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Processo      CÍVEL

Comarca/Fórum         Fórum de Marília

Processo Nº           344.01.2010.026727-7

Cartório/Vara         1ª. Vara Cível

Competência           Cível

Nº de Ordem/Controle          2017/2010

Grupo         Registro Público

Ação Retificação de Registro Civil (em geral)



VISTOS ________, qualificado nos autos, ajuizou a presente ação de
RETIFICAÇÃO DE ASSENTO, alegando, em suma, que desde o falecimento
de sua mãe, foi criado pela sua avó materna, Senhora ________, quem lhe
dedicou todo amor e carinho. Alegou que desde sua infância sempre manteve
conduta de pessoa do sexo feminina, inclusive intitulando-a pelo nome de
______. Alegou, ainda, que realizou tratamento psicológico e realizou várias
cirúrgicas, inclusive para a redesignação do sexo para reestruturação de sua
genitália. Assim sendo, pleiteia a modificação de seu nome para ______, do
sexo feminino e a retificação de seu nome perante a Delegacia da Receita
Federal. Com a petição inicial, vieram os documentos juntados às fls.11/34. O
Ministério Público opinou pela procedência do pedido (fls.40/42). É o relatório.
DECIDO. “É função da jurisdição, encontrar soluções satisfatórias para o
usurário, desde que não prejudiquem o grupo em que vive, assegurando a
fruição dos direitos básicos do cidadão”. O pedido merece procedência. No
caso presente, ligada à pretensão da parte autora à concepção clássica da
idéia de Justiça está a célere comparação feita por Aristóteles entre a equidade
e a régua de Lesbos (a régua adapta-se à forma da pedra e não é rígida,
exatamente como a Lei que se ajusta aos fatos). É a equidade a adaptação da
norma à situação de fato, com atenuação do rigor e da rigidez da lei, pois a sua
aplicação, crua e simples, pode revelar-se de uma dureza de manifesta
injustiça, conduzindo a uma inconveniência, a um absurdo, a uma iniqüidade...
À Toda as criações da natureza são iguais. Todas as ações cruéis, piedosas ou
indiferentes são iguais. Contudo, o homem não é igual a nenhum outro homem,
bicho ou coisa. Não é igual a nada. Todo ser humano é um estranho ímpar.
(Carlos Drumond de Andrade). Não é crível que a questão envolvendo o
transexualismo seja solucionada apenas na área medicinal e que o Direito
cerre os olhos ao tema, numa atitude cômoda e ortodoxa, totalmente alheios à
realidade das coisas... É o que acontece no caso dos autos. O autor nasceu
homem e assim foi registrado, em razão apenas da aparência física (genitália).
Entretanto, provado restou que, psicologicamente, o autor sempre foi “a outra”.
Suas atitudes, diárias, sempre foi de mulher: comportamento, vestimentas,
companheiros, acabando por desaguar na cirurgia que o transformou, com
perfeição, em mulher, conforme se vê pela fotografia juntada à f.12. Verifica-se
pelo documento de fl.17, datado de 30 de junho de 2010, que a psicóloga
confirmou que o autor “cumpriu o período de acompanhamento psicológico
para realizar a cirurgia CID 564 de readequação genital”. Por outro lado, o
Laudo de Exame Físico juntado às fls.15/16, emitido pelo Doutor Jalma Jurado
– CRM 9867, concluiu pelo Exame Físico: “que o autor apresenta-se com
vestimentas, hábitos, comunicação, postura e desenvoltura perfeitamente
femininas. Ao exame físico objetivo soma sua conformação e caracteres
sexuais secundários são compatíveis com a linha feminina, incluindo cabelos,
distribuição pisola corpórea, fascies e diâmetros e escapulares e pélvicos”. O
laudo de Exame Físico realizado após a cirurgia que “os tecidos escrotais
foram reduzidos e saturados ao redor da neovagina assemelhado os lábios
vaginais. Na área pubiana o tecido cutâneo teve sua gordura removida e fixado
imitou a depressão da comissura vaginal superior”. Portanto, não há como
negar a pretensão da parte autora, diante dos fatos apresentados nestes autos.
O autor já é, agora, também fisicamente mulher. Como último estágio na
procura de sua identidade pretende, agora, modificar, no assento próprio, o
nome e o sexo. Está última barreira, jurídica, não pode ser obstáculo a tanto.
Nesse sentido, a doutrina de Luiz Alberto David Araújo (“A Proteção
Constitucional do Transexual”, Ed. Saraiva, 2000, p.135) que: “Realmente, o
casamento só poderia ocorrer entre pessoas do sexo oposto, nos termos do
art.180 do Código Civil. Mas qual o conceito de sexo que devemos adotar? O
sexo biológico? O sexo psicológico? O sexo gonadal? Enfim, se há vários
conceitos, porque devemos utilizar o biológico? E, ademais, há o
reconhecimento médico da necessidade da cirurgia, já que o paciente tem
tendência para o sexo diferente do biológico, ou seja, para a mudança de sexo.
Portanto, diante do conflito, por que não afirmar, no caso, que o individuo
pertence ao sexo para o qual foi operado? Realmente, sabemos que,
internamente, a constituição física do individuo operado continua a mesma, ou
seja, mantém seu sexo de origem. Mas a sociedade está preocupada com o
sexo de origem do individuo, ou ele tem direito a uma nova vida, integrado
socialmente, participando integrativamente, de forma saudável? Ou deve
sempre trazer consigo a situação de ‘transexual’?”. E mais adiante: “Se o
Estado concorda com a cirurgia, por entendê-la necessária, uma vez que tem a
responsabilidade do acompanhamento médico, seria melhor deixar de anotar a
transexualidade no documento, respeitando o sexo psicológico, já definido pela
cirurgia de redesignação sexual? Concordar com a cirurgia, mas não definir a
situação do operado, é o mesmo que abonar, dar fiança, sem cumprir com a
obrigação de quem concorda com a verdade dos fatos. O argumento
geralmente utilizado é o de que poderia haver casamento entre pessoas do
mesmo sexo, mas não serão do mesmo sexo e se admitir outras classificações
para este, como a psicológica, por exemplo. No caso, o transexual tem apenas
o sexo biológico, que já foi alterado em conformidade com o seu sexo
psicológico. Este sim, forte e determinante, já foi objeto de decisão médica,
acompanhada de equipe multidisciplinar, para a conclusão da cirurgia”. A
Constituição Federal de 1988, apesar de não conter uma cláusula geral
expressa destinada à tutela ampla dos direitos da personalidade, absorveu, em
seu Título I, em que são expostos princípios fundamentais do Estado brasileiro,
a doutrina geral da personalidade, protegendo a dignidade da pessoa humana
e garantindo a prevalência dos direitos fundamentais do homem. Considerando
que o ser humano vive em sociedade, fazendo parte integrante de uma
comunidade de personalidades, à ordem jurídica incumbe, portanto, outorgar a
todo ser humano a qualidade de sujeito de direito e uma esfera de autonomia
de vontade em suas relações sociais. Nisto consiste o direito da personalidade.
A tutela da personalidade, sob todos os seus aspectos, e a garantia de que
todo ser humano leve sua vida com pleno desenvolvimento e com igualdade de
oportunidades, exigem a existência, no direito positivo, de uma cláusula geral
de proteção da personalidade. Assim, a Carta Magna de 1988 reconhece a
existência de um direito geral ao livre e pleno desenvolvimento da
personalidade humana, negar ao portador de disforia do gênero o direito à
adequação do sexo morfológico e o sexo psicológico e a conseqüente
redesignação do estado sexual e o prenome no assento de nascimento acaba
por afrontar a lei fundamental. No caso dos autos, o autor já se submeteu a
intervenção médica que resultou na extirpação dos órgãos sexuais externos, do
sexo masculino, e na construção cirúrgica de um simulacro do órgão sexual
feminino, a neovaginoplastia, de modo a permitir-lhe a prática do coito vagínico;
se ostenta ele, agora, ainda por força de ingestão de hormônios, as principais
características morfológicas de uma mulher (cabelos longos, ausência de
barba, etc..), insistir em manter, em seu assento de nascimento (e
conseqüentemente em seus documentos pessoais), a indicação de prenome e
estado sexual que não correspondem, em absoluto, à maneira como aparece
em suas relações com o mundo exterior, significa condená-lo a uma situação
de incerteza, angústias e conflitos, impedindo-o, ou ao menos dificultando-lhe o
exercício das atividades de seres humanos, negando-lhe o direito da cidadania.
Por conseguinte, diante do problema humano retratado nos autos, a solução
que melhor se harmoniza com os preceitos constitucionais é a acolhida integral
da pretensão inicial. POSTO ISTO e considerando o mais que dos autos
consta, JULGO PROCEDENTE o pedido para, com fundamento no artigo 5º, X,
da Constituição Federal e artigo 55, parágrafo único, c.c. artigo 109 da Lei nº
6.015/73, determinar as modificações almejadas na inicial para que o autor
passe a chamar-se “_________”, de sexo “FEMININO”. Oportunamente,
expeça-se o mandado ao Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais da
Comarca de Garça e a Delegacia da Receita Federal para as modificações
necessárias, arquivando-se os autos. P.R.I.C.



Marília, 17 de dezembro de 2010.

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Direito sao bernardo tgdp - alteracao registro - transsexual - marilia - 110310

  • 1. Processo CÍVEL Comarca/Fórum Fórum de Marília Processo Nº 344.01.2010.026727-7 Cartório/Vara 1ª. Vara Cível Competência Cível Nº de Ordem/Controle 2017/2010 Grupo Registro Público Ação Retificação de Registro Civil (em geral) VISTOS ________, qualificado nos autos, ajuizou a presente ação de RETIFICAÇÃO DE ASSENTO, alegando, em suma, que desde o falecimento de sua mãe, foi criado pela sua avó materna, Senhora ________, quem lhe dedicou todo amor e carinho. Alegou que desde sua infância sempre manteve conduta de pessoa do sexo feminina, inclusive intitulando-a pelo nome de ______. Alegou, ainda, que realizou tratamento psicológico e realizou várias cirúrgicas, inclusive para a redesignação do sexo para reestruturação de sua genitália. Assim sendo, pleiteia a modificação de seu nome para ______, do sexo feminino e a retificação de seu nome perante a Delegacia da Receita Federal. Com a petição inicial, vieram os documentos juntados às fls.11/34. O Ministério Público opinou pela procedência do pedido (fls.40/42). É o relatório. DECIDO. “É função da jurisdição, encontrar soluções satisfatórias para o usurário, desde que não prejudiquem o grupo em que vive, assegurando a fruição dos direitos básicos do cidadão”. O pedido merece procedência. No caso presente, ligada à pretensão da parte autora à concepção clássica da idéia de Justiça está a célere comparação feita por Aristóteles entre a equidade e a régua de Lesbos (a régua adapta-se à forma da pedra e não é rígida, exatamente como a Lei que se ajusta aos fatos). É a equidade a adaptação da norma à situação de fato, com atenuação do rigor e da rigidez da lei, pois a sua aplicação, crua e simples, pode revelar-se de uma dureza de manifesta injustiça, conduzindo a uma inconveniência, a um absurdo, a uma iniqüidade... À Toda as criações da natureza são iguais. Todas as ações cruéis, piedosas ou indiferentes são iguais. Contudo, o homem não é igual a nenhum outro homem, bicho ou coisa. Não é igual a nada. Todo ser humano é um estranho ímpar.
  • 2. (Carlos Drumond de Andrade). Não é crível que a questão envolvendo o transexualismo seja solucionada apenas na área medicinal e que o Direito cerre os olhos ao tema, numa atitude cômoda e ortodoxa, totalmente alheios à realidade das coisas... É o que acontece no caso dos autos. O autor nasceu homem e assim foi registrado, em razão apenas da aparência física (genitália). Entretanto, provado restou que, psicologicamente, o autor sempre foi “a outra”. Suas atitudes, diárias, sempre foi de mulher: comportamento, vestimentas, companheiros, acabando por desaguar na cirurgia que o transformou, com perfeição, em mulher, conforme se vê pela fotografia juntada à f.12. Verifica-se pelo documento de fl.17, datado de 30 de junho de 2010, que a psicóloga confirmou que o autor “cumpriu o período de acompanhamento psicológico para realizar a cirurgia CID 564 de readequação genital”. Por outro lado, o Laudo de Exame Físico juntado às fls.15/16, emitido pelo Doutor Jalma Jurado – CRM 9867, concluiu pelo Exame Físico: “que o autor apresenta-se com vestimentas, hábitos, comunicação, postura e desenvoltura perfeitamente femininas. Ao exame físico objetivo soma sua conformação e caracteres sexuais secundários são compatíveis com a linha feminina, incluindo cabelos, distribuição pisola corpórea, fascies e diâmetros e escapulares e pélvicos”. O laudo de Exame Físico realizado após a cirurgia que “os tecidos escrotais foram reduzidos e saturados ao redor da neovagina assemelhado os lábios vaginais. Na área pubiana o tecido cutâneo teve sua gordura removida e fixado imitou a depressão da comissura vaginal superior”. Portanto, não há como negar a pretensão da parte autora, diante dos fatos apresentados nestes autos. O autor já é, agora, também fisicamente mulher. Como último estágio na procura de sua identidade pretende, agora, modificar, no assento próprio, o nome e o sexo. Está última barreira, jurídica, não pode ser obstáculo a tanto. Nesse sentido, a doutrina de Luiz Alberto David Araújo (“A Proteção Constitucional do Transexual”, Ed. Saraiva, 2000, p.135) que: “Realmente, o casamento só poderia ocorrer entre pessoas do sexo oposto, nos termos do art.180 do Código Civil. Mas qual o conceito de sexo que devemos adotar? O sexo biológico? O sexo psicológico? O sexo gonadal? Enfim, se há vários conceitos, porque devemos utilizar o biológico? E, ademais, há o reconhecimento médico da necessidade da cirurgia, já que o paciente tem tendência para o sexo diferente do biológico, ou seja, para a mudança de sexo. Portanto, diante do conflito, por que não afirmar, no caso, que o individuo pertence ao sexo para o qual foi operado? Realmente, sabemos que, internamente, a constituição física do individuo operado continua a mesma, ou seja, mantém seu sexo de origem. Mas a sociedade está preocupada com o sexo de origem do individuo, ou ele tem direito a uma nova vida, integrado socialmente, participando integrativamente, de forma saudável? Ou deve sempre trazer consigo a situação de ‘transexual’?”. E mais adiante: “Se o Estado concorda com a cirurgia, por entendê-la necessária, uma vez que tem a responsabilidade do acompanhamento médico, seria melhor deixar de anotar a transexualidade no documento, respeitando o sexo psicológico, já definido pela
  • 3. cirurgia de redesignação sexual? Concordar com a cirurgia, mas não definir a situação do operado, é o mesmo que abonar, dar fiança, sem cumprir com a obrigação de quem concorda com a verdade dos fatos. O argumento geralmente utilizado é o de que poderia haver casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas não serão do mesmo sexo e se admitir outras classificações para este, como a psicológica, por exemplo. No caso, o transexual tem apenas o sexo biológico, que já foi alterado em conformidade com o seu sexo psicológico. Este sim, forte e determinante, já foi objeto de decisão médica, acompanhada de equipe multidisciplinar, para a conclusão da cirurgia”. A Constituição Federal de 1988, apesar de não conter uma cláusula geral expressa destinada à tutela ampla dos direitos da personalidade, absorveu, em seu Título I, em que são expostos princípios fundamentais do Estado brasileiro, a doutrina geral da personalidade, protegendo a dignidade da pessoa humana e garantindo a prevalência dos direitos fundamentais do homem. Considerando que o ser humano vive em sociedade, fazendo parte integrante de uma comunidade de personalidades, à ordem jurídica incumbe, portanto, outorgar a todo ser humano a qualidade de sujeito de direito e uma esfera de autonomia de vontade em suas relações sociais. Nisto consiste o direito da personalidade. A tutela da personalidade, sob todos os seus aspectos, e a garantia de que todo ser humano leve sua vida com pleno desenvolvimento e com igualdade de oportunidades, exigem a existência, no direito positivo, de uma cláusula geral de proteção da personalidade. Assim, a Carta Magna de 1988 reconhece a existência de um direito geral ao livre e pleno desenvolvimento da personalidade humana, negar ao portador de disforia do gênero o direito à adequação do sexo morfológico e o sexo psicológico e a conseqüente redesignação do estado sexual e o prenome no assento de nascimento acaba por afrontar a lei fundamental. No caso dos autos, o autor já se submeteu a intervenção médica que resultou na extirpação dos órgãos sexuais externos, do sexo masculino, e na construção cirúrgica de um simulacro do órgão sexual feminino, a neovaginoplastia, de modo a permitir-lhe a prática do coito vagínico; se ostenta ele, agora, ainda por força de ingestão de hormônios, as principais características morfológicas de uma mulher (cabelos longos, ausência de barba, etc..), insistir em manter, em seu assento de nascimento (e conseqüentemente em seus documentos pessoais), a indicação de prenome e estado sexual que não correspondem, em absoluto, à maneira como aparece em suas relações com o mundo exterior, significa condená-lo a uma situação de incerteza, angústias e conflitos, impedindo-o, ou ao menos dificultando-lhe o exercício das atividades de seres humanos, negando-lhe o direito da cidadania. Por conseguinte, diante do problema humano retratado nos autos, a solução que melhor se harmoniza com os preceitos constitucionais é a acolhida integral da pretensão inicial. POSTO ISTO e considerando o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido para, com fundamento no artigo 5º, X, da Constituição Federal e artigo 55, parágrafo único, c.c. artigo 109 da Lei nº 6.015/73, determinar as modificações almejadas na inicial para que o autor
  • 4. passe a chamar-se “_________”, de sexo “FEMININO”. Oportunamente, expeça-se o mandado ao Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais da Comarca de Garça e a Delegacia da Receita Federal para as modificações necessárias, arquivando-se os autos. P.R.I.C. Marília, 17 de dezembro de 2010.