Textos selecionados de "O Sétimo Selo" de José Rodrigues dos Santos, para a experiência levada a cabo pelos alunos do 12ºCT5, sob a orientação da professora Fátima Sarmento. Atividade realizada com a biblioteca escolar
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO NOVO ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES E TENDÊNCIAS PROMOVIDAS P...
O sétimo selo 12º ct5 esfh
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O SÉTIMO SELO
A Energia dos combustíveis: Produção de H2 e o Sétimo Selo
Tomás não era um modelo de homem arrumado, mas aquilo pareceu-lhe
de mais; a casa manifestamente não levava uma limpeza há pelo menos
seis meses. Ele e Filipe desbravaram caminho até aos sofás e
acomodaram-se com cautela, evitando as partes do tecido onde as nódoas
lhes pareciam mais frescas.
"Então é aqui que tens trabalhado? ", perguntou Filipe, reprimi ndo um
esgar de nojo.
"Right ho", confirmou o inglês. "É este o meu covil se creto.
Tomás olhou para o amigo com surpresa.
"Nunca cá tinhas estado?"
"Não", disse o geólogo. "Sabia que o James estava escondido aqui em
Yulara, claro, mas nunca cá vim." Incli nou a cabeça, coma se explicasse o
óbvio. "Por motivos de segurança.”
"Então digam lá", começou Tomás, indo direito ao assun to. "O que
querem vocês de mim? "
Filipe e Cummings trocaram um olhar e o inglês sentou -se diante deles
e fez sinal ao seu amigo português para que fosse ele a explicar as coisas.
"Julgo, Casanova, que já conheces o essencial da história"(…) "Desde
a morte do Howard e do Blanco, eu e o James temos andado e scondidos.
Eu fui para a Sibéria, ele veio aqui para a Austrália. Mas não parámos os
trabalhos. Eu continuei a monitorizar a situação das reservas petrolíferas
mundiais e ele prosseguiu as pesquisas que tinha encetado com o Blanco.
Quando nos separamos, ficou combinado que não nos contactaríamos, a
não ser em caso de necessidade extrema e sempre através de mensagens
codificadas. Até que, há algumas semanas, o James me enviou uma dessas
mensagens, a da citação bíblica que já mencionei."
"A do Apocalipse."
"Essa" assentiu. "Ela contém o nome de código do nosso projecto.
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"Ah, sim? E como se chama o projecto, afinal?"
"O Sétimo Selo."
" O projecto do Sétimo Selo encontra-se conceptualizado neste caderno",
anunciou [o inglês]. "Foi concebido, em termos teóricos, pelo meu colega de
Barcelona, professor Blanco Roca, que... humpf... foi cobardemente assassinado no
seu gabinete."
Orlov remexeu-se na poltrona, acusando o toque.
"Adiante", ordenou. "Adiante."
O inglês endireitou-se e ficou muito hirto, a olhar o russo com uma expressão
sobranceira.
"Este projecto apresenta aquilo que poderá ser a solução para os problemas que
a humanidade está já a enfrentar e que se vão agravar no futuro.
Trata-se de uma bateria que nunca precisa de recarga, que não emite calor, que
não emite som, que não polui e que se alimenta de um combustível muito
abundante no nosso planeta."
"Um combustível muito abundante? ", admirou-se Orlon. "O quê? Caca de
vaca?"
Cummings fitou o r u s s o com frieza glacial, o desdém a cintilar-lhe nos olhos.
“Água.”
Os homens reunidos na sala, com excepção de Filipe, contraíram o rosto numa
careta incrédula.
“Água?", exclamou Tomás, que decidira ficar calado, mas naquele instante não
conseguiu reprimir a surpresa. "A água como combustível do futuro?"
"A água", insistiu o inglês.
"Mas... mas como?”
O professor de Oxford (…) mergulhou as mãos na gaveta e extraiu uma grande
placa branca, que foi pendurar num prego já colocado na parede. Era um quadro, a
superfície láctea e lisa como marfim, igual a tantos outros usados nas reuniões de
trabalho das empresas. O académico pegou numa caneta de feltro e assinalou um
ponto negro na brancura.
"Tudo começou num ponto, há quinze mil milhões de anos", disse. "Toda a
matéria, o espaço e as forças estavam comprimidas num ponto infinitamente
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pequeno que, de repente, sem que nós saibamos porquê, irrompeu... humpf... crian-
do o universo.
“ 0 B i g B a n g " , observou Tomás, já familiarizado com esse tema.
"Isso mesmo", confirmou Cummings. " 0 Big Bang”. Os primeiros segundos foram,
como devem imaginar... humpf... muito atribulados. (..) Se pudéssemos viajar no
tempo, veríamos que o universo parecia, nesta altura, um nevoeiro denso. "E qual foi
pergunto-vos eu, o primeiro átomo a ser formado?"
Os russos encolheram os ombros, quase indiferentes. A sua especialidade era
outra.
"Hidrogénio", respondeu Filipe, que já conhecia a resposta.
Cummings voltou-se para o quadro e escreveu um grande H na superfície branca.
"Hidrogénio", confirmou. " O primeiro elemento da tabela periódica, o mais
simples de todos os átomos." Assinalou um ponto e desenhou um círculo em seu
redor. "Tem um protão no núcleo e um eletrão a orbitar. Humpf... nada mais ele-
mentar." "Também foram criados os átomos de hélio, mas os de hidrogénio eram os
mais abundantes. Para cada átomo de hélio havia nove de hidrogénio."
Orlov suspirou, claramente impaciente.
"Desculpe lá, mas que interesse tem essa conversa de chacha?"
O inglês soergueu a sobrancelha, numa pose muito afectada.
"O... humpf... cavalheiro não queria que eu lhe explicasse o que é o Sétimo Selo?"
"Sim, claro. Mas o que tem isto a ver com o Sétimo Selo?"
"Tenha paciência", pediu Cummings. O seu corpo de gigante franzino estremeceu,
como se tivesse levado um pequeno choque. "Onde... humpf... ia eu?"
"No hidrogénio."
"Ah, right ho. O hidrogénio." Olhou para o H que desenhara no quadro branco.
"Pois, o hidrogénio é o mais pequeno, o mais simples, o mais antigo e o mais
abundante átomo que existe no universo." Ergueu a mão. "Saliento sobretudo a ideia
de... humpf... abundante. O hidrogénio é muito, muito abundante. Três em cada
quadro de todos os átomos que se podem encontrar no universo são de hidrogénio.
0 hidrogénio... humpf... corresponde a setenta e cinco por cento da massa existente
no cosmos." Arqueou os olhos. "E muito." Bateu com a ponta da caneta no H. "Sendo
tão abundante, todavia, e difícil encontrar hidrogénio em estado puro. Alguém sabe
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por que razão isso acontece?"
Fez-se silêncio na sala. Ninguém sabia.
"O hidrogénio é reactivo", disse Filipe por fim, era ele o único que estava a par
do assunto.
"O hidrogénio é altamente reactivo", confirmou o professor de Oxford. "Isso quer
dizer que o hidrogénio odeia... humpf... a solidão. Como não gosta de ficar sozinho
em casa, o que ele faz é juntar-se com grande facilidade a outros átomos. Se fosse
uma mulher... humpf... o hidrogénio seria uma prostituta."
Os russos riram-se. Esta conversa já era mais do seu meio.
Cummings arrependeu-se da imprudência de ter recorrido àquela metáfora
perante tal plateia e pôs um ar digno, como se n ã o tivesse escutado os
comentários.
"O que eu quero dizer com isto é que o hidrogénio, sendo extraordinariamente
abundante, quase só se encontra... humpf... em forma híbrida. Por exemplo,
quando o hidrogénio se aproxima do oxigénio, cola-se logo a ele, formando a água.
Se por acaso é o nitrogénio que passa nas redondezas, o hidrogénio associa-se de
imediato e ambos formam amónia. E, se o átomo que passar por perto for o carbono,
o hidrogénio agarra-se a ele e... humpf... nascem os hidrocarbonos."
"Ao juntar-se aos outros átomos, o... humpf... hidrogénio armazena energia."
"A energia nuclear?", perguntou Orlov, em cuja mente a palavra e n e r g i a ,
associada a hidrogénio, dava b o m b a de hidrogénio.
"Não", corrigiu o inglês. "Isso é outra coisa. Chama-se energia nuclear à energia
associada à força forte que... humpf.., mantém o núcleo unido. Neste caso, porém,
estamos a falar de um outro tipo de energia, uma energia que é armazenada quando
o hidrogénio se liga a outros átomos.
"Ah, bom."
Cummings deu dois passos para o lado e, aproximando-se da janela, apontou
para qualquer coisa que estava para além do vidro sujo.
"Estão a ver aquilo ali?", perguntou.
Orlov ergueu-se e espreitou pela janela na direcção indicada. Era um enorme
arbusto, de aspecto robusto e rude, semelhante aos milhares que se estendiam pela
planície.
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"Sim, o que tem?”
“Chama-se wanari e é uma espécie de acácia." Encolheu os ombros. "Na verdade,
é-me indiferente que seja um... humpf... wanari ou outra coisa qualquer. O que
importa é que se trata de uma planta. E isto porquê? O que têm as plantas a ver
com... humpf... o hidrogénio?"
Orlov, que regressara ao seu lugar, relacionou a pergunta com o anúncio que
Cummings tinha feito no início da sua exposição.
“A água?”
"A água", confirmou. "Humpf... e o que é a água?" Voltou-se para o quadro e
escreveu H2 O. "São dois átomos de hidrogénio, associados a um de oxigénio.”
"Onde eu queria mesmo chegar era a um processo chamado... humpf...
fotossíntese", disse Cummings, esforçando-se por manter um fio condutor na sua
exposição. "Em termos gerais, a fotossíntese ocorre quando as plantas transformam
ar, a luz do Sol e a água em açúcar." Virou-se para o quadro e desenhou o Sol por
cima e uma folha por baixo, com uma gota de água assente na superfície. "O que se
passa é o seguinte." Do Sol desenhou uma seta apontada para a folha da planta. "A
energia solar incide sobre a folha e... humpf... provoca uma cisão das moléculas de
água. O oxigénio e o hidrogénio, que estão unidos na água, separam-se." Bateu com
a caneta na gota desenhada sobre a folha, para enfatizar esse ponto. "Separam-se",
repetiu. "Ora, como já vimos, o hidrogénio não gosta de ficar sozinho. A energia
solar obrigou-o a separar-se do oxigénio, e o átomo de hidrogénio, para recuperar a
sua estabilidade, vai logo à procura de um novo companheiro. E quem é que
encontra ali na planta? O carbono. Ou seja, o hidrogénio associa-se ao carbono e...
humpf... forma um novo composto, chamado carbo-hidrato, com quem partilha a sua
energia extra." Voltou-se para a assistência. "Que nome damos nós aos carbo-
hidratos?"
"Açúcar,", respondeu Filipe de imediato, sempre ciente de que mais ninguém iria
dar a resposta.
"Nem mais", confirmou o inglês. "Os carbo-hidratos, nascem da junção do carbono
com o hidrogénio carregado de energia solar, são habitualmente conhecidos por...
humpf_ açúcar." Alterou o tom de voz, num aparte. "Daí que o açúcar seja altamente
energético."
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"Nem mais. O carvão é uma fonte de energia. E que tipo de energia e essa? É a
energia solar, armazenada pelo hidrogénio no momento da fotossíntese, ocorrida
na altura em que a folha do wanari... humpf... estava viva. Quando atiramos o
carvão para a fornalha, o processo de fotossíntese inverte-se. O hidrogénio larga o
carbono e associa-se ao oxigénio, libertando a sua energia extra. E o carbono, que
entretanto ficou sozinho, também se associa ao oxigénio, criando o dióxido de
carbono, que é libertado na atmosfera. Isto acontece com o carvão... humpf... e
acontece com os outros hidrocarbonetos que se formam ao longo de milhões de
anos: o petróleo é o gás."
"Se bem entendi, a energia n ã o está no carbono", resumiu Orlov. "Está no
hidrogénio.
"Isso. O que significa que, quanto mais átomos de hidrogénio têm o
hidrocarbono... humpf... mais energia esse hidrocarbono contém."
"Os hidrocarbonos não têm todos a mesma quantidade de hidrogénio?"
"Não, de modo nenhum. Por exemplo, o hidrocarboneto com menos energia
é... humpf... o carvão. E porquê? Porque o carvão tem o carbono e o hidrogénio
na proporção de um para um. Já o petróleo é mais energético, uma vez que, para
cada átomo de carbono que possui, existem dois de hidrogénio.
E o gás natural pode libertar ainda mais energia, dado que tem... humpf...
quatro átomos de hidrogénio para cada átomo de carbono." Olhou a assistência.
"Isto está claro? "
"Sim.”
"Então prestem atenção a esta pergunta... humpf... porque é importante." "E se,
em vez de queimarmos um combustível que tem carbono e hidrogénio, queimarmos
apenas hidrogénio? O que acontece?"
“Apenas hidrogénio?"
"Sim. E se, na palavra hidroc a rbo nos, dispensarmos os c arbo nos? E se ...
humpf... ficarmos só c om os hidros? "
"lsso é possível ? "
“Porque não? Tiramos os carbonos da equação e ficamos apenas com o...
humpf... hidrogénio."
Orlov encolheu os ombros.
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"Qual seria a consequência? "
Cummings pareceu espantado com a pergunta.
"À luz do que eu já vos expliquei, a consequência não vos parece... humpf...
óbvia? Então, se a energia do petróleo está no hidrogénio que ele contém e não
no carbono, é evidente que, se eu retirar o carbono da equação, continuarei a
dispor de energia." Repetiu a ideia, preocupado em sublinhar este ponto crucial.
"Não se esqueçam de que... humpf... a energia está no hidrogénio, não no carbono.
"Estou a ver."
"Ou seja, eu não preciso do carvão, do petróleo ou do gás natural para nada.
Apenas preciso do hidrogénio."
"Mas isso é brilhante", exclamou Tomás, rompendo o mutismo a que se
remetera. "Brilhante."
Orlov abanou a cabeça, sem entender bem.
"Qual é a vantagem disso?”
Cummings estreitou as pálpebras. A cabeça do russo era dura.
"Oiça, o que provoca o aumento da temperatura do planeta?", perguntou,
enchendo-se de paciência professoral.
“Segundo o que os maricas dos ecologistas andam para aí a dizer, é a queima
do petróleo."
"Que é um hidrocarboneto", adiantou o inglês de imediato. "Repare bem que,
quando se queima petróleo, o que acontece... humpf... é que ocorre a fotossíntese
ao contrário. Ou seja, o hidrogénio liberta-se do carbono e associa-se ao oxigénio.
Como fica sozinho, o carbono também se associa ao oxigénio, criando um novo
composto. Como se chama... humpf... esse composto
"Dióxido de carbono", repetiu Filipe, sem perder tempo.
"E qual o composto mais responsável pelo efeito de estufa que provoca o...
humpf... aquecimento do planeta?"
"Dióxido de carbono", disse o geólogo, como se tivesse o disco riscado.
"Então o que acontece se tirarmos o carbono da equação?" "Deixa de se formar
o dióxido de carbono, porque não há carbono.
Os olhos de Cummings pousaram em Orlov, insinuando que não era preciso
acrescentar mais nada.
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"Está a perceber agora qual a vantagem de se queimar apenas o hidrogénio?”
"Sim."
"Se eliminarmos o carbono e ficarmos apenas com o hidrogénio, retemos a
parte energética do combustível e, ao mesmo tempo, deixamos de lançar dióxido
de carbono na atmosfera. É uma solução ganhadora a todos os níveis. Ganhamos
mais energia... humpf... e ganhamos uma energia limpa."
"O hidrogénio puro tem mais energia do que a gasolina?"
"Claro que tem", exclamou Cummings, quase escandalizado com a pergunta. "Um
litro de hidrogénio possui três vezes mais energia do que um litro de gasolina.
"Hmm."
"E assim matamos dois coelhos com... humpf... uma cajadada só", exclamou o
inglês. "Paramos o aquecimento do planeta e deixamos de depender do petróleo,
recorrendo ao... humpf... átomo mais abundante do universo para ir buscar o
combustível de que precisamos.
Orlov contorceu-se na poltrona, reflectindo sobre o que ouvira.
"Isso é muito inconveniente para os meus empregadores", observou
sombriamente. "Se essa ideia for conhecida e desenvolvida, eles vão ficar no
desemprego." Fez uma pausa. "E eu também.”.
Cummings cofiou a sua barba branca.
"Pois, imagino que isso seja... humpf... um pouco aborrecido para a indústria
petrolífera, sim."
O russo acariciou a arma.
"Vamos ter de fazer alguma coisa para resolver esse problema, não lhe parece?"
O inglês olhou, horrorizado, para a espingarda automática nas mãos de Orlov.
"Mas, espere, ainda há um problema a resolver", apressou-se a acrescentar, os
olhos a saltitarem nervosamente entre a arma e o russo.
"Problema? Que problema? "
"Onde é que vamos buscar o hidrogénio?"
Orlov pareceu não estar a perceber a pergunta.
"Bem... não foi você que disse que três em cada quatro átomos existentes no
universo são de hidrogénio?”
"Disse, e... humpf... é verdade."
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"Então qual é o problema?"
"É um facto que setenta e cinco por cento da massa existente no cosmos é
hidrogénio. Mas eu acrescentei também outra coisa, não se lembra?"
Orlov fez um esforço de memória, mas nada lhe ocorreu. "O quê?"
"Expliquei que o hidrogénio, sendo imensamente abundante, odeia viver
sozinho. O que ele gosta é de se associar a outros átomos.
"Ah, sim", sorriu o russo. "O hidrogénio é uma puta."
"Pois... humpf... é isso", murmurou Cummings, revirando os olhos. "Ora a
facilidade que o hidrogénio tem em associar-se a outros átomos faz com que seja
muito raro encontrar átomos isolados de hidrogénio."
O rosto do russo abriu-se num sorriso.
"Ah, pois é", exclamou. "Você disse isso, disse." Cruzou a perna, satisfeito.
"Então como vão vocês resolver esse problema?"
"Quer mesmo saber?"
"Estou curioso."
Foi a vez de ser o inglês a sorrir.
"Estávamos então a falar do hidrogénio, não estávamos?". começou
Cummings, " O carbono é o átomo dos combustíveis fósseis que aquece o
planeta, mas... humpf_ quem tem a energia é o hidrogénio. Se tirarmos o
carbono e ficarmos só com o hidrogénio, acaba-se o aquecimento do planeta e
a dependência em relação aos combustíveis fósseis. Do ponto de vista
conceptual, nada mais... humpf... simples.
" O problema é arranjar o hidrogénio em estado puro”. observou o russo.
"Sim, o hidrogénio é o átomo mais abundante do universo mas... humpf... é
difícil arranjá-lo em estado puro." "Então como é que você faz?"
Cummings passou os dedos delgados nos pelos brancos da barba, como se o
que fosse dizer a seguir fosse a descoberta mais óbvia da história da
humanidade.
"Uso a... humpf... água."
“Porquê?"
"A água é um composto muito abundante no nosso planeta, não é? Porque não
usá-la... humpf... como combustível?'
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"Mas como é que você faz isso?"
O inglês suspirou, um tanto enfadado por ter de explicar o seu trabalho a um
energúmeno com a missão de o matar.
"Oiça", disse. "Você sabe decerto qual... humpf... a fórmula química da água,
não sabe?"
"H2O", devolveu o russo. "Isso é elementar."
"E o H vem de onde?"
“É o símbolo do hidrogénio."
"Consequentemente, a água tem... humpf... hidrogénio, certo?"
"Sim."
"Então é aí que eu vou buscar a... humpf... energia. Ao hidrogénio da água."
"Mas como é que faz isso?", insistiu Orlov.
"Você sabe o que é a eletrólise?"
O russo fez um esforço de memória.
"Já dei isso na escola", observou. "É um processo químico qualquer, não é?"
"A eletrólise é a decomposição de uma substância química... humpf... através
de uma corrente eléctrica. Os seus princípios baseiam-se nas leis de Faraday e,
através desse processo, é possível separar os dois elementos da água, o oxigénio
e o hidrogénio. Para conseguir isso, coloca-se água pura num recipiente e...
humpf... liga-se a corrente elétrica. Submetidos à energia eléctrica, os átomos
de hidrogénio separam-se dos de oxigénio e juntam-se aos outros átomos de
hidrogénio. A energia eléctrica gasta neste processo... humpf... fica armazenada
no hidrogénio."
"isso não e um processo novo, pois não?"
"Não, é uma coisa antiga. A primeira vez que... humpf... se fez a eletrólise foi
em 1800."
"Então onde quer você chegar?"
Cummings inclinou-se para a frente, como se se preparasse para confidenciar
um segredo.
"E se... humpf... invertermos o processo? O que acontece?"
"Inverter o processo? O que quer dizer com isso?"
"Inverter o processo", repetiu o inglês. "Em vez de pegar em água e separar
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os seus dois elementos, hidrogénio e oxigénio, porque não... humpf...uni-los?"
" O que acha você que aconteceria?"
Orlov considerou aquela ideia.
"Bem, suponho que, se se juntasse o hidrogénio e o oxigénio, se formava outra vez
a água, n ã o é ?"
"Claro."
"E então? Qual é a vantagem disso?"
Cummings recostou-se no assento.
"Não se lembra de eu lhe explicar que, quando o hidrogénio se volta a juntar ao
oxigénio... humpf... se liberta a energia de ligação entre eles?"
"Sim."
"Então é essa... humpf... a vantagem."
"Portanto, se bem entendi, o senhor quer aproveitar a energia extra do hidrogénio.
“É isso?”
"Claro."
"E como poderá fazê-lo?"
Cummings ergueu o dedo, como se indicasse que aquela pergunta era muito
pertinente.
"Essa é a grande questão", exclamou. Fez um gesto com as mãos, como se segurasse
um objecto rectangular invisível. “A solução é arranjar uma caixa... humpf... dividida
em duas partes."
Simulou que enchia cada um dos lados da caixa. "Colocamos oxigénio numa parte e
hidrogénio puro na outra. Posicionamos um metal especial, designado catalista, na
parte do hidrogénio, de modo a provocar uma reacção química... humpf... que forçará
os átomos de hidrogénio a soltarem-se. O problema é que, sozinhos, esses átomos
tornam-se muito instáveis e têm grande urgência em associar-se a outros elementos.
Lembre-se de que eles odeiam a solidão." Inclinou a cabeça. "Ora, se os átomos de
hidrogénio quiserem acasalar com outros átomos, quais são... humpf... os parceiros
mais disponíveis nas redondezas?"
" O oxigénio?"
O inglês sorriu.
" O oxigénio armazenado no outro lado da caixa", confirmou. "Quando o catalista
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provoca a reacção química que solta os átomos de hidrogénio, esses átomos... humpf...
vão a correr em direcção aos de oxigénio." Aproximou o dedo esquerdo do direito,
simulando a aproximação entre os dois elementos. " O que nós vamos fazer é abrir um
corredor que viabilize esse encontro, colocando um electrólito... humpf... entre as
duas partes da caixa. O electrólito deixa passar o protão de hidrogénio, mas, atenção,
barra o caminho ao electrão. Ora isto é um problema, uma vez que o electrão fica
totalmente desesperado com esta separação e quer a todo o custo juntar-se ao
protão. Como somos boas pessoas... humpf... e ficamos com enorme pena do electrão
solitário, coitadinho, arranjámos maneira de possibilitar esse encontro romântico."
"E como é que fazem isso?"
"Abrimos um segundo corredor, instalando um fio metálico entre os dois lados
da caixa." Procurou o russo com os olhos. "Está claro... humpf... isto?"
"Sim", disse Orlov. " O protão do átomo de hidrogénio passa pelo electrólito
e o electrão tem de ir pelo fio metálico.”
"Right ho ", exclamou Cummings, satisfeito por até um gangster ser capaz de
perceber a sua explicação técnica. “ E é aqui que está ... humpf... o segredo. Um
electrão é, na prática, uma descarga de corrente eléctrica, o que significa que a
sua deslocação liberta energia sob uma forma que pode ser usada para o que
quisermos. Com ela podemos acender l â m p a d a s ou... humpf... pôr motores de
automóveis em funcionamento. O que quisermos.” Indicou a outra metade da
caixa imaginária. "Uma vez n o outro lado, o electrão junta-se ao protão e, agora
reconstituído o átomo de hidrogénio... humpf... pode então acasalar com o
oxigénio e formar água."
Orlov ficou um longo momento a massajar o queixo enquanto assimilava as
implicações deste processo. "E é isso o Sétimo Selo?"
O inglês assentiu com a cabeça.
"Em termos esquemáticos, sim. O Sétimo Selo é um projecto para desenvolver
uma nova fonte de energia, usando combustível... humpf... muito mais
abundante do que o petróleo e que funciona sem o carbono que aquece a
atmosfera. O nosso desafio envolveu a resolução de problemas específicos,
incluindo as delicadas questões da concentração do armazenamento do
hidrogénio, tornando-o uma alternativa vantajosa aos combustíveis fósseis. O
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hidrogénio já era conhecido como alternativa energética. Nós limitámo-nos a
superar os derradeiros obstáculos."
“E já passou à fase de testes?”
"Não tenho feito... humpf... outra coisa."
Orlov assinalou o deserto em redor.
"Foi para isso que veio para aqui?"
"Bem... não. Eu podia perfeitamente fazer isto em Oxford, um lugar que, para
ser sincero, se me afigura bem mais simpático. Acontece que havia uns...
humpf... nasty chaps que decidiram que este trabalho era inconveniente e que..."
"Sim, já sei", cortou Orlov, impaciente. "Mas já experimentou esse sistema
em automóveis? "
"Com certeza."
"E qual o resultado?"
"Quatro litros de gasolina... humpf... dão para um automóvel normal
percorrer, em média, cinquenta quilómetros, não é? Mas nos testes que efectuei
aqui no deserto, um carro movido com este tipo de bateria conseguiu percorrer
mais de cem quilómetros... humpf... com apenas um quilo de hidrogénio."
"A sério?"
"A eficiência quase triplicou", disse. "Além disso, as baterias de hidrogénio
são silenciosas, não apresentaram quaisquer vibrações e... humpf... apenas
emitiram vapor de água." Ergueu o indicador. "Acima de tudo, e muito
importante lembrar, não houve libertação de dióxido de carbono, uma vez que
o processo... humpf... não envolve carbono."
O Sétimo Selo, José Rodrigues dos Santos
(texto com adaptações e supressões)
Responsáveis: Maria de Fátima Sarmento
Maria Manuela T. Paredes
Turma envolvida no projeto: 12ºCT5