O documento discute os conceitos fundamentais da lógica proposicional clássica, incluindo: (1) proposições, variáveis proposicionais e formas proposicionais; (2) operadores proposicionais verofuncionais como "não", "e", "ou"; (3) tabelas de verdade e condições de verdade; (4) operações lógicas como negação, conjunção, disjunção, condicional e bicondicional.
1. Lógica proposicional clássica
= disciplina da Lógica iniciada pelos estóicos (Grécia, séc. III a.C.)
e desenvolvida no séc. XX.
Proposição
= pensamento expresso numa frase declarativa com sentido
Variável proposicional
= símbolo que representa uma proposição
(consoantes maiúsculas a partir do P)
Forma proposicional
= estrutura da proposição (sem qualquer conteúdo)
As variáveis proposicionais surgem nas formas proposicionais
2. Proposição
Simples = não tem qualquer operador
Composta = tem algum operador
Operador proposicional
= expressão que acrescentada a uma ou a duas proposições (simples ou compostas)
forma uma nova proposição
Ex. 1
Operador proposicional: “Toda a gente sabe que”. Frase: “Cinco é um número primo”
Nova frase: “Toda a gente sabe que cinco é um número primo”
Ex. 2
Operador proposicional: “e”. Frases: “Sábado vou sair”, “Sábado vou divertir-me”.
Nova frase: “Sábado vou sair e [sábado vou] divertir-me”
3. Operador [proposicional] verofuncional
= aquele que faz com que
[sabendo-se] o valor de verdade da(s) proposição(ões) sem ele
determine / [sabe-se]
o valor de verdade da proposição com ele
Ex. 1
operador não verofuncional:
“O Asdrúbal gostaria que”
Existe justiça social
F
O Asdrúbal gostaria que existisse justiça social
?
Operadores
Unários = aplicam-se a uma proposição
Binários = aplicam-se a duas proposições
4. Ex. 2
Operador verofuncional:
“É falso que” ou “não”
É falso que Matosinhos fique a sul do Douro
V
Matosinhos fica a sul do rio Douro
F
Matosinhos não fica a sul do Douro
V
No caso do operador verofuncional “É falso que” ou “não”
a sua colocação inverte o valor de verdade da proposição primitiva
5. Ex. 3
Operador verofuncional:
“e”
O Pedro é estudante da ESAG e mora em Lavra
F
O Pedro é estudante da ESAG
V
O Pedro mora em Lavra
F
No caso do operador verofuncional “e”
basta que uma das proposições intervenientes seja falsa
para que a formada por elas ligadas pelo operador seja falsa
6. Ex. 4
Operador verofuncional:
“ou”
A Luísa foi para a escola ou passear
V
A Luísa foi para a escola
V
A Luísa foi passear
F
No caso do operador verofuncional “ou”
basta que uma das proposições intervenientes seja verdadeira
para que a formada por elas ligadas pelo operador seja verdadeira
7. Tabelas de Verdade
Tabela de verdade
= dispositivo gráfico
que exibe os valores de verdade de uma forma proposicional
em cada uma das condições de verdade
Condições de verdade
= circunstâncias que tornam uma proposição verdadeira ou falsa
Ex. 1
“Três é um número par”
Circunstâncias possíveis: I – três ser um número par. II – três não ser um número par.
Na circunstância I a frase é verdadeira e na circunstância II a frase é falsa.
8. Ex. 2
“O Xico caminha gingão e [o Xico] mastiga chiclete.”
Existem quatro circunstâncias possíveis:
I – O Xico caminhar gingão (V) e mastigar chiclete (V).
II – O Xico caminhar gingão (V) e não mastigar chiclete (F).
III – O Xico não caminhar gingão (F) e mastigar chiclete (V).
IV – O Xico não caminhar gingão (F) e não mastigar chiclete (F).
Valor de verdade da frase citada em cada uma das circunstâncias:
• na circunstância I, a frase é V
• na circunstância II, a frase é F
• na circunstância III, a frase é F
• na circunstância IV, a frase é F
OBS:
Com outro operador verofuncional, por exemplo “ou” em lugar de “e”,
os resultados seriam diferentes (só na circunstância IV é que a frase citada seria F)
9. Ex. 1
Tabela de verdade de:
“2000 não foi um ano bissexto”
Interpretação: P = 2000 foi um ano bissexto
P Não P
V F
F V
Proposição
simples
envolvida
Circunstâncias
possíveis
Forma
proposicional
em questão
Valores de verdade
da forma proposicional
em cada uma
das circunstâncias
possíveis
10. Exs. 2 e 3
Tabelas de verdade de:
“No sábado fico em casa e leio um livro”
e de
“No sábado fico em casa ou leio um livro”
Interpretação: P = No sábado fico em casa. Q = No sábado leio um livro.
P Q P e Q
V V V
V F F
F V F
F F F
P Q P ou Q
V V V
V F V
F V V
F F F
OBS:
A tabela de verdade não diz se a proposição é V ou F,
diz em que circunstâncias a proposição é V ou F.
11. A
Quantas linhas tem uma tabela de verdade?
2n
Lógica bivalente:
2
valores de verdade
(V e F)
Número
de
variáveis
Exemplos:
Uma variável proposicional (P): 2 linhas. Duas variáveis proposicionais (P e Q): 4 linhas.
Três variáveis proposicionais (P, Q e R): 8 linhas...
B
Quantas colunas tem uma tabela de verdade?
À esquerda: uma coluna em baixo de cada variável proposicional
À direita: uma coluna em baixo de cada operador
12. C
Como se ordenam as linhas?
Na tabela de verdade têm de estar representadas todas as circunstâncias possíveis
A completude da tabela de verdade garante-se com uma convenção: à esquerda...
1.º
... colocam-se as variáveis proposicionais por ordem alfabética (P, Q, R, ...)
2.º
... e debaixo da:
última (por exemplo R) intercalam-se V e F um a um (VF),
penúltima (por exemplo Q) intercalam-se V e F dois a dois (VVFF),
antepenúltima (por exemplo P) intercalam-se V e F quatro a quatro (VVVVFFFF),
etc.
13. Disjunção [inclusiva] – operação lógica e designação da proposição composta
Proposições
intervenientes
Linguagem natural
(frases + operador)
Formalização
(variáveis proposicionais
+ constante lógica)
Disjuntas
No Homem existe livre-arbítrio
ou determinismo
P∨Q
P Q P ∨ Q
V V V
V F V
F V V
F F F
Regra:
A disjunção [inclusiva] é falsa quando ambas as disjuntas são falsas
14. Disjunção Exclusiva – operação lógica e designação da proposição composta
Proposições
intervenientes
Linguagem natural
(frases + operador)
Formalização
(variáveis proposicionais
+ constante lógica)
Disjuntas
Os dias do mês são
ou pares ou ímpares
P∨Q
P Q P ∨ Q
V V F
V F V
F V V
F F F
Regra:
A disjunção exclusiva é verdadeira (falsa)
se as disjuntas tiverem valores de verdade diferentes (iguais).
15. OBS:
“Inclusiva” se inclui a hipótese de ambas as disjuntas serem verdadeiras
“Exclusiva” se exclui essa hipótese
“Ou” / “ou... ou...”
não garante a distinção que tem de se fazer intuitivamente em função do contexto
Em Filosofia usa-se sobretudo a disjunção inclusiva.
Variantes:
O aluno é rapaz a menos que que seja rapariga
O dia do mês é par a não ser que seja ímpar
16. Conjunção – operação lógica e designação da proposição composta
Proposições
intervenientes
Linguagem natural
(frases + operador)
Formalização
(variáveis proposicionais
+ constante lógica)
Conjuntas
O Porto é uma cidade
nortenha e litoral
P∧Q
P Q P ∧ Q
V V V
V F F
F V F
F F F
Regra:
A conjunção é verdadeira quando ambas as conjuntas são verdadeiras
17. Variantes:
Tanto a conjunção quanto / como a disjunção são operações lógicas
Quer o vermelho quer o verde são cores nacionais
Portugal bem como / tal como a Espanha são países ibéricos
Agosto foi quente mas / apesar de / embora / no entanto ventoso
Nota:
A lógica é indiferente a qualquer expressividade...
18. Condicional ou Implicação – operação lógica e designação da proposição composta
Proposições
intervenientes
Linguagem natural
(frases + operador)
Formalização
(variáveis proposicionais
+ constante lógica)
Antecedente e
Consequente
Se o individuo é
português, [então o
individuo] é europeu.
Um individuo ser
português implica que
seja europeu.
PQ
P Q P Q
V V V
V F F
F V V
F F V
Regra:
A condicional é falsa quando a verdade implica a falsidade.
19. OBS 1:
A condicional ou implicação é a operação lógica menos intuitiva
Declaração X: Se chover, então levo guarda-chuva
1 – Chove (V) e levo guarda-chuva (V)
2 – Chove (V) e não levo guarda-chuva (F)
3 – Não chove (F) e levo guarda-chuva (V)
4 – Não chove (F) e não levo guarda-chuva (F)
Em que situações é a declaração X verdadeira ou falsa?
Nas situações 1 (VV) e 4 (FF) é obviamente verdadeira.
Na situação 2 (VF) é obviamente falsa.
Na situação 3 (FV), menos obviamente, também é verdadeira
(não foi dito o que se faria caso não chovesse,
não foi dito que se levaria guarda-chuva se, e só se, chovesse)
20. OBS 2:
A condicional ou implicação é a operação lógica menos intuitiva
Se o cidadão é português, então é europeu.
VV
FV
Ser português Ser europeu
FF
Onde se representa a hipótese VF no gráfico ?
21. OBS 3:
A condicional ou implicação é a operação lógica menos intuitiva
1 – não importa o valor de verdade
de cada uma das proposições envolvidas (antecedente e consequente)
2 – não importa se há realmente conexão entre as proposições
3 – importa unicamente a relação entre os valores de verdade das proposições
Exemplos de condicionais verdadeiras:
“Se a Espanha é uma república, então fica na américa do sul” (FF)
“Se a Espanha é uma república, então fica na europa” (FV)
“Se a Espanha é uma monarquia, então fica na europa” (VV)
Exemplo de condicional falsa
“Se a Espanha é uma monarquia, então fica na américa do sul” (VF)
22. OBS 4:
A condicional ou implicação é o único operador binário que não é comutativo
(não é indiferente a ordem das proposições antecedente e consequente)
P Q P Q Q P
V V V V
V F F V
F V V F
F F V V
Quando o V implica o F a forma proposicional é F
mas
Quando o F implica o V a forma proposicional é V
23. OBS 5:
As condicionais ou implicações intuitivamente verdadeiras exprimem
condições suficientes e necessárias
“Se um individuo é português, então é europeu”
Condição suficiente
(basta para...)
Ser português Ser europeu
Condição necessária
(é imprescindível para...)
24. OBS 6:
Variantes:
“Se um individuo é português, então é europeu”
A
Ideia sempre presente: o antecedente é condição suficiente do consequente
Se / caso / no caso de / sempre que o individuo é português, [então] é europeu
B
Ideia sempre presente: o consequente é condição necessária do antecedente
O cidadão [não] é português somente se / [...] a menos que / [...] a não ser que
for [seja] europeu
25. Bicondicional ou Equivalência – operação lógica e designação da proposição composta
Proposições
intervenientes
Linguagem natural
(frases + operador)
Formalização
(variáveis proposicionais
+ constante lógica)
Equivalentes
Um número é par se, e só
se, for divisível por dois.
Um número ser par
equivale a ser divisível
por dois.
PQ
P Q P Q
V V V
V F F
F V F
F F V
Regra:
A bicondicional ou equivalência é verdadeira (falsa)
se as equivalentes tiverem valores de verdade iguais (diferentes).
26. OBS:
Cada uma das proposições equivalentes exprime
a condição suficiente e necessária do que é expresso pela outra
e,
por essa razão, as definições explícitas formulam-se através de equivalências
Variantes:
Um número é primo se, e só se / somente se / apenas se, é apenas divisível por si e
pela unidade
Dizer que uma figura geométrica é um triângulo equivale a dizer que tem três ângulos
Homem é animal racional
Se um número é par é divisível por dois e vice-versa
27. Negação – operação lógica e designação da proposição composta
Proposição interveniente
Linguagem natural
(frase + operador)
Formalização
(variável proposicional +
constante lógica)
Matosinhos não fica a sul
do Douro.
É falso que Matosinhos
fique a sul do Douro.
P
P P
V F
F V
Regra:
A negação inverte o valor de verdade da proposição
28. OBS:
A negação pode estar implícita: in(m)- / des- / a- / ...
nem (= e não)
Variantes
A situação é indesejável / desagradável /anormal / ...
Não é verdade que / não é o caso que / Matosinhos seja uma cidade do interior
O oceano que banha Matosinhos não é o Índico nem o Pacífico
29. Mnemónica
P Q ∧ ∨ ∨
V V V V V F V
V F F V F V F
F V F V F V V
F F F F V F V
30. Formalização
1.º
Colocar a frase na forma canónica
2.º
Fazer a interpretação ou o dicionário
(sempre pela afirmativa)
3.º
Formalizar
(substituir cada frase por uma variável proposicional
e cada operador por uma constante lógica)
31. Âmbito dos operadores
Âmbito do operador = proposição(ões) afetada(s) pelo operador;
pode ser maior ou menor
Ao fazer as colunas da tabela de verdade segue-se por ordem crescente
de âmbito do operador
(começa-se pela do operador de menor âmbito
e acaba-se com a do operador de maior âmbito: operador principal)
1.º (das negações) [ (P ∧ Q) ∨ R] S
2.º (da conjunção)
3.º (da negação da conjunção)
4.º (da disjunção)
5.º (da negação da disjunção)
6.º (da condicional)
32. Erros na determinação do âmbito (frequentemente do âmbito da negação)
resultam em proposições não equivalentes
Dicionário: P = O aluno chega atrasado. Q = O aluno tem falta
(P Q)
1.ª
2.ª
P Q)
1.ª
2.ª
É falso que se o aluno chega atrasado,
tem falta
Se o aluno não chega atrasado,
tem falta
P Q (P Q)
V V F V
V F V F
F V F V
F F F V
2.ª 1.ª
P Q P Q
V V F V
V F F V
F V V V
F F V F
1.ª 2.ª
Nota: dizer “É falso que...” (no início da frase) em vez de “Não” reduz a ambiguidade.
33. Ambiguidade de âmbito
Ambiguidade de âmbito = situação em que há mais do que uma maneira
de entender o âmbito de um operador
Domingo vou à praia ou leio um livro e vou ao cinema
As vírgulas (na linguagem natural) tal como os parêntesis (na linguagem da lógica)
eliminam a ambiguidade
Domingo vou à praia,
ou leio um livro e vou ao cinema
Domingo vou à praia ou leio um livro,
e vou ao cinema
34. Domingo vou à praia,
ou leio um livro e vou ao cinema
Domingo vou à praia ou leio um livro,
e vou ao cinema
Interpretação: P = Domingo vou à praia. Q = Domingo leio um livro.
R = Domingo vou ao cinema
P Q R P ∨ (Q ∧ R)
V V V V V
V V F V F
V F V V F
V F F V F
F V V V V
F V F F F
F F V F F
F F F F F
2.ª 1.ª
P Q R (P ∨ Q) ∧ R
V V V V V
V V F V F
V F V V V
V F F V F
F V V V V
F V F V F
F F V F F
F F F F F
1.ª 2.ª
Conclusão: as duas proposições não são equivalentes