesquisa, haja maior adesão da classe para resposta às edições futuras do presente
diagnóstico.
8
3. ADVOCACIA E INTERSECCIONALIDADE
Quando a advocacia é pensada enquanto coletividade, é certo que podemos estabelecer
características e necessidades comuns a toda classe. A busca pela melhoria nas
condições para o exercício profissional é, de modo geral, o objetivo buscado pelas
políticas institucionais pautadas pela Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de cada
uma de suas seccionais. Todavia, ao lado da importância do reconhecimento do
conjunto de advogados e advogadas enquanto grupo, é igualmente importante a
identificação e compreensão das diferenças intragrupo, do contrário estaríamos
vinculados a uma falsa concepção de universalidade e, consequentemente, traçando
políticas inadequadas e ineficientes.
No Brasil, somente no final do século XIX foi autorizado às mulheres brasileiras o direito
de acessar o ensino superior, quando, em 19 de abril de 1879, D. Pedro II fez aprovar lei
que formalmente autorizava a presença feminina em cursos superiores. Mesmo sem o
impedimento legal, a permanência de outros obstáculos sociais tornou bastante lento o
processo de efetivo ingresso das mulheres brasileiras na rede educacional superior. Na
Bahia, é somente no começo do século XX que se podia perceber a presença de algumas
poucas mulheres nos cursos de Medicina, Direito e Engenharia.1
De outro lado, o processo de colonização e escravização no Brasil praticamente baniu
negros e negras do sistema formal de ensino, quadro que não se reverteu quando da
promulgação da Lei Áurea em 1888. Ainda hoje são sentidos os reflexos do histórico
escravista na subrepresentatividade negra nas universidades brasileiras, realidade
somente tocada a partir da recente implementação das políticas raciais afirmativas nas
Universidades, podendo-se citar o pioneiro programa de Cotas brasileiro implementado
em 2003 pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, muito antes da Lei das Cotas (nº
12.711), de 2012.2
1
QUEIROZ, Delcele Mascarenhas. Mulheres no ensino superior no Brasil. Disponível em: <
http://23reuniao.anped.org.br/textos/0301t.PDF> Acesso em 01 de agosto de 2019.
2
GUARNIERI, Fernanda; MELO-SILVA, Lucy Leal. Cotas Universitárias no Brasil: análise de uma década de
produção científica. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pee/v21n2/2175-3539-pee-21-02-
00183.pdf> Acesso em 01 de agosto de 2019.
9
Por tais razões, é preciso compreender que o grande coletivo de advogados e advogadas
inscritos na OAB-Bahia não experimentam, necessariamente, as mesmas dificuldades e
opressões, assim como as políticas institucionais nem sempre conseguirão beneficiar a
todos e todas caso não estejam atentas às diferenças internamente encontradas. Nesse
contexto, é indispensável perceber os obstáculos históricos e ainda presentes
enfrentados pelas mulheres advogadas, assim como perceber as barreiras
tradicionalmente colocadas contra a população negra. É imprescindível, ainda, analisar,
institucionalmente, como essas vias de opressão se cruzam e se sobrepõem, gerando
variados níveis de desigualdades distribuídos entre a classe de advogados e advogadas.
É com esse olhar que a presente pesquisa é pensada a partir do conceito de
interseccionalidade desenvolvido por Kimberle Crenshaw. De acordo com a autora,
existem fronteiras tradicionalmente colocadas nos estudos de raça e gênero quando
analisados separadamente, havendo a necessidade de se explorar de que maneira tais
dimensões se cruzam.3
Nesse sentido, o presente estudo objetiva direcionar ações
institucionais que toquem não apenas o racismo e o machismo enquanto isoladamente
compreendidos, mas, especialmente, entendidos a partir de suas eventuais
sobreposições, impactando de modo diferenciado no exercício profissional de cada
advogado e advogada.
3
CRENSHAW, Kimberle. Mapping the Margins: Intersectionality, Identity Politics, and Violence against
Women of Color. Stanford Law Review, Vol. 43, No. 6 (Jul., 1991), pp. 1241-1299. Disponível em:
<https://alexy.asian.lsa.umich.edu/courses/readings/Crenshaw_Mapping%20the%20Margins.pdf>
Acesso em 01 de agosto de 2019.
10
4. PRINCIPAIS RESULTADOS
por Daniela Portugal e Camila Trabuco
É importante compreender que a presente pesquisa representa uma primeira
aproximação com uma nova forma de se pensar políticas institucionais e que, portanto,
será aperfeiçoada em futuras edições, que agora já se encontram em fase de
planejamento. Neste tópico, serão exibidos os principais resultados obtidos a partir do
questionário aplicado.
4.1. INFORMAÇÕES GERAIS
Atualmente, encontram-se registrados junto à OAB-BA 24.976 homens e 24.087
mulheres. Significa, portanto, que a advocacia baiana é composta de 51,91% de homens
e 49,09% de mulheres - composição praticamente paritária em termos de gênero, o que
passou a ser refletido na proposta de Conselho Seccional apresentada pela atual gestão.
Dentre os 49.064 advogados e advogadas cadastrados, é importante mencionar que a
jovem advocacia representa 39,40%, totalizando 19.330 jovens inscritos. Em Salvador,
especificamente, tem-se um total de 10.001 jovens advogadas e advogados,
representando 35,25% da advocacia na capital. A força da jovem advocacia está
refletida, também, na decisão histórica do Conselho Federal da OAB, em outubro de
2018, pelo fim da cláusula de barreira, presente no parágrafo 2º do 63º artigo do
Estatuto da Advocacia, que impedia advogadas e advogados com menos de cinco anos
de carteira de concorrerem nas eleições da Ordem. Diante disso, foi sancionada a Lei nº
13.875, de 20 de setembro de 2019, responsável por alterar o Estatuto da Advocacia e
a Ordem dos Advogados do Brasil e reduzir, de cinco para três anos, o tempo necessário
de exercício efetivo da profissão para fins de eleição para os cargos de Conselheiro
Seccional e das Subseções.
Quanto às pessoas que responderam ao questionário aplicado, pode-se dizer que o
número de participantes ainda é muito reduzido em comparação ao conjunto de
11
advogadas e advogados, o que compromete, naturalmente, a confiabilidade científica
dos resultados alcançados, sem que se possa ignorar, de outro modo, o fato de os dados
coletados refletirem, de um modo geral, o perfil da classe.
O questionário foi aplicado entre advogadas e advogados, pessoas negras e não negras,
de diferentes orientações sexuais e condições socioeconômicas. A aplicação foi
distribuída, ainda, entre profissionais que atuam em Salvador e Região Metropolitana,
bem como entre aqueles que concentram o exercício da atividade nas comarcas do
interior. Espera-se que, em edições futuras, a ação conte com uma participação mais
ampla da classe, a fim de que se amplie a confiabilidade dos resultados de pesquisa
obtidos.
GRÁFICO 1: IDENTIDADE DE GÊNERO
Entre as pessoas que responderam ao questionário, 56,04% são mulheres e 43,95% são
homens, percentual que difere um pouco do quadro geral de gênero no número total
de inscrições junto à OAB. Entende-se que a diferença se deve, provavelmente, ao fato
de a aplicação da pesquisa ser fruto de iniciativa da Comissão da Mulher Advogada,
ainda que com o apoio da Diretoria da Seccional. Com isso, acredita-se que a divulgação
acabou impactando mais no interesse de participação das mulheres do que dos homens
advogados. A diferença não chega, todavia, a comprometer o resultado dos estudos, já
que, de modo geral, reflete a paridade hoje presente no quadro da OAB-BA.
43,95%
56,04%
HOMENS MULHERES
12
GRÁFICO 2: RENDA MENSAL
Entre todos os entrevistados, constatou-se que 18,95% recebem até R$ 1.000,00;
44,91% entre R$ 1.001,00 e R$ 4.000,00; 21,09% entre R$ 4.001,00 e R$ 8.000,00; 7,44%
entre R$ 8.001,00 e R$ 12.000,00 e somente 7,59% são remunerados em patamar
superior a R$ 12.000,00. Os mencionados dados são preocupantes, especialmente
quando se observa o alto número de profissionais que possuem renda mensal não
superior a R$ 1.000,00. Mais adiante, em uma perspectiva interseccional, serão
avaliados como os fatores de raça e gênero impactam na remuneração dos nossos
profissionais.
GRÁFICO 3: REGIÃO DE CONCENTRAÇÃO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL
Verificou-se, ainda, que o questionário foi respondido por 57,37% de profissionais que
concentram o exercício da advocacia em Salvador e Região Metropolitana, bem como
por 42,63% dos que atuam em comarcas do interior.
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
ATÉ R$ 1.000,00 R$ 1.001,00 A R$
4.000,00
R$ 4.001,00 A R$
8.000,00
R$ 8.001,00 A R$
12.000,00
MAIS DE R$ 12.000,00
57,37%
42,63%
SALVADOR INTERIOR
13
GRÁFICO 4: JOVEM ADVOCACIA
Por fim, constatou-se que 50,59% dos entrevistados são jovens advogados, possuindo,
portanto, menos de cinco anos de inscrição junto à OAB-BA. Destaque-se que algumas
políticas institucionais já consideram a especial condição de jovem advogado, como é o
caso das taxas progressivas nas anuidades. Entretanto, a ampla participação da jovem
advocacia na resposta ao questionário é de extrema importância, como se verá adiante,
pois fornece informações relevantes acerca de outras modalidades de especial
vulnerabilidade para além da econômica.
50,59%
49,41%
JOVEM ADVOGADO MAIS DE CINCO ANOS DE OAB
14
4.2. RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
por Vinícius Assumpção e Daniela Portugal
Os dados desta primeira pesquisa convidam a uma série de reflexões sobre a questão
racial e a advocacia, além de abrirem caminho para novas investigações que permitam
não só ampliar o conhecimento, mas propor medidas específicas para o exercício plural
da profissão.
GRÁFICO 5: PERFIL RACIAL DOS ENTREVISTADOS
O percentual de pessoas não-negras (71,75%) do total de advogadas e advogados nos
remete a debates importantes. O primeiro deles diz respeito ao perfil bastante
embranquecido dos cursos de Direito, apesar de alguma diversidade ter se instaurado
com a implementação de iniciativas como as cotas e o Fies ao longo da última década.
Sendo baixo o número de bacharelas e bacharéis negras e negros, é tendência lógica e
natural termos um índice menor dessas/esses profissionais na advocacia. O quadro se
agrava se refletirmos sobre as dificuldades de se conseguir estágio nos escritórios de
advocacia sendo pessoa negra, o que muitas vezes incentiva o ingresso nas carreiras
públicas e desestimula as tentativas no setor privado.
O segundo debate demanda maior verificação, porém é uma realidade recorrente nos
censos que atentam para a questão racial: a dificuldade da pessoa entrevistada em se
enxergar negra/negro. Como afirma Dzidzienyo: “o crescimento da consciência negra é
71,75%
27,87%
0,36%
PESSOA NÃO NEGRA PESSOA NEGRA PESSOA INDÍGENA
15
desencorajado pela recusa da sociedade em conceder ao cidadão negro a oportunidade
de realizar sua íntegra identidade – inclusive seu eu negro”4
. Sim, a autodefinição
autêntica ainda esbarra nas limitações impostas pela lógica racista que nos turva a visão
à nossa própria negritude, ou, ciente dela, nos convida a negá-la quando indagados a
respeito. Essa soma de fatores é capaz de visibilizar as razões para termos menos de
30% de pessoas negras na advocacia enquanto as estatísticas indicam que temos, na
Bahia, mais de 80% de “pretos e pardos”.
GRÁFICO 6: ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS) QUE FORAM
VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
Entre os entrevistados autodeclarados negros e que concentram a advocacia em
Salvador e região metropolitana, 24,57% afirmam já terem sido vítimas de racismo e
75,42% afirmam nunca terem sofrido qualquer ato discriminatório. Entre os
entrevistados autodeclarados negros que concentram atividade profissional nas
comarcas do interior do estado, os dados coletados quanto ao referido quesito são de
14,78% e 85,21%, respectivamente.
De uma maneira geral, entre os advogados e advogadas autodeclarados negros que
afirmam nunca ter sofrido racismo, é possível constatar, objetivamente, dois dados
contraditórios, pois 7,69% afirmaram que já receberam remuneração inferior por ser
4
“DZIDZIENYO, Anani. The Position of Blacks in Brazilian Society. Report n. 7. London: Minority Rights
Group, 1971. apud NASCIMENTO, Abdias. O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um Racismo
Mascarado. São Paulo: Perspectivas, 2016, p. 136.
20,89%
79,10%
JÁ SOFREU RACISMO NUNCA SOFREU RACISMO
16
pessoa negra e 11,37% afirmam já terem sido alvo de críticas e piadas relacionadas à
estética negra.
Entre os entrevistados, pessoas negras e não negras, 30,60% já presenciaram, no
exercício da profissão, práticas de racismo. Entretanto, dentre todos os entrevistados,
somente 1,03% se considera uma pessoa racista, ao passo que 98,96% declaram que
não se consideram pessoas racistas. Não houve um número expressivo de entrevistados
autodeclarados indígenas, razão pela qual o relatório de pesquisa não trouxe, nesta
primeira edição, um recorte específico relacionado à discriminação voltada à condição
de pessoa indígena, inclusive no cuidado de evitar a identificação das pessoas
entrevistadas.
Nesse contexto, é de se ler com redobrada atenção a negação de 79% de quem se
autodeclara negra/negro quanto a terem sido vítimas de racismo. Conhecendo bem as
estruturas extremamente racializadas do nosso país, os resultados da pesquisa
possivelmente consagram uma espiral de “não-reconhecimentos”. Num primeiro plano,
rejeita-se a própria negritude ou condição étnica; num segundo estágio, tendo-a
afirmada, nega-se a vivência de violências racistas. Rejeitando qualquer “relação
canônica” com os dados estatísticos5
, parece razoável ter como hipótese que ao menos
parte das pessoas entrevistadas desconhece as sutilezas do racismo e não nota as
inúmeras situações em que a raça é elemento empregado para a sua estigmatização,
sua invisibilização, para a promoção de gracejos mais ou menos explícitos e opressões
de outras ordens.
5
LIMA JR., Antonio Teixeira. Igualdade Racial. Políticas sociais: acompanhamento e análise. Instituto de
pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, 2019.
17
GRÁFICO 7: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS
NEGROS(AS) QUE FORAM VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
Entre aqueles que nada fizeram após terem sido vítimas de racismo, 50% se
autodeclaram principal fonte de renda familiar e 50% afirmam que não são a principal
fone de renda familiar.
GRÁFICO 8: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADOS E ADVOGADAS NEGROS(AS)
Avaliando-se, especificamente, a relação entre a remuneração e questões raciais e de
gênero, observa-se a situação de especial vulnerabilidade experimentada por
40%
3,75%
2,50%
48,75%
NÃO FEZ NADA PEDIU DEMISSÃO
PROCESSOU O AUTOR DO FATO OUTRAS SOLUÇÕES
0,00%
20,00%
40,00%
60,00%
80,00%
100,00%
120,00%
HOMENS NÃO NEGROS HOMENS NEGROS E
INDÍGENAS
MULHERES NÃO NEGRAS MULHERES NEGRAS E
INDÍGENAS
ATÉ R$ 1.000,00 R$ 1.001,00 A R$ 4.000,00 R$ 4.001,00 A R$ 8.000,00
R$ 8.001,00 A R$ 12.000,00 MAIS DE R$ 12.000,00
18
advogadas negras, que acabam não experimentando nem a inserção profissional do
advogado homem negro, nem a projeção conquistada pelas mulheres não negras
advogadas. Pode-se identificar, no gráfico acima, que os homens não negros advogados
são os que mais recebem em patamar superior a R$ 12.000,00 (15,85%), e são também
os que menos recebem menos de R$ 1.000,00 mensais (12,12%). Na sequência,
identifica-se a posição econômica dos homens negros advogados, sendo que 5,42%
recebem mais de 12.000,00 por mês e 13,25% recebem menos de R$ 1.000,00 mensais.
Com relação à situação das mulheres advogadas, é possível notar a submissão a piores
condições de trabalho de uma maneira geral, de modo que, entre as mulheres não
negras, somente 4,41% recebem mais de R$ 12.000,00 e 22,06% recebem menos de R$
1.000,00 por mês. A situação experimentada por mulheres negras no exercício da
advocacia, todavia, é a que merece maior atenção institucional, uma vez que se
constatou que somente 0,94% são remuneradas em patamar superior a R$ 12.000,00 e
29,72% recebem até R$ 1.000,00 mensais. A pesquisa, portanto, demonstra a
exploração profissional experimentada por advogadas negras, o que reflete, mesmo no
campo da advocacia, a manutenção das estruturas racistas e machistas que marcam a
sociedade.
Dado o primeiro passo para melhor conhecer a advocacia baiana, as próximas pesquisas
poderão avançar ainda mais ao empregar ferramentas que permitam esmiuçar sua
realidade e vivências. O detalhamento das perguntas talvez seja um relevante
instrumento para provocar nas pessoas entrevistadas, advogadas e advogados, negras
e negros, a percepção crítica das situações com que usualmente se deparam no exercício
da profissão.
19
4.3. ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
por Vander Costa e Daniela Portugal
O Assédio moral consiste em prática abusiva, sistemática e reiterada, com o intuito de
atingir a dignidade e integridade física ou psíquica do ser humano trabalhador. Embora
não seja um fenômeno novo, pois sempre esteve presente desde as mais remotas
relações humanas, o assédio tem sido revelado com mais intensidade na sociedade
moderna, traduzida pela competitividade, consumismo e pelo vazio existencial.
Comumente atrelado ao vínculo empregatício, a concepção do assédio moral pode ser
ampliada para abranger as diversas configurações do trabalho, pois o direito ao meio
ambiente laboral saudável é indistinto e possui assento constitucional.
Os advogados e advogadas sujeitos a subordinação, quando assediados, em regra, são
expostos às formas tradicionais de abuso, por exemplo, rigor excessivo, excesso de
trabalho, restrição da atuação profissional, situações humilhantes que visam
desestabilizá-los, pessoalmente e profissionalmente, interferindo na sua autoestima.
Outrossim, esses profissionais também estão vulneráveis à modalidade de assédio
moral praticado por agentes públicos. Neste caso, o abuso pode ser caracterizado pela
inobservância sistemática dos direitos, garantias e prerrogativas profissionais pelas
instâncias de poder.
GRÁFICO 9: VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
30,97%
69,03%
JÁ FOI VÍTIMA DE ASSÉDIO MORAL
NUNCA SOFREU ASSÉDIO MORAL
20
Os dados colhidos pela pesquisa demonstram que 30,97% dos entrevistados foram
vítimas de alguma modalidade de assédio moral descrita no questionário. Confrontando
os dados de assédio moral com a identidade étnico-racial da pessoa entrevistada,
constata-se que, entre os entrevistados que se autodeclararam pessoa negra ou
indígena, 28,72% afirmam já terem sido vítima de assédio moral. Entre os entrevistados
que se autodeclaram pessoas não negras, 31% afirmam já terem sido vítima de assédio
moral no exercício da advocacia.
Destaque-se que os referidos dados se mantêm relativamente equivalentes entre
aqueles que exercem advocacia na capital ou no interior. Dentre os entrevistados que
concentram a advocacia em Salvador e região metropolitana, 33,29% afirmam já terem
sofrido assédio moral, e dentre os que exercem a atividade nas comarcas do interior
27,85% declarou já ter sofrido a mencionada prática.
GRÁFICO 10: HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA
PROFISSÃO
Relacionando os dados obtidos sobre assédio moral e gênero, nota-se que as mulheres
são vítimas preferenciais da referida prática. Dentre os homens entrevistados, 20,46%
afirma já ter sofrido assédio moral no exercício da profissão. Entre as mulheres
entrevistadas, o referido percentual é praticamente o dobro, considerando que 39,21%
das mulheres entrevistadas afirmou já ter sofrido assédio moral.
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
70,00%
80,00%
90,00%
HOMENS MULHERES
JÁ SOFRERAM ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFRERAM ASSÉDIO MORAL
21
GRÁFICO 11: ASSÉDIO MORAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL
Ao serem cruzados os dados referentes a orientação sexual, com as informações obtidas
acerca de assédio moral, constata-se que pessoas homossexuais e bissexuais são alvo
preferencial de assédio sexual no exercício da profissão. Dentre os entrevistados que se
autodeclaram heterossexuais, 30,50% afirmam já terem sofrido assédio moral. Já entre
aqueles que se autodeclaram homossexuais ou bissexuais, nota-se que 39,43%
declaram já terem sofrido assédio moral no exercício da advocacia.
Optou-se por não tratar, em recorte específico, da identidade de gênero enquanto
pessoa travesti ou transexual dado o pequeno número de pessoas que responderam
afirmativamente ao referido quesito, fator que poderia acabar por permitir a
identificação pessoal das respostas, o que fugiria ao objetivo do presente relatório.
Desta maneira, as respostas fornecidas pelas pessoas travestis e transexuais
entrevistadas foram computadas conforme a identidade de gênero declarada.
O agente público que pratica assédio moral contra advogados ofende os artigos 37 e
133 da Constituição Federal, as prerrogativas profissionais previstas no Art. 7º Lei nº
8.906/1994, sem prejuízo de outras leis especiais aplicáveis.
Por sua vez, o advogado que incorrer em assédio, além de violar o Art. 7º Lei nº
8.906/1994, também descura do dever de urbanidade previsto no Art. 33 do Estatuto
da Advocacia e 27 do Código de Ética.
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
70,00%
80,00%
HETEROSSEXUAIS HOMOSSEXUAIS E BISSEXUAIS
JÁ SOFRERAM ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFRERAM ASSÉDIO MORAL
22
O sistema OAB possui instrumentos para combater o assédio moral, protegendo
advogados contra os abusos praticados por outros advogados ou agentes públicos, por
exemplo, a Comissão de Direitos e Prerrogativas que, junto ao Conselho e a Diretoria da
Ordem, asseguram a efetividade das prerrogativas profissionais.
Quando o abuso é cometido por advogado, também é possível buscar o Tribunal de Ética
e Disciplina para denunciar o profissional por descumprimento do dever de urbanidade.
Por fim, o assédio moral provoca diminuição da autoestima, compromete a capacidade
laboral, a convivência social, afetiva, podendo desencadear depressão, estresse,
ansiedade, esgotamento, atingindo severamente a integridade psíquica da vítima, por
isso, a prevenção e o combate são essências para o exercício saudável da advocacia.
23
4.4. ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
por Daniela Portugal
A compreensão do assédio sexual e da importunação sexual no exercício da advocacia
passa antes pela identificação das estruturas de opressão racial e de gênero legadas pelo
histórico patriarcal e colonialista brasileiro. Como bem explica Sueli Carneiro, a
miscigenação que dá origem à identidade nacional e ao equivocado mito da democracia
racial está assentada nas práticas de “violação colonial perpetrada pelos senhores
brancos contra as mulheres negras e indígenas”6
. Pode-se dizer, portanto, que a
identidade brasileira é edificada a partir da cultura do estupro, da violência e do assédio,
o que nos permite compreender a naturalização, ainda nos dias de hoje, da erotização
e a coisificação do corpo feminino - em especial o das mulheres negras.
Dentre as variadas formas social, administrativa ou legalmente previstas de repressão
ao assédio sexual, destaca-se aquela descrita no art. 216-A do Código Penal, nos
seguintes termos “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior
hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. A
figura é punida com pena de detenção de um a dois anos. De acordo com Cezar Roberto
Bitencourt (2015, p. 80-82), a hierarquia funcional ou posição de ascendência é
elemento indispensável para a caracterização do crime, assim como o ato de obrigar,
forçar, compelir ou coagir a vítima à realização de práticas sexuais. Ainda conforme o
autor, por se tratar de delito formal, a sua consumação independe da efetiva ocorrência
da conjunção carnal ou ato libidinoso, sendo suficiente a ameaça.7
A importunação sexual, por sua vez, encontra-se tipificada no art. 215-A do Código
Penal, que criminaliza a conduta de “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato
libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”. A figura é
6
CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma
perspectiva de gênero. In: ASHOKA EMPREENDIMENTOS SOCIAIS; TAKANO CIDADANIA (Orgs.). Racismos
contemporâneos. Rio de Janeiro: Takano Editora, 2003.
7
BITENCOURT, Cesar. Tratado de Direito Penal. Parte Especial. Dos crimes contra a dignidade sexual até
os crimes contra a fé pública. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
24
punida com a sanção de um a cinco anos de reclusão, desde que não configure crime
ainda mais grave, tratando-se, portanto, de um tipo penal subsidiário. Destaque-se que
a importunação ofensiva ao pudor, antes prevista no art. 61 da Lei das Contravenções
Penais, passou a ser criminalizada a partir da Lei nº 13.718, de 2018 - legislação cuja
previsão, por ser mais gravosa, tem natureza irretroativa, somente alcançando as
condutas praticadas a partir da sua entrada em vigor.
Vale destacar que as práticas de assédio e importunação de natureza sexual são também
tuteladas em outros ramos do Direito para além da esfera penal, de modo que, uma vez
ausentes, no caso concreto, as elementares típicas específicas da figura incriminadora,
a conduta ainda sofrerá as sanções trabalhistas, cíveis ou administrativas cabíveis,
conforme o caso. No âmbito institucional da OAB, merece destaque a súmula nº 9, de
2019, publicadas pelo Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB em março de 2019,
possibilitando o indeferimento de inscrição ou mesmo a exclusão por motivo de prática
de violência contra a mulher:
A prática de violência contra a mulher, assim definida na “Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher –
‘Convenção de Belém do Pará’ (1994)”, constitui fator apto a demonstrar a
ausência de idoneidade moral para a inscrição de bacharel em Direito nos
quadros da OAB, independente da instância criminal, assegurado ao Conselho
Seccional a análise de cada caso concreto8
.
Quando se trata de violência contra a mulher, a Convenção de Belém do Pará menciona,
expressamente, em seu artigo 2, “b”, a figura do “assédio sexual no local de trabalho”.
Portanto, a aplicação efetiva do enunciado sumular demanda, necessariamente, a
repressão severa da OAB, para além das demais consequências jurídicas cabíveis, contra
as práticas de assédio e importunação de natureza sexual no exercício da advocacia. É
com essa preocupação que a presente pesquisa cuidou de coletar dados referentes à
vitimização relacionada a tais condutas abusivas.
8
CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2019. Súmula n. 09/2019/COP.
Disponível em <https://deoab.oab.org.br/pages/materia/26322>
25
GRÁFICO 12: VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO
DA ADVOCACIA
De maneira geral, entre advogados e advogadas, 14,53% das pessoas entrevistadas
alegam já terem sido vítimas de assédio sexual ou de importunação sexual durante a
atuação profissional. Muita embora 14,53% afirmem já ter sofrido diretamente uma
prática de assédio ou importunação de caráter sexual, é necessário destacar que 36,28%
já presenciaram alguma prática de assédio contra a mulher no exercício da profissão,
percentual ainda mais expressivo, que deixa evidente a subnotificação que marca tal
modalidade de abuso.
Não há, todavia, como estudar a prática de assédio sexual, importunação sexual e outros
delitos dessa natureza sem que se promova um recorte epistemológico de gênero. Isto
porque, como se sabe, tais condutas são, como regra, praticadas por homens contra
mulheres. Significa, portanto, que a vulnerabilidade em virtude do gênero se apresenta
como um dos fatores decisivos no estudo dos referidos delitos.
GRÁFICO 13: PERCENTUAL DE HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E
IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
85,47%
14,53%
NUNCA FORAM VÍTIMAS JÁ FORAM VÍTIMAS
0,00%
20,00%
40,00%
60,00%
80,00%
100,00%
120,00%
HOMENS MULHERES
JÁ FORAM VÍTIMAS NUNCA FORAM VÍTIMAS
26
Assim, avaliando os entrevistados por gênero, nota-se que 97,15% dos homens
advogados nunca foram vítimas de assédio sexual ou importunação sexual no exercício
da profissão. Já entre as mulheres, 23,68% das entrevistadas já sofreu tal prática, o que
demonstra uma evidente conexão entre o gênero da vítima a maior probabilidade de
sofrer tais modalidades de abuso. Registre-se, ainda, que entre as mulheres
entrevistadas, 43,42% já presenciaram alguma outra mulher sofrendo prática de assédio
ou importunação de caráter sexual.
GRÁFICO 14: VÍTIMAS DE ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS POR GÊNERO
Com isso, entre as pessoas entrevistadas que afirmam já terem sofrido assédio ou
importunação sexual, 91,37% das vítimas são do sexo feminino, enquanto somente
8,62% dos ofendidos são do sexo masculino. Entre as mulheres vítimas de assédio
sexual, a condição de mulher negra ou indígena não se revelou maior fator de
vulnerabilidade entre as entrevistadas. Entre as mulheres negras e indígenas
entrevistadas, 23,89% declara já ter sofrido assédio, enquanto 76,10% afirmam nunca
terem sofrido a referida prática. Já entre as mulheres não negras entrevistadas, o
percentual se mostra equivalente, tendo 23,14% já sofrido a prática e 76,85% declarado
nunca ter sido vítima.
8,62%
91,37%
HOMENS MULHERES
27
Vale também destacar que, entre as vítimas do sexo masculino que declararam ter
sofrido assédio sexual, a orientação sexual não se mostrou um fator decisivo,
distribuindo-se o percentual entre homens heterossexuais, homossexuais e bissexuais
de maneira equivalente. Diferentemente, entre as mulheres, a orientação sexual se
mostrou fator relevante relacionado à prática de assédio e importunação sexuais. Isto
porque, entre as mulheres que se autodeclararam lésbicas ou bissexuais, 31,42%
afirmaram já terem sido vítimas de tais práticas. Já entre as mulheres heterossexuais
entrevistadas o percentual é relativamente menor, de modo que 23,31% declaram já
terem sofrido com tais condutas.
GRÁFICO 15: PRÁTICAS DE ASSÉDIO MAIS COMUNS
Entre as mulheres que declaram já terem sofrido assédio ou importunação sexuais, 90%
já foram alvo de cantadas insistentes no exercício profissional; 72,22% já ouviram
comentários desrespeitosos de conotação sexual no exercício da advocacia e 21,66%
chegaram a sofrer toques não consentidos no corpo.
Fator que merece destaque é a falta de consciência como relação à prática de assédio
ou importunação de natureza sexual por parte das próprias vítimas. Entre as mulheres
entrevistadas que declaram nunca terem sofrido tal prática, 16,89% afirmam já terem
sido, no exercício da profissão, alvo de cantadas insistentes, 13,96% já ouviram
comentários desrespeitosos de conotação sexual e 1,89% chegou a sofrer toques não
consentidos no corpo sem que compreendessem tal prática como modalidade de
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
70,00%
80,00%
90,00%
100,00%
CANTADAS INSISTENTES COMENTÁRIOS
DESRESPEITOSOS DE
CONOTAÇÃO SEXUAL
TOQUES NÃO CONSENTIDOS
NO CORPO
28
assédio. Vale ressaltar, também, que, entre os homens entrevistados, 88,75% não se
consideram pessoas machistas.
GRÁFICO 16: O PERFIL DO ASSEDIADOR
Quanto aos relatos de assédio sexual e de importunação sexual, as vítimas de tais
condutas revelaram que em 13,72% o agressor ocupava uma posição de superioridade
hierárquica. A relação de hierarquia não é elemento indispensável para a caracterização
do ilícito de tais condutas, todavia é exigida para o caso de imputação de crime de
assédio sexual. Nesse sentido, a condição de superior hierárquico ou ascendência
inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função são requisitos exigidos para a
incidência do crime de assédio sexual previsto no art. 216-A do código Penal,
diferentemente do delito de importunação sexual, previsto no art. 215-A do mesmo
diploma jurídico, que somente prevê a prática de ato libidinoso não consentido com o
objetivo de satisfação da lascívia própria ou de terceiro.
13,72%
86,28%
EXISTÊNCIA DE SUPERIORIDADE HIERÁRQUICA
INEXISTÊNCIA DE SUPERIORIDADE HIERÁRQUICA
29
GRÁFICO 17: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS VÍTIMAS DE
ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA
É possível notar, dos dados acima apontados, ser ínfimo o percentual de processos
gerados para a apuração dos assédios e importunações, mesmo em se tratando de
vítimas que exercem a advocacia, fator que facilitaria, me tese, o acesso à justiça.
Portanto, mesmo nesse meio profissional, os atos abusivos restam impunes, livres de
quaisquer consequências penais ou mesmo administrativas. É necessário, portanto,
reposicionar a OAB na repressão às práticas de violência de gênero sofridas no exercício
da advocacia, criando medidas voltadas a superar o atual quadro de subnotificação e,
respeitando-se o devido processo, direcionadas a reprimir e prevenir tais condutas
abusivas.
41,62%
7,10%
0,50%
47,71%
NÃO FEZ NADA PEDIU DEMISSÃO PROCESSOU O AUTOR DO FATO OUTRA SOLUÇÃO
30
4.5. ADVOCACIA E DIREITOS LGBTQI+
por Filipe Garbelotto e Daniela Portugal
Na última década, a Ordem dos Advogados do Brasil passou a destinar, internamente,
espaços voltados exclusivamente à temática dos direitos da população LGBTQI+ através
da criação de comissão específica, no Conselho Federal. As seccionais e subseções
passaram a adotar procedimento idêntico, com a criação de comissões semelhantes em
âmbito das seccionais e das subseções. Desta forma, a população LGBTQI+ passou a
dispor de expressivo espaço dentro do sistema OAB, que de forma capilarizada vem
contribuindo para o enfrentamento da LGBTFobia e para o fomento ao debate dos
temas afetos à causa.
Em sintonia com a importância do combate à LGBTFobia, em junho de 2019 o Conselho
Federal aprovou a Súmula n. 11/2019/COP, com o seguinte enunciado:
INIDONIEDADE MORAL. VIOLÊNCIA CONTRA PESSOA LGBTI+. ANÁLISE DO
CONSELHO SECCIONAL DA OAB. Assim a prática de violência contra pessoas
LGBTI+, em razão da Orientação Sexual, Identidade de Gênero e Expressão de
Gênero, constitui fator apto a demonstrar ausência de idoneidade moral para
inscrição de bacharel em Direito nos quadros da OAB, independente da
instância criminal, assegurado ao Conselho seccional a análise de cada caso
concreto.9
Deste modo, a presente pesquisa também cuidou de coletar dados relativos às práticas
de LGBTFobia sofridas por advogadas e advogados no exercício profissional em virtude
de sua identidade de gênero ou orientação sexual.
Daniel Borrillo conceitua a prática da homofobia como sendo “manifestação arbitrária
que consiste em designar o outro como contrário, inferior ou anormal; por sua diferença
irredutível, ele é posicionado a distância, fora do universo comum dos humanos”.
Complementa o autor que, “confinado no papel do marginal ou excêntrico, o
9
CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2019. Súmula n. 11/2019/COP.
Disponível em <https://www.oab.org.br/Content/pdf/sumulas/sumula-11-2019-COP.pdf>
31
homossexual é apontado pela norma social como bizarro, estranho ou extravagante”10
.
A LGBTFobia, portanto, abrange o ódio e hostilidade direcionado a lésbicas, gays,
bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros, alcançando logicamente as práticas
direcionadas contra pessoas intersexo, assexuais, queer, ou quaisquer outras em virtude
de identidade de gênero ou orientação sexual.
Nesse sentido, é importante reconhecer que o exercício da advocacia ainda se dá em
um espaço extremamente cisnormativo, isto é, composto basicamente por pessoas que
se identificam com o sexo biológico socialmente atribuído ao nascimento e, com isso,
entendidas como pessoas “normais”. Infelizmente, significativa parte da sociedade
ainda entende a travestilidade e transexualidade como identidades patologizadas e
criminalizadas, pois traduzem identidades que diferem do gênero designado ao
nascimento. Assim, é indispensável a compreensão da forma como as identidades de
gênero e as relações sociais de poder interferem no exercício da advocacia.
GRÁFICO 18: ADVOCACIA E CISNORMATIVIDADE
Como é possível notar, a advocacia reflete uma sociedade cisnormativa, já que somente
0,36% das pessoas entrevistadas se autodeclaram travestis ou transexuais. Trata-se,
também, de espaço heteronormativo, em que a heterossexualidade colocada como
padrão de normalidade.
10
BORRILLO, Daniel. Homofobia: história e crítica de um preconceito. Trad. Guilherme João de Freitas
Teixeira. Belo Horizonte: Autêntica, 2010, p. 13.
99,64%
0,36%
CISGÊNERO TRAVESTI OU TRANSEXUAL
32
GRAFICO 19: ADVOCACIA E HETERONORMATIVIDADE
Cabe destacar que, entre advogadas e advogados heterossexuais entrevistados, 99,18%
afirmam que não são pessoas homofóbicas. Entretanto, contraditoriamente, 23,52%
atestam que já presenciaram alguma prática discriminatória contra a população
LGBTQI+ no exercício da profissão, o que demonstra a dificuldade em reconhecer a si
próprio enquanto sujeito LGBTfóbico.
Acerca do perfil das advogadas e dos advogados LGBTQI+, importa destacar que 74,64%
possuem idade não superior a 37 anos, e 57,74% atualmente são cadastrados junto à
OAB/BA como jovens advogados, portanto com menos de cinco anos de inscrição. Além
disso, 59,15% exercem advocacia em Salvador e região metropolitana, enquanto 40,84%
declararam exercer a profissão em comarcas do interior.
GRÁFICO 20: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+
94,76%
5,23%
HETEROSSEXUAIS
HOMOSSEXUAIS, LÉSBICAS, BISSEXUAIS E OUTRAS ORIENTAÇÕES
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
ATÉ R$ 1.000,00 R$ 1.001,00 A R$
4.000,00
R$ 4.001,00 A R$
8.000,00
R$ 8.001,00 A R$
12.000,00
MAIS DE R$
12.000,00
33
Quanto às faixas de remuneração das advogadas e dos advogados LGBTQI+, constatou-
se que 16,90% recebem até R$ 1.000,00; 54,92% entre R$ 1.001,00 e R$ 4.000,00;
22,53% entre R$ 4.001,00 e R$ 8.000,00; 2,81% entre R$ 8.001,00 e R$ 12.000,00 e
2,81% são remunerados em patamar superior a R$ 12.000,00. Dentre os entrevistados
LGBTQI+, merece destaque que 47,88% declaram ser a principal fonte de renda familiar,
número superior ao de advogados e advogadas heterossexuais que declaram ser
principal fonte de renda, que é de 44,90%.
Ainda é possível notar que jovens advogadas e dos advogados LGBTQI+ assumem
responsabilidade econômica familiar mais cedo que os jovens profissionais
heterossexuais, pois 41,46% daqueles são principal fonte de renda familiar, ao passo
que somente 34,72% destes declaram assumir a mesma responsabilidade econômica.
Vale destacar, conforme dados nacionalmente coletados pelo Ministério de Direitos
Humanos em pesquisa sobre violências LGBTFóbicas no Brasil, que dão conta que
grande parte das agressões dessa natureza ocorrem em casa: 20,40% dos casos contra
travestis; 20% dos casos contra transexuais; 27,40% contra gays e 29,70% contra
lésbicas11
. Portanto, a especial hostilidade do ambiente doméstico e familiar na vivência
de pessoas LGBTQI+ pode ser apontada como um dos fatores que explica, na presente
pesquisa, o elevado número de declarantes que afirmam ser a principal fonte de renda
familiar.
GRÁFICO 21: ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+ E ASSÉDIO MORAL
11
MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS. SECRETARIA NACIONAL DE CIDADANIA. Violência LGBTFóbicas
no Brasil: dados da violência. Elaboração de Marcos Vinícius Moura Silva – Documento eletrônico –
Brasília: Ministério dos Direitos Humanos, 2018.
39,43%
65,57%
JÁ SOFREU ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFREU ASSÉDIO MORAL
34
Entre advogadas e advogados LGBTQI+ entrevistados, 39,43% afirmam já terem sofrido
assédio moral no exercício da advocacia. Significa dizer, portanto, que são vitimados
com maior frequência com práticas assédio moral se comparados a advogadas e
advogados heterossexuais, que apresentam percentual inferior de ocorrências dessa
natureza (30,97%).
GRÁFICO 22: ADVOGADAS LGBTQI+ E ASSÉDIO SEXUAL
Entre advogadas e advogados LGBTQI+ entrevistados, 16,90% afirmam já terem sofrido
assédio sexual ou importunação sexual no exercício da advocacia. Especificamente
analisando a realidade das mulheres LGBTQI+ advogadas, constatou-se que 31,42% das
entrevistadas já haviam sido vítimas de assédio ou importunações sexuais exercendo a
atividade profissional, o que demonstra a maior vulnerabilidade quando cruzados os
fatores de gênero e orientação sexual.
GRÁFICO 23: LGBTFOBIA
31,42%
68,58%
JÁ SOFREU ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS
NUNCA SOFREU ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS
33,80%
66,20%
JÁ FOI VÍTIMA DE LGBTFOBIA NUNCA FOI VÍTIMA DE LGBTFOBIA
35
Entre advogadas e advogados LGBTQI+ entrevistados, 33,80% afirmam já terem sido
vítimas de preconceito ou discriminação decorrente da orientação sexual durante o
exercício da advocacia. Além disso, 53,52% dos entrevistados LGBTQI+ informam que já
presenciaram algum tipo de prática de LGBTfobia no exercício da profissão.
Merece destaque, além do posicionamento do CFOAB para a repressão às práticas de
LGBTFobia no âmbito interno da OAB, o atual entendimento do Supremo Tribunal
Federal acerca da criminalização da referida prática. O STF, atento aos crimes de ódio
sofridos por pessoas LGBTQI+, em decisão histórica, no julgamento da ADO nº 26,
ocorrido em 13 de junho de 2019, determinou que as ações homofóbicas e transfóbicas
deverão ser criminalizadas por meio dos preceitos primários inscritos na Lei nº 7.716,
de 1989, enquanto se aguarda a implementação, pelo Congresso Nacional, dos
mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5 da Constituição
Federal.
GRÁFICO 24: QUEM JÁ PRESENCIOU ATO LGBTFÓBICO
Note-se, portanto, que a maioria das pessoas entrevistadas afirmou já ter presenciado
uma conduta LGBTFóbica no exercício da profissão, entretanto, somente 0,82%
admitem ser pessoas homofóbicas. Tal contraste demonstra a hipocrisia que marca o
tratamento do tema entre nossos profissionais, que precisam se conscientizar acerca de
tão importante questão, sendo indispensável também frisar o papel institucional da OAB
nesse processo informativo e educacional.
53,52%
46,48%
JÁ PRESENCIOU PRÁTICA DE LGBTFOBIA
NUNCA PRESENCIOU PRÁTICA DE LGBTFOBIA
36
Judith Butler, citando Foucault, afirma que “o corpo só ganha significado no discurso no
contexto das relações de poder. A sexualidade é uma organização historicamente
específica do poder, do discurso, dos corpos e da afetividade”12
. O direito de existir e
ser respeitado e respeitada deve ser uma busca coletiva e constante, dentro e fora do
exercício da advocacia.
12
FOUCAULT, Michel. The history of sexuality. v. 1: An Introduction. Trad. Robert Hurley. Nova York:
Vintage, 1980. apud BUTLER, Judith. Problemas de Gênero. Feminismo e subversão da identidade.Trad.
Renato Aguiar. 11. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016, p. 162.
37
4.6. A JOVEM ADVOCACIA
por Daniela Portugal
Acerca das condições de trabalho para a jovem advocacia, é importante alertar que
28,27% dos entrevistados com menos de cinco anos de OAB possuem uma renda
pessoal mensal inferior R$ 1.000,00. Os jovens advogados são, portanto, aqueles que
enfrentam as piores condições econômicas no exercício da advocacia, já que, entre os
entrevistados com mais de cinco anos de OAB, somente 9,40% recebem remuneração
mensal inferior a R$ 1.000,00.
GRÁFICO 25: REMUNERAÇÃO INFERIOR A R$ 1.000,00 NA JOVEM ADVOCACIA
Portanto, entre as advogadas e advogados entrevistados que recebem remuneração
mensal inferior a R$ 1.000,00, constata-se que 75,48% integram a jovem advocacia.
Entre esses jovens com renda inferior mil reais, 24,74% afirmam ser principal fonte de
renda familiar e 28,86% já foram vítimas de assédio moral no exercício da profissão, o
que agrava a situação de vulnerabilidade experimentada, além de contribuir para a
subnotificação das eventuais práticas de assédio moral sofridas.
75,48%
24,52%
JOVEM ADVOCACIA MAIS DE CINCO ANOS DE OAB
38
GRÁFICO 26: ASSÉDIO MORAL NA JOVEM ADVOCACIA
Entre a jovem advocacia, observou-se que 29,59% das pessoas entrevistadas já haviam
sofrido alguma prática de assédio moral ainda no curso dos primeiros cinco anos de
advocacia. Comparando o referido quesito entre aqueles que já possuem mais de cinco
anos de inscrição, observou-se que 32,38% afirmam já terem sido vítimas de assédio
moral ao longo do exercício profissional. Percebe-se, portanto, que não há um aumento
significativo no percentual de vítimas de assédio moral entre aqueles com mais de cinco
anos de carteira da OAB, o que leva a inferir, logicamente, que a prática abusiva tem
maior incidência durante o período em que a vítima é jovem advogado ou advogada,
razão pela qual o percentual, com o passar dos anos, mantém-se em patamar quase
equivalente.
GRÁFICO 27: ASSÉDIO MORAL ENTRE JOVENS ADVOGADAS E JOVENS ADVOGADOS
Avaliando de maneira ainda mais específica os dados de assédio moral praticado contra
a jovem advocacia, nota-se que as mulheres são, expressivamente, as maiores vítimas
29,59%
70,41%
JÁ SOFRERAM ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFRERAM ASSÉDIO MORAL
76,84%
23,15%
JOVENS ADVOGADAS JOVENS ADVOGADOS
39
da prática. Entre as vítimas pertencentes à jovem advocacia que declaram já ter sofrido
assédio moral, 76,84% são mulheres e apenas 23,15% são homens.
GRÁFICO 28: ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NA JOVEM ADVOCACIA
Merece destaque o expressivo número de pessoas entrevistadas com menos de cinco
anos de carteira da OAB que declaram já ter sofrido assédio sexual ou importunação
sexual no exercício da profissão. Com isso, entre as vítimas que autodeclaram já ter
sofrido tal modalidade de abuso, 46,19% pertencem à jovem advocacia e 53,80% já
possuem mais de cinco anos de inscrição.
Entre os jovens advogados que declaram terem sofrido assédio sexual ou importunação
sexual, mais uma vez, percebe-se o fator gênero como elemento indicativo de
expressiva vulnerabilidade. Entre os jovens advogados ofendidos, somente 5,49% são
do sexo masculino e 94,50% das vítimas são mulheres. Por essas razões, atenta à
especial situação de vulnerabilidade experimentada por jovens advogadas e advogados,
a OAB tem traçado estratégias específicas de inclusão, valorização e fortalecimento da
jovem advocacia, com o objetivo institucional de proteger nossos novos profissionais
contra práticas abusivas de exploração no ambiente de trabalho, assim como prevenir
e reprimir práticas de assédio moral ou sexual.
94,50%
5,49%
MULHERES HOMENS
Comissão da
Mulher Advogada
BAHIA

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Advocacia em Numeros 2019

  • 1.
  • 2. INSTITUCIONAL ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO DO ESTADO DA BAHIA Diretoria Executiva: Fabrício Castro Oliveira - Presidente Ana Patrícia Dantas Leão - Vice-Presidente Marilda Sampaio Miranda Santana - Secretária-Geral Maurício Silva Leahy - Secretário-Geral Adjunto Hermes Hilarião Teixeira Neto - Tesoureiro Realização: Comissão da Mulher Advogada OAB-BA Daniela Portugal - Presidenta Camila Trabuco - Vice-Presidenta Fernanda Cardoso - Secretária Geral Equipe Técnica: Daniela Portugal - Coordenação de Pesquisa Ronaldo Bispo Lima - Gerente de Informática da OAB-BA Guilherme Mendonça Jr - Técnico de Informática da OAB-BA Bruno Luis Santana dos Santos - Técnico de Informática da OAB-BA Relatórios: Daniela Portugal Camila Trabuco Filipe Garbelotto Vander Costa Vinícius Assumpção
  • 3. 2 Membros da Comissão da Mulher Advogada: Daniela Portugal – Presidenta Camila Trabuco – Vice-presidenta Fernanda Cardoso - Secretária Geral Ajucinéa Matos Aline Vieira Carolina Blanco Cristina Rios Daniela Barbosa Fábia Rodrigues Fernanda Cardoso Graziele Souza Karen Baraúna Karen Kuentzer Karina Ferreira Leila Ifá Laís Teles Lorena Macedo Luana Libório Luciana Santiago Luise Reis Luzia Vicente Márcia Regina Maria Neide Maria Zélia Milena Monstans Neuma Jesus Raquel Dortas Rita Ifá Samantha Carvalho Vanessa Carrilho Ylla Guimarães Colaboradoras: Ana Luísa Hiltner Angela Prazeres Cídia Dayara Helaine Teixeira Jéssica Berenguer Joana Araújo Jorgete Pinheiro Juana Sarno Laís Santos Lize Borges Luana de Oliveira Maiana Alves Sabrina Telles Tatiana Hipólito
  • 4. 3 SUMÁRIO 1. APRESENTAÇÃO........................................................................................................ 5 2. METODOLOGIA......................................................................................................... 7 3. ADVOCACIA E INTERSECCIONALIDADE...................................................................... 8 4. PRINCIPAIS RESULTADOS........................................................................................ 10 4.1. INFORMAÇÕES GERAIS ........................................................................................ 10 4.2. RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA............................................................. 14 4.3. ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA.................................................. 19 4.4. ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA ...... 23 4.5. ADVOCACIA E DIREITOS LGBTQI+......................................................................... 30 4.6. A JOVEM ADVOCACIA .......................................................................................... 37
  • 5. 4 LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1: IDENTIDADE DE GÊNERO GRÁFICO 2: RENDA MENSAL GRÁFICO 3: REGIÃO DE CONCENTRAÇÃO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL GRÁFICO 4: JOVEM ADVOCACIA GRÁFICO 5: PERFIL RACIAL DOS ENTREVISTADOS GRÁFICO 6: ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS) QUE FORAM VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA GRÁFICO 7: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS) QUE FORAM VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA GRÁFICO 8: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADOS E ADVOGADAS NEGROS(AS) GRÁFICO 9: VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA GRÁFICO 10: HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO GRÁFICO 11: ASSÉDIO MORAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL GRÁFICO 12: VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA GRÁFICO 13: PERCENTUAL DE HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA GRÁFICO 14: VÍTIMAS DE ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS POR GÊNERO GRÁFICO 15: PRÁTICAS DE ASSÉDIO MAIS COMUNS GRÁFICO 16: O PERFIL DO ASSEDIADOR GRÁFICO 17: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS VÍTIMAS DE ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA GRÁFICO 18: ADVOCACIA E CISNORMATIVIDADE GRAFICO 19: ADVOCACIA E HETERONORMATIVIDADE GRÁFICO 20: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+ GRÁFICO 21: ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+ E ASSÉDIO MORAL GRÁFICO 22: ADVOGADAS LGBTQI+ E ASSÉDIO SEXUAL GRÁFICO 23: LGBTFOBIA GRÁFICO 24: QUEM JÁ PRESENCIOU ATO LGBTFÓBICO GRÁFICO 25: REMUNERAÇÃO INFERIOR A R$ 1.000,00 NA JOVEM ADVOCACIA GRÁFICO 26: ASSÉDIO MORAL NA JOVEM ADVOCACIA GRÁFICO 27: ASSÉDIO MORAL ENTRE JOVENS ADVOGADAS E JOVENS ADVOGADOS GRÁFICO 28: ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NA JOVEM ADVOCACIA
  • 6. 5 1. APRESENTAÇÃO Nobres colegas advogados e advogadas, Foi com o objetivo de conhecer melhor o perfil da nossa advocacia que a Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Bahia, por meio de iniciativa da Comissão da Mulher Advogada - BA, iniciou projeto de coleta de dados acerca dos profissionais vinculados ao nosso sistema OAB. O objetivo é utilizar a compilação para pautar de maneira mais adequada as políticas de valorização da advocacia no âmbito estadual. A coleta de dados foi pensada e projetada a partir de uma análise interseccional, avaliando informações relativas a gênero, raça e classe, agregando, também, outros elementos de extrema importância, tais como identidade de gênero, orientação sexual, região de concentração da atividade profissional e tempo de exercício da advocacia. Colher informações a partir de tais fatores certamente nos auxiliará a pensar nossas políticas institucionais de maneira ainda mais participativa e colaborativa além de consciente da realidade enfrentada pelos nossos colegas no exercício da profissão. Dentre os quesitos aplicados, reunimos informações sobre advogados e advogadas vítimas de racismo, com atenção especial para os obstáculos profissionais experimentados pela mulher negra advogada. Também foram reunidas informações referentes a assédio moral, quando se pode ter uma noção mais precisa da elevada incidência da referida prática, vitimando, sobretudo, a jovem advocacia e, especialmente, as mulheres com menos de cinco anos de inscrição junto à OAB. Na avaliação das práticas de assédio moral sofridas no exercício profissional, também se identificou a orientação sexual como fator de maior vulneração, razão pela qual o tema também foi objeto de especial dedicação no relatório de pesquisa. Foram compilados, ainda, dados sobre violência de gênero, identificando percentual de profissionais que já foram vítimas de assédio sexual ou importunação sexual no exercício da advocacia. Pudemos identificar, com maior precisão, os obstáculos enfrentados pela mulher advogada, vítima preferencial de práticas de abuso sexual, o que nos permitirá o aperfeiçoamento do nosso sistema interno de proteção.
  • 7. 6 A OAB-Bahia é consciente do seu dever de conhecer de perto as dificuldades vivenciadas pela nossa classe, que é tão plural, e, com isso, estabelecer diálogos e direcionar projetos futuros. O presente diagnóstico é apenas um exemplo de diversas outras políticas que vêm sendo objeto de inovação pela atual gestão, simbolizando um convite à reflexão conjunta sobre a realidade da advocacia de hoje e, especialmente, sobre aquela que queremos construir. Fabrício Castro e Daniela Portugal
  • 8. 7 2. METODOLOGIA O presente relatório compila dados colhidos a partir de pesquisa quantitativa descritiva. Portanto, trata-se de estudo feito a partir de amostra do universo de advogadas e advogados cadastrados junto ao sistema OAB-Bahia, com o objetivo de registrar informações relevantes relacionadas a gênero, raça, classe, orientação sexual, região de exercício da advocacia e tempo de inscrição. Como instrumento principal de obtenção de informações, utilizou-se questionário estruturado fechado, com quesitos pensados a partir de perspectiva interseccional, para o fim de levantamento estatístico dos elementos coletados. O questionário foi aplicado por meio do “OAB Pesquisas”, software de consultas e pesquisas desenvolvido pela MOBTEX Softwares sob encomenda da OAB-Bahia, integrado à base de dados do próprio sistema OAB, vinculado a mecanismos de privacidade e segurança de dados. Inicialmente, foi gerado um link para aplicação de pré-teste do questionário, com o objetivo de correção de erros e de aperfeiçoamento dos quesitos e, após duas fases de teste, validou-se a versão final. Em seguida, o link de acesso foi enviado para o e-mail de todos os advogados e advogadas inscritos na OAB, Seccional Bahia, utilizando-se o endereço eletrônico cadastrado pelo próprio profissional junto à OAB. A divulgação da campanha se deu por e-mail, boletim informativo e também por intermédio das redes sociais do sistema OAB. O ingresso no link era iniciado mediante digitação do número de inscrição junto à OAB. A resposta aos questionamentos era feita de modo progressivo, sendo que somente a resposta ao quesito aplicado acionava o acesso ao questionamento subsequente, não se disponibilizando a opção de voltar para modificação das informações já armazenadas. Responderam ao questionário 1.356 advogados e advogadas, número amostral relativamente pequeno diante do total de 48.667 inscritos para os quais foi encaminhado o link de acesso. Espera-se que, com a divulgação dos primeiros resultados de pesquisa, haja maior adesão da classe para resposta às edições futuras do presente diagnóstico.
  • 9. 8 3. ADVOCACIA E INTERSECCIONALIDADE Quando a advocacia é pensada enquanto coletividade, é certo que podemos estabelecer características e necessidades comuns a toda classe. A busca pela melhoria nas condições para o exercício profissional é, de modo geral, o objetivo buscado pelas políticas institucionais pautadas pela Ordem dos Advogados do Brasil, por meio de cada uma de suas seccionais. Todavia, ao lado da importância do reconhecimento do conjunto de advogados e advogadas enquanto grupo, é igualmente importante a identificação e compreensão das diferenças intragrupo, do contrário estaríamos vinculados a uma falsa concepção de universalidade e, consequentemente, traçando políticas inadequadas e ineficientes. No Brasil, somente no final do século XIX foi autorizado às mulheres brasileiras o direito de acessar o ensino superior, quando, em 19 de abril de 1879, D. Pedro II fez aprovar lei que formalmente autorizava a presença feminina em cursos superiores. Mesmo sem o impedimento legal, a permanência de outros obstáculos sociais tornou bastante lento o processo de efetivo ingresso das mulheres brasileiras na rede educacional superior. Na Bahia, é somente no começo do século XX que se podia perceber a presença de algumas poucas mulheres nos cursos de Medicina, Direito e Engenharia.1 De outro lado, o processo de colonização e escravização no Brasil praticamente baniu negros e negras do sistema formal de ensino, quadro que não se reverteu quando da promulgação da Lei Áurea em 1888. Ainda hoje são sentidos os reflexos do histórico escravista na subrepresentatividade negra nas universidades brasileiras, realidade somente tocada a partir da recente implementação das políticas raciais afirmativas nas Universidades, podendo-se citar o pioneiro programa de Cotas brasileiro implementado em 2003 pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, muito antes da Lei das Cotas (nº 12.711), de 2012.2 1 QUEIROZ, Delcele Mascarenhas. Mulheres no ensino superior no Brasil. Disponível em: < http://23reuniao.anped.org.br/textos/0301t.PDF> Acesso em 01 de agosto de 2019. 2 GUARNIERI, Fernanda; MELO-SILVA, Lucy Leal. Cotas Universitárias no Brasil: análise de uma década de produção científica. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pee/v21n2/2175-3539-pee-21-02- 00183.pdf> Acesso em 01 de agosto de 2019.
  • 10. 9 Por tais razões, é preciso compreender que o grande coletivo de advogados e advogadas inscritos na OAB-Bahia não experimentam, necessariamente, as mesmas dificuldades e opressões, assim como as políticas institucionais nem sempre conseguirão beneficiar a todos e todas caso não estejam atentas às diferenças internamente encontradas. Nesse contexto, é indispensável perceber os obstáculos históricos e ainda presentes enfrentados pelas mulheres advogadas, assim como perceber as barreiras tradicionalmente colocadas contra a população negra. É imprescindível, ainda, analisar, institucionalmente, como essas vias de opressão se cruzam e se sobrepõem, gerando variados níveis de desigualdades distribuídos entre a classe de advogados e advogadas. É com esse olhar que a presente pesquisa é pensada a partir do conceito de interseccionalidade desenvolvido por Kimberle Crenshaw. De acordo com a autora, existem fronteiras tradicionalmente colocadas nos estudos de raça e gênero quando analisados separadamente, havendo a necessidade de se explorar de que maneira tais dimensões se cruzam.3 Nesse sentido, o presente estudo objetiva direcionar ações institucionais que toquem não apenas o racismo e o machismo enquanto isoladamente compreendidos, mas, especialmente, entendidos a partir de suas eventuais sobreposições, impactando de modo diferenciado no exercício profissional de cada advogado e advogada. 3 CRENSHAW, Kimberle. Mapping the Margins: Intersectionality, Identity Politics, and Violence against Women of Color. Stanford Law Review, Vol. 43, No. 6 (Jul., 1991), pp. 1241-1299. Disponível em: <https://alexy.asian.lsa.umich.edu/courses/readings/Crenshaw_Mapping%20the%20Margins.pdf> Acesso em 01 de agosto de 2019.
  • 11. 10 4. PRINCIPAIS RESULTADOS por Daniela Portugal e Camila Trabuco É importante compreender que a presente pesquisa representa uma primeira aproximação com uma nova forma de se pensar políticas institucionais e que, portanto, será aperfeiçoada em futuras edições, que agora já se encontram em fase de planejamento. Neste tópico, serão exibidos os principais resultados obtidos a partir do questionário aplicado. 4.1. INFORMAÇÕES GERAIS Atualmente, encontram-se registrados junto à OAB-BA 24.976 homens e 24.087 mulheres. Significa, portanto, que a advocacia baiana é composta de 51,91% de homens e 49,09% de mulheres - composição praticamente paritária em termos de gênero, o que passou a ser refletido na proposta de Conselho Seccional apresentada pela atual gestão. Dentre os 49.064 advogados e advogadas cadastrados, é importante mencionar que a jovem advocacia representa 39,40%, totalizando 19.330 jovens inscritos. Em Salvador, especificamente, tem-se um total de 10.001 jovens advogadas e advogados, representando 35,25% da advocacia na capital. A força da jovem advocacia está refletida, também, na decisão histórica do Conselho Federal da OAB, em outubro de 2018, pelo fim da cláusula de barreira, presente no parágrafo 2º do 63º artigo do Estatuto da Advocacia, que impedia advogadas e advogados com menos de cinco anos de carteira de concorrerem nas eleições da Ordem. Diante disso, foi sancionada a Lei nº 13.875, de 20 de setembro de 2019, responsável por alterar o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil e reduzir, de cinco para três anos, o tempo necessário de exercício efetivo da profissão para fins de eleição para os cargos de Conselheiro Seccional e das Subseções. Quanto às pessoas que responderam ao questionário aplicado, pode-se dizer que o número de participantes ainda é muito reduzido em comparação ao conjunto de
  • 12. 11 advogadas e advogados, o que compromete, naturalmente, a confiabilidade científica dos resultados alcançados, sem que se possa ignorar, de outro modo, o fato de os dados coletados refletirem, de um modo geral, o perfil da classe. O questionário foi aplicado entre advogadas e advogados, pessoas negras e não negras, de diferentes orientações sexuais e condições socioeconômicas. A aplicação foi distribuída, ainda, entre profissionais que atuam em Salvador e Região Metropolitana, bem como entre aqueles que concentram o exercício da atividade nas comarcas do interior. Espera-se que, em edições futuras, a ação conte com uma participação mais ampla da classe, a fim de que se amplie a confiabilidade dos resultados de pesquisa obtidos. GRÁFICO 1: IDENTIDADE DE GÊNERO Entre as pessoas que responderam ao questionário, 56,04% são mulheres e 43,95% são homens, percentual que difere um pouco do quadro geral de gênero no número total de inscrições junto à OAB. Entende-se que a diferença se deve, provavelmente, ao fato de a aplicação da pesquisa ser fruto de iniciativa da Comissão da Mulher Advogada, ainda que com o apoio da Diretoria da Seccional. Com isso, acredita-se que a divulgação acabou impactando mais no interesse de participação das mulheres do que dos homens advogados. A diferença não chega, todavia, a comprometer o resultado dos estudos, já que, de modo geral, reflete a paridade hoje presente no quadro da OAB-BA. 43,95% 56,04% HOMENS MULHERES
  • 13. 12 GRÁFICO 2: RENDA MENSAL Entre todos os entrevistados, constatou-se que 18,95% recebem até R$ 1.000,00; 44,91% entre R$ 1.001,00 e R$ 4.000,00; 21,09% entre R$ 4.001,00 e R$ 8.000,00; 7,44% entre R$ 8.001,00 e R$ 12.000,00 e somente 7,59% são remunerados em patamar superior a R$ 12.000,00. Os mencionados dados são preocupantes, especialmente quando se observa o alto número de profissionais que possuem renda mensal não superior a R$ 1.000,00. Mais adiante, em uma perspectiva interseccional, serão avaliados como os fatores de raça e gênero impactam na remuneração dos nossos profissionais. GRÁFICO 3: REGIÃO DE CONCENTRAÇÃO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL Verificou-se, ainda, que o questionário foi respondido por 57,37% de profissionais que concentram o exercício da advocacia em Salvador e Região Metropolitana, bem como por 42,63% dos que atuam em comarcas do interior. 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% ATÉ R$ 1.000,00 R$ 1.001,00 A R$ 4.000,00 R$ 4.001,00 A R$ 8.000,00 R$ 8.001,00 A R$ 12.000,00 MAIS DE R$ 12.000,00 57,37% 42,63% SALVADOR INTERIOR
  • 14. 13 GRÁFICO 4: JOVEM ADVOCACIA Por fim, constatou-se que 50,59% dos entrevistados são jovens advogados, possuindo, portanto, menos de cinco anos de inscrição junto à OAB-BA. Destaque-se que algumas políticas institucionais já consideram a especial condição de jovem advogado, como é o caso das taxas progressivas nas anuidades. Entretanto, a ampla participação da jovem advocacia na resposta ao questionário é de extrema importância, como se verá adiante, pois fornece informações relevantes acerca de outras modalidades de especial vulnerabilidade para além da econômica. 50,59% 49,41% JOVEM ADVOGADO MAIS DE CINCO ANOS DE OAB
  • 15. 14 4.2. RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA por Vinícius Assumpção e Daniela Portugal Os dados desta primeira pesquisa convidam a uma série de reflexões sobre a questão racial e a advocacia, além de abrirem caminho para novas investigações que permitam não só ampliar o conhecimento, mas propor medidas específicas para o exercício plural da profissão. GRÁFICO 5: PERFIL RACIAL DOS ENTREVISTADOS O percentual de pessoas não-negras (71,75%) do total de advogadas e advogados nos remete a debates importantes. O primeiro deles diz respeito ao perfil bastante embranquecido dos cursos de Direito, apesar de alguma diversidade ter se instaurado com a implementação de iniciativas como as cotas e o Fies ao longo da última década. Sendo baixo o número de bacharelas e bacharéis negras e negros, é tendência lógica e natural termos um índice menor dessas/esses profissionais na advocacia. O quadro se agrava se refletirmos sobre as dificuldades de se conseguir estágio nos escritórios de advocacia sendo pessoa negra, o que muitas vezes incentiva o ingresso nas carreiras públicas e desestimula as tentativas no setor privado. O segundo debate demanda maior verificação, porém é uma realidade recorrente nos censos que atentam para a questão racial: a dificuldade da pessoa entrevistada em se enxergar negra/negro. Como afirma Dzidzienyo: “o crescimento da consciência negra é 71,75% 27,87% 0,36% PESSOA NÃO NEGRA PESSOA NEGRA PESSOA INDÍGENA
  • 16. 15 desencorajado pela recusa da sociedade em conceder ao cidadão negro a oportunidade de realizar sua íntegra identidade – inclusive seu eu negro”4 . Sim, a autodefinição autêntica ainda esbarra nas limitações impostas pela lógica racista que nos turva a visão à nossa própria negritude, ou, ciente dela, nos convida a negá-la quando indagados a respeito. Essa soma de fatores é capaz de visibilizar as razões para termos menos de 30% de pessoas negras na advocacia enquanto as estatísticas indicam que temos, na Bahia, mais de 80% de “pretos e pardos”. GRÁFICO 6: ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS) QUE FORAM VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA Entre os entrevistados autodeclarados negros e que concentram a advocacia em Salvador e região metropolitana, 24,57% afirmam já terem sido vítimas de racismo e 75,42% afirmam nunca terem sofrido qualquer ato discriminatório. Entre os entrevistados autodeclarados negros que concentram atividade profissional nas comarcas do interior do estado, os dados coletados quanto ao referido quesito são de 14,78% e 85,21%, respectivamente. De uma maneira geral, entre os advogados e advogadas autodeclarados negros que afirmam nunca ter sofrido racismo, é possível constatar, objetivamente, dois dados contraditórios, pois 7,69% afirmaram que já receberam remuneração inferior por ser 4 “DZIDZIENYO, Anani. The Position of Blacks in Brazilian Society. Report n. 7. London: Minority Rights Group, 1971. apud NASCIMENTO, Abdias. O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um Racismo Mascarado. São Paulo: Perspectivas, 2016, p. 136. 20,89% 79,10% JÁ SOFREU RACISMO NUNCA SOFREU RACISMO
  • 17. 16 pessoa negra e 11,37% afirmam já terem sido alvo de críticas e piadas relacionadas à estética negra. Entre os entrevistados, pessoas negras e não negras, 30,60% já presenciaram, no exercício da profissão, práticas de racismo. Entretanto, dentre todos os entrevistados, somente 1,03% se considera uma pessoa racista, ao passo que 98,96% declaram que não se consideram pessoas racistas. Não houve um número expressivo de entrevistados autodeclarados indígenas, razão pela qual o relatório de pesquisa não trouxe, nesta primeira edição, um recorte específico relacionado à discriminação voltada à condição de pessoa indígena, inclusive no cuidado de evitar a identificação das pessoas entrevistadas. Nesse contexto, é de se ler com redobrada atenção a negação de 79% de quem se autodeclara negra/negro quanto a terem sido vítimas de racismo. Conhecendo bem as estruturas extremamente racializadas do nosso país, os resultados da pesquisa possivelmente consagram uma espiral de “não-reconhecimentos”. Num primeiro plano, rejeita-se a própria negritude ou condição étnica; num segundo estágio, tendo-a afirmada, nega-se a vivência de violências racistas. Rejeitando qualquer “relação canônica” com os dados estatísticos5 , parece razoável ter como hipótese que ao menos parte das pessoas entrevistadas desconhece as sutilezas do racismo e não nota as inúmeras situações em que a raça é elemento empregado para a sua estigmatização, sua invisibilização, para a promoção de gracejos mais ou menos explícitos e opressões de outras ordens. 5 LIMA JR., Antonio Teixeira. Igualdade Racial. Políticas sociais: acompanhamento e análise. Instituto de pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, 2019.
  • 18. 17 GRÁFICO 7: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS AUTODECLARADOS NEGROS(AS) QUE FORAM VÍTIMAS DE RACISMO NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA Entre aqueles que nada fizeram após terem sido vítimas de racismo, 50% se autodeclaram principal fonte de renda familiar e 50% afirmam que não são a principal fone de renda familiar. GRÁFICO 8: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADOS E ADVOGADAS NEGROS(AS) Avaliando-se, especificamente, a relação entre a remuneração e questões raciais e de gênero, observa-se a situação de especial vulnerabilidade experimentada por 40% 3,75% 2,50% 48,75% NÃO FEZ NADA PEDIU DEMISSÃO PROCESSOU O AUTOR DO FATO OUTRAS SOLUÇÕES 0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00% 100,00% 120,00% HOMENS NÃO NEGROS HOMENS NEGROS E INDÍGENAS MULHERES NÃO NEGRAS MULHERES NEGRAS E INDÍGENAS ATÉ R$ 1.000,00 R$ 1.001,00 A R$ 4.000,00 R$ 4.001,00 A R$ 8.000,00 R$ 8.001,00 A R$ 12.000,00 MAIS DE R$ 12.000,00
  • 19. 18 advogadas negras, que acabam não experimentando nem a inserção profissional do advogado homem negro, nem a projeção conquistada pelas mulheres não negras advogadas. Pode-se identificar, no gráfico acima, que os homens não negros advogados são os que mais recebem em patamar superior a R$ 12.000,00 (15,85%), e são também os que menos recebem menos de R$ 1.000,00 mensais (12,12%). Na sequência, identifica-se a posição econômica dos homens negros advogados, sendo que 5,42% recebem mais de 12.000,00 por mês e 13,25% recebem menos de R$ 1.000,00 mensais. Com relação à situação das mulheres advogadas, é possível notar a submissão a piores condições de trabalho de uma maneira geral, de modo que, entre as mulheres não negras, somente 4,41% recebem mais de R$ 12.000,00 e 22,06% recebem menos de R$ 1.000,00 por mês. A situação experimentada por mulheres negras no exercício da advocacia, todavia, é a que merece maior atenção institucional, uma vez que se constatou que somente 0,94% são remuneradas em patamar superior a R$ 12.000,00 e 29,72% recebem até R$ 1.000,00 mensais. A pesquisa, portanto, demonstra a exploração profissional experimentada por advogadas negras, o que reflete, mesmo no campo da advocacia, a manutenção das estruturas racistas e machistas que marcam a sociedade. Dado o primeiro passo para melhor conhecer a advocacia baiana, as próximas pesquisas poderão avançar ainda mais ao empregar ferramentas que permitam esmiuçar sua realidade e vivências. O detalhamento das perguntas talvez seja um relevante instrumento para provocar nas pessoas entrevistadas, advogadas e advogados, negras e negros, a percepção crítica das situações com que usualmente se deparam no exercício da profissão.
  • 20. 19 4.3. ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA por Vander Costa e Daniela Portugal O Assédio moral consiste em prática abusiva, sistemática e reiterada, com o intuito de atingir a dignidade e integridade física ou psíquica do ser humano trabalhador. Embora não seja um fenômeno novo, pois sempre esteve presente desde as mais remotas relações humanas, o assédio tem sido revelado com mais intensidade na sociedade moderna, traduzida pela competitividade, consumismo e pelo vazio existencial. Comumente atrelado ao vínculo empregatício, a concepção do assédio moral pode ser ampliada para abranger as diversas configurações do trabalho, pois o direito ao meio ambiente laboral saudável é indistinto e possui assento constitucional. Os advogados e advogadas sujeitos a subordinação, quando assediados, em regra, são expostos às formas tradicionais de abuso, por exemplo, rigor excessivo, excesso de trabalho, restrição da atuação profissional, situações humilhantes que visam desestabilizá-los, pessoalmente e profissionalmente, interferindo na sua autoestima. Outrossim, esses profissionais também estão vulneráveis à modalidade de assédio moral praticado por agentes públicos. Neste caso, o abuso pode ser caracterizado pela inobservância sistemática dos direitos, garantias e prerrogativas profissionais pelas instâncias de poder. GRÁFICO 9: VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA 30,97% 69,03% JÁ FOI VÍTIMA DE ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFREU ASSÉDIO MORAL
  • 21. 20 Os dados colhidos pela pesquisa demonstram que 30,97% dos entrevistados foram vítimas de alguma modalidade de assédio moral descrita no questionário. Confrontando os dados de assédio moral com a identidade étnico-racial da pessoa entrevistada, constata-se que, entre os entrevistados que se autodeclararam pessoa negra ou indígena, 28,72% afirmam já terem sido vítima de assédio moral. Entre os entrevistados que se autodeclaram pessoas não negras, 31% afirmam já terem sido vítima de assédio moral no exercício da advocacia. Destaque-se que os referidos dados se mantêm relativamente equivalentes entre aqueles que exercem advocacia na capital ou no interior. Dentre os entrevistados que concentram a advocacia em Salvador e região metropolitana, 33,29% afirmam já terem sofrido assédio moral, e dentre os que exercem a atividade nas comarcas do interior 27,85% declarou já ter sofrido a mencionada prática. GRÁFICO 10: HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO MORAL NO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO Relacionando os dados obtidos sobre assédio moral e gênero, nota-se que as mulheres são vítimas preferenciais da referida prática. Dentre os homens entrevistados, 20,46% afirma já ter sofrido assédio moral no exercício da profissão. Entre as mulheres entrevistadas, o referido percentual é praticamente o dobro, considerando que 39,21% das mulheres entrevistadas afirmou já ter sofrido assédio moral. 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00% HOMENS MULHERES JÁ SOFRERAM ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFRERAM ASSÉDIO MORAL
  • 22. 21 GRÁFICO 11: ASSÉDIO MORAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL Ao serem cruzados os dados referentes a orientação sexual, com as informações obtidas acerca de assédio moral, constata-se que pessoas homossexuais e bissexuais são alvo preferencial de assédio sexual no exercício da profissão. Dentre os entrevistados que se autodeclaram heterossexuais, 30,50% afirmam já terem sofrido assédio moral. Já entre aqueles que se autodeclaram homossexuais ou bissexuais, nota-se que 39,43% declaram já terem sofrido assédio moral no exercício da advocacia. Optou-se por não tratar, em recorte específico, da identidade de gênero enquanto pessoa travesti ou transexual dado o pequeno número de pessoas que responderam afirmativamente ao referido quesito, fator que poderia acabar por permitir a identificação pessoal das respostas, o que fugiria ao objetivo do presente relatório. Desta maneira, as respostas fornecidas pelas pessoas travestis e transexuais entrevistadas foram computadas conforme a identidade de gênero declarada. O agente público que pratica assédio moral contra advogados ofende os artigos 37 e 133 da Constituição Federal, as prerrogativas profissionais previstas no Art. 7º Lei nº 8.906/1994, sem prejuízo de outras leis especiais aplicáveis. Por sua vez, o advogado que incorrer em assédio, além de violar o Art. 7º Lei nº 8.906/1994, também descura do dever de urbanidade previsto no Art. 33 do Estatuto da Advocacia e 27 do Código de Ética. 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% HETEROSSEXUAIS HOMOSSEXUAIS E BISSEXUAIS JÁ SOFRERAM ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFRERAM ASSÉDIO MORAL
  • 23. 22 O sistema OAB possui instrumentos para combater o assédio moral, protegendo advogados contra os abusos praticados por outros advogados ou agentes públicos, por exemplo, a Comissão de Direitos e Prerrogativas que, junto ao Conselho e a Diretoria da Ordem, asseguram a efetividade das prerrogativas profissionais. Quando o abuso é cometido por advogado, também é possível buscar o Tribunal de Ética e Disciplina para denunciar o profissional por descumprimento do dever de urbanidade. Por fim, o assédio moral provoca diminuição da autoestima, compromete a capacidade laboral, a convivência social, afetiva, podendo desencadear depressão, estresse, ansiedade, esgotamento, atingindo severamente a integridade psíquica da vítima, por isso, a prevenção e o combate são essências para o exercício saudável da advocacia.
  • 24. 23 4.4. ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA por Daniela Portugal A compreensão do assédio sexual e da importunação sexual no exercício da advocacia passa antes pela identificação das estruturas de opressão racial e de gênero legadas pelo histórico patriarcal e colonialista brasileiro. Como bem explica Sueli Carneiro, a miscigenação que dá origem à identidade nacional e ao equivocado mito da democracia racial está assentada nas práticas de “violação colonial perpetrada pelos senhores brancos contra as mulheres negras e indígenas”6 . Pode-se dizer, portanto, que a identidade brasileira é edificada a partir da cultura do estupro, da violência e do assédio, o que nos permite compreender a naturalização, ainda nos dias de hoje, da erotização e a coisificação do corpo feminino - em especial o das mulheres negras. Dentre as variadas formas social, administrativa ou legalmente previstas de repressão ao assédio sexual, destaca-se aquela descrita no art. 216-A do Código Penal, nos seguintes termos “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. A figura é punida com pena de detenção de um a dois anos. De acordo com Cezar Roberto Bitencourt (2015, p. 80-82), a hierarquia funcional ou posição de ascendência é elemento indispensável para a caracterização do crime, assim como o ato de obrigar, forçar, compelir ou coagir a vítima à realização de práticas sexuais. Ainda conforme o autor, por se tratar de delito formal, a sua consumação independe da efetiva ocorrência da conjunção carnal ou ato libidinoso, sendo suficiente a ameaça.7 A importunação sexual, por sua vez, encontra-se tipificada no art. 215-A do Código Penal, que criminaliza a conduta de “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”. A figura é 6 CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero. In: ASHOKA EMPREENDIMENTOS SOCIAIS; TAKANO CIDADANIA (Orgs.). Racismos contemporâneos. Rio de Janeiro: Takano Editora, 2003. 7 BITENCOURT, Cesar. Tratado de Direito Penal. Parte Especial. Dos crimes contra a dignidade sexual até os crimes contra a fé pública. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
  • 25. 24 punida com a sanção de um a cinco anos de reclusão, desde que não configure crime ainda mais grave, tratando-se, portanto, de um tipo penal subsidiário. Destaque-se que a importunação ofensiva ao pudor, antes prevista no art. 61 da Lei das Contravenções Penais, passou a ser criminalizada a partir da Lei nº 13.718, de 2018 - legislação cuja previsão, por ser mais gravosa, tem natureza irretroativa, somente alcançando as condutas praticadas a partir da sua entrada em vigor. Vale destacar que as práticas de assédio e importunação de natureza sexual são também tuteladas em outros ramos do Direito para além da esfera penal, de modo que, uma vez ausentes, no caso concreto, as elementares típicas específicas da figura incriminadora, a conduta ainda sofrerá as sanções trabalhistas, cíveis ou administrativas cabíveis, conforme o caso. No âmbito institucional da OAB, merece destaque a súmula nº 9, de 2019, publicadas pelo Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB em março de 2019, possibilitando o indeferimento de inscrição ou mesmo a exclusão por motivo de prática de violência contra a mulher: A prática de violência contra a mulher, assim definida na “Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – ‘Convenção de Belém do Pará’ (1994)”, constitui fator apto a demonstrar a ausência de idoneidade moral para a inscrição de bacharel em Direito nos quadros da OAB, independente da instância criminal, assegurado ao Conselho Seccional a análise de cada caso concreto8 . Quando se trata de violência contra a mulher, a Convenção de Belém do Pará menciona, expressamente, em seu artigo 2, “b”, a figura do “assédio sexual no local de trabalho”. Portanto, a aplicação efetiva do enunciado sumular demanda, necessariamente, a repressão severa da OAB, para além das demais consequências jurídicas cabíveis, contra as práticas de assédio e importunação de natureza sexual no exercício da advocacia. É com essa preocupação que a presente pesquisa cuidou de coletar dados referentes à vitimização relacionada a tais condutas abusivas. 8 CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2019. Súmula n. 09/2019/COP. Disponível em <https://deoab.oab.org.br/pages/materia/26322>
  • 26. 25 GRÁFICO 12: VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA De maneira geral, entre advogados e advogadas, 14,53% das pessoas entrevistadas alegam já terem sido vítimas de assédio sexual ou de importunação sexual durante a atuação profissional. Muita embora 14,53% afirmem já ter sofrido diretamente uma prática de assédio ou importunação de caráter sexual, é necessário destacar que 36,28% já presenciaram alguma prática de assédio contra a mulher no exercício da profissão, percentual ainda mais expressivo, que deixa evidente a subnotificação que marca tal modalidade de abuso. Não há, todavia, como estudar a prática de assédio sexual, importunação sexual e outros delitos dessa natureza sem que se promova um recorte epistemológico de gênero. Isto porque, como se sabe, tais condutas são, como regra, praticadas por homens contra mulheres. Significa, portanto, que a vulnerabilidade em virtude do gênero se apresenta como um dos fatores decisivos no estudo dos referidos delitos. GRÁFICO 13: PERCENTUAL DE HOMENS E MULHERES VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA 85,47% 14,53% NUNCA FORAM VÍTIMAS JÁ FORAM VÍTIMAS 0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00% 100,00% 120,00% HOMENS MULHERES JÁ FORAM VÍTIMAS NUNCA FORAM VÍTIMAS
  • 27. 26 Assim, avaliando os entrevistados por gênero, nota-se que 97,15% dos homens advogados nunca foram vítimas de assédio sexual ou importunação sexual no exercício da profissão. Já entre as mulheres, 23,68% das entrevistadas já sofreu tal prática, o que demonstra uma evidente conexão entre o gênero da vítima a maior probabilidade de sofrer tais modalidades de abuso. Registre-se, ainda, que entre as mulheres entrevistadas, 43,42% já presenciaram alguma outra mulher sofrendo prática de assédio ou importunação de caráter sexual. GRÁFICO 14: VÍTIMAS DE ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS POR GÊNERO Com isso, entre as pessoas entrevistadas que afirmam já terem sofrido assédio ou importunação sexual, 91,37% das vítimas são do sexo feminino, enquanto somente 8,62% dos ofendidos são do sexo masculino. Entre as mulheres vítimas de assédio sexual, a condição de mulher negra ou indígena não se revelou maior fator de vulnerabilidade entre as entrevistadas. Entre as mulheres negras e indígenas entrevistadas, 23,89% declara já ter sofrido assédio, enquanto 76,10% afirmam nunca terem sofrido a referida prática. Já entre as mulheres não negras entrevistadas, o percentual se mostra equivalente, tendo 23,14% já sofrido a prática e 76,85% declarado nunca ter sido vítima. 8,62% 91,37% HOMENS MULHERES
  • 28. 27 Vale também destacar que, entre as vítimas do sexo masculino que declararam ter sofrido assédio sexual, a orientação sexual não se mostrou um fator decisivo, distribuindo-se o percentual entre homens heterossexuais, homossexuais e bissexuais de maneira equivalente. Diferentemente, entre as mulheres, a orientação sexual se mostrou fator relevante relacionado à prática de assédio e importunação sexuais. Isto porque, entre as mulheres que se autodeclararam lésbicas ou bissexuais, 31,42% afirmaram já terem sido vítimas de tais práticas. Já entre as mulheres heterossexuais entrevistadas o percentual é relativamente menor, de modo que 23,31% declaram já terem sofrido com tais condutas. GRÁFICO 15: PRÁTICAS DE ASSÉDIO MAIS COMUNS Entre as mulheres que declaram já terem sofrido assédio ou importunação sexuais, 90% já foram alvo de cantadas insistentes no exercício profissional; 72,22% já ouviram comentários desrespeitosos de conotação sexual no exercício da advocacia e 21,66% chegaram a sofrer toques não consentidos no corpo. Fator que merece destaque é a falta de consciência como relação à prática de assédio ou importunação de natureza sexual por parte das próprias vítimas. Entre as mulheres entrevistadas que declaram nunca terem sofrido tal prática, 16,89% afirmam já terem sido, no exercício da profissão, alvo de cantadas insistentes, 13,96% já ouviram comentários desrespeitosos de conotação sexual e 1,89% chegou a sofrer toques não consentidos no corpo sem que compreendessem tal prática como modalidade de 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00% 100,00% CANTADAS INSISTENTES COMENTÁRIOS DESRESPEITOSOS DE CONOTAÇÃO SEXUAL TOQUES NÃO CONSENTIDOS NO CORPO
  • 29. 28 assédio. Vale ressaltar, também, que, entre os homens entrevistados, 88,75% não se consideram pessoas machistas. GRÁFICO 16: O PERFIL DO ASSEDIADOR Quanto aos relatos de assédio sexual e de importunação sexual, as vítimas de tais condutas revelaram que em 13,72% o agressor ocupava uma posição de superioridade hierárquica. A relação de hierarquia não é elemento indispensável para a caracterização do ilícito de tais condutas, todavia é exigida para o caso de imputação de crime de assédio sexual. Nesse sentido, a condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função são requisitos exigidos para a incidência do crime de assédio sexual previsto no art. 216-A do código Penal, diferentemente do delito de importunação sexual, previsto no art. 215-A do mesmo diploma jurídico, que somente prevê a prática de ato libidinoso não consentido com o objetivo de satisfação da lascívia própria ou de terceiro. 13,72% 86,28% EXISTÊNCIA DE SUPERIORIDADE HIERÁRQUICA INEXISTÊNCIA DE SUPERIORIDADE HIERÁRQUICA
  • 30. 29 GRÁFICO 17: MEDIDAS ADOTADAS POR ADVOGADAS E ADVOGADOS VÍTIMAS DE ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA É possível notar, dos dados acima apontados, ser ínfimo o percentual de processos gerados para a apuração dos assédios e importunações, mesmo em se tratando de vítimas que exercem a advocacia, fator que facilitaria, me tese, o acesso à justiça. Portanto, mesmo nesse meio profissional, os atos abusivos restam impunes, livres de quaisquer consequências penais ou mesmo administrativas. É necessário, portanto, reposicionar a OAB na repressão às práticas de violência de gênero sofridas no exercício da advocacia, criando medidas voltadas a superar o atual quadro de subnotificação e, respeitando-se o devido processo, direcionadas a reprimir e prevenir tais condutas abusivas. 41,62% 7,10% 0,50% 47,71% NÃO FEZ NADA PEDIU DEMISSÃO PROCESSOU O AUTOR DO FATO OUTRA SOLUÇÃO
  • 31. 30 4.5. ADVOCACIA E DIREITOS LGBTQI+ por Filipe Garbelotto e Daniela Portugal Na última década, a Ordem dos Advogados do Brasil passou a destinar, internamente, espaços voltados exclusivamente à temática dos direitos da população LGBTQI+ através da criação de comissão específica, no Conselho Federal. As seccionais e subseções passaram a adotar procedimento idêntico, com a criação de comissões semelhantes em âmbito das seccionais e das subseções. Desta forma, a população LGBTQI+ passou a dispor de expressivo espaço dentro do sistema OAB, que de forma capilarizada vem contribuindo para o enfrentamento da LGBTFobia e para o fomento ao debate dos temas afetos à causa. Em sintonia com a importância do combate à LGBTFobia, em junho de 2019 o Conselho Federal aprovou a Súmula n. 11/2019/COP, com o seguinte enunciado: INIDONIEDADE MORAL. VIOLÊNCIA CONTRA PESSOA LGBTI+. ANÁLISE DO CONSELHO SECCIONAL DA OAB. Assim a prática de violência contra pessoas LGBTI+, em razão da Orientação Sexual, Identidade de Gênero e Expressão de Gênero, constitui fator apto a demonstrar ausência de idoneidade moral para inscrição de bacharel em Direito nos quadros da OAB, independente da instância criminal, assegurado ao Conselho seccional a análise de cada caso concreto.9 Deste modo, a presente pesquisa também cuidou de coletar dados relativos às práticas de LGBTFobia sofridas por advogadas e advogados no exercício profissional em virtude de sua identidade de gênero ou orientação sexual. Daniel Borrillo conceitua a prática da homofobia como sendo “manifestação arbitrária que consiste em designar o outro como contrário, inferior ou anormal; por sua diferença irredutível, ele é posicionado a distância, fora do universo comum dos humanos”. Complementa o autor que, “confinado no papel do marginal ou excêntrico, o 9 CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2019. Súmula n. 11/2019/COP. Disponível em <https://www.oab.org.br/Content/pdf/sumulas/sumula-11-2019-COP.pdf>
  • 32. 31 homossexual é apontado pela norma social como bizarro, estranho ou extravagante”10 . A LGBTFobia, portanto, abrange o ódio e hostilidade direcionado a lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros, alcançando logicamente as práticas direcionadas contra pessoas intersexo, assexuais, queer, ou quaisquer outras em virtude de identidade de gênero ou orientação sexual. Nesse sentido, é importante reconhecer que o exercício da advocacia ainda se dá em um espaço extremamente cisnormativo, isto é, composto basicamente por pessoas que se identificam com o sexo biológico socialmente atribuído ao nascimento e, com isso, entendidas como pessoas “normais”. Infelizmente, significativa parte da sociedade ainda entende a travestilidade e transexualidade como identidades patologizadas e criminalizadas, pois traduzem identidades que diferem do gênero designado ao nascimento. Assim, é indispensável a compreensão da forma como as identidades de gênero e as relações sociais de poder interferem no exercício da advocacia. GRÁFICO 18: ADVOCACIA E CISNORMATIVIDADE Como é possível notar, a advocacia reflete uma sociedade cisnormativa, já que somente 0,36% das pessoas entrevistadas se autodeclaram travestis ou transexuais. Trata-se, também, de espaço heteronormativo, em que a heterossexualidade colocada como padrão de normalidade. 10 BORRILLO, Daniel. Homofobia: história e crítica de um preconceito. Trad. Guilherme João de Freitas Teixeira. Belo Horizonte: Autêntica, 2010, p. 13. 99,64% 0,36% CISGÊNERO TRAVESTI OU TRANSEXUAL
  • 33. 32 GRAFICO 19: ADVOCACIA E HETERONORMATIVIDADE Cabe destacar que, entre advogadas e advogados heterossexuais entrevistados, 99,18% afirmam que não são pessoas homofóbicas. Entretanto, contraditoriamente, 23,52% atestam que já presenciaram alguma prática discriminatória contra a população LGBTQI+ no exercício da profissão, o que demonstra a dificuldade em reconhecer a si próprio enquanto sujeito LGBTfóbico. Acerca do perfil das advogadas e dos advogados LGBTQI+, importa destacar que 74,64% possuem idade não superior a 37 anos, e 57,74% atualmente são cadastrados junto à OAB/BA como jovens advogados, portanto com menos de cinco anos de inscrição. Além disso, 59,15% exercem advocacia em Salvador e região metropolitana, enquanto 40,84% declararam exercer a profissão em comarcas do interior. GRÁFICO 20: REMUNERAÇÃO DE ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+ 94,76% 5,23% HETEROSSEXUAIS HOMOSSEXUAIS, LÉSBICAS, BISSEXUAIS E OUTRAS ORIENTAÇÕES 0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 ATÉ R$ 1.000,00 R$ 1.001,00 A R$ 4.000,00 R$ 4.001,00 A R$ 8.000,00 R$ 8.001,00 A R$ 12.000,00 MAIS DE R$ 12.000,00
  • 34. 33 Quanto às faixas de remuneração das advogadas e dos advogados LGBTQI+, constatou- se que 16,90% recebem até R$ 1.000,00; 54,92% entre R$ 1.001,00 e R$ 4.000,00; 22,53% entre R$ 4.001,00 e R$ 8.000,00; 2,81% entre R$ 8.001,00 e R$ 12.000,00 e 2,81% são remunerados em patamar superior a R$ 12.000,00. Dentre os entrevistados LGBTQI+, merece destaque que 47,88% declaram ser a principal fonte de renda familiar, número superior ao de advogados e advogadas heterossexuais que declaram ser principal fonte de renda, que é de 44,90%. Ainda é possível notar que jovens advogadas e dos advogados LGBTQI+ assumem responsabilidade econômica familiar mais cedo que os jovens profissionais heterossexuais, pois 41,46% daqueles são principal fonte de renda familiar, ao passo que somente 34,72% destes declaram assumir a mesma responsabilidade econômica. Vale destacar, conforme dados nacionalmente coletados pelo Ministério de Direitos Humanos em pesquisa sobre violências LGBTFóbicas no Brasil, que dão conta que grande parte das agressões dessa natureza ocorrem em casa: 20,40% dos casos contra travestis; 20% dos casos contra transexuais; 27,40% contra gays e 29,70% contra lésbicas11 . Portanto, a especial hostilidade do ambiente doméstico e familiar na vivência de pessoas LGBTQI+ pode ser apontada como um dos fatores que explica, na presente pesquisa, o elevado número de declarantes que afirmam ser a principal fonte de renda familiar. GRÁFICO 21: ADVOGADAS E ADVOGADOS LGBTQI+ E ASSÉDIO MORAL 11 MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS. SECRETARIA NACIONAL DE CIDADANIA. Violência LGBTFóbicas no Brasil: dados da violência. Elaboração de Marcos Vinícius Moura Silva – Documento eletrônico – Brasília: Ministério dos Direitos Humanos, 2018. 39,43% 65,57% JÁ SOFREU ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFREU ASSÉDIO MORAL
  • 35. 34 Entre advogadas e advogados LGBTQI+ entrevistados, 39,43% afirmam já terem sofrido assédio moral no exercício da advocacia. Significa dizer, portanto, que são vitimados com maior frequência com práticas assédio moral se comparados a advogadas e advogados heterossexuais, que apresentam percentual inferior de ocorrências dessa natureza (30,97%). GRÁFICO 22: ADVOGADAS LGBTQI+ E ASSÉDIO SEXUAL Entre advogadas e advogados LGBTQI+ entrevistados, 16,90% afirmam já terem sofrido assédio sexual ou importunação sexual no exercício da advocacia. Especificamente analisando a realidade das mulheres LGBTQI+ advogadas, constatou-se que 31,42% das entrevistadas já haviam sido vítimas de assédio ou importunações sexuais exercendo a atividade profissional, o que demonstra a maior vulnerabilidade quando cruzados os fatores de gênero e orientação sexual. GRÁFICO 23: LGBTFOBIA 31,42% 68,58% JÁ SOFREU ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NUNCA SOFREU ASSÉDIO OU IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS 33,80% 66,20% JÁ FOI VÍTIMA DE LGBTFOBIA NUNCA FOI VÍTIMA DE LGBTFOBIA
  • 36. 35 Entre advogadas e advogados LGBTQI+ entrevistados, 33,80% afirmam já terem sido vítimas de preconceito ou discriminação decorrente da orientação sexual durante o exercício da advocacia. Além disso, 53,52% dos entrevistados LGBTQI+ informam que já presenciaram algum tipo de prática de LGBTfobia no exercício da profissão. Merece destaque, além do posicionamento do CFOAB para a repressão às práticas de LGBTFobia no âmbito interno da OAB, o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da criminalização da referida prática. O STF, atento aos crimes de ódio sofridos por pessoas LGBTQI+, em decisão histórica, no julgamento da ADO nº 26, ocorrido em 13 de junho de 2019, determinou que as ações homofóbicas e transfóbicas deverão ser criminalizadas por meio dos preceitos primários inscritos na Lei nº 7.716, de 1989, enquanto se aguarda a implementação, pelo Congresso Nacional, dos mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5 da Constituição Federal. GRÁFICO 24: QUEM JÁ PRESENCIOU ATO LGBTFÓBICO Note-se, portanto, que a maioria das pessoas entrevistadas afirmou já ter presenciado uma conduta LGBTFóbica no exercício da profissão, entretanto, somente 0,82% admitem ser pessoas homofóbicas. Tal contraste demonstra a hipocrisia que marca o tratamento do tema entre nossos profissionais, que precisam se conscientizar acerca de tão importante questão, sendo indispensável também frisar o papel institucional da OAB nesse processo informativo e educacional. 53,52% 46,48% JÁ PRESENCIOU PRÁTICA DE LGBTFOBIA NUNCA PRESENCIOU PRÁTICA DE LGBTFOBIA
  • 37. 36 Judith Butler, citando Foucault, afirma que “o corpo só ganha significado no discurso no contexto das relações de poder. A sexualidade é uma organização historicamente específica do poder, do discurso, dos corpos e da afetividade”12 . O direito de existir e ser respeitado e respeitada deve ser uma busca coletiva e constante, dentro e fora do exercício da advocacia. 12 FOUCAULT, Michel. The history of sexuality. v. 1: An Introduction. Trad. Robert Hurley. Nova York: Vintage, 1980. apud BUTLER, Judith. Problemas de Gênero. Feminismo e subversão da identidade.Trad. Renato Aguiar. 11. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016, p. 162.
  • 38. 37 4.6. A JOVEM ADVOCACIA por Daniela Portugal Acerca das condições de trabalho para a jovem advocacia, é importante alertar que 28,27% dos entrevistados com menos de cinco anos de OAB possuem uma renda pessoal mensal inferior R$ 1.000,00. Os jovens advogados são, portanto, aqueles que enfrentam as piores condições econômicas no exercício da advocacia, já que, entre os entrevistados com mais de cinco anos de OAB, somente 9,40% recebem remuneração mensal inferior a R$ 1.000,00. GRÁFICO 25: REMUNERAÇÃO INFERIOR A R$ 1.000,00 NA JOVEM ADVOCACIA Portanto, entre as advogadas e advogados entrevistados que recebem remuneração mensal inferior a R$ 1.000,00, constata-se que 75,48% integram a jovem advocacia. Entre esses jovens com renda inferior mil reais, 24,74% afirmam ser principal fonte de renda familiar e 28,86% já foram vítimas de assédio moral no exercício da profissão, o que agrava a situação de vulnerabilidade experimentada, além de contribuir para a subnotificação das eventuais práticas de assédio moral sofridas. 75,48% 24,52% JOVEM ADVOCACIA MAIS DE CINCO ANOS DE OAB
  • 39. 38 GRÁFICO 26: ASSÉDIO MORAL NA JOVEM ADVOCACIA Entre a jovem advocacia, observou-se que 29,59% das pessoas entrevistadas já haviam sofrido alguma prática de assédio moral ainda no curso dos primeiros cinco anos de advocacia. Comparando o referido quesito entre aqueles que já possuem mais de cinco anos de inscrição, observou-se que 32,38% afirmam já terem sido vítimas de assédio moral ao longo do exercício profissional. Percebe-se, portanto, que não há um aumento significativo no percentual de vítimas de assédio moral entre aqueles com mais de cinco anos de carteira da OAB, o que leva a inferir, logicamente, que a prática abusiva tem maior incidência durante o período em que a vítima é jovem advogado ou advogada, razão pela qual o percentual, com o passar dos anos, mantém-se em patamar quase equivalente. GRÁFICO 27: ASSÉDIO MORAL ENTRE JOVENS ADVOGADAS E JOVENS ADVOGADOS Avaliando de maneira ainda mais específica os dados de assédio moral praticado contra a jovem advocacia, nota-se que as mulheres são, expressivamente, as maiores vítimas 29,59% 70,41% JÁ SOFRERAM ASSÉDIO MORAL NUNCA SOFRERAM ASSÉDIO MORAL 76,84% 23,15% JOVENS ADVOGADAS JOVENS ADVOGADOS
  • 40. 39 da prática. Entre as vítimas pertencentes à jovem advocacia que declaram já ter sofrido assédio moral, 76,84% são mulheres e apenas 23,15% são homens. GRÁFICO 28: ASSÉDIO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAIS NA JOVEM ADVOCACIA Merece destaque o expressivo número de pessoas entrevistadas com menos de cinco anos de carteira da OAB que declaram já ter sofrido assédio sexual ou importunação sexual no exercício da profissão. Com isso, entre as vítimas que autodeclaram já ter sofrido tal modalidade de abuso, 46,19% pertencem à jovem advocacia e 53,80% já possuem mais de cinco anos de inscrição. Entre os jovens advogados que declaram terem sofrido assédio sexual ou importunação sexual, mais uma vez, percebe-se o fator gênero como elemento indicativo de expressiva vulnerabilidade. Entre os jovens advogados ofendidos, somente 5,49% são do sexo masculino e 94,50% das vítimas são mulheres. Por essas razões, atenta à especial situação de vulnerabilidade experimentada por jovens advogadas e advogados, a OAB tem traçado estratégias específicas de inclusão, valorização e fortalecimento da jovem advocacia, com o objetivo institucional de proteger nossos novos profissionais contra práticas abusivas de exploração no ambiente de trabalho, assim como prevenir e reprimir práticas de assédio moral ou sexual. 94,50% 5,49% MULHERES HOMENS