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O CORAÇÃO DO BAOBÁ História: Recriaçao de H. Gougard Tradução de Maria do Rosário Pedreira Formatação: Iracema- 03-10-10
Num dia de grande calor, um lebrão parou à sombra de um baobá, sentou-se na erva e, contemplando ao longe a restolhada sob o vento a soprar, sentiu-se infinitamente bem. Baobá, pensou ele, como é leve e fresca a tua sombra ao braseiro do meio-dia! Levantou o focinho para os ramos poderosos.  As folhas estremeceram felizes, devido aos pensamentos simpáticos que se lhes dirigiam.
O lebrão riu-se, vendo-as contentes. Ficou calado por uns instantes e depois, piscando o olho e batendo com a língua, tomado de malícia jovial, disse: A tua sombra é boa, é claro, seguramente melhor do que o teu fruto.  Não quero maldizer, mas o que me pende sobre a cabeça tem todo o ar de um odre de água morna.
O baobá, despeitado de ouvir assim duvidar dos seus sabores depois do elogio que lhe abrira a alma, entrou no jogo.  Deixou cair o fruto num tufo de erva.  O lebrão farejou-o, provou-o, achou-o delicioso.  Depois o devorou, lambeu o focinho e balançou a cabeça.
A grande árvore, impaciente por ouvir o seu veredicto, susteve a respiração. O teu fruto é bom!  admitiu o lebrão.
Depois sorriu, retomou a alegria impertinente e acrescentou: Seguramente é melhor do que o teu coração. Perdoa-me a franqueza: o coração que bate em ti parece-me mais duro do que uma pedra.
O baobá, ouvindo estas palavras, sentiu-se invadido por uma emoção que jamais experimentara.  Oferecer a este pequeno ser as suas belezas mais secretas, Deus do céu, era seu desejo!
Mas, assim de repente, que medo tinha de descobri-las!  Lentamente entreabriu a casca.
Então apareceram colares de pérolas, panos bordados, sandálias finas, jóias de ouro.  Todas estas maravilhas que enchiam o coração do baobá escorreram em profusão diante do lebrão, cujo focinho tremeu e cujos olhos se arregalaram.
Obrigado, obrigado. És a melhor e a mais bela árvore do mundo — disse ele, rindo como uma criança satisfeita e apanhando febrilmente o magnífico tesouro. Voltou a casa com as costas dobradas por todos esses bens. A mulher acolheu-o, pulando de alegria.
Aliviou-o depressa de tão belo fardo, vestiu panos e sandálias, ornou o pescoço de jóias e saiu para o mato, impaciente de ser admirada pelas companheiras. Encontrou uma hiena.
O outro lhe contou o que tinha dito e feito à sombra do baobá.   Esse cadáver, ofuscado pelas invejáveis riquezas que passavam por si, foi imediatamente à toca do lebrão e perguntou-lhe onde tinha encontrado aqueles ornamentos soberbos com que se vestia a esposa.
A hiena correu para lá com os olhos inflamados, ávida dos mesmos bens. Jogou o mesmo jogo.   O baobá, que a alegria do lebrão tinha verdadeiramente rejubilado, de novo se agradou de dar a sua frescura,
Depois, a música da sua folhagem e o sabor do seu fruto,  Finalmente, a beleza do seu coração.
Mas, quando a casca se abriu, a hiena atirou-se às maravilhosas oferendas como sobre uma presa. Escavando com unhas e dentes as profundezas da velha árvore para dela ainda arrancar mais coisas, pôs-se a resmungar:
E nas tuas entranhas o que há? Também quero devorar as tuas entranhas!  Quero tudo o que tens até as tuas raízes!  Quero tudo, ouves? O baobá, ferido, dilacerado, tomado de medo, guardou os seus tesouros.
E a hiena, insatisfeita e furiosa, voltou de mãos vazias para a floresta.  Desde esse dia, ela  procura desesperadamente oferendas ilusórias nos animais mortos que encontra, sem nunca ouvir a brisa singela que acalma o espírito.
Quanto ao baobá, já não abre a ninguém o seu coração.  Tem medo.  É preciso compreendê-lo: o mal que lhe fizeram é invisível, mas incurável.
Em verdade, o coração dos homens é semelhante ao desta árvore prodigiosa:  cheio de riquezas e benefícios.  Porque se abrirá tão pouco, quando se abre?
De que hiena se lembrará?

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O coração do baobá

  • 1. O CORAÇÃO DO BAOBÁ História: Recriaçao de H. Gougard Tradução de Maria do Rosário Pedreira Formatação: Iracema- 03-10-10
  • 2. Num dia de grande calor, um lebrão parou à sombra de um baobá, sentou-se na erva e, contemplando ao longe a restolhada sob o vento a soprar, sentiu-se infinitamente bem. Baobá, pensou ele, como é leve e fresca a tua sombra ao braseiro do meio-dia! Levantou o focinho para os ramos poderosos. As folhas estremeceram felizes, devido aos pensamentos simpáticos que se lhes dirigiam.
  • 3. O lebrão riu-se, vendo-as contentes. Ficou calado por uns instantes e depois, piscando o olho e batendo com a língua, tomado de malícia jovial, disse: A tua sombra é boa, é claro, seguramente melhor do que o teu fruto. Não quero maldizer, mas o que me pende sobre a cabeça tem todo o ar de um odre de água morna.
  • 4. O baobá, despeitado de ouvir assim duvidar dos seus sabores depois do elogio que lhe abrira a alma, entrou no jogo. Deixou cair o fruto num tufo de erva. O lebrão farejou-o, provou-o, achou-o delicioso. Depois o devorou, lambeu o focinho e balançou a cabeça.
  • 5. A grande árvore, impaciente por ouvir o seu veredicto, susteve a respiração. O teu fruto é bom! admitiu o lebrão.
  • 6. Depois sorriu, retomou a alegria impertinente e acrescentou: Seguramente é melhor do que o teu coração. Perdoa-me a franqueza: o coração que bate em ti parece-me mais duro do que uma pedra.
  • 7. O baobá, ouvindo estas palavras, sentiu-se invadido por uma emoção que jamais experimentara. Oferecer a este pequeno ser as suas belezas mais secretas, Deus do céu, era seu desejo!
  • 8. Mas, assim de repente, que medo tinha de descobri-las! Lentamente entreabriu a casca.
  • 9. Então apareceram colares de pérolas, panos bordados, sandálias finas, jóias de ouro. Todas estas maravilhas que enchiam o coração do baobá escorreram em profusão diante do lebrão, cujo focinho tremeu e cujos olhos se arregalaram.
  • 10. Obrigado, obrigado. És a melhor e a mais bela árvore do mundo — disse ele, rindo como uma criança satisfeita e apanhando febrilmente o magnífico tesouro. Voltou a casa com as costas dobradas por todos esses bens. A mulher acolheu-o, pulando de alegria.
  • 11. Aliviou-o depressa de tão belo fardo, vestiu panos e sandálias, ornou o pescoço de jóias e saiu para o mato, impaciente de ser admirada pelas companheiras. Encontrou uma hiena.
  • 12. O outro lhe contou o que tinha dito e feito à sombra do baobá. Esse cadáver, ofuscado pelas invejáveis riquezas que passavam por si, foi imediatamente à toca do lebrão e perguntou-lhe onde tinha encontrado aqueles ornamentos soberbos com que se vestia a esposa.
  • 13. A hiena correu para lá com os olhos inflamados, ávida dos mesmos bens. Jogou o mesmo jogo. O baobá, que a alegria do lebrão tinha verdadeiramente rejubilado, de novo se agradou de dar a sua frescura,
  • 14. Depois, a música da sua folhagem e o sabor do seu fruto, Finalmente, a beleza do seu coração.
  • 15. Mas, quando a casca se abriu, a hiena atirou-se às maravilhosas oferendas como sobre uma presa. Escavando com unhas e dentes as profundezas da velha árvore para dela ainda arrancar mais coisas, pôs-se a resmungar:
  • 16. E nas tuas entranhas o que há? Também quero devorar as tuas entranhas! Quero tudo o que tens até as tuas raízes! Quero tudo, ouves? O baobá, ferido, dilacerado, tomado de medo, guardou os seus tesouros.
  • 17. E a hiena, insatisfeita e furiosa, voltou de mãos vazias para a floresta. Desde esse dia, ela procura desesperadamente oferendas ilusórias nos animais mortos que encontra, sem nunca ouvir a brisa singela que acalma o espírito.
  • 18. Quanto ao baobá, já não abre a ninguém o seu coração. Tem medo. É preciso compreendê-lo: o mal que lhe fizeram é invisível, mas incurável.
  • 19. Em verdade, o coração dos homens é semelhante ao desta árvore prodigiosa: cheio de riquezas e benefícios. Porque se abrirá tão pouco, quando se abre?
  • 20. De que hiena se lembrará?