1. José Paulo Paes
Henriqueta Lisboa
Mário Quintana
Vinícius de Moraes
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2. Alguns conceitos
• A poesia é uma das sete artes tradicionais,
através da qual a linguagem humana é utilizada
com fins estéticos.
• Tem um caráter abstrato.
• Num sentido amplo, a poesia identifica-se com a
própria arte.
• É a arte de representar sentimentos por meio da
expressão do belo.
• "Todas as coisas têm seu mistério, e a poesia é o
mistério que todas as coisas têm".
Garcia Lorca
3. José Paulo Paes
José Paulo Paes nasceu em Taquaritinga SP, em 1926. Estudou
química industrial em Curitiba, onde iniciou sua atividade literária
colaborando na revista Joaquim, dirigida por Dalton Trevisan. De
volta a São Paulo trabalhou em um laboratório farmacêutico e
numa editora. Desde de 1948 escreve com regularidade para
jornais e periódicos literários. Toda sua obra poética foi reunida,
em 1986, sob o título Um por todos. Em 1987 dirigiu uma oficina
de tradução de poesia na UNICAMP. Faleceu no dia 09.10.1998.
4. Henriqueta Lisboa
Henriqueta Lisboa (1901-1985), poeta mineira considerada pela crítica
um dos grandes nomes da lírica modernista, dedicou-se à poesia,
ensaios e traduções. Nasceu em Lambari, Minas Gerais, em 15 de julho
de 1901, filha do farmacêutico e deputado federal João de Almeida
Lisboa e de Maria Rita Vilhena Lisboa. Formou-se normalista pelo
Colégio Sion de Campanha, MG, e, em 1924, mudou-se para o Rio de
Janeiro. Dedicou-se à poesia desde muito jovem. Henriqueta faleceu
em Belo Horizonte, no dia 9 de outubro de 1985. Seu Centenário foi
comemorado ao longo do ano de 2002.
5. Mário Quintana
Mário Quintana, poeta gaúcho nascido em Alegrete, em 30 de julho de
1906, e morreu em 5 de maio de 1994, em Porto Alegre. Trabalhou em
vários jornais gaúchos. Traduziu Proust, Conrad, Balzac, e outros
autores de importância. Em 1940, lançou a Rua dos Cataventos, seu
Primeiro livro de poesias. Ao que seguiram Canções (1946), Sapato
Florido (1948), O aprendiz de Feiticeiro (1950), Espelho Mágico (1951),
Quintanares (1976), Apontamentos de História Sobrenatural (1976), A
Vaca eo Hipogrifo (1977), Prosa e Verso (1978), Baú de Espantos
(1986), Preparativos de Viagem (1987), além de varias antologias.
6. Vinícius de Moraes
Poeta, compositor, intérprete e diplomata brasileiro, nasceu no Rio em
19/10/13 e faleceu na mesma cidade em 09/07/80. Escreveu seu
primeiro poema aos sete anos. Fez curso de Direito no Rio e de
Literatura Inglesa em Oxford. Ingressou na carreira diplomática, por
concurso, em 1943, tendo servido como vice-cônsul em Los Angeles
(1947-50), o que abriu sua temática, posteriormente enriquecida pelo
seu interesse em teatro e cinema. Serviu também em Paris (duas
vezes) e Montevidéu.
7. O Livro
O livro divide-se em seis partes:
Gente
Animais
Coisas
Lugares
Tempo
Amor
9. Pescaria
Um homem
que se preocupava demais
com coisas sem importância
acabou ficando com a cabeça cheia de minhocas.
Um amigo lhe deu então a idéia
de usar as minhocas
numa pescaria para se distrair das preocupações.
O homem se distraiu tanto
pescando
que sua cabeça ficou leve
como um balão
e foi subindo pelo ar
até sumir nas nuvens.
Onde será que foi parar?
Não sei
nem quero me preocupar com isso.
Vou mais é pescar.
10. Mamãezinha
Mamãezinha, conta, Conta, Mamãezinha,
conta uma história! conta uma história!
Mamãezinha agora Mamãezinha agora
está no fogão está no seu sono
fazendo quitutes cansado, sem sonhos.
para o seu neném.
Mamãezinha, conta,
conta uma história!
Mamãezinha agora
está no tanque
lavando as roupas
do seu neném.
11. Menininho doente
Na minha rua há um menininho doente.
Enquanto os outros partem para a escola,
Junto à janela, sonhadoramente,
Ele ouve o sapateiro bater sola.
Ouve também o carpinteiro, em frente,
Que uma canção napolitana engrola.
E pouco a pouco, gradativamente,
O sofrimento que ele tem se evola. . .
Mas nesta rua há um operário triste:
Não canta nada na manhã sonora
E o menino nem sonha que ele existe.
Ele trabalha silenciosamente. . .
E está compondo este soneto agora,
Pra alminha boa do menino doente. . .
12. Teu nome
Teu nome, Maria Lúcia
Tem qualquer coisa que afaga
Como uma lua macia
Brilhando à flor de uma vaga.
Parece um mar que marulha
De manso sobre uma praia
Tem o palor que irradia
A estrela quando desmaia.
É um doce nome de filha
É um belo nome de amada
Lembra um pedaço de ilha
Surgindo de madrugada.
Tem um cheirinho de murta
E é suave como a pelúcia
É acorde que nunca finda
É coisa por demais linda
Teu nome, Maria Lúcia...
14. As borboletas
Brancas
Azuis
Amarelas
E pretas
Brincam
Na luz
As belas
Borboletas
Borboletas brancas
São alegres e francas.
Borboletas azuis
Gostam muito de luz.
As amarelinhas
São tão bonitinhas!
E as pretas, então . . .
Oh, que escuridão!
15. Pirilampos
Quando a noite
Vem baixando,
Nas várzeas ao lusco-fusco
E na penumbra das moitas
E na sombra erma dos campos,
Piscam, piscam pirilampos.
São pirilampos ariscos
Que acendem pisca-piscando
As suas verdes lanternas,
Ou são claros olhos verdes,
De menininhos travessos,
Verdes olhos semitontos,
Semitontos mas acesos
Que estão lutando com o sono?
16. Das falsas posições
Com a pele do leão vestiu-se o burro um dia.
Porém, no seu encalço, a cada instante e hora,
"Olha o burro! Fiau! Fiau!" gritava a bicharia...
Tinha o parvo esquecido as orelhas de fora!
17. Identificação
Seria um siri na Síria
Ou um grou da Goenlândia?
Uma arara do Ararat
Ou uma pata da Patagónia?
Seria uma anta da Antártida
Ou um hamster de Amsterdã?
Um periquito de Quito
Ou marmota do Mar Morto?
Seria uma rena do Reno?
Uma mosca de Moscou?
Chinchila da China ou Chile?
Lontra de Londres talvez?
Seria um bicho do sul?
Seria um bicho no norte?
Sei lá. Quem quiser saber,
Que lhe peça o passaporte.
20. O relógio
Passa, tempo, tic-tac
Tic-tac, passa, hora
Chega logo, tic-tac
Tic-tac, e vai-te embora
Passa, tempo
Bem depressa
Não atrasa
Não demora
Que já estou
Muito cansado
Já perdi
Toda a alegria
De fazer
Meu tic-tac
Dia e noite
Noite e dia
Tic-tac
Tic-tac
Dia e noite
Noite e dia
21. Cadê
Nossa! que escuro!
Cadê a luz?
Dedo apagou.
Cadê o dedo?
Entrou no nariz.
Cadê o nariz?
Dando um espirro.
Cadê o espirro?
Ficou no lenço.
Cadê o lenço?
Foi com a calça.
Cadê a calça?
No guarda- roupa.
Cadê o guarda-roupa?
Fechado à chave.
Cadê a chave?
Homem levou.
Cadê o homem?
Está dormindo
de luz apagada.
Nossa! que escuro!
22. Canção da Garoa
Em cima do meu telhado,
Pirulin lulin lulin,
Um anjo, todo molhado,
Soluça no seu flautim.
O relógio vai bater;
As molas rangem sem fim.
O retrato na parede
Fica olhando para mim.
E chove sem saber por quê...
E tudo foi sempre assim!
Parece que vou sofrer:
Pirulin lulin lulin...
24. Rua dos Cataventos II
Dorme, ruazinha… E tudo escuro…
E os meus passos, quem é que pode ouvi-los?
Dorme o teu sono sossegado e puro,
Com teus lampiões, com teus jardins tranqüilos
Dorme… Não há ladrões, eu te asseguro…
Nem guardas para acaso persegui-los…
Na noite alta, como sobre um muro,
As estrelinhas cantam como grilos…
O vento está dormindo na calçada,
O vento enovelou-se como um cão…
Dorme, ruazinha… Não há nada…
Só os meus passos… Mas tão leves são
Que até parecem, pela madrugada,
Os da minha futura assombração…
25. Pomar
Menino - madruga Rebrilha, cem olhos
o pomar não foge! agrupados, negros.
(pitangas maduras E as frutas estalam
dão água na boca.) - espuma de vidro -
nos lábios de rosa.
Menino descalço Menino guloso!
Não olha onde pisa.
Trepa pelas árvores Menino guloso,
Agarrando pêssegos. Ontem vi um figo
(Pêssegos macios mesmo que um veludo,
como paina e flor. redondo, polpudo,
Dentadas de gosto!) E disse: este é meu!
Meu figo onde está?
Menino, cuidado,
jabuticabeiras -passarinho comeu,
novinhas em folha passarinho comeu...
não agüentam peso.
26. Escola
Escola é o lugar onde a gente vai quando não está de férias.
O chefe da escola é a diretora.
A diretora manda na professora.
A professora manda na gente.
A gente manda em ninguém.
Só quando manda alguém plantar batata.
Além de fazer lição na escola,
a gente tem que fazer lição em casa.
A professora leva nossa lição para casa dela e corrige.
Se a gente não errasse,
a professora não precisava levar
lição para casa.
Por isso é que a gente erra.
Embora não seja piano, nem banco,
a professora também dá notas.
Quem não tem boas notas, não passa de ano.
(será que fica sempre com a mesma idade?)
27. A casa
Era uma casa
muito engraçada
Não tinha teto,
não tinha nada
Ninguém podia
entrar nela, não
Porque na casa
não tinha chão
Ninguém podia
dormir na rede
Porque na casa
não tinha parede
Ninguém podia
fazer pipi
Porque penico
não tinha ali
Mas era feita
com muito esmero
Na rua dos bobos
Numero zero
29. Convite
Poesia
é brincar com palavras
como se brinca
com bola, papagaio, pião.
Só que
bola, papagaio,pião
de tanto brincar
se gastam.
As palavras não:
quanto mais se brinca
com elas
mais novas ficam.
Como a água do rio
que é água sempre nova.
Como cada dia
que é sempre um novo dia.
Vamos brincar de poesia?
30. O Espelho
E como eu passasse por diante do espelho
Não vi meu quarto com as suas estantes
Nem este meu rosto
Onde escorre o tempo.
Vi primeiro uns retratos na parede:
Janelas onde olham avós hirsutos
E as vovozinhas de saia-balão
Como para-quedistas às avessas que subissem do fundo do tempo.
O relógio marcava a hora
Mas não dizia o dia. O Tempo,
Desconcertado,
Estava parado.
Sim, estava parado
Em cima do telhado...
Como um catavento que perdeu as asas!
31. O tempo é um fio
O tempo é um fio fino bastante frágil. Mas ainda é tempo!
Um fio fino que à toa escapa.
Soltai os potros aos quatro ventos,
O tempo é um fio. mandai os servos de um pólo ao
Tecei! Tecei! outro,
Rendas de bilro com gentileza. vencei escarpas, dormi nas moitas,
Com mais empenho franças espessas. voltai com tempo que já se foi...
Malhas e redes com mais astúcia.
O tempo é um fio que vale muito.
Franças espessas carregam frutos.
Malhas e redes apanham peixes.
O tempo é um fio por entre os
dedos.
Escapa o fio, perdeu-se o tempo
Lá vai o tempo
como um farrapo
jogado à toa!
32. Soneto de aniversário
Passem-se dias, horas, meses, anos
Amadureçam as ilusões da vida
Prossiga ela sempre dividida
Entre compensações e desenganos.
Faça-se a carne mais envilecida
Diminuam os bens, cresçam os danos
Vença o ideal de andar caminhos planos
Melhor que levar tudo de vencida.
Queira-se antes ventura que aventura
À medida que a têmpora embranquece
E fica tenra a fibra que era dura.
E eu te direi: amiga minha, esquece...
Que grande é este amor meu de criatura
Que vê envelhecer e não envelhece.
34. Soneto de Fidelidade
De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
35. Fidelidade
Ainda agora e sempre
o amor complacente.
De perfil de frente
com vida perene.
E se mais ausente
a cada momento
Tanto mais presente
com o passar do tempo
à alma que consente
no maior silêncio
em guardá-lo dentro
de penumbra ardente
sem esquecimento
nunca para sempre
doloridamente
36. Mistério do amor
É o beija-flor
que beija a flor
ou é a flor
que beija o beija-flor?
37. Um dia acordarás
Um dia acordarás num quarto novo
Sem saber como foste para lá
E as vestes que acharás ao pé do leito
De tão estranhas te farão pasmar,
A janela abrirás, devagarinho:
Fará nevoeiro e tu nada verás...
Hás de tocar, a medo, a campainha
E, silenciosa, a porta se abrirá.
E um ser, que nunca viste, em um sorriso
Triste, te abraçará com seu maior carinho
E há de dizer-te para o teu assombro:
- Não te assustes de mim, que sofro há tanto!
Quero chorar - apenas - no teu ombro
E devorar teus olhos, meu amor...
38. Autopsicografia
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Fernando Pessoa
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