Este documento descreve uma homenagem a Eugénio Lisboa, um dos maiores pensadores portugueses. Várias figuras importantes participaram do evento para celebrar a vida e carreira multifacetada de Lisboa, que teve contribuições significativas na engenharia, literatura, diplomacia e tradução. O livro resultante da homenagem contém depoimentos de diversas pessoas sobre como Lisboa continua sendo relevante por questionar tendências dominantes.
Homenagem a Eugénio Lisboa, influente pensador português
1. 36 homenagem Eugénio Lisboa
Lisboa
de muitas faces
Homem multifacetado, nos saberes
e no percurso, um dos grandes pensadores
portugueses vê-se reconhecido no livro
Eugénio Lisboa: Vário, Intrépido
e Fecundo – Uma Homenagem.
texto João Morales
E
ngenheiro de formação, se dissermos que foi universo da engenharia, das empresas de petróleos,
o responsável pela projecção da rede eléc- mas também pela diplomacia, com responsabilidade na
trica de Lourenço Marques (actual Maputo, edição em Inglaterra (onde esteve 17 anos) de autores
capital da sua terra natal, Moçambique) está basilares da língua portuguesa: «obras de Eça, Pessoa,
encontrada uma boa metáfora para abordar Régio, José Rodrigues Miguéis, Jorge de Sena, David
a homenagem de que foi alvo um dos grandes pensado- Mourão-Ferreira, Fernão Mendes Pinto, entre vários
res portugueses vivos. Eugénio Lisboa: Vário, Intrépido outros, ganharam uma nova montra ao serem vertidos
e Fecundo – Uma Homenagem, livro organizado por para inglês graças ao esforço conjunto (por vezes tena-
Otília Pires Martins e Onésimo Teotónio Almeida císsimo) de Eugénio Lisboa e [L. C.] Taylor», recorda
(edição da Opera Omnia), foi apresentado em Outu- Júlio Conrado.
bro, numa concorrida sessão que lhe foi dedicada, na João Bigotte-Chorão salienta o comunicador, não
Universidade de Aveiro. obscurecido pelo académico: «Quem conheça Eugénio
A sessão (organizada pela citada dupla de acadé- Lisboa apenas dos seus escritos – claros, lúcidos e de
micos que coordenou a antologia e apadrinhada pelo larga informação – talvez ignore que na conversa do
actual Reitor da Universidade de Aveiro, Manuel As- dia-a-dia ele mostra os mesmos predicados. O escri-
sunção) contou com a presença de alguns dos autores tor é também um grande conversador – vivo, irónico e
dos depoimentos (no livro são sete dezenas) – no palco acutilante», desvenda-nos, confirmando a desconfiança
e na plateia – e de outras figuras que se associaram ao sobre como a comunicação é, na figura de Lisboa, um
acto, como o secretário de Estado da Cultura, Francisco elemento de prazer e nunca de obrigação ou ostentação,
José Viegas; Maria de Jesus Barroso (que leu poesia de razão pela qual a informação flui em registo de tertúlia
Eugénio Lisboa) ou Amélia Muge (que a cantou). descomprometida, independentemente do grau de exi-
gência e conhecimentos envolvidos.
Várias eVocações
Muitas são as figuras envolvidas nesta edição. Ernesto PalaVras de Vida
Rodrigues, autor da que dá o título, começa por expri- Se o encontro serviu para evocar o percurso de um
mir como «aos 80 anos, Eugénio Lisboa é o nosso mais homem dedicado de igual forma às letras e às ciências
jovem e variado ensaísta». A vida do homenageado ditas exactas, foi igualmente destacada a sua defesa de
presta-se ao autêntico mosaico evocado, com passagem uma cidadania activa e dinâmica, mas também a cla-
pela Universidade, pela crítica literária, pela poesia, pelo rividência ao debruçar-se sobre autores e criações que
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o secretário de nem sempre alinham nas tendências
estado, Francisco dominantes – quem não se rege pela
José Veigas; o
reitor, Manuel
moda está sempre actual.
assunção e o Naturalmente, este é um livro
homenageado de afectos e, como tal, de cumpli-
assistem às cidades. É o caso do episódio rela-
intervenções
tado por Carlos Adrião Rodrigues
(falecido antes da conclusão deste
projecto), dando conta do papel
de Eugénio Lisboa no julgamento
de Virgílio de Lemos, onde a sua
dissertação sobre o papel dos sím-
bolos tradicionais na poesia é fun-
otília Pires damental para que este seja ilibado.
Martins e O cenário é Moçambique, início da
onésimo Teotónio
de almeida, a du- década de 60, e o poeta era acusado
pla organizadora de ofensas à bandeira nacional, por
da homenagem se lhe ter referido como “capulana
verde e vermelha”.
E Adrião Rodrigues prossegue
no relato inaudito ao contar-nos
que, após absolvição em várias ins-
tâncias legais, uma carta à Polícia
Política pedia a devolução dos li-
vros, retidos pela Lei. Extraviados
os exemplares – resposta oficial –
eugénio lisboa, decidiu avançar com novo pedido;
à conversa com
onésimo Teotónio
uma indemnização ao autor. O seu
almeida e José espanto foi desmedido, quando
Manuel costa, recebeu o cheque de cinco contos:
editor da opera «deve ser o único caso em que a
omnia
PIDE pagou livros apreendidos».
Dia 15 de Dezembro o livro vai
ter uma segunda sessão de apresen-
tação (na livraria Ler Devagar, LX
Factory, em Lisboa), oportunidade
para escutar os organizadores des-
ta homenagem explicarem a razão
de tão grande unanimidade em
amélia Muge redor da figura de Eugénio Lisboa.
cantou a poesia de
eugénio lisboa
E discreto poeta, como já se disse.
Meditava ele, numa entrevista pu-
blicada em Artes entre as Letras, em
Novembro de 2010, incluída como
anexo: «O poeta – em sentido for-
mal – tem, em mim, aparecido pou-
co e quase clandestinamente. Eu sei
que ser-se discreto, em Portugal, sai
caro: quando falamos em voz baixa,
o silêncio dos outros, a nosso respei-
to, é garantido». ¶
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