Este documento é um prefácio para o livro "A Profecia de Isaías", escrito por A. R. Crabtree. O livro fornece um estudo crítico e exegese do profeta Isaías, com tradução do hebraico e discussão de versões. O autor espera que o livro ajude pastores e missionários no Brasil a entenderem melhor as mensagens de Isaías.
AUTORA VILMA DIAS - MARIA ANTES DE SER MARIA (1).ppt
A_Profecia_de_Isaías_volume1
1.
2.
3. A PROFECIA DE ISAIAS
CA P ÍT UL OS 1-39
TEXTO, EXEGESE E EXPOSIÇÃO
VOLUME I
A. R. CRABTREE, A. B., D. B-, Th. D.
1.“ EDIÇÃO
1967
C A S A P U B L I C A D O R A B A T I S T A
Caixa Posta! 320 - Z C - OO
Rio de Janeiro — Gb.
4. CAPA DE PAULO DAMAZIO
Impresso em Gráficas Próprias
Tiragem 3.000 Data 30-03-1967
5. IN MEMORIAM
Estava êste livro para sair do prelo quando nos veio
a triste notícia do falecimento do seu ilustre autor, nosso
saudoso irmão, Dr. A . R. Crabtree, que, aposentado, resi
dia ultimamente em sua terra natal, os Estados Unidos
ia América do N orte. Ilustre e mui competente catedrático
no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, e também
Reitor, Crabtree ensinou hebraico, Velho Testamento,
6. 6 A. R. C R A B T R E E
Teologia do V .T ., Filosofia da Religião Cristã, Apologética
e ainda outras disciplinas.
Dos seus livros podemos mencionar no momento os
seguintes : «História dos Batistas no Brasil», Vol. I, «Ar
queologia Bíblica», «Introdução ao Nôvo Testamento»,
«Sintaxe do Hebraico do Velho Testamento», «Esperança
Messiânica», «O Livro de Amós», «O Livro de Oséias», «A
Profecia de Isaías» em 2 volumes (o 2" volume no prelo), «A
Profecia de Jeremias» (a sair), «Dicionário Hebraico-Por-
tuguês», «Baptists in Brazil» (em inglês), e muitas outras
publicações menos volumosas.
O seu passamento deu-se em Roanoke, V a., E .U .A .,
no dia 15 de abril de 1965.
Pretendemos publicar uma biografia mais extensa
quando da divulgação do 2? Volume de «A Profecia de
Isaías», atualmente no prelo.
Ao saudoso Irmão, a homenagem dos batistas do Bra
sil e da Casa Publicadora Batista.
Maio de 1965.
Alrair S. Gonçalves
7. Èste Comentário sôbre a Mensagem do
Príncipe dos Profetas representa um meio século
de estudo agradável da Bíblia, trinta e cinco
anos de ensino de Hebraico e do Velho Testa
mento, com muito tempo dedicado ao preparo de
quinze livros em português. Sem qualquer re
muneração financeira, o único motwo na pro
dução desta obra é o amor ao trabalho e o desejo
de contribuir à literatura evangélica na língua
portuguêsa para os pastores e obreiros que es
tão servindo galhardamente na extensão do
reino de Deus no mundo.
Êste é um estudo crítico e exegético da
Profecia de 1saias, com a exposição cuidadosa
dos problemas do texto hebraico e da sua inter
pretação. Apesar de o texto original do Velho
Testamento ter sido evidentemente transmitido
com cuidado escrwpuloso atrm és dos séculos,
ainda há vários problemas textuais da Bíblia
Hebraica. Há numerosos manuscritos e muitos
outros documentos que ajudam no estudo críti
co do Nôvo Testamento. Mas até recentemente
havia apenas três manuscritos antigos do He
braico Bíblico, e o mais antigo dêstes, conheci
do como o Texto Massorético, é datado de 895
a .C ., muitos séculos depois do tempo de IsaJvas.
8. A. R. C R A B T R E E
Em 1947 foram descobertos numa caver
nat perto do Mar Morto, um manuscrito quase
completo do Livro de Isaías, e outro que tem
apenas a têrça parte da obra. Êstes documen
tos são dlatados por F. W . Albright e outros
arqueólogos no último século antes de Cristo,
Ou no primeiro século cristão. Êstes dois ma
nuscritos concordam notavelmente com o Tex
to Massorético. O primeiro contém variações
que esclarecem algumas dificuldades dos três
textos do século nono. As versões, como a
Septuagmta ou LXX, a Aramaica e outras, têm
valor no estudo do Hebraico Bíblico . 0 leitor
notará no Comentário a discussão destas ver
sões, e a preferência em alguns casos do texto
na edição da Bíblia Hebraica de Ruã. Kittel da
American Bible Society.
No preparo dêste Comentário, o autor vi-
sma não somente aos estudantes do Hebraico,
mas também aos muitos pastores estudiosos que
fizeram o seu curso teológico sem incluir o es
tudo da língua de Sião. Êstes podem entender
clardmente, e aproveitar-se das explicações do
texto original do grande profeta.
No estudo desta profecia, surge o proble
ma de algumas interpolações na obra origmal
de Isaías. Mas, segundo os nossos estudos, al
guns comentaristas exageram o número destas
interpolações, e assim atribuem várias passa
gens escritas por Isaías a outros escritores do
tempo do cativeiro babilónico, e até ãe depois
dessa época. Alguns destes não qiuerem enten
der a larga visão do remo de Deus, e a profun
deza das mensagens do profeta, e assim insis
tem em que as profecias sobre a Nova Êpoca
9. A P R O F E C IA DE ISAÍAS
foram escritas muitos anos depois do tempo de
Ismas. Mas alguns eruditos modernos reco
nhecem a autenticidade destas passagens.
O autor apresenta a sua própria tradução
do hebraico, cjue varia freqüentemente das ver
sões em português e inglês, na esperança de
que a versão mais literal possa ajudar no es
clarecimento do sentido original da linguagem
poética do livro. A maior parte da profecia foi
escrita em poesia, e o reconhecimento dêste
fato ajuda no entendimento mais claro da men
sagem .
Além das obras mencionadas na Bibliogra
fia, o autor reconhece que ele é devedor a mui
tos estudos, e a muitas experiências da provi
dência de Deus, como pastor, e como professor
no Seminário Teológico do Rio de Janeiro.
A minha senhora, Dona Mattel, tem enri
quecido a minha vida espiritual como compa
nheira no serviço do Senhor. Além do seu
trabalho mcansável de esposa e mãe, ela se
aprofundou no estudo de português. Tem lido
todos os méus manuscritos, corrigindo os erros
tipográficos, e oferecendo sugestões importan
tes sobre a linguagem de várias declarações.
Ê o desejo êo autor que esta obra seja útil
aos pastores do Brasil e de Portugal no aumen
to do seu conhecimento das verdades eternas
apresentadas por êste nobre Mensageiro da Re
velação Divina.
A. E. Crabtree
11 de agôsto de 1963
10.
11. ÍNDICE
Prefácio...................................................................................... 7
Introdução................................................................................. 17
Análise dos Capítulos 1 -3 9 ...................................................... 51
A Profecia de Isaías — Texto, Exegese e Exposição............ 59
I. A Infidelidade de Judá e Jerusalém.............................. 59
A. O Sobrescrito.................................................................. 59
B. A Controvérsia do Senhor com o Seu P o v o ............. 60
1. A Ingratidão do Povo de Israel............................. 61
2. A Nação Pecaminosa............................................... 64
3. A Palavra do Senhor sôbre a Religião e a Vida 69
4. “Arrependei-vos” ....................................................... 75
5. Lamento sôbre Jerusalém........................................ 77
6. O Julgamento do Senhor........................................ 78
7. A Operação da Justiça Divina na Vida de Israel 79
8. A Vinda dos Povos ao Senhor de S iã o ............. 83
C. O Castigo da Idolatria e do Orgulho Humano no
Dia do Senhor................................................................ 90
D. O Julgamento Divino de Jerusalém e de Judá . . . . 98
1. A Anarquia S ocia l.................................................... 99
2. O Povo Arruinado..................................................... 103
3. Os Esmagadores do P o v o ........................................ 106
E. As Mulheres Altivas de Jerusalém............................. 107
F. A Beleza, e a Glória de Sião Purificada...................... 112
G. Um Cântico da Vinha do Senhor................................ 117
H. Ais Contra os Perversos............................................... 123
II. “Resguarda o Testemunho” 134
A. A Visão Inaugural de Isaías........................................ 134
B. Isaías e a Guerra Siríaco-Efraimita......................... 146
1. O Sinal de Sear-Jasube............................................ 148
2. Sinal de Em anuel.................................................... 154
P ág in a
12. 12 A. R. C R A B T R E E
3. A Invasão de Judá pelos Assírios e os Egípcios 165
4. O Sinal de Maher-Shalal-Has-Baz........................ 168
5. Os Dois Rios Simbólicos ......................................... 170
6. A Fé do Profeta no Senhor Emanu E l .................. 172
7. O Temor do Homem e o Temor de D eu s............ 173
C. Isaías Cessa as Atividades Proféticas........................ 175
III. Superstições dos Vacilantes na F é .............................. 177
A. Admoestações Contra o Espiritismo.......................... 177
B. À Lei e ao Testemunho................................................. 178
C. O Reino Messiânico........................................................ 180
D. O Julgamento de Efraim como Lição para Judá .. 186
IV. Não Temas a Assíria....................................................... 191
A. A Ameaça Arrogante da Assíria.................................. 192
1. A Jactância da Assíria............................................. 192
2. A Labareda do Senhor Consumirá as Florestas
da Assíria................................................................... 193
3. Um Restante de Israel e Judá Voltará ao Senhor 199
4. Sião Será Liberto do Jugo da Assíria.................. 201
5. A Aproximação do Invasor...................................... 202
6. A Humilhação dos Invasores Orgulhosos............. 204
B. O Reino Pacífico e Justo do M essias........................ 205
1. O Rebento de Jessé.................................................. 206
2. O Messias e a Nova Glória de Isra el.................. 212
C. O Culto de Louvor pela Restauração de Israel .. .. 217
V. O Julgamento de Reinos e de P ovos............................. 220
A. O Destino da Babilônia................................................. 221
B. A Queda do Tirano das N ações.................................. 231
C. O Propósito do Senhor na Destruição da Assíria .. 242
D. A Alegria Prematura dos Filisteus............................. 244
E. Oráculo Concernente a M oabe.................................... 247
F. Oráculo sôbre a Aliança de Israel e a S íria............. 258
1. Oráculo Concernente a D am asco......................... 259
2. O Abandono dos Íd olos............................................ 261
3. O Culto de Adonis, uma Segurança Falsa .. .. 262
G. O Poder Mundial Se Levanta, e C a i............................ 264
H. Profecia Concernente ao E g ito................................... 266
1. Resposta do Profeta aos Emissários da Etiópia 267
2. Profecia Contra o E g ito......................................... 272
P ág in a
13. A P R O F E C I A DE ISAíAS 13
3. Judá e Javé dos Exércitos, um Terror para os
Egípcios....................................................................... 279
4. Os Egípcios e os Assírios Adorarão ao Senhor .. 280
' 5. Evitar Alianças Políticas com Estrangeiros .. .. 285
i. Uma Visão da Queda da Babilônia............................. 289
j. Oráculo Concernente a D um á...................................... 294
KL Oráculo Concernente à A rábia................................... 296
Lj. A Leviandade Religiosa dos Habitantes de Jerusalém 298
M. A Degradação de Sebna, o Mordomo do R e i............ 306
íí. A Profecia Contra T ir o ................................................. 311
1. Oráculo Concernente a Tiro e S idom .................. 311
2. A Restauração de Tiro Depois de Setenta Anos .. 316
. “Despertai e Cantai, os Que Habitais no Pó” ............. 318
A. O Bom Efeito do Castigo de Israel............................. 321
1. A Terra Ficará Desolada por Causa do Pecado dos
Seus Habitantes........................................................ 321
2. Um Clamor de Confiança....................................... 325
3. A Grande Catástrofe............................................. 327
4. O Julgamento e a Nova E r a .................................. 328
B. Maravilhas das Atividades do S en h or.................... 330
1. Salmo de Gratidão ao Senhor pelo Livramento do
Seu P o v o .................................................................... 330
2. Uma Profecia da Idade M essiânica.................... 332
3. Outro Hino de Louvor Relacionado com a Hu
milhação de M oabe.................................................. 335
C. Um Pedido de Salvação Mais Perfeita....................... 337
1. Hino de Gratidão pela Vitória................................ 338
2. O Povo Espera Ansiosamente os Juízos Retos do
S en h or........................................................................ 340
3. As Bênçãos da Disciplina e da Orientação Divina 342
4. Experiências Tristes Que o Povo Sofreu antes da
Sua Redenção .. ..................................................... 344
5. Os Teus Mortos Viverão, os Seus Corpos Res
suscitarão ............................................................. •• 345
D. Conclusão desta Mensagem de Aspirações e Espe
ranças ............................................................................... 347
1. O Povo Deve Esconder-se até Que Passe o Jul
gamento D ivin o........................................................ 347
P ágina
14. 2. A Punição dos Podêres Cruéis do M undo............ ...348
3. Cântico do Senhor Concernente à Sua Vinha .. 349
4. A Significação da Disciplina Divina de Israel .. 351
5. Uma Profecia da Restauração dos Desterrados..jí
de Israel..................................................................... ...353
VII. Não Escarneçais para Fazer Mais Fortes os Vossos
Grilhões...............................................................................354
A. O Castigo Certo dos Impenitentes de Efraim e Judá 356
1. A Queda de Samaria, a Capital de Israel .. .. 356
2. Jerusalém, Bem como Samaria, Tem os Seus Bê
bados, Incluindo Sacerdotes e P rofetas.................359
3. A Aliança com a Morte e com S h eol.................. ...362
B. A Justificação das Atividades Providenciais do Se
nhor em Relação com o Seu P o v o ................................366
C. A Obra Maravilhosa do Senhor.................................. ...369
1. A Humilhação Iminente e a Libertação de Je
rusalém ..........................................................................369
2. A Cegueira e a .Hipocrisia do P ov o....................... ...371
3. A Religião Meramente Convencional Perecerá .. 373
D. A Rejeição da Segurança da Fé no Senhor................374
1. A Repreensão dos Conspiradores............................374
2. A Redenção de Israel.................................................376
3. A Infidelidade na Aliança Política com o Egito 378
4. No Sossêgo e na Confiança Estará a Vossa Pôrça 381
E. O Poder do Deus Invisível............................................ ...386
1. Promessa para o Povo Sofredor de S iã o ................386
2. Será Destruído o Inimigo do Povo de Deus .. .. 389
3. A Fôrça de Cavalos ou o Poder do Espírito do
Senhor........................................................................ ...392
4. O Senhor dos Exércitos É o Defensor de Jerusalém 394
F. A Comunidade Ideal na Idade Messiânica............. ...397
1. O Estabelecimento do Govêmo Messiânico .. .. 398
2. A Transformação Espiritual do Povo na Nova Era 399
3. O Contraste entre os Característicos do Fraudu
lento e os do N obre.....................................................400
4. Advertência Contra as Mulheres de Jerusalém 402
5. O Poder Transformador do Espírito na Idade
Vindoura.................................................................... ...404
14 A. R. CRABTREE
Página'
15. Página
VIU. “A Recompensa de Deus” ........................................... 406
Al A Aflição e o Livramento de Jerusalém................... 407
1. O Apêlo do Profeta ao Senhor Contra os Opres
sores dos Judeus....................................................... 407
2. Efeitos da Manifestação da Presença do Senhor 412
B . IA Indignação do Senhor Contra Tôdas as Nações .. 417
C. J ÁFelicidade de Sião no Futuro.................................. 423
IX. A Influência de Isaías em Três Situações no Reino
de Ezequias................................................................ 427
A. Senaqueribe Exige a Capitulação de Jerusalém .. .. 429
B. O Rei Ezequias Recebe o Conselho de Isaías............ 439
C. A Carta do Rei da Assíria............................................ 440
D. A Oração de Ezequias................................................... 442
E. O Profeta Conforta a Ezequias................................... 446
F. Sinal para os Sobreviventes......................................... 448
G. Mensagem sôbre a Retirada de Senaqueribe............ 449
H. O Desastre dos Assírios e a Morte de Senaqueribe 450
I. A Doença de Ezequias e a Sua Cura Maravilhosa 452
J. A Embaixada de Merodaque-Baladã......................... 459
A PROFECIA DE ISAÍAS 15
16.
17. ISA!AS
INTRODUÇÃO, CAPÍTULOS 1 - 39
I. A História do Tempo de Isaías, 742-601
Não há outra obra do Velho Testamento que interesse
tão profundamente aos estudantes bíblicos como o Livro
de Isaías. O livro inteiro relaciona-se com mais de du
zentos anos da história dramática da religião do povo de
Israel. Neste período o reino do sul, ou de Judá, na pro
vidência de Deus, sobreviveu à subjugação política pela
Assíria, e, mais de cem anos depois, a pequena nação caiu
no poder da Babilônia. A cidade capital, juntamente com
o Templo do Senhor, foi completamente destruída; e o
seu povo mais importante foi levado em cativeiro. Assim
Judá escapou ao destino da morte nacional que Israel ti
nha sofrido, para conservar o restante dos fiéis do povo
do Senhor no Império da Babilônia. Êstes judeus passa
ram longos anos no cativeiro, mas tinham o privilégio de
habitar, ou viver como colônia, e assim manter em grande
parte os seus costumes nacionais e a sua própria religião.
Depois de setenta anos no cativeiro, êste grupo do povo
escolhido do Senhor Javé, na providência divina, foi liber
tado e restaurado para a sua terra, disciplinado e prepa
rado pelo Senhor, para cumprir a sua missão dé trans
mitir, através da sua própria história, a revelação do amor
e do propósito do Senhor Deus para tôdas as nações do
mundo.
O profeta Isaías de Jerusalém, com os seus ensinos'
proféticos, imprimiu a sua influência pessoal no livro in
teiro, mas as próprias mensagens dêle, segundo as evidên
cias intèrnàs, são incluídas nos primeiros 39 capítulos da
obra.
18. 18 A. R. CRABTREE
0 profeta recebeu a sua visão inaugural no ano da
morte do rei Uzias ou Azarias, e exerceu o seu ministério
profético nos últimos 40 anos do século oitavo, no período
dos reinos de Jotão, Acaz e Ezequias. É difícil determi
nar a data exata dos respectivos governos dêsses reis,
mas as conclusões dos estudantes modernos, à luz dos no
vos conhecimentos arqueológicos, variam dentro de pou
cos anos. Muitos concordam no ano de 742 a.C. como a
data da visão inaugural do profeta.
Uzias começou o seu reino em 783; Jotão governou
como regente de 750-742, e como rei de 742-735. Acaz rei
nou de 735-715, e Ezequias de 715-687. Isaías exerceu o
seu ministério profético entre os anos 742 e 701, e possi
velmente por mais alguns poucos anos. Não há certeza
de que tivesse proferido qualquer mensagem antes de ter
recebido a visão da majestade do Senhor, no Templo.
Israel e Judá no Reinado de Uzias, 783-742
Por muitos anos depois da morte de Salomão e a di
visão do Reino de Israel, havia contendas e lutas políticas
entre os dois reinos, de significação local, especialmente
na influência da religião e da ética do povo. Mas quando
o Reino de Israel tornou-se mais poderoso sob o govêm o
de Onri e Acabe, os dois reinos dos israelitas, no desen
volvimento do comércio internacional, chegaram a reco
nhecer a insensatez das contendas locais perante o desen
volvimento do Império da Assíria.
Isaías nasceu e passou os primeiros anos da mocidade
no período mais próspero na história de Israel e Judá des
de o tempo de Salomão. Mas houve um período crítico
na história dé Israel quando Salmanaser III começou a cam
panha militar, com o propósito de aumentar o domínio da
Assíria pela conquista das pequenas nações ao oeste e su
doeste. Êle foi detido pela coalizão de Israel, Síria, Ha-
19. A P R O F E C IA DE 1SAÍAS 19
mate e outros pequenos aliados na batalha de Karkar ou
Carcar, c. 853. Mais tarde, Jeú, rei de Israel, pagou tri
buto à Assíria, c. 842. Por alguns anos depois, Israel
manteve guerras com os arameus da Síria, II Reis 13:3.
Judá também sofreu dessas lutas, II Reis 12:17-18. Mas
por alguns anos, depois destas lutas, quando os ara
meus ficaram impotentes e os assírios se preocupavam
com problemas internos, Israel e Judá experimentaram o
maior período de prosperidade na sua história.
Jeroboão II de Israel restabeleceu domínio sôbre a
maior parte dos países governados por Salomão, II Reis
14:25, 28. Do saque dêsses estados, e do tributo que dêles
recebeu, ganhou Israel enormes riquezas.
Judá era menos poderoso, mas tornou-se próspero
nessa mesma época, sob o governo de Uzias ou Azarias.
A conquista de Edom e o pôrto de Elate do Mar Ver
melho, II Reis 14:7, 22, lhe deu domínio sôbre o comér
cio das caravanas entre o pôrto do Mediterrâneo e o les
te. Uzias usou a renda dessas conquistas para desenvol
ver a economia de Judá, e para fortalecer as suas defesas
militares, II Crôn. 26:1-15. Quando Isaías começou o seu
ministério público, Judá se achava no auge de sua pros
peridade (Cp. Is. 2:7).
Com o grande aumento dos tesouros de prata e ouro,
de cavalos e carros, os ricos adoravam cada vez mais o
luxo, e os privilegiados se regozijavam na prosperidade
e na libertinagem, Is. 3:16-23; 5:11-22; 28:1; 32:9. Os
ricos abusavam do poder para perverter a justiça e rou
bar os indefesos, 1:23; 3:14, 15; 5:23; 10:1,2. Os ava
rentos ajuntavam casa a casa até que não houvesse mais
lugar. Assim êles ficaram como os únicos moradores no
meio da terra, 5:8. Nesta terrível desordem social,
acompanhada pela hipocrisia religiosa, 1:11, o jovem pro
feta proclamou a justiça do Santo de Israel, e o dia imi
nente do julgamento do Senhor.
20. 20 A. R. C R A B T R E E
Nessas condições econômicas, os políticos de Sama-
ria e de Jerusalém nada queriam saber dos perigos pro
clamados pelos profetas. Como Amós tinha dito: «Êles
viviam sossegados em Sião, e sentiam-se seguros no mon
te de Samaria», Am. 6:1. Os políticos, e até o povo em
geral, não tinham o discernimento moral para reconhecer
a gravidade da sua infidelidade para com o Senhor Javé,
o Santo de Israel. Nem podiam entender que a sua pros
peridade material tinha sido o resultado, em grande par
te, do descanso político, enquanto que a Assíria estava
preocupada com a subjugação dos vizinhos de Judá, com
o preparo para estender a sua campanha militar na con
quista das pequenas nações vizinhas, e até do seu grande
rival, o Egito.
Antes da morte de Uzias, o Império da Assíria, sob
o govêrno do nôvo imperador, Tiglate-Pileser, já come
çara a campanha de 18 anos de conquista dos países vizi
nhos ao oeste. Dentro de poucos anos êle subjugou Ar-
pade, Damasco e Tiro, estendendo o seu domínio até Ha-
mate no Orontes. Cêrca de 738, Menaém, de Israel, pa
gou tributo enorme ao conquistador, II Reis 15:19-20.
Não obstante o fato de que Judá se achava no caminho
da marcha do poderoso exército da Assíria, não há qual
quer indicação de que as autoridades de Jerusalém tives
sem qualquer noção do perigo do conquistador.
A Confederação de Rezim, Rei da Síria, e Peca,
de Israel
Alguns anos depois da subjugação de Israel por Ti
glate-Pileser, Peca, assassino e usurpador do trono de
Israel, fêz aliança com Rezim de Damasco, em revolta
contra o domínio da Assíria. Cêrca de 735, êstes dois
reis planejaram atacar a Judá, e obrigá-lo a entrar numa
aliança política contra o domínio da Assíria, II Reis 15:
21. A P R O F E C IA DE ISAIAS 21
37; 16:5; Is. 7:1-2. É possível que o rei Acaz e os seus
conselheiros de Jerusalém já haviam adotado a política
de pedir o socorro da Assíria contra a aliança de Peca
e Rezim.
Nos capítulos 7 e 8 de Isaías temos um relató
rio resumido da entrevista do profeta com o rei Acaz. O
mensageiro do Senhor revela claramente, nesta hora crí
tica da história de Judá, o espírito profético no conselho
ao rei na sua grande perturbação. Procura animar o rei
com a mensagem do Senhor. O rei, da casa de Davi, deve
acautelar-se e ficar calmo, e não deve ter mêdo, nem fi
car desanimado «por causa destes dois tocos de tições fu-
megantes». Êstes dois homens fracos e barulhentos es-
gotar-se-ão sem poder executar o seu plano contra Judá.
Isaías reconheceu que a Assíria se tornaria inimigo mais
perigoso de Judá do que a aliança de Rezim e Peca. A
aliança de Acaz com a Assíria mostra a falta de fé no
Senhor Deus, e o perigo crescente para a religião do povo
de Judá. Veja II Reis 16:7. Isaías aconselhou, em vão,
que o rei de Judá se libertasse de alianças políticas e con
fiasse no Senhor.
É difícil entender, à luz dos eventos subseqüentes,
por que alguns escritores justificam esta submissão vo
luntária à Assíria da parte do covarde Acaz. Êle aban
donou a fé no Senhor Javé, o Deus do seu povo, fêz pas
sar o seu filho pelo fogo, e entregou-se completamente
à idolatria, II Reis 16:10-18. Assim, precipitou o envol
vimento de Judá no seu declínio político e religioso. Não
há nada na história dêsse homem para indicar que êle
demonstrou no seu govêrno quaisquer qualidades de esta
dista. Quando o rei Acaz recusou definitivamente a men
sagem do Senhor e entregou-se ao domínio da Assíria, o
profeta ficou quase inativo durante a maior parte do go
vêrno dêsse rei infiel.
22. 22 A. R. CRABTREE
Todavia, Isaías apresentou o seu apêlo ao povo numa
série de breves mensagens, encontradas no capítulo 8.
Por meio de um ato simbólico, êle ilustrou a destruição
da Síria e de Israel. Com formalidade legal o mensagei
ro do Senhor colocou uma placa num lugar público com a
inscrição A Maher-shalal-hash-baz, o nome de um dos seus
filhos, Rápido-despôja-prêsa-segura. Declarou, na ocasião,
«Antes que o menino saiba dizer meu pai ou minha mãe,
serão levadas as riquezas de Damasco, e os despojos de
Samaria, diante do rei da Assíria» — Is. 8 :4. Mas o povo
em geral, bem como as autoridades públicas mostraram
a mesma insensibilidade espiritual e incredulidade religio
sa. A pregação do profeta produziu apenas a cegueira
mental e a dureza de coração, justamente de acôrdo com
o significado da visão inaugural.
Quando o povo em geral chegou a desprezar a men
sagem divina, o profeta cessou por algum tempo o seu
ministério público, e marcou a ocasião por um ato signi
ficativo. «Liga o testemunho, sela a lei entre os meus
discípulos» — 8:16. A expressão fica obscura, mas tal
vez se refira às mensagens proferidas durante a crise com
Acaz, e que o profeta selou na presença de seus poucos
discípulos como protesto contra a incredulidade nacional.
É quase certo que havia, neste tempo de incredulidade
geral, um grupo de discípulos do profeta, instruído e de
senvolvido mais tarde como o restante fiel.
O Significado da Queda de Samaria, 721
Tiglate-Pileser aceitou com alegria o tributo de Acaz,
matou o rei da Síria, conquistou a cidade de Damasco e
levou cativa uma grande parte do seu povo. Colocou um
títere no trono de Samaria, e assim fêz de Israel uma
província da Assíria. Quando Tiglate morreu, em 727, o
seu filho Salmanaser V ocupou o trono da Assíria, de 727-
23. A PROFECIA DE ISAÍAS 23
722. Oséias, rei de Israel, pagou tributo a Salmanaser
por pouco tempo, e então conspirou com o rei do Egito
contra a Assíria, II Reis 18:4, no esforço de ganhar a sua
independência. Salmanaser respondeu logo com uma for
te invasão de Israel. Sitiou a cidade de Samaria por mais
de três anos, II Reis 17:2-6, e a cidade caiu finalmente no
poder de Sargão II, sucessor de Salmanaser, no princípio
do ano 721. Assim terminou o Reino de Israel. As Dez
Tribos ficaram perdidas para sempre. Foi um caso de
genocídio, ou a destruição nacional. Uma grande parte
dos moradores da cidade, 27.290, foi deportada para a
Mesopotâmia e Média. Samaria passou a ser habitada por
uma população mista, e Judá limitava-se em parte com
uma província do Império da Assíria, exterminador de
nações.
Eventos no Reinado de Sargão 11, 721-705
No primeiro ano do seu govêrno Sargão sofreu uma
derrota que lhe foi infligida pelo rei de Elão. Então sur
giu logo entre as províncias do oeste, incluindo a Filístia
e o Egito, uma revolta contra a Assíria, mas Sargão es
magou os revoltosos na batalha de Ráfia. Devido pro
vavelmente à influência de Isaías, Judá não tomou parte
nesta batalha contra a Assíria. Na mensagem de 14:28-
32, proferida talvez no último ano de Acaz, Isaías adver
tiu aos filisteus de que o poder da Assíria ainda não fôra
enfraquecido.
Surgiu entre os judeus, influenciados pelo Egito, mas
sem o apoio de Isaías, um movimento revoltoso contra a
Assíria, nos princípios do reinado de Ezequias. Numa
inscrição de 711 Sargão menciona Filístia, Éden, Moabe
e Judá, como os países obrigados a trazer tributo à Assí
ria. Declara também que estas províncias tinham envia
do sinais de homenagem a Faraó, príncipe sem poder de
ajudá-las. Sargão despachou uma expedição militar con
24. 24 A. R. C R A B T R E E
tra Asdode, e com a queda do foco da conspiração, a re
volta fracassou. Judá estava pagando tributo à Assíria,
mas não há evidência de que tomasse parte nesta cons
piração .
A invasão de Judá por Senaqueribe, 701
Com o assassínio de Sargão e o estabelecimento de
Senaqueribe no trono da Assíria, em 705, surgiu entre
as províncias do grande império o desejo e a esperan
ça de libertarem-se do domínio cruel do seu opressor.
Por alguns anos, 721-709, Merodaque-Baladã, o caldeu, ti
nha oferecido resistência obstinada contra Sargão, e foi
subjugado com dificuldade. Revoltou-se também contra
Senaqueribe, e foi subjugado com duas campanhas do
exército assírio. No seu poder crescente, o Egito ambi
cioso aproveitou-se das perturbações políticas para fo
mentar a insurreição contra a Assíria. Nestas circuns
tâncias, as províncias da Palestina e Fenícia uniram-se na
revolta. Contra o conselho de Isaías, Ezequias, de Judá,
tomou parte na conspiração.
De 705 a 701 o profeta Isaías dirigiu as suas mensa
gens contra os conselheiros políticos que confiavam no
socorro do Egito, 28:7-13; 28:14-22; 29:15-16; 30:1-7;
31:1-3. Durante o govêrno de Ezequias, o grande mensa-
géiro do Senhor exerceu o seu ministério profético vigo
rosamente, mas aparentemente com poucos resultados até
à crise na história de Jerusalém, quando aconselhou e per-
súádiü ao rei Ezequias a recusar a entrega da cidade de
Jerusalém ao poder de Senaqueribe, Is. 37.
, Nota-se uma certa mudança na pregação do profeta
no período do govêrno de Ezequias. No princípio do seu
ministério, o profeta denunciou em têrmos fortes o or
gulho, a iniqüidade e a infidelidade religiosa do povo.,
Condenou severamente a. corrupção e a injustiça dos ricos
25. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 25
e das autoridades políticas. No período do govêrno de
Ezequias o profeta olhou mais para o futuro, e discutiu
a operação do propósito do Senhor na história, e especial
mente na história do povo do Senhor. Ao mesmo tempo
êle denunciou severamente as intrigas políticas e a injus
tiça social. Veja 28:14-15; 29:15-16; 31:1-3; 22:15-25;
28:1-21; 29:9-14. Quando Ezequias pediu o socorro do
Egito, o profeta denunciou «esta aliança com a morte»,
28:15.
Quando o rei e o povo confiavam no poder militar
e nas alianças políticas, o conselheiro espiritual do seu
povo declarou que a fé no Senhor Javé, o Santo de Israel,
o Deus da história, era a única esperança segura para
Judá. Ao mesmo tempo, o profeta reconheceu que a Assí
ria era instrumento na mão de Deus para castigar o povo
infiel de Judá. Mas declara firmemente que o arrogan
te conquistador será humilhado, 10:5-16; 37:22-25.
Como um dos conspiradores contra o Império da
Assíria, Ezequias aguardava a fúria da vingança de Se-
naqueribe. Na sua terceira campanha militar o terrí
vel conquistador invadiu as províncias no oeste. Êle des
creve as vitórias e as conquistas dramáticas daquela ex
pedição no «Taylor-Prism», agora no Museu Britânico
(Veja a Arqueologia Bíblica do autor, p. 269). A sua
narrativa não concorda perfeitamente nos pormenores
com a da Bíblia, II Reis 18:13-16. Nota-se logo na sua
narrativa a arrogância e o exagêro costumário dos fatos
em favor da grandeza das vitórias militares, em contras
te com a história clara e humilhante na Bíblia, II Reis
18:17-37. Senaqueribe não oferece qualquer explicação
porque abandonou o sítio de Jerusalém, mas dá a entender
que foi por causa do grande tributo que tinha recebido
de Ezequias.
Lembrando-se da sorte funesta de Israel, Ezequias,
por motivos de patriotismo e da religião, recusou-se a en
26. 26 A. R. C R A B T R E E
tregar a cidade ao poder cruel da Assíria. Mas que podia
fazer nessa situação extrema? Virou-se ao homem de
Deus. Isaías tinha pregado corajosamente contra a polí
tica de Ezequias na revolta contra a Assíria, mas nunca
tinha perdido a fé no propósito do Senhor de salvar a ci
dade de Sião do poder de Senaqueribe. Não obstante o
fato de que o rei Ezequias havia seguido a política popu
lar, contra o conselho do profeta Isaías, nesta grande
crise êle recebe e segue o conselho do mensageiro do Se
nhor, e recusa submeter-se às exigências arrogantes de
Senaqueribe. O discernimento espiritual do mensageiro
do Senhor foi completamente verificado. De repente,
uma pestilência terrível atacou o acampamento dos assí
rios, e matou 185.000 homens do exército assírio, Is. 37 :
36. Assim, Senaqueribe retirou-se repentinamente de
Judá, voltou para a sua terra, e nunca mais voltou contra
Judá e a cidade de Jerusalém. A sua política foi comple
tamente alterada pelo desastre que sofreu na campanha
contra Jerusalém. Quando consideramos o significado
da salvação de Jerusalém do poder do exército cruel da
Assíria, é difícil exagerar a importância dêsse evento do
qual dependia o futuro da religião de Judá.
A inspiração divina que guiou o ministério profético
de Isaías e a bênção da providência de Deus que honrou
e conseguiu a realização das suas esperanças proféticas
constituem a mais linda história, e o mais profundo en
tendimento da religião do povo do Velho Testamento.
Esta vitória da fé, juntamente com os eventos históricos
de 701, termina apropriadamente a carreira pública dês-
te nobre mensageiro do Santo de Israel.
II. A vida e o Ministério Profético de Isaías
Fora dos seus próprios escritos temos pouca infor
mação sôbre a vida do profeta Isaías. Nasceu nos fins
do período da prosperidade econômica, e do declínio reli-
27. A P R O F E C I A DE ISAÍAS 27
gioso de Israel e Judá. A poderosa nação da Assíria já
começara a campanha militar contra o ocidente, com o
propósito de conquistar o mundo. Isaías era menino quan
do Amós, o primeiro profeta canônico, dirigiu ao reino de
Israel a mensagem do julgamento divino sôbre a infideli
dade daquela nação. Amós e Oséias já tinham iniciado
o nôvo movimento profético, com novas revelações do
caráter de Deus e novas interpretações dos princípios
fundamentais do reino de Deus, quando Isaías recebeu a
visão da santidade e da majestade do Senhor Javé, e res
pondeu voluntàriamente à voz de Deus: «Eis-me aqui, en
via-me a mim.»
Era filho de Amoz, distinguido claramente do pro
feta Amós. Segundo uma tradição persistente entre os
judeus, Amoz era de família nobre, irmão de Amazias,
rei de Judá, II Reis 14:1. No seu espírito como profeta
e como estadista, Isaías era mais nobre do que os reis de
Israel e Judá. O profeta geralmente ocupava uma posi
ção social nos círculos^ políticos e sacerdotais. A sua
mentalidade aristocrática indicava a nobreza da família.
Em 8:3 a espôsa de Isaías é mencionada como pro
fetisa, e alguns supõem que ela tivesse o dom e o espí
rito de profecia. Mas é mais provável que as esposas dos
profetas eram chamadas profetisas por cortesia, do mes
mo modo como as mulheres dos sacerdotes eram deno
minadas sacerdotisas. Isaías teve dois filhos e êle lhes deu
nomes simbólicos: Sear-Jasube (Um-Restante-Yoltará);
Maher-shalal-hash-baz (Rápido-despôjo-prêsa-segura).
Isaías exerceu o seu ministério profético nos últimos
40 anos do século oitavo, e possivelmente por mais um
pouco de tempo, mas não temos referência a qualquer
mensagem dêle depois do ano 701. De u’a maneira es
pecial êste homem de Deus tomou parte proeminente nas
crises políticas e religiosas de Judá durante o seu mi
nistério, e assim ganhou fama bem merecida como o
28. 28 A. R. C R A B T R E E
maior estadista da época, se não do Velho Testamento.
É certamente o mais poderoso profeta do Velho Testa
mento. É claro que o Senhor levantou êste homem no
período da apostasia do seu povo, e no tempo da expan
são do Império da Assíria, que ameaçou a destruição do
povo escolhido do Senhor. De acôrdo com a tradição,
êle sofreu martírio às ordens do rei Manassés, e foi pro-
vàvelmente serrado ao meio (Cp. Heb. 11:37).
Em espírito aristocrático, Isaías comportou-se como
príncipe entre os homens, falando sempre com a auto
ridade do embaixador do Santo de Israel. Nas prega
ções, bem como nas obras e nas atividades proféticas,
êle sempre se apresenta como o mais alto exemplo da
cultura de Judá. Sempre demonstra a capacidade inte
lectual de analisar os problemas políticos e sociais do
seu povo, e a habilidade profética de entender e interpre
tar a mensagem do Senhor Javé, o Santo de Israel, de
acôrdo com as necessidades religiosas dos seus patrí
cios. Sempre demonstra a firmeza de caráter para pre
gar as verdades da revelação divina como a única solu
ção dos problemas políticos, éticos, sociais e religiosos
de Judá. Observam-se, no estudo cuidadoso das suas
mensagens, não somente os seus maravilhosos talentos,
como também a perfeita harmonia no uso de seus dons
no esforço de orientar as autoridades políticas, e a socie
dade nacional nos deveres e nas responsabilidades mo
rais de acôrdo com a vontade revelada do Senhor.
Como Amós e os outros profetas, Isaías era homem
do seu tempo, influenciado pela história do seu povo, e
pelas crises históricas da época. Mas a fôrça da sua
personalidade, e seu discernimento espiritual dos sinais
do tempo, e sua transmissão das verdades eternas da
revelação divina para as gerações do futuro, elevaram
êste mensageiro do Senhor acima da época transitória,
e fizeram dêle um mensageiro de Deus para tôdas as ge
29. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 29
rações subseqüentes. As verdades fundamentais que
Isaías proclamou vivem ainda, e viverão eternamente.
Não tinha, nem poderia ter, a última palavra da revela
ção divina sôbre a glória e a graça de Deus, mas contri
buiu muito para esclarecer as operações do Criador na
história humana, e o propósito e poder do Controlador
das atividades dos povos e das nações do mundo. A gló
ria do Senhor enche o mundo inteiro, mas, na sua ma
jestade maravilhosa, o Deus de Israel comunica-se com
os seus profetas, e com todos os seus servos fiéis.
Nas meditações sôbre a morte do seu rei Uzias, o
jovem experimentou a presença e o poder da santidade,
da majestade e da glória de Deus. E naquela sublime
visão, Isaías recebeu a incumbência de entregar-se nas
mãos do Senhor, e dedicar a vida completamente ao ser
viço do Senhor. O velho monarca tinha governado o
reino de Judá no período da maior prosperidade nacio
nal, mas estava nos últimos dias de sua vida, ou já ti
nha morrido. É provável que Isaías já começara a en
tender que a morte dêste poderoso rei do seu povo es
tava marcando o fim de uma época na história de Judá,
e o princípio do período de anarquia e confusão (Cp.
3:18). Assim, na visão foi permitido ao jovem pro
feta entender, à luz da revelação da santidade e da ma
jestade do Senhor, o pecado da infidelidade do povo e
os sofrimentos que haviam de enfrentar por causa da
sua infidelidade e dos seus pecados, 6:9-13. A revelação
da Pessoa do verdadeiro Rei preparou Isaías para en
frentar as responsabilidades e as obrigações morais de
receber e transmitir ao seu povo obstinado e rebelde os
seus ensinos, com coragem, confiança e persistência,
na dependência do socorro divino.
As verdades eternas imprimidas no espírito de Isaías
por essa experiência memorável são confirmadas pelos
resultados do seu ministério profético. Desempenhou-se
30. 30 A. R. CRABTREE
fielmente da incumbência que aceitou voluntariamente
em resposta ao Senhor, «A quem enviarei, e quem há de
ir por nós?» Manifestaram-se os resultados da pregação
da mensagem de Deus na vida e na história dos insensí
veis e incrédulos, bem como no espírito e na missão do
restante fiel, o núcleo do povo regenerado pela graça de
Deus.
Convém reconhecer os quatro períodos do ministé
rio dêsse profeta, e a adaptação da mensagem profética
às circunstâncias históricas da vida nacional. O pri
meiro se estende desde a morte de Uzias em 742 até os
princípios do reino de Acaz em 734. O segundo é o pe
ríodo de conflito do profeta com o rei Acaz, nos princí
pios do seu reino de 734-715. O terceiro se centraliza
contra a política de aliança com o Egito contra o Impé
rio da Assíria de 715-705. Na quarta divisão a profecia
relaciona-se principalmente com a invasão de Judá por
Senaqueribe, e a libertação de Jerusalém de 705-701.
1. As Profecias do Primeiro Período
É difícil determinar as ocasiões e as datas quando
foram proferidas muitas das mensagens de Isaías. Essas
questões serão discutidas mais elaboradamente no co
mentário próprio. As pregações «a respeito de Judá e
Jerusalém» nos capítulos 1-5 foram proclamadas provà-
velmente no reino de Jotão.
As condições sociais e religiosas de Judá eram se
melhantes às de Israel nos dias de Amós. Mas, devido
às maiores relações políticas de Israel com outras na
ções, e especialmente devido ao casamento de Acabe com
Jezabel, o reino do norte foi mais influenciado pela re
ligião dos fenícios do que o de Judá. Ao mesmo tempo,
na ingratidão para com o Senhor, na religião de cerimo-
nialismo, na infidelidade ao Senhor, e no fracasso mo
ral, Judá não era superior ao Reino de Israel. O profeta
31. tmla dos pecados de Judá no espírito e no entendimen
to do seu predecessor, Amós. O povo se mostra mais
insensível aos favores de Deus do que o boi e a jumenta
aos cuidados de seus donos, 1:3. A idolatria, a supers
tição e a confiança nas riquezas são característicos da
vida nacional, cp. 2. Os males sociais, a opressão e a
injustiça praticadas contra os pobres e fracos pelos ri
cos e poderosos, 3:9,14,15, e o luxo e a vaidade das
mulheres de Jerusalém, 3:16, são condenados com a
mesma severidade do profeta Amós. Nesse período do
seu ministério o profeta se apresenta como pregador da
justiça e do juízo vindouro. Os dois assuntos mais acen
tuados nas pregações dêsse tempo são o pecado do povo,
especialmente dos ricos, e a certeza do desastre nacional,
5:8-24. As passagens 9:8-21; 10:22-23; 32:9-14, e pro-
vàvelmeinte outras, foram proferidas nesse período.
O povo de Judá em geral, como o de Israel, influen
ciado, sem dúvida, pela religião mais fácil e mais agra
dável dos cananeus, julgava que podia ganhar os favo
res do Senhor Javé pelos serviços rituais e os sacrifícios
custosos, apesar dos pecados e da infidelidade dos ofertan-
tes, 1:10-17. A Parábola da Vinha, 5:1-7, proclama em
têrmos claros que o Senhor esperava da casa de Israel,
e dos homens de Judá, o juízo em vez de opressão, e a
justiça em vez do clamor dos oprimidos.
Isaías proclama também o julgamento vindouro em
têrmos claros e cintilantes. O dia do Senhor não será o
dia de vitória e honra para o povo de Judá, como se es
perava. Será antes o dia quando todo o soberbo e al
tivo será humilhado perante a exaltada majestade e a
glória do Senhor, 2:9-22. O Senhor mesmo virá em pes
soa para julgar os anciãos e os príncipes do povo, 3:14.
Em 1:24-26 o profeta olha para o futuro quando Judá
será purificada, como era dantes. Então Jerusalém se
chamará «idade de justiça, cidade fiel. Há dois lindos
quadros da Idade Messiânica do futuro, 2:2-4 e 4:2-6.
A PROFECIA DE ISAÍAS 31
32. 32 A. R. C R A B T R E E
2. O Conflito do Profeta com o Rei Acaz
No esforço de persuadir o rei Acaz a confiar no au
xílio do Senhor, e não fazer aliança com a Assíria, o pro
feta fracassou. Os profetas em geral sempre se mos
travam contra alianças políticas das pequenas nações de
Israel e Judá com as nações poderosas. Opuseram-se
igualmente à violação de tais alianças que pudessem re
sultar na sua subjugação, ou na sua ruína final. Apre
sentam-se nos capítulos 7 e 8 a história do confli
to de Isaías com o rei Acaz, e algumas mensagens sim
bólicas dirigidas ao povo. Nesta segunda parte do seu
ministério, o profeta se apresenta como conselheiro po
lítico, e, segundo a opinião de muitos estudantes, como
verdadeiro estadista. Instava com tôda autoridade pro
fética para que Acaz renunciasse à confiança no auxí
lio político, e confiasse no socorro do Senhor. «Se não
crerdes, certamente não sereis estabelecidos.» Isaías en
tendeu claramente a insensatez do rei Acaz em subme
ter-se voluntàriamente ao domínio da Assíria, pagando
tributo a Tiglate-Pileser para livrá-lo da ameaça da Sí
ria e Efraim quando êle já havia começado o seu plano
de conquistar os pequenos países ao oeste.
Com a rejeição da sua mensagem pelo rei e pelo
povo em geral, o profeta interrompeu a sua atividade
profética até à morte do rei Acaz. Houve, porém, um
pequeno grupo de homens que ouviu com interesse as
pregações do profeta. Entre êstes que se destacaram de
entre a geração incrédula e insensível, e receberam com
alegria os ensinos do mensageiro do Senhor, havia aquê-
le restante fiel de que dependia o futuro do reino de
Deus.
3. À Operação do Propósito de Deus na História
Com a morte do rei Acaz e a inauguração do rei
Ezequias, Isaías reassumiu o seu ministério profético.
33. A PROFECIA DE ISAÍAS 33
A profecia contra os filisteus foi proferida neste perío
do, 14:28-32. Durante êste período o profeta pregou
freqüentemente, dirigindo as suas mensagens ao rei
Ezequias, às autoridades políticas, no esforço de orien
tar a vida nacional de acôrdo com a vontade do Senhor.
No ministério dêsse período (18:1-7; 19:1-15; 20:
1-6; 22:1-25), nota-se uma certa mudança no interêsse
e nas mensagens do profeta. Na primeira parte do seu
ministério êle denunciou severamente o orgulho, a ini
qüidade e a infidelidade religiosa do povo. Condenou
igualmente a corrupção e a opressão do povo pelos ho
mens ricos e poderosos. No reino de Ezequias o profe
ta pensava mais profundamente na operação do propó
sito de Deus na História. Continuou a censurar as in
trigas políticas das autoridades, 28:14-15; 29:15-16;
30:1-5; 31:1-3. Nos anos de 715 a 711 êle fala menos
na injustiça e opressão, e trata do problema da queda de
Samaria, e a extinção do reino das Dez Tribos. Fala
mais claramente sôbre o problema que perturba os pen
sadores de tôdas as gerações. O Império da Assíria era
mais cruel do que a nação de Israel que êle tinha des
truído. Vangloriou-se no sítio de Jerusalém, dizendo:
«Porventura como fiz a Samaria e aos seus ídolos, não
o faria igualmente a Jerusalém e aos seus ídolos?» Com
clareza crescente o profeta anunciava a aniquilação da
quele império envolvido no plano divino para o estabe
lecimento do verdadeiro reino de Deus no mundo. É di
fícil para alguns teólogos de hoje entender o ensino de
Isaías, de que Deus pudesse usar o poder cruel da Assí
ria na realização do seu propósito na direção da histó
ria humana (10:5). Depois de ser usada como instru
mento na mão de Deus no castigo de Judá, a Assíria se
ria destruída pelo poder supremo do Senhor, 10:5-17.
34. 34 A. R. CRABTREE
4. A Invasão de Judá por Senaqueribe, e a Salvação
de Jerusalém
Aparentemente, Ezequias não prometeu a Meroda-
que-Baladã auxílio na revolta contra a Assíria. É cer
to, todavia, que os países pequenos, vizinhos de Judá, en
traram na conspiração contra o poderoso império, en
corajados aparentemente pelo revoltoso Merodaque-Ba-
ladã da província da Babilônia. Logo que subjugou êste
persistente revoltoso da Babilônia, Senaqueribe, o nôvo
rei da Assíria, iniciou a campanha militar contra as pro
víncias revoltosas do oeste. Embora Judá não tomasse
parte na aliança contra a Assíria, Ezequias, com o seu
povo, ficou amedrontado perante a pavorosa campa
nha militar de Senaqueribe. Seguindo o conselho dos
políticos, Ezequias pediu a ajuda do Egito (28:7-13,
14:22; 29:15-16; 30:1-7; 31:1-3). O mensageiro do Se
nhor denunciou vigorosamente esta aliança com a morte,
28:15, e a esperança falsa de achar segurança política
por meio de alianças militares.
Isaías entendeu claramente a ambição e a política pe
rigosa da Assíria, bem como a futilidade de qualquer
aliança de Judá contra ela. A única fôrça de Judá con
tra a agressão arrogante da Assíria não seria militar, mas
sim o propósito do Santo de Israel, o Controlador da Histó
ria. O rei Ezequias e os políticos aparentemente tinham dú
vidas quanto ao valor do auxílio militar do Egito, e ten
taram esconder do profeta os seus desígnios, 29 :15; 30:1.
Mas o profeta acompanhava as atividades e os planos
dêsses homens, e freqüentemente usava de linguagem
irônica sôbre os seus esforços sutis de enganar o Todo-
Poderoso (29:15; 30:1-12; 31:1-2). Nessa situação pe
rigosa, Isaías usou métodos ainda mais drásticos para
influenciar a opinião pública contra a rebelião. Por três
anos êle andou «nu e descalço», 20:1-6, como sinal da
35. A PROFECIA DE ISAÍAS 35
humilhação que o Egito havia de sofrer às mãos da
Assíria.
O profeta reconheceu que Judã também tinha que
sofrer a invasão da Assíria, e que isto seria o julgamen
to inevitável do Senhor. Assim, nas suas pregações, o
mensageiro do Senhor procurou desenvolver o espírito
religioso das autoridades e do povo, e prepará-los para
enfrentar a tragédia sem perder a fé no Senhor da His
tória, o Deus de Israel. Como tinha procurado persuadir
o rei Acaz a não fazer aliança com a Assíria, agora êle
se esforça para mostrar às autoridades a tolice de fazer
aliança com o Egito em revolta contra a Assíria.
Na orientação divina, Isaí^s entendeu claramente
os limites do poder da Assíria no eterno propósito de
Deus. Releva notar, todavia, que o profeta nunca iden
tificou a política da Assíria com o propósito moral do
Todo-Poderoso. Veja 10:32 e 10:33. A crise na vida de
Jerusalém ofereceu ao Senhor dos céus e da terra a oca
sião de demonstrar a sua majestade, a sua glória e o
seu poder no transtorno do poder arrogante da Assíria.
A libertação de Jerusalém do poderoso exército militar
de Senaqueribe é um exemplo supremo na história in
teira da redenção poderosa do Deus Altíssimo. Foi a
inauguração do reino de santidade, justiça e paz, reser
vado para o restante purificado do povo escolhido.
A orientação e o encorajamento do rei Ezequias pelo
profeta nessa ocasião, com os seus resultados de eterna
significação para o reino de Deus no mundo foi uma
conclusão apropriada do ministério dêsse grande homem
de Deus. «Com os pés na terra firme, a cabeça nas nu
vens e o coração nas verdades eternas do Deus verdadei
ro», êste servo de Deus entendeu claramente a injustiça
política e a infidelidade religiosa do seu povo. Homem de
convicções inabaláveis, êle pregava fielmente as verdades
eternamente operativas na vida dos homens e das nações.
36. 36 A. R. CRABTREE
Na comunhão entranhável com o Espírito do Senhor Oni
potente, êste pregador da justiça divina tinha a autori
dade e o poder de apresentar a mensagem de esperança
ao seu povo na hora da angústia, e assim salvou o reino
enfraquecido de Judá da tragédia nacional que ocorrera
com o Reino de Israel.
III. A Teologia de Isaías
Não há diferença especial entre os ensinos teológicos
de Isaías e os outros profetas da época. Êles concordam
nos ensinos sôbre a natureza e o caráter do Senhor Javé,
o Deus de Israel; a controvérsia divina com o povo de Is
rael e Judá; o julgamento vindouro de Israel e Judá pela
agência da Assíria; e o estabelecimento final do reino de
Deus no mundo. Isaías, porém, entendeu mais claramen
te do que os outros profetas os fatos políticos da história
humana. Como resultado da visão inaugural, êle enten
deu mais claramente a santidade, a majestade e a glória
eterna de Deus, a missão de Israel, e o futuro do Reino
Messiânico do Senhor dos céus e da terra.
Pois na experiência religiosa de Isaías, Deus era o
Soberano, o Exaltado, o Senhor Javé dos Exércitos, o
Santo cuja glória enchia tôda a terra. No seu alto e su
blime trono o Senhor Javé é o Rei, não somente de Israel,
mas o Soberano absoluto e universal do mundo inteiro.
As criaturas resplandecentes, os serafins, que refletem e
proclamam a glória divina, são cônscios das suas imper
feições em comparação com a majestade do Senhor, e co
brem o rosto e os pés na presença do seu Criador.
O profeta contemplava profundamente o mistério so
lene da visão que recebera do Senhor; o fogo simbólico
da expiação; a severidade da mensagem divina dirigida ao
povo de Israel; e acima de tudo a santidade inacessível do
Senhor Javé. A significação radical de santidade é sepa
ração, mas o que separa o Senhor do universo que Êle
37. A PROFECIA DE ISAÍAS 37
criou é a bondade e a justiça do seu propósito nas ativi
dades de preservar e dirigir as obras da criação. A san
tidade ou a divindade descreve a superioridade infinita do
Senhor em relação às criaturas do mundo. A santidade
não descreve qualquer atributo especial da natureza di
vina, mas declara apenas a noção da divindade, na sua
distinção de tôdas as outras formas de existência.
O têrmo santidade, per si, não especifica qualquer
atributo de Deus, mas toma a sua qualidade da natureza
e do propósito de todos os atributos do Senhor, como a
bondade e a justiça, 5:16. A bondade, a justiça e o amor
de Deus são absolutos. Tôdas as virtudes humanas são
relativas. A justiça soberana é pessoal nas relações com
o homem criado à imagem de Deus. No seu amor e na
sua justiça Deus fala à consciência do homem, exigindo
dêle a submissão e a obediência. Mas é na revelação pró
pria do Senhor que o homem conhece a vontade e o pro
pósito de Deus para a sua vida na sociedade humana. O
Santo de Israel é o Rei soberano na história de tôdas as
nações. Não obstante o fato de que os homens não enten
dem perfeitamente a significação das obras divinas, é o
Senhor Javé quem governa a História de acôrdo com o
seu eterno propósito na criação do homem (Cp. 5:12,19;
28: 23-29; 29:14).
O Santo de Israel é inteiramente diferente de outros
santos: na sua natureza, na soberania, no propósito das
suas atividades, e na exigência de obediência universal
à sua vontade.
A glória do Senhor relaciona-se com o universo in
teiro. «Tôda a terra está cheia da sua glória.» Santo,
santo, santo é o Senhor dos Exércitos. Esta afirmação
dos serafins declara o que Deus é em si mesmo. Tôda a
terra está cheia da sua glória. Esta declaração descreve
o que Deus é na revelação. Assim o cântico dos serafins
declara que a plenitude da terra inteira é a glória de
Deus.
38. 38 A. R. CRABTREE
0 Senhor Javé na História
A doutrina da soberania de Deus, acentuada nos
ensinos de Isaías, levou o profeta a pensar na revelação
do propósito do Senhor na História. No propósito do seu
reino, o Soberano pergunta na visão quem há de repre
sentá-lo na terra. Desde então, Isaías pensava no pro
pósito do Senhor que se realiza progressivamente no go-
vêmo providencial do mundo, 5:12; 10:12,23; 14:24,26,27;
28:21-24. A obra do Senhor significa para o profeta o
estabelecimento do seu Reino de Justiça no mundo. É
o ato final e decisivo que o Senhor executará na grande
consumação da História.
As autoridades irreligiosas não podiam entender as
obras e as atividades do Senhor na direção da História,
5:12. Permaneciam cegas quanto à operação da provi
dência de Deus na vida dos homens e das nações. O gênio
de Isaías, em comunhão com o Espírito do Senhor, per
cebeu que o reino do Senhor é supremo, não somente
na esfera da natureza física, como também no govêmo
da história humana. Como a glória do Senhor enche tôda a
terra, assim também a atividade do Criador penetra tôda
a história humana. Como os homens eram cegos quanto
à glória do Senhor, assim também os irreligiosos zomba
vam das atividades de Deus no controle da história dos
homens e das nações.
Isaías, como Amós, acentuava os atributos austeros
do Senhor. Fala freqüentemente sôbre a sabedoria, o
zêlo e a ira do Senhor, 28:29; 31:2; 9:7; 9:19; 10:6. A
justiça divina liga-se diretamente com a santidade do
Senhor, 5:16. Embora Isaías, de Jerusalém, não fale do
amor como atributo do Senhor Javé, o Santo de Israel,
êle reconhece claramente o propósito da graça de Deus
em tôdas as suas relações com Israel, 30:18. No senti
mento vigoroso de Isaías, Deus se apresenta como o So-
39. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 39
berano absoluto, de majestade suprema e de glória infi
nita. Deus fala aos homens por intermédio do profeta
Isaías como o Senhor Javé dos Exércitos, com a autori
dade do Criador e do Rei dos céus e da terra.
O Senhor Javé e Israel
O concêrto do Senhor com o povo de Israel deter
minou o desenvolvimento das escrituras do Velho Tes
tamento. Mas neste sentido temos que entender a signi
ficação do concêrto, Giên. 12:3 e Êx. 19:1-6. Isaías, como
os outros profetas, baseou a sua mensagem ao povo nesta
relação especial entre o Senhor e a nação de Israel. De
acôrdo com o concêrto, o Senhor Javé é o Deus de Israel,
e Israel é o povo de Deus. É evidente em todos os escri
tos proféticos que o povo em geral não entendeu clara
mente a verdadeira significação do concêrto. Israel se
ufanava da sua relação peculiar com o Senhor, mas não
quis entender ou aceitar a responsabilidade religiosa que
o concêrto lhe impunha. Javé é o Deus de Israel num
sentido especial. E, correlativamente, Israel é o povo do
Senhor num sentido especial.
Porquanto a sua religião fôsse nacional, segundo os
profetas, Israel tinha a incumbência de servir ao Senhor
como nação sacerdotal. Por intermédio dos profetas, o
Senhor trata com o povo de Israel no seu conjunto. O
pecado do israelita é reconhecido como delito nacional.
Todos os israelitas tinham que reconhecer e honrar ao
Senhor Javé na vida pessoal, mas sempre como membro
do conjunto nacional. Em virtude da solidariedade nacio
nal, todos os israelitas, em tôdas as esferas da vida,
eram responsáveis perante o Senhor pelos pecados ou
pela fé e obediência do grupo.
Deus como Soberano universal, em virtude do seu
propósito na escolha de Israel, era Rei, num sentido es
40. 40 A. R. C R A B T R E E
pecial, dêste povo. Israel, por sua parte, representava o
reino de Deus na terra. Isaías era o mensageiro do Rei,
comissionado para falar ao povo e orientá-lo de acôrdo
com a revelação do Senhor Soberano. Portanto, Isaías,
como os outros profetas, se esforçava para estabelecer
as relações de harmonia espiritual entre o Rei e o povo
do seu reino. Para êste profeta a religião nacional resu
mia-se na frase a santificação do Senhor dos Exércitos
(8:13; 29:33).
O julgamento do estado moral de Israel pelo profeta
era simplesmente a aplicação dêstes princípios às con
dições sociais é religiosas do povo da época. Experimen
tando a visão da Santidade do Senhor, o jovem Isaías
sentiu-se perdido, separado de Deus pela sua impureza.
Logo em seguida, êle reconheceu a condição pecaminosa
da vida inteira de Israel como nação. O seu próprio pe
cado foi purificado pelo contato com o fogo divino, o
símbolo da santidade do Senhor. Mas aprendeu na mesma
ocasião que o único fogo que poderia purificar a nação
mergulhada na iniqüidade era o fogo do julgamento su
premo, que podia queimar ou destruir os elementos peca
minosos de Israel, deixando apenas o restante indestru
tível, a santa semente, 6:13.
A visão da Santidade do Senhor, na sua majestade
e justiça, preparou o jovem para entender e interpretar
a insensibilidade, a impureza, e a corrupção do povo em
geral, bem como a tirania, a injustiça e a hipocrisia das
autoridades políticas, ricas e poderosas, 29:13; 1:10-17;
1:4.
Nas circunstâncias religiosas da época, Isaías enten
deu que a sua pregação teria o efeito de afastar o povo
hipócrita ainda para mais longe do Deus Santo. Israel
como nação tinha abandonado ao Senhor, e o Senhor o
rejeitara.
41. A PROFECIA DE ISAÍAS 41
Uma das doutrinas básicas e fundamentais dêste
mensageiro do Senhor é que a fé tem que ser o motivo
e a fôrça da orientação de Israel na sua vida política,
bem como na vida religiosa, 7:9. Aquêle que crer não se
apressará, 28:16. Na tranqüilidade e na confiança será a
vossa fôrça, 30:15. Estas declarações nos oferecem a
chave para abrir o entendimento desta grande profecia.
Quando o destino do povo em geral foi determinado pela
incredulidade e a infidelidade, os que se separaram dos
pecaminosos e incrédulos da época eram orientados e
abençoados de acôrdo com a sua fé no Santo de Israel.
Portanto, o julgamento iminente de Israel não apresenta
quaisquer terrores para aquêles que crêem na palavra
certa da Revelação.
Os Ensinos Escatológicos de Isaías
Os escritores do Velho Testamento são os primeiros
entre todos os povos antigos do mundo que apresentam
um conceito distintivo, definitivo e coerente do signifi
cado da História. A origem histórica da religião bíblica
forneceu aos escritores a chave para a interpretação da
História. Os mensageiros da revelação de Deus sabiam
interpretar as atividades do Senhor na sua vida nacional.
Entenderam não somente o propósito do Senhor, na sua
própria história, como também na criação do mundo para
o serviço e o desenvolvimento da humanidade inteira.
O Criador dos céus e da terra está dirigindo a história do
mundo para o alvo que êle mesmo predeterminou.
Mas, como os outros profetas, Isaías reconheceu a
desarmonia, a incoerência e as imperfeições religiosas do
povo de Israel, em comparação com o reino ideal do fu
turo que pela fé no Deus Santo e Justo esperava. Aparen
temente, os profetas do século oitavo esperavam uma
catástrofe física e social, seguida por uma nova ordem
do reino de Deus na terra, no qual tôdas as fôrças da
42. 42 A. R. C R A B T R E E
natureza se tornariam subservientes às necessidades da
humanidade completamente renovada.
Há quatro elementos nos ensinos de Isaías sôbre o
futuro do reino de Deus: O Dia do Senhor, O Restante, O
Reino Messiânico e A Inviolabilidade de Sião. Alguns
dizem que há contradições nestes ensinos. É verdade que
as circunstâncias históricas e religiosas determinavam a
variação da ênfase em cada um dêles, mas isto certa
mente não significa contradições. Significa antes a har
monia no julgamento divino da massa do infiéis e do Res
tante Fiel.
O Dia do Senhor
Isaías, 2:12-21, como Amós, 5:18, descreve o Dia
do Senhor como o dia que será contra todo soberbo e altivo,
e contra todo o que se exalta, para que seja abatido, 2:12.
No conceito do Dia do Senhor, os dois profetas explicam
as conseqüências da rebelião e da infidelidade de Israel
e Judá. Naquele dia o Senhor se apresentará no esplen
dor da sua glória e da sua majestade para julgar os po
vos, a soberba, a autoridade e o poder dos homens infiéis.
Todos êstes serão abatidos, e lançarão às toupeiras e aos
morcegos os seus ídolos de prata e os seus ídolos de ouro
que fizeram para adorar, 2:20.
Isaías não limitou a significação do Dia do Senhor
ao desastre da invasão de Judá pelos assírios. Reconheceu
que o Senhor usou a Assíria como instrumento para o
castigo de Judá, e ensinou também que o propósito de
Deus visava à destruição do cruel Império da Assíria.
Depois da retirada do exército de Senaqueribe que infli
giu um desastre terrível contra Judá e Jerusalém, Isaías
reconheceu que o Dia do Senhor, o Santo de Israel, seria
o alvo da história humana quando o reino da justiça di
vina fôsse estabelecido na terra.
43. A PROFECIA DE ISAÍAS 43
O Restante Fiel do Senhor
Por meio do nome de um dos seus filhos o profeta
proclama esta doutrina do Restante fiel: Sear-Jasube
(Um-Restante-Voltará). O ensino do significado dêste
nome do filho indica que Isaías, bem cedo, talvez desde
a visão inaugural, 6:13, nutria a esperança, se não a cer
teza, de que um restante do povo de Israel seria salvo do
desastre vindouro. Não há qualquer contradição neste
ensino do arrependimento e salvação de um grupo fiel
ao Senhor, e a infidelidade persistente da massa que as
sim traria sôbre si a destruição completa. O fogo do
julgamento, como a brasa viva da visão, pode destruir,
5:24; 9:19, ou pode purificar, 1:25,26. O Senhor não
podia abandonar Israel, o seu povo, enquanto houvesse
alguns sobreviventes da Filha de Sião, 1:9. O propósito
divino no castigo de Israel é a disciplina para que o povo
reconheça a sua infidelidade, se arrependa da iniqüidade
e se volte ao Senhor, 9:13; 10:12. Mas para os revolto
sos persistentes contra o Senhor a destruição final é ine
vitável, 28:22. Deus pode perdoar, purificar e salvar os
pecadores que se arrependem e se voltam com fé ao
Santo de Israel. A ameaça para os infiéis toma-se uma
gloriosa promessa para os fiés. Um-Restante-Voltará.
Naquele dia o restante de Israel e os sobreviventes da
casa de Jacó nunca mais se estribarão naquele que os feriu,
mas se estribarão no Senhor, o Santo de Israel, 10:20.
Quanto ao Reino de Israel, Isaías não esperava mais
do que um pequeno número de sobreviventes, 17:5,6, por
que aquela nação como tal tinha que sofrer o extermínio.
Quanto a Judá, a promessa de salvação foi limitada ac
número das pessoas que receberiam a mensagem do pro
feta e se arrependeriam, depositando a fé na graça sal
vadora do Senhor. Em 10:20-23 o restante é constituído
dos escapados de Jacó. Mas é provável que Isaías pensava
em formar, ensinar e treinar o grupo de seus discípulos.
44. 44 A. R. C R A B T R E E
8:16-18, como o grupo fiel ou o núcleo do reino futuro
do Senhor. Êste resto indestrutível dos israelitas, ou da
casa de Jacó, levou o profeta Isaías, desanimado com os
resultados da pregação da Palavra de Deus, a reconhecer
que o seu serviço como mensageiro do Santo de Israel
tinha valor inestimável e permanente para a religião do
futuro.
O Reino Messiânico
O têrmo Messias originou-se do costume de ungir
com óleo, 5 pessoas ou cousas, e assim separá-las
- T
para um serviço especial do Senhor. O têrmo Messias,
ungido, usa-se no Velho Testamento para designar o Rei
Ideal da casa de Davi, sempre com a esperança de que êle
estabeleceria o reino ideal de justiça. Teórica e simboli
camente todos os reis eram ungidos do Senhor, represen
tantes do reino de Deus na terra. Mas na prática muitos
dos reis contribuíram para a corrupção do govêrno, e o
desvio do povo para a infidelidade e a idolatria.
Não há outro profeta que tenha entendido tão clara
mente o fracasso religioso do povo escolhido como aquêle
que havia experimentado a visão da santidade do Senhor.
Mas êste mensageiro zeloso do Senhor nos apresenta tam
bém o Rei Ideal do futuro, o Rei Messiânico da casa de Davi.
A figura dêste Rei e do seu reino apresenta-se freqüente
mente na obra de Isaías, 7:14-17; 9:2-7; 11:1-9; 32:1-5.
Opiniões variam quanto à ordem cronológica destas
passagens, e também quanto à interpretação do seu signi
ficado. Não há razão suficiente para se duvidar de que
êstes trechos são profecias genuínas de Isaías. O con
traste entre os ensinos destas passagens e o teor da pro
fecia que trata da infidelidade da massa do povo concor
dam perfeitamente com a visão inaugural e as experiên
cias subseqüentes do profeta. Não há razões suficientes
para se rejeitar a interpretação messiânica do oráculo
45. A PROFECIA DE ISAÍAS 45
de 7:14-17. A passagem evidentemente se relaciona com
9:2-7. Nestes dois oráculos o destino nacional depende
do nascimento da Criança. Êste fato indica que Emanu EI
ó idêntico à Criança Maravilhosa de 9:6,7. Em 7:14 a
criança é Deus Conosco, e em 9:6 é Deus Forte, Pai da
Eternidade, Príncipe da Paz. A criança nascida da virgem,
Mat. 1:23, é o Messias, o herdeiro maravilhoso do trono
de Davi. Isto não é declarado na passagem, mas o pro
feta reconhece que a incredulidade de Acaz determina o
destino trágico para a nação, e desde então o profeta de
posita sua confiança no restante fiel. Êle declara aqui
como o Rei Messiânico há de nascer . Em 9:1-7 êle men
ciona os atributos divinos do Messias que lhe deram a
habilidade de inspirar e guiar o restante que tinha andado
nas trevas, para ver e andar na luz resplandecente do Se
nhor. Em 11:1-9 o Messias é um rebento do tronco de
Jessé, dotado com o Espírito do Senhor, o espírito de sa
bedoria e entendimento, o espírito de conselho e de forta
leza, o espírito de conhecimento e do temor do Senhor. Os
atributos conferidos ao Rebento pelo Espírito do Senhor
significam, como as outras passagens, a divindade do Ungi
do do Senhor. O Espírito do Senhor confere ao Rei Messiâ
nico o discernimento e a energia devocional para executar
o govêrno perfeito do seu reino eterno de justiça e paz.
Os versículos 1-8 e 15-18 do capítulo 32 descrevem o
reino justo e reto do Messias. 0 profeta não fala, nestas
passagens, nos atributos divinos do Rei ideal, menciona
dos nos capítulos 9 e 11, mas descreve a perfeição do go
vêrno do Messias vindouro.
A Inviolabilidade de Sião
Portanto, assim diz o Senhor Javé:
Eis que estou assentando em Sião, uma pedra,
uma pedra já provada,
pedra preciosa de esquina, de fundação segura;
aquêle que crê não se apresse, 28:16.
46. 46 A. R. CRABTREE
Nos dias de Ezequias os assírios ameaçaram Jerusa
lém, e no sítio da cidade pelo exército poderoso de Senâ-
queribe, a destruição do monte do Senhor parecia inevi
tável. Mas o Senhor tinha revelado ao profeta o propó
sito de salvar Jerusalém, mostrando-lhe embora, também,
a necessidade imperiosa de castigar e disciplinar o povo
antes que o reino divino pudesse ser aperfeiçoado. Em vá
rias declarações o profeta reconheceu a Sião como o centro
do reino futuro do Senhor, 1:26,27; 2:2-4; 8:18; 14:32;
18:7; 28:16; 29:1; 30:19,29; 37:32.
Isaías viu a glória do Senhor no Templo, o lugar da
habitação divina na terra. Nos últimos dias o reino de
Deus será estabelecido no monte da casa do Senhor, 2:1.
No tempo do maior perigo o Senhor assentou-se no Monte
Sião, e defendeu a cidade contra os inimigos. Assim ma
nifestou o seu poder perante tôdas as nações. Sião como
o Santuário do Senhor é inviolável. Será salvo na crise
do julgamento, e será o refúgio dos salvos da calamidade
nacional. A santidade de Sião, como o resto fiel da casa
de Davi, é o penhor divino da indestrutibilidade da cidade
dos servos fiéis do Senhor.
Alguns pensam que esta convicção inabalável do
profeta a respeito da inviolabilidade de Sião firmou-se
nos últimos dias do seu ministério. Há, porém, numero
sas referências ao Monte Sião, como a habitação do Se
nhor, em várias partes da profecia. E estas referências a
Sião como a habitação do Senhor indicam que esta cer
teza do profeta a respeito de Jerusalém como o centro do
reino eterno do Senhor era um dos princípios básicos nos
ensinos de Isaías.
IV . Característicos Literários do Profeta Isaías
A maior parte da sua profecia foi escrita em forma
de poesia. É muito semelhante à estrutura da poesia
dos Salmos, de Provérbios e de outras profecias. Os co
47. A PR O F E C IA DE ISAÍAS 47
mentaristas modernos geralmente reconhecem três ou
quatro espécies de composição na profecia. Os oráculos
são as declarações ou as mensagens que o profeta recebe
diretamente do Senhor, com a incumbência de transmi-
ti-los ao povo como a Palavra de Deus. As memórias são
as narrativas autobiográficas que o profeta conta ao povo.
São geralmente explicações da chamada ao ministério
profético, ou de outras experiências pessoais com Deus.
A biografia profética distingue-se das memórias, porque
são narrativas a respeito do profeta contadas por outras
pessoas, e não pelo profeta mesmo, como no caso de 7 :1-17.
Oráculos
O elemento de suprema importância da profecia é
o Oráculo, ou a mensagem que o profeta recebe direta
mente do Senhor com a vocação de transmiti-la ao seu
povo. O oráculo é geralmente proclamado como a Pala
vra de Deus. Ao mesmo tempo o profeta podia sentir-se
incumbido de publicar em forma permanente a mensagem
recebida do Senhor, Jer. 36:1-4. Isaías, como Jeremias, re
conheceu a incumbência pessoal de apresentar uma série
de seus oráculos na forma escrita, 8:16-18; 30:1. Quando
o profeta declara: Assim diz o Senhor, 10:24;37:6, êle
é o portador da mensagem da autoridade do Senhor, o
Deus Soberano.
O oráculo podia tomar a forma de repreensão, ameaça,
exortação ou promessa. Estas formas aparecem, às vêzes,
em combinação, como repreensão e ameaça, ou como exor
tação e promessa, 5:8; 5:24; 10:1-4; 10:20; 7:4-6. O
profeta verdadeiro não falava da sua própria volição, por
que sempre se sentia constrangido pela vontade do Se
nhor, Jer. 20:7-9.
Quando o profeta tinha a certeza de que havia sido
comissionado pelo Senhor, a experiência da chamada e da
48. 48 A. R. C R A B T R E E
comunicação espiritual com Deus influenciou profunda
mente o seu ministério profético e fortaleceu a mensa
gem para com os ouvintes (Cp. Jer. 20:9).
Memórias
Estas narrativas autobiográficas aparecem na for
ma de prosa, mas encontram-se nelas, de vez em quando,
alguns breves oráculos pessoais, 6:8-13; 8:1,5-8, 12-15.
No capítulo 6 Isaías conta uma das mais importantes
narrativas autobiográficas em tôda a literatura profética.
É a história da experiência pessoal com o Senhor quando,
por meio da visão inaugural, o jovem sentiu-se vocacio
nado e comissionado como mensageiro do Santo de Israel.
Biografia Profética
Esta forma da literatura profética consta de narra
tivas escritas sôbre as atividades do profeta por outra
pessoa, como 7:1-17; 20:1-6; 36:1-39:8. Mas há opiniões
diferentes a respeito dos capítulos 36-39. Alguns escrito
res pensam que a primeira passagem, 7:1-17, foi origi
nalmente autobiográfica, e foi mudada em biográfica por
algumas pequenas mudanças do texto, dando a entender
que é a mensagem de Isaías, mas escrita por outra pessoa,
Mas o profeta certamente podia escrever na terceira pes
soa sôbre as suas próprias experiências. Encontram-se
também oráculos em algumas destas narrativas biográ
ficas, como 37:22-29; 38:10-20. Algumas destas passa
gens biográficas apresentam problemas críticos que serão
discutidos no comentário.
V. O Texto Massorético e o Rôlo do Mar Morto
O nosso comentário baseia-se quase que inteiramente
no hebraico do Texto Massorético datado em 895, e guar
dado atualmente no Cairo. Seguimos, de vez em quando,
49. A P R OFE CI A DE ISAÍAS 49
o texto sugerido na margem da Bíblia Hebraica, editada
por Rud. Kittel da American Bible Society, ou outras
versões aprovadas por alguns dos mais eruditos comen
taristas. Não temos exemplares dos outros dois manus
critos antigos guardados em Alepo e Leninegrado, mas
apenas algumas referências dos mesmos em outras obras.
Temos um exemplo dos LXX que consultamos freqüen
temente .
Passaram-se quinze séculos desde o tempo do profeta
Isaías até à publicação do Texto Massorético da sua pro
fecia. Êste texto foi transmitido através dos anos com
muito cuidado e fidelidade. Mas no correr dos anos o
texto original inevitàvelmente sofreu algumas pequenas
modificações na transmissão, devido aos erros dos copis
tas, e talvez, em raros casos, devido ao esforço de escla
recer textos difíceis ou duvidosos. Mas são poucos os
exemplos dos textos cujo sentido é duvidoso ou inexpli
cável .
As versões do grego, latim, siríaco e aramaico podem
oferecer um pouco de auxílio no estudo do texto hebraico,
quando o sentido do texto não fôr bem claro, mas devem
ser usadas com cuidado.
Entre a descoberta de manuscritos bíblicos na caverna
de Ain Feshca, perto do Mar Morto, em 1947, havia um
manuscrito de Isaías quase completo, e outro que pre
serva mais ou menos a têrça parte da profecia. O pri
meiro dêstes é geralmente conhecido como O Rôlo de
Isaías do Mosteiro d,e São Marcos, de Jerusalém, mas agora
pertence ao govêrno de Israel. Êste manuscrito concorda,
em geral, com o Texto Massorético. Mas apresenta al
gumas poucas variações, importantes no estudo do texto.
Os tradutores da Revised Standard Version preferiram
treze destas variações em lugar do Texto Massorético.
O manuscrito incompleto de Isaías segue mais de perto
50. 50 A. R. C R A B T R E E
o Texto Massorético, e tem pouco valor no estudo de pas
sagens difíceis do hebraico.
Mas êstes manuscritos, datados agora na última parte
do segundo século, ou na primeira parte do primeiro sé
culo antes de Cristo, são os mais antigos exemplos do
texto da profecia, e concordam notàvelmente com o texto
tradicional.
51. Análise dos Capítulos 1-39
Há quatro divisões principais dêstes capítulos: I.
Capítulos 1-12; II. 13-27; III. 28-35; IV. 36-39.
ESBÔÇO MAIS COMPLETO DÊSTES CAPÍTULOS, 1:1-39:»
I. A Infidelidade de Judá e Jerusalém, 1:1-5:29
A . O Sobrescrito, 1 :1
B. A Controvérsia do Senhor com o Seu povo,
1:2-31
1. A Ingratidão do Povo de Israel, 1:2-3
2. A Nação Pecaminosa, 2:4-9
3. A Palavra do Senhor sôbre a Religião
e a Vida, 1:10-17
4. Arrependei-vos, 1:18-20
5. Lamento sôbre Jerusalém, 1:21-23
6. O Julgamento da Parte do Senhor,
1:24-26
7. A Operação da Justiça Divina na Vida
de Israel, 1:27-31
8. A Vinda dos Povos ao Senhor de Sião,
2:1-5
C. O Castigo da Idolatria e do Orgulho Humano
no Dia do Senhor, 2:6-22
D . O Julgamento Divino de Jerusalém e de Judá,
3:1-15
1. A Anarquia Social, 3 :l-7
2. O Povo Arruinado, 3:8-12
3. Os Esmagadores do Povo, 3:13-15
52. 52 A. R. C R A B T R E E
E. As Mulheres Altivas de Jerusalém, 3:16-4:1
F. A Beleza e a Glória de Sião Purificada, 4:2-6
G. Um Cântico d.a Vinha do Senhor, 5:1-7
H. Ais Contra os Perversos, 5:8-30
II. Resguarda o Testemunho, 6:1 - 8:18
A. A Visão Inaugural de Isaías, 6:1-13
B. Isaías e a Guerra Siríaco-Efraimita, 7:1-8:15
1. Sinal de Sear-Jasube, 7:1-9
2. Sinal de Emanuel, 7:10-17
3. A Invasão Iminente, 7:18-25
4. Sinal de Maher-Shalal-Hash-Baz, 8:1-4
5. Os Dois Rios Simbólicos, 8:5-8
6. A Fé do Profeta no Senhor Emanuel,
8:9-10
7. O Temor do Homem e o Temor de Deus,
8:11-15
C. Isaías Cessa as Atividades Proféticas, 8:16-18
III. Superstições dos Vacilantes na Fé, 8:19-9:1
A. Admoestações Contra o Espiritismo, 8:19
B. À Lei e ao Testemunho, 8:20; 9:1
C. O Reino Messiânico, 9:2-7
D. O Julgamento de Efraim Apresenta uma Li
ção para Judá, 9:8-10:4
IV. Não Temas a Assíria, 10:5-12:6
A. A Ameaça Arrogante da Assíria, 10:5-34
1. A Jactância da Assíria, 10:5-16
2. A Labareda do Senhor Consumirá as
Florestas da Assíria, 10:17-19
53. A P R O F E C IA DE 1SAÍAS 53
3. Um Resto de Israel e Judá Voltará ao
Senhor, 10:20-23
4. Sião Será Liberto do Jugo da Assí
ria, 10:24-27
5. O Invasor Aproxima-se, 10:28-32
6. A Humilhação dos Invasores Orgulho
sos, 10:33-34
B. O Reino Pacífico e Justo d,o Messias, 11:1-16
1. O Rebento de Jessé, 11:1-9
2. O Messias e a Nova Glória de Israel,
11:10-16
C. Culto de Louvor pela Restauração de Israel,
12:1-6
O Julgamento de Reinos e de Povos, 13:1-23:18
A . O Destino da Babilônia, 13:1-22
B. A Quedai do Tirano dais Nações, 14:1-23
C. O Propósito do Senhor na Destruição da
Assíria, 14:24-27
D. A Alegria Prematura dos Filisteus, 14:28:32
E . Oráculo Concernente a Moabe, 15:1-16:14
F . Oráculo sôbre a Aliança de Israel e a Síria,
17:1-11
1. Oráculo Concernente a Damasco, 17 :l-6
2. Abandono dos ídolos, 17:7-8
3. Segurança Falsa, o Culto de ídolos,
17:9-11
G. O Poder Mundial Se Levanta e Cai, 17:12-14
H. Profecia Contra o Egito, 18:1-20:6
1. Resposta do Profeta aos Emissários
da Etiópia, 18:1-7
54. A. R. C R A B T R E E
2. Profecia Contra o Egito, 19:1-15
3. Judá e o Senhor Javé, um Terror para
os Egípcios, 19:16-17
4. Os Egípcios e os Assírios Adorarão ao
Senhor, 19:18-25
5. Evita Alianças Políticas com Estran
geiros, 20:1-6
I. Uma Visão da Queda da Babilônia, 21:1-10
J. Oráculo Concernente a Dumá, 21:11-12
K. Oráculo Concernente a Arábia, 21:13-17
L. A Leviandad,e Religiosa dos Moradores de
Jerusalém, 22:1-14
M. A Degradação de Sebna, 22:15-25
N. A Profecia Contra Tiro, 23:1-18
1. Oráculo Concernente a Tiro e Sidom,
23:1-14
2. A Restauração de Tiro Depois de Se
tenta Anos, 23:15-18
Despertai e Cantai, os Que Habitais no Pó,
24:1-27:13
A. O Bom Efeito do Castigo de Israel, 24:1-23
1. A Terra Ficará Desolada por Causa do
Pecado dos Habitantes, 24:1-12
2. Um Clamor de Confiança, 24:13-16a
3. A Grande Catástrofe, 24:16b-20
4. O Julgamento e a Nova Era, 24:21-23
B. Maravilhas das Atividades do Senhor, 25:1-12
1. Salmo de Gratidão pelo Livramento
do Povo, 25:1-5
2. Profecia da Idade Messiânica, 25:6-8
55. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 55
3. Hino de Louvor pela Humilhação de
Moabe, 25:9-12
C. Um Pedido de Salvação Mais Perfeita,
26:1-19
1. Gratidão pela Vitória, 26:1-6
•2. O Povo Espera Ansiosamente os Juizes
Retos do Senhor, 26:7-10
3. As Bênçãos da Disciplina e da Orien
tação Divina, 26:11-15
4. Experiências Tristes Que o Povo So
freu Antes da Sua Redenção, 26:16-18
5. Os Teus Mortos Viverão, os Seus Cor
pos Ressuscitarão, 26:19
D. Conclusão da Mensagem de Aspirações e Es
peranças, 26:20-27:13
1. O Povo Deve Esconder-se até Que
Passe o Julgamento Divino, 26:20-21
2. A Punição dos Podêres Cruéis do Mun
do, 27:1
3. Cântico da Vinha do Senhor, 27:2-6
4. A Significação da Disciplina de Israel,
27: 7-11
5. Uma Profecia da Restauração dos Des
terrados de Israel, 27:12-13
VII. Não Escarneçais, Agravando, Assim, os Vossos
Grilhões, 28:1-32:20
A. O Castigo Certo de Efraim e Judá, 28:1-29
1. A Queda da Capital de Israel, 28:1-6
2. Bêbedos entre os Sacerdotes e Profetas
de Jerusalém, 28:7-13
56. 56 A. R. C R A B T R E E
3. A Aliança com a Morte e com o Sheol,
28:14-22
B . A Providência do Senhor em Relação ao Seu
Povo, 28:23-29
C. A Obra Maravilhosa do Senhor, 29:1-14
1. A Humilhação e o Livramento de Je
rusalém, 29:1-8
2. A Cegueira e a Hipocrisia do Povo,
29:9-12
3. A Religião Meramente Convencional
Perecerá, 29:13-14
D. A Rejeição da Segurança da Fé no Senhor,
29:15 - 30:17
1. A Repreensão dos Conspiradores,
29:15-16
2. A Redenção de Israel, 29:17-24
3. A Infidelidade de Judá na Aliança Po
lítica com o Egito, 30:1-7
4. No Sossêgo e na Confiança a Vossa
Fôrça, 30:8-17
E. O Poder do Deus Invisível, 30:18-31:9
1. Promessa para o Povo Sofredor de
Sião, 30:18-26
2. Será Destruído o Inimigo do Povo de
Deus, 30:27-33
3. A Fôrça de Cavalos e o Poder do Se
nhor, 31:1-3
4. O Senhor dos Exércitos É o Defensor
de Jerusalém, 31:4-9
57. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 57
F. A Comunidade Ideal na Idade Messiânica,
32:1-8
1 . 0 Estabelecimento do Govêrno Mes
siânico, 32:1-2
2. A transformação Espiritual do Povo
na Idade Messiânica, 32:3-5
3. Contraste entre os Característicos do
Fraudulento e do Honesto, 32:6-8
4. Advertência Contra as Mulheres de
Jerusalém, 32:9-14
5. 0 Poder Transformador do Espírito
na Idade Vindoura, 32:15-20
VIII. A Recompensa Divina, 33:1-35:10
A. A Aflição e o Livramento de Jerusalém,
33:1-24
1. O Apêlo ao Senhor Contra os Opresso
res dos Judeus, 33:1-13
2. Efeitos da Manifestação da Presença
do Senhor, 33:14-24
B. A Indignação do Senhor Contra Tõdas as
Nações, 34:1-17
C. A Felicidade de Sião no Futuro, 35:1-10
IX. A Influência de Isaías no Reino de Ezequias,
36:1-39:8
A. Senaqueribe Exige a Capitulação de Jerusa
lém, 36:1-37:4
B. O Rei Ezequias Recebe o Conselho do Pro
feta Isaías, 37:5-7
58. A. R. C R A B T R E E
C. A Carta do Rei da Assíria, 37:8-13
D. A oração de Ezequias, 37:14-20
E. O Profeta Aconselha e Conforta Ezequias,
37:21-29
F. Sinal para os Sobreviventes, 37:30-32
G. O Desastre dos Assírios e a Morte de Sena-
queribe, 37:33-38
H. A Doença de Ezequias e Sua Cura Maravi
lhosa, 38:1-21
I. A Embaixada de Merodaque-Baladã Visita o
Rei Ezequias, 39:1-8
59. A PROFECIA DE 1SAÍAS
Capítulos 1-39
TEXTO, EXEGESE E EXPOSIÇÃO
I. A Infidelidade de Judá e Jerusalém — 1 :1 - 5:29
Esta primeira secção do livro consta de profecias re
cebidas do Senhor e transmitidas a Judá e Jerusalém no
primeiro período do ministério de Isaias. Nesta série
de oráculos o profeta apresenta acusações e ameaças do
Senhor contra o povo de Judá, com a promessa de mi
sericórdia divina, nas condições de arrependimento e
obediência à vontade revelada de Deus. Neste primeiro
capítulo o profeta dá ênfase aos ensinos básicos do li
vro e ao seu ministério como mensageiro de Deus.
A . O Sobrescrito — 1:1
1. A visão de Isaias, filho de Amoz, que êle viu concernente a
Judá e Jerusalém, nos dias de Uzias, Jotão e Ezequias, reis
de Judá.
O versículo é claramente o título da profecia que ter
mina com as narrativas sôbre o reino de Ezequias nos
cps. 36-39. Todavia, é mais apropriado para os primei
ros doze capítulos. Há, porém, uma série de ameaças con
tra o reino de Israel em 9:8-21, e nos capítulos 13-23 há
um grupo de oráculos contra várias outras nações. Mas
estas nações estão relacionadas, de uma ou de outra ma
neira, com a história de Judá.
60. 60 A. R. C R A B T R E E
A visão, }Í?Hi, de Isaías aparentemente indica aqui a
mensagem inteira do livro, mas êste fato não exclui o
sentido radical da palavra. O cp. 6 descreve o signi
ficado da visão na experiência do profeta. O têrmo tem
o sentido largo de ver, contemplar, perceber, sentir e ex
perimentar. Assim, todos os verdadeiros profetas do Se
nhor tinham a vocação de receber e entender a mensagem
da revelação divina, distingui-la de seus próprios pensa
mentos, e entregá-la ao povo de acôrdo com a vontade
divina.
O nome Isaías, , significa Javé é a salvação
t : “ :
ou Javé dará a salvação. Êste grande mensageiro do Se
nhor entendeu e exemplificou a significação simbólica do
próprio nome nas suas pregações. O nome do pai de
Isaías é Amoz, diferente do nome do profeta Amós.
Enquanto o profeta fala principalmente “ concernen
te a Judá e Jerusalém” , no cap. 7, e em vários outros
lugares, êle trata das relações do Reino de Israel com
Judá. Jerusalém, a cidade do profeta, a capital de Judá,
e o centro da teocracia, é considerada, às vêzes, como a
região inteira de Judá. É também distinguida de Judá,
e recebe ênfase especial no livro, 3:1, 8; 5:8; 22:21.
Alguns insistem em que a frase “ reis de Judá” é tau
tológica, e foi acrescentada depois do tempo de Isaías,
mas frases paralelas se encontram nos títulos dos livros
de Jeremias, Oséias, Amós e Miquéias.
B . A Controvérsia do Senhor com o Seu Povo, 1 :2-31
É fato significativo a posição do profeta no meio da
história do povo escolhido. A bondade do Senhor não ti
nha despertado o espírito de gratidão no íntimo dos filhos
de Judá, e o castigo disciplinar não os tinha levado ao
61. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 61
arrependimento e à obediência. Contudo, o Senhor Javé,
110 seu amor imutável, não podia desampará-los, mas le
vantou profetas para admoestar ao povo de Judá sôbre o
perigo da destruição daqueles que persistem na rebelião
contra o seu Deus, e a calamidade do desprêzo da pala
vra divina claramente revelada por intermédio dos men
sageiros do Senhor.
0 profeta explica neste capitulo a controvérsia do
Senhor com o seu povo de Judá. Judá está sofrendo as
conseqüências da sua rebelião contra o Senhor, mas não
quer aprender a lição do seu sofrimento. 0 profeta de
nuncia o culto que o povo de Judá julga agradável a Deus
e esclarece o espírito da religião verdadeira. Não obstan
te a sua infidelidade, o povo ainda pode voltar-se para o
Senhor.
1. A Ingratidão do Povo de Israel, 1:2-3
2. Ouvi, ó céus, e dá ouvidos, ó terra;
porque o Senhor é quem fala:
Criei filhos, e os engrandeci,
mas êles se rebelaram contra mim.
3. O boi conhece o seu possuidor,
e o jumento a manjedoura do seu dono:
mas Israel não conhece,
o meu povo não entende.
Êstes dois versículos poéticos constituem a introdu
ção de uma série de mensagens recebidas do Senhor,
apresentando, ao mesmo tempo, a razão básica da terrí
vel denúncia de Judá. Os céus e a terra são chamados
para testemunhar a acusação do Senhor contra o seu
povo. É uma introdução profundamente significativa.
Moisés começou o seu cântico de Deut. 32:1-43 com o
mesmo apêlo aos céus e à terra. Quando o Senhor ofe
receu ao seu povo a liberdade de escolher entre a bên
62. 62 A. R. C R A B T R E E
ção e a maldição, entre a obediência e a desobediência,
êle chamou os céus e a terra como testemunhas, Deut.
30:19. Segundo Amós 3:9 e Miquéias 6:2, o procedimen
to revoltoso de Israel é publicado aos exércitos dos céus
e aos habitantes da terra. A rebelião contra o Senhor tor
na-se mais grave à luz da verdade de que a sua glória en
che os céus e a terra, Is. 6:3; Amós 4:13. É o Todo-
Poderoso quem opera na História para conseguir o seu
eterno propósito, Is. 10:5.
Porque é Javé quem fala. É o grande EU SOU, rPHií
mas para Moisés, os profetas e os israelitas êle é Javé
(Jeovah), mPP , ÊLE É.
Criei e engrandeci filhos. A forma dêstes dois ver
bos no hebraico é intensiva. Os têrmos são sinônimos,
mas no uso de palavras sinônimas, a segunda geralmen
te avança o sentido da primeira. A primeira palavra aqui
descreve o processo de criar e educar carinhosamente o
filho; a segunda refere-se à alta posição do filho bem
treinado. Assim o Senhor gerou o seu filho, libertando-
o da escravidão do Egito. Deu-lhe a independência como
povo, com as suas próprias leis; plantou-o na sua própria
terra, e levantou profetas para lhe transmitir as eternas
verdades da revelação divina. Além de tudo isto, o Se
nhor lhe deu a incumbência de preservar e entregar às
nações da terra as verdades eternas recebidas do Se
nhor.
Através da História o Senhor tratou o seu povo es
colhido como filho querido. Êste versículo no princípio
da mensagem severa do profeta, bem como Oséias 11:1-4,
refuta a opinião popular de que o ensino da paternidade
de Deus apresenta-se somente em o Nôvo Testamento.
Aqui o Senhor fala como pai, comovido pelo sentimen
to de pesar despertado pela insensibilidade e a infidelida
de de Israel, e do sofrimento que está trazendo sôbre si
63. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 63
mesmo pela rebelião contra o seu Deus, de santidade, jus
tiça e amor. Na sua infidelidade o povo tinlia perdido
i? capacidade de discernir ou avaliar o amor imutável
do seu Deus.
Foi assim que o filho Israel correspondeu ao amor
paterno do seu Deus. Esta palavra yti*E , significa ram-
“ T
per relações com alguém, ou separar-se completamente
dêlc. Assim Israel se rebelou contra a casa de Davi, I
Heis 12:19. Pela própria vontade, e até com violência,
Judá tinha rompido a sua própria relação com o seu Se
nhor. Apesar do amor de Deus que o povo tinha experi
mentado através da História, e não obstante a promessa
solene da fidelidade (Êx. 1,9:8), o filho revoltoso renun
ciou ao amor imutável do Senhor e abandonou o seu
Deus.
Havendo violado o concêrto de Deus, e cortado os
laços que o prendiam ao Senhor, Israel tinha perdido
o seu sentido moral, e a capacidade de reconhecer a gra
vidade do seu pecado. Com a persistência na rebelião, o
povo tinha perdido a capacidade de arrepender-se e vol
tar ao Senhor. Desde o tempo de Davi e Salomão, o espí
rito revoltoso do povo em geral tornava-se cada vez mais
forte. Os reis Asa e Joás se esforçaram para fazer uma
reforma religiosa entre o povo, mas com poucos resul
tados. Os reis, os ricos e o povo em geral tinham caído
tão completamente na imoralidade, que praticavam, sem
escrúpulo, a injustiça, a corrupção e a idolatria. Rejei
tavam a palavra dos mensageiros do Senhor e entrega
vam-se de coração ao serviço agradável dos deuses es
tranhos. Isto também acontece com todos que se esque
cem de Deus.
0 profeta acentua a tragédia da ingratidão de Israel
pelo contraste com a fidelidade instintiva dos animais do
mésticos aos seus donos. Até o boi conhece o seu dono.
64. 64 A. R. CRABTREE
Esta palavra, y p é muito rica nos seus vários sentidos.
Usa-se aqui no sentido de conhecer por experiência. O
animal doméstico conhece instintivamente a bondade do
seu dono. Trabalha docilmente no serviço do homem, e
dêle recebe sustento. Não tem qualquer propensão de
mudar o seu modo de viver e servir, ou de recusar obe
decer fielmente à vontade do dono. Também pela expe
riência o jumento tem conhecimento, pelo menos, da
manjedoura do seu possuidor.
Israel deve ter profundo conhecimento filial do Se
nhor, o conhecimento entranhável do amor do seu Deus,
mas tinha perdido até o sentido de gratidão, característi
co do animal doméstico. Não entende, r a , não tem con
sideração, não reconhece mais que são filhos do Senhor
Javé, que a sua própria existência e a sua felicidade de
pendem da graça de Deus (Jer. 5:24).
2. A Nação Pecaminosa, 2:4-9
4. Ah! nação pecaminosa,
povo carregado de iniqüidade,
descendência de malfeitores,
filhos corruptores !
Êles abandonaram o Senhor,
desprezaram o Santo de Israel,
afastaram-se para, trás.
Nota-se a mudança do ritmo nesta poesia de lamen
tação. O Senhor tinha falado pelo profeta e acusado os
seus filhos de rebelião. Mas nesta lamentação do Pai,
acentua-se ainda mais a tragédia da revolta de Judá. Há
neste versículo quatro substantivos para designar os re
voltosos: nação, povo, semente, filhos.
As nações vizinhas ignoravam a revelação divina
que os israelitas tinham recebido por intermédio dos
65. A P R O F E C IA DE ISAÍAS 65
mensageiros do Senhor. Mas Deus, o Pai de Israel, de
clara neste versículo que o seu próprio povo se tornara
"nação pecaminosa” em vez de uma nação santa; “ povo
iníquo” ou “ perverso” em vez de um povo justo; “ se
mente de malfeitores” em vez de a descendência do povo
escolhido do Senhor; “ filhos que praticam a corrupção”
em vez de filhos do amor imutável do seu Pai.
A palavra Ah! descreve o sentimento de dor do Pai
abandonado pelos filhos, e não se refere aqui ao sofri
mento de Judá, segundo a nossa interpretação, mas pode
significar o ai do povo pecaminoso. 0 participio NI2'P1
declara que a nação vai errando repetidamente o alvo
da sua vocação. 0 povo é sobrecarregado, * 0 3 ,oprimi-
li # v v
do de perversidade, ou atos malignos. Os filhos da
T
casa do Pai degeneraram, tornaram-se crimino-
— T
sos. Abandonaram, 2tV > o Senhor, desprezaram,
- t - T
ou rejeitaram com desdém “ o Santo de Israel” , o seu
próprio Deus. A frase, o Senhor de Israel, usada freqüente
mente pelo profeta Isaías, originou-se evidentemente com
a experiência na visão inaugural no Templo. A Santidade
é a natureza essencial do Senhor que o separa e o exalta
acima de tôda a criação. Pessoas e cousas são denomi
nadas santas apenas no sentido da sua separação para o
serviço do Senhor. A frase voltaram para trás não tra
duz nitidamente o hebraico que é um pouco difícil. A
forma reflexiva do verbo -flté melhor traduzida “ se es
tranharam completamente” , apostataram. Chamado
para ser um povo santo, Israel tinha recebido as provas
do amor imutável no concerto do Sénhór, mas tinha
rompido os laços que o prendiam ao Santo de Israel.
66. 66 A. R. C R A B T R E E
Não obstante o plural dos verbos no versículo cin
co, o autor personifica a nação, e descreve a sua enfer
midade como se fôsse liomem gravemente enfêrmo. Al
guns dizem que a descrição sugere o corpo de escravo
tão castigado que não há mais lugar nêle sem feridas.
Assim traduzem Hfâ “ Em que parte sereis ainda fe
ridos?” Mas, “ Por que” traduz melhor o hebraico. O
verbo HD2 significa ferir, matar, Jos. 10:26. Por que
T T
continuais a vossa rebelião, a vossa apostasia?
O povo tinha recebido bastante castigo para ser le
vado ao arrependimento. O corpo estava cheio de contu
sões, e o coração se tornara fraco e insensível. Não ha
via nada recomendável na sua vida moral e religiosa.
É desesperada a condição nacional. Havendo despreza
do o Santo de Israel, a única fonte do seu socorro, o
povo, na sua miséria, não tinha qualquer alívio ou con-
fôrto, e não manifestava qualquer desejo de voltar-se
para o Senhor.
A ferida, , com a carne rasgada deve ser atada;
a pisadura, nTlâH »deve ser amolecida com óleo; a cha
T “
ga sangradora, n v"Ü deve ser espremida e limpa,
T * * T “
para se tornar curável. Assim a nação pecadora tinha
trazido sôbre si a terrível moléstia que ameaçava des
truí-la, e não quis arrepender-se para receber a salva
ção. “ Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não
tenho prazer na morte do perverso, mas em que êle se
converta do seu caminho e viva” (Ez. 33:11; Cp. Is.
1:18).
5* Por que sereia perpetuamente feridos,
visto que continuais em rebeldia ?
Tôda a cabaça está doente,
« todo o coração enfêrmo.