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REPRODUÇÃO
do por familiares do garoto, que
não receberam qualquer indenização. O caso ainda “tramita
na Vara da Infância e da Juventude”, segundo informações da
assessoria de imprensa
do Ministério Público do Estado do Rio
de Janeiro, que na
época flagrou diversas
outras irregularidades
nas instalações do CT usado
pelas categorias de base.
Assim como todos os clubes
formadores do Brasil, o Vasco
ficará sujeito à assinatura de
um termo de ajustamento de
conduta (TAC) caso novas irregularidades sejam verificadas
após a notificação do Ministério
Público do Trabalho, sob pena
de multa e ações judiciais.
“Os clubes que quiserem desenvolver uma categoria de base
para formar profissionais têm
de respeitar a lei. Se não tiverem condições financeiras de
respeitar os direitos adquiridos pelos adolescentes e previstos na Constituição, não
podem exercer a formação
profissional”, cravou Marques, ao ser questionado se
não temia o fechamento de
muitos clubes.
O problema foi levantado pelo presidente da
Federação Paraense de
Futebol, Antônio Carlos
Nunes. “É bom estabelecer regras, mas tem de ver
quem pode fazer isso. Tem
muito clube carente”, pondera. “Podem fechar as
portas e para onde irão
essas crianças?
Bem ou mal, o
time cuida.”
esporte
MAURICIO VAL/VIPCOMM
- DOMINGO, 24 DE MARÇO DE 2013
TRAGÉDIA: Wendel Silva tinha 14 anos quando
morreu durante um treino do Vasco, em fevereiro do ano passado
Nunes já se comprometeu
com o Ministério Público do
Trabalho a acabar com o campeonato Sub-13, que era organizado pela Federação Paraense
de maneira irregular – disputado por clubes formadores, com
características que vislumbram
a preparação de um profissional
do futebol.
A muitos quilômetros dali,
no Paraná, os times Coritiba e
Atlético Paranaense não tiveram dificuldades para cumprir
as exigências após serem notificados. “A adequação pedida
não precisa ser feita pois já estávamos de acordo. O que não
podemos é deixar de aprimorar
nossa estrutura”, disse Mário
André Mazzuco, coordenador
das categorias de base do Coritiba, que mantém 52 atletas em
seus alojamentos.
O Atlético-PR também já
estava de acordo com as exigências e havia firmado um
EXCEÇÃO: Desde a infância, Neymar foi preparado para se tornar um
craque. Na foto, o atleta durante treino da seleção brasileira Sub-17
TAC em 2012 com o Ministério Público do Trabalho do
Paraná, no qual se comprometeu a não alojar menores
de 14 anos. “A legislação
está aí para ser atendida em
sua plenitude, mas é certo
que muitos clubes, principalmente os de menor estrutura, terão dificuldades ante
os gastos envolvidos”, diz o
superintendente do Atlético-PR, Dagoberto dos Santos.
“Este é um discurso conhecido para quem se acomodou em fazer futebol à moda
antiga”, comenta o diretor-executivo da Universidade
do Futebol, Eduardo Conde
Tega. Para ele, é preciso haver
educação completa aos jovens
que buscam espaço no futebol,
ensinamentos que serão usados
caso eles se tornem ou não jogadores. “Estudos indicam que
a cada 3 mil crianças e adolescentes inseridos nas chamadas
‘Escolinhas de Futebol’ apenas
uma consegue ingressar na rotina de um clube formador. Os
que são eliminados acabam se
tornando frustrados devido a
orientações inadequadas.”
“Infelizmente, até hoje os problemas socioeducacionais no Brasil
acabam resultando em alojamentos cheios, com milhares de jovens
buscando no futebol a única opção
para um futuro melhor, quando na
verdade o esporte deveria ser uma
escolha profissional cujo desenvolvimento ocorre com o tempo, paralelamente aos estudos”, escreve o
campeão mundial pelo Corinthians,
Paulo André, em livro no qual relata suas experiências em alojamentos
durante a adolescência.
Em “O jogo da minha vida”,
o zagueiro conta casos absurdos,
como o fraco ensino disponibilizado, no qual percebia que o conte-
údo passado em matemática, no
ensino médio, era o mesmo que ele
havia aprendido no fundamental 1
ou ainda a “dica” que recebeu de
uma professora de português que
o orientou a “a partir daquele dia
escrever sempre ‘comeram’, ‘falaram’, em vez de ‘comerão’, ‘falarão’, pois assim acertaria 80% das
vezes”, o que o fez estudar por conta própria.
Sobre a luta para permanecer
no time, Paulo André revela que
optou por ser zagueiro exatamente
pela concorrência e ainda relatou
como era duro ver amigos dispensados depois de anos tentando virar profissional – e jogadores de
empresários ganhando chance.
No livro, o jogador ainda fala sobre
treinos em que garotos
corriam até vomitar em razão do esforço exigido por treinadores que ainda humilhavam
adolescentes em formação. Entre
histórias e reflexões, Paulo André se
pergunta: “Até hoje penso no que
deixamos de viver e aprender nesse
período. Por que não desenvolver
outras habilidades além do futebol?
Será que outros aprendizados seriam conflitantes para o nosso desenvolvimento futebolístico ou viriam a nos ajudar?”
FOLHAPRESS
A adolescência em um alojamento
EXPERIÊNCIA: Zagueiro Paulo André conta em livro sua
história antes de se tornar jogador profissional