O documento discute os desafios logísticos da região amazônica, especialmente em Manaus. Aponta a dependência do modal hidroviário e a morosidade causada pela burocracia e falta de infraestrutura nos portos e aeroportos para a liberação de mercadorias. Defende investimentos em novos terminais portuários e na ponte sobre o Rio Negro para estimular o desenvolvimento regional e reduzir os custos logísticos, atualmente em torno de 20% do faturamento das empresas.
Sinalizar esta mensagem O Amazonas tem que despertar para a logística
1. INFRAESTRUTURA
Chico Batata
O Amazonas tem que
despertar para a logística
Gargalo na liberação de mercadorias, reclamações quanto aos serviços e
dependência do modal hidroviário são alguns dos aspectos que causam
morosidade à logística de uma das regiões que mais crescem no Brasil
A
ndar pelas ruas de Manaus são, a obra, que teve início em ja- chegar a Manaus devido à corren-
e conversar com a popula- neiro de 2008 e tem previsão de ser teza. Com o advento da ponte, as
ção causa certa estranheza. concluída no próximo mês de ou- cargas serão retiradas do porto,
É comum as pessoas se referirem ao tubro, ligará a capital do estado às transbordadas para caminhões e
restante do país na terceira pessoa. cidades amazonenses de Iranduba, entregues na capital em 50 minu-
Mais comum ainda é escutar de al- Manacapuru e Novo Airão. Para o tos”, explica. Vale lembrar que a
guns moradores que nas férias irão presidente da Comissão da Indús- distância entre os dois municípios
passear pelo Brasil. Trata-se de uma tria, Comércio e Turismo do estado é de 86 quilômetros.
brincadeira, mas que traduz a sensa- do Amazonas, Francisco Souza, o O presidente da comissão res-
ção de isolamento presente no dia empreendimento tem uma impor- salta outra vantagem da ponte. “Os
a dia daqueles que vivem numa das tância muito grande em termos de insumos que chegam ao Polo Indus-
regiões que mais traduzem para os logística e desenvolvimento para trial de Manaus (PIM) provenientes
estrangeiros o que é o Brasil. a região. “A ponte irá gerar outra da Ásia vêm pelo Atlântico e gas-
Algumas ações já estão sendo Manaus”, diz. tam cerca de 60 dias para chegar.
colocadas em prática para mini- Souza explica. “Há um porto em A ponte permitirá que os produtos
mizar os efeitos desse isolamento. Manacapuru. Hoje, uma embarca- sejam recebidos no estado do Acre,
A ponte sobre o Rio Negro é uma ção que parte carregada dessa cida- via Peru, sejam transportados pela
delas. Com 3.600 metros de exten- de demora de 18 a 20 horas para Transoceânica, a BR 317, e depois
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2. venham pelo Rio Purus, afluente “Muita gente fala que a Amazônia
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do rio Solimões, até Manacapuru”, é distante, mas isso não é verdade,
conta. Segundo ele, o tempo gasto uma vez que, na logística global, o
com a utilização dessa rota será de que se diz é que existe uma indepen-
20 dias e o custo com transporte dência de localização, ou seja, as in-
para as empresas do PIM será redu- dústrias são instaladas levando em
zido em cerca de US$ 2 bilhões por consideração aspectos como mão de
ano. “É necessário, contudo, que obra, incentivos fiscais e mercado,
o trecho peruano da Interoceânica por exemplo”, frisa.
seja concluído e a hidrovia do rio O executivo é mais enfático. “A
Purus seja formatada”, afirma. distância da Amazônia para os prin-
Apesar de ainda necessitar de in- cipais centros e o transporte não
fraestrutura complementar para se são impeditivos logísticos para a re-
tornar de fato uma opção logística gião”, define. Para ele, o transporte,
que integre por completo a região, a bem ou mal, será realizado, já que
Para Souza, ponte sobre o Rio Negro
ponte já estimula a economia local. o aeroporto local permite o aces-
estimulará o desenvolvimento
“Já há 12 grandes indústrias interes- so a qualquer tipo de aeronave, o
sadas em instalar suas operações do modal rodo-fluvial, apesar de uma verde é desembaraçada automatica-
outro lado do rio, região que, hoje, logística confusa, será realizado e mente, sem qualquer verificação. O
já responde por 98% da indústria os problemas podem ser superados canal amarelo significa conferência
cerâmica – tijolo e telha – no estado com investimentos. Na opinião de dos documentos de instrução da
do Amazonas. A ponte estimulará o Barreto, os verdadeiros gargalos Declaração de Importação (DI) e das
desenvolvimento”, salienta Souza. são a burocracia e a infraestrutura informações constantes na declara-
dos terminais de liberação. “Nosso ção. No caso de seleção para o canal
Os embarcadores grande problema, hoje, está no mo- vermelho, há, além da conferência
mento em que as cargas chegam a documental, a conferência física da
As indústrias veem o cenário de Manaus e têm que sair do aeropor- mercadoria. Finalmente, quando a
maneira mais macro. A localização to, do porto ou dos terminais de ar- DI é selecionada para o canal cinza,
do estado mais uma vez marca o dis- mazenagem para irem até o estoque é realizado o exame documental, a
curso. O coordenador da Comissão da fábrica.” No caminho inverso verificação física da mercadoria e a
de Logística do Centro da Indústria também há impeditivos. Segundo o aplicação de procedimento especial
do Estado do Amazonas (Cieam), coordenador, é preciso haver velo- de controle aduaneiro, para verifi-
Augusto César Barreto, tem uma cidade no processo burocrático para cação de elementos indiciários de
pronta resposta quando questiona- a liberação dos produtos. Atualmen- fraude, inclusive no que se refere ao
do sobre o quão longe é a região. te, uma encomenda que chega a preço declarado da mercadoria.
Manaus, por via aérea, proveniente De acordo com o executivo, os
de São Paulo, demora três dias para fiscais se esforçam para realizar o
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ser liberada. trabalho, mas não há recursos –
O processo é longo. A carga che- mão de obra, equipamentos, siste-
ga e precisa ser liberada pela Recei- mas e espaço para armazenagem.
ta Federal – já que a maior parte “O aeroporto de Manaus deveria
do que é recebido vai para o PIM e, operar 24 horas por dia, sete dias
segundo a Suframa, 70% são cargas por semana, mas ele funciona de
importadas –, depois pelo Minis- segunda a segunda, das 8h às 17h”,
tério da Agricultura e, se precisar, reclama. Os gargalos já aumentam
pela Agência Nacional de Vigilância os custos logísticos. Barreto conta
Sanitária (Anvisa). Depois disso, a que as indústrias do PIM faturaram
Receita vincula a carga aos denomi- em 2009, juntas, US$ 25 bilhões,
nados canais, que podem ser verde, gastando apenas com transporte
amarelo, vermelho ou cinza. A im- 3% do faturamento bruto. Se leva-
Barreto: burocracia é o principal gargalo portação selecionada para o canal das em consideração todas as eta-
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3. INFRAESTRUTURA
pas do processo, os custos logísti- Terminais portuários
cos chegam a 10%, podendo atingir Mesmo com maior
até 20% em alguns setores. Os operadores portuários se de-
Para o coordenador, o problema transit-time, é preferível fendem. O Administrador Portuá-
não é pontual; não existe um único rio do Porto Chibatão, José Luiz de
culpado, pois o problema é sistêmi- trazer as cargas Souza Batista, diz que a demora na
co. “Na minha opinião, é preciso liberação das cargas não diz respei-
que um único órgão acompanhe pelo rodofluvial, to ao porto, e sim à Receita Federal.
esses agentes a fim de controlar e “Tenho área e máquinas suficientes
administrar todos os processos. É pois o tempo de para as operações. Hoje, de tudo o
mais barato resolver o problema de que movimentamos, cerca de 7% é
liberação das mercadorias do que desembaraço é menor canal vermelho. O interesse da em-
investir em rodovia, sinalização presa é que haja rotatividade no pá-
de hidrovias e melhorar a pratica- tio. Não temos problema de espaço
gem”, enfatiza. para estocar, pois operamos apenas
Enquanto isso não ocorre, ex- a pior possível. “Do preço final de com 60% do pátio ocupado. Hoje,
plica, os embarcadores, para supe- uma mercadoria, o custo logístico movimentamos 13 mil TEUs por
rar os gargalos, terão que investir contribui entre 8% e 15%, chegan- mês”, informa.
internamente na estrutura logísti- do a 25% se o modal aéreo for uti- O Chibatão é um porto privado
ca, em treinamento e sistemas para lizado”, diz. com um cais flutuante de 431 me-
minimizar a burocracia. Outra ini- “De São Paulo a Manaus de na- tros de comprimento, com capa-
ciativa, ainda sem previsão, é com- vio são dez dias, e são cobrados R$ cidade para atracar quatro navios
por no PIM uma gestão logística 7 mil por contêiner, mas as empre- simultaneamente. A área privada
unificada, a fim de gerar volume de sas demoram 30 dias para receber conta com 125 m 2 e capacidade para
transporte. Hoje, a gestão é realiza- a carga adquirida. Já se trouxer- 8.500 TEUs estáticos. A secundária
da por empresa. mos de carreta, utilizando rodovia tem 200 mil m 2 e há uma terceira de
e rio, são cobrados R$ 13 mil por 90 mil m 2 em fase final de alfande-
Entregas cada carreta embarcada na balsa, e gamento, com previsão de iniciar as
as mercadorias são entregues em 20 operações no final do mês de junho
Ralph Assayag, presidente da dias, pois, assim que são desembar- e capacidade para sete mil TEUs es-
Federação das Câmaras de Dirigen- cadas, são entregues. Então, às ve- táticos.
tes Lojistas do Estado do Amazo- zes é preferível vir de carreta, pois Os investimentos previstos para
nas (FCDL-AM), setor que recebe evita-se que as mercadorias fiquem o triênio 2008-2010, cerca de US$
as cargas fracionadas, afirma que a paradas nos terminais portuários”, 100 milhões, já foram concluídos.
infraestrutura logística na região é reconhece. Entre as ações, destaque para a aqui-
A federação tem posição firme sição, em 2009, da Tomiasi Trans-
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quanto ao tema. “Nossa sugestão portes, especializada na logística
para melhorar a logística é abrir pesada. O valor do negócio não foi
mais terminais portuários, setor revelado. “A ideia com a compra foi
hoje controlado por duas empresas. fazer o Grupo Chibatão partir para
Além disso, trabalhamos para que a logística integrada. Nós desem-
a BR-319, que liga Manaus a Porto barcamos a carga em nosso porto e
Velho, saia do papel”, define. O di- temos condição de entregá-la na in-
rigente pede, ainda, a privatização dústria. Não somos apenas um ope-
da administração dos aeroportos. rador portuário, somos um operador
“O custo logístico hoje representa logístico”, garante Batista.
20% no faturamento das empresas. No Porto Público da capital, ar-
Só com a abertura de novos termi- rendado em 2001 por 25 anos para
nais este número cairia para 5% e a Empresa de Revitalização do Por-
Ana Maria: é preciso colocar em aumentaríamos o volume movi- to de Manaus, são três as principais
funcionamento as hidrovias mentado em 20%”, calcula. atividades: a navegação regional,
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4. INFRAESTRUTURA
o turismo internacional e a opera- Já o Terminal Portuário das La- terno. No local, serão operados con-
ção de carga de longo curso – mo- jes, administrado pela Lajes Logís- têineres, carga geral e de projetos. O
vimentação de contêineres e cargas tica, empresa composta pela Log-In porto está projetado para operar 250
de projeto. O diretor do porto, Ales- e Juma Participações, trabalha para mil TEUs por ano e receberá cargas
sandro Bronze, informa que o ter- figurar entre os players da região. de cabotagem e longo curso. Cerca de
minal possui uma área operacional O diretor da Lajes, Laurits Hansen, 220 funcionários irão operar o termi-
de 98 mil m 2, sendo 50 mil m 2 desti- conta que o processo de licencia- nal. Inicialmente, o local será utilizado
nados à operação de carga. A capa- mento ambiental para a implanta- para cargas próprias, provenientes da
cidade estática do porto é para três ção do terminal havia sido inter- Juma e da Log-In, mas a ideia é dispo-
mil contêineres. rompido por uma medida cautelar nibilizar o espaço para a utilização de
Bronze explica que, no segmen- da justiça estadual. “Recorremos da outras companhias.
to de cargas, o trabalho consiste decisão e um juiz federal revogou a Hansen destaca que entre os dife-
em receber os contêineres dos ter- medida. Desde o dia 2 de junho já renciais do empreendimento está sua
minais privados e realizar o desem- estamos aptos a retomar o processo localização, que facilita o acesso por
baraço, operação denominada DTA, de licenciamento. As obras devem água e por terra. “Quem utilizar nos-
que leva quatro dias. O volume de ser iniciadas na segunda quinzena sa estrutura irá poupar mais de dez
contêineres operados não foi di- de agosto e concluídas em 22 me- quilômetros de navegação, em com-
vulgado. Quanto à carga de pro- ses”, acredita. paração com os terminais que ope-
jeto, são cerca de dois navios com O Terminal Portuário das Lajes terá ram hoje. Pode parecer pouco, mas,
dez mil toneladas cada por mês. “A uma área operacional de 157 mil m2, quando se fala em navegação num
carga representa 60% de nosso fatu- com um cais flutuante de 260 metros, rio em frente à capital de um estado,
ramento”, diz. O número absoluto que permitirá a operação de um navio isso faz bastante diferença no que diz
não foi revelado. no berço interno e outro no berço ex- respeito à velocidade de navegação e
O diretor divulga
que a tendência é o
porto de Manaus focar
em cargas de projeto.
Para isso, foram reali-
zados investimentos
para a aquisição de
três empilhadeiras, to-
talizando, agora, seis
equipamentos e dois
guindastes, estes em
parceria com uma em-
presa privada, um para
90 toneladas e outro
para 150 toneladas.
Além disso, o executi-
vo conta que foi rea-
lizada a verticalização
do armazém de 12 mil
m2 e aumentado o cais
flutuante em cem me-
tros, contando agora
com 364 metros. O
Divulgação
investimento total nas
melhorias começou em
2001, já foi concluído
e alcançou a cifra de R$
30 milhões. Terminal Portuário das Lajes chega para estimular a competição no setor
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5. exposição a riscos”, frisa. Além dis- Oliveira de Souza, o órgão está inse- “Há muitas alternativas para o Ama-
so, lembra o executivo, sua localiza- rido nas negociações que acontecem zonas se tornar um polo logístico.
ção evita que os navios passem pelo tanto na questão da abertura para o Pelas características da região, temos
encontro das águas, um dos cartões Pacífico utilizando a Transoceânica, efetivamente condições de colocar
postais da cidade de Manaus. Já por passando pelo Acre e Peru, quanto em funcionamento as hidrovias, mi-
terra, há um acesso de quatro quilô- na utilização da hidrovia, saindo do nimizando os problemas”, afirma.
metros ao distrito industrial sem ne- Amazonas para acessar o Pacífico pela
nhuma interferência urbana. cidade de Tabatinga (AM). Fábio Penteado
Ana Maria conta que a estrada
Poder Público em território brasileiro, no Acre, está
toda trafegável graças ao financia-
A Superintendência da Zona Fran- mento realizado pela Suframa para Centro da Indústria do Estado do Amazonas:
ca de Manaus (Suframa), autarquia a realização da obra. “O trecho com- (92) 3584-4107
vinculada ao Ministério do Desen- plicador está no Peru, que ainda não Comissão da Indústria, Comércio e Turismo:
volvimento, Indústria e Comércio foi concluído e não tem prazo”, diz. (92) 3183-4427
Exterior que administra a Zona Fran- A coordenadora é outra pessoa Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas
ca de Manaus (ZFM), exerce um papel que ressalta as dificuldades em mo- do Estado do Amazonas: (92) 3621-3515
indireto no que diz respeito às ques- vimentar as cargas na região, princi- Porto Chibatão: (92) 2129-1900
tões logísticas. Segundo a coordena- palmente na cidade de Manaus, lo- Porto de Manaus: (92) 2123-4350
dora-geral de Estudos Econômicos e calizada no centro do estado. Apesar Suframa: (92) 3182-1500
Empresariais da Suframa, Ana Maria disso, é otimista e indica uma opção. Terminal Portuário das Lajes: (92) 3308-9004