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ÓTICA DA COMPLEXIDADE – A ARTICULAÇÃO DOS SABERES
                     NELLY NOVAES COELHO, Universidade de S. Paulo

    Há uma inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados, fragmentados,
                       compartimentados entre disciplinas e, por outro lado, realidades e problemas cada vez mais
                       polidisciplinares, transversais, multidimensionais , transnacionais, globais, planetários. [...] A
     hiperespecialização impede de ver o global (que ela fragmenta em parcelas), bem como o essencial (que
    ela dilui). [...] o retalhamento das disciplinas (no Ensino) torna impossível apreender "o que é tecido junto",
                                                              isto é, o complexo, segundo o sentido original do termo.
                                                                                                  Edgar Morin. 2000



Nessa lúcida síntese da atual realidade, no campo do saber institucionalizado, Edgar
Morin toca no verdadeiro "nervo" da mutação em processo no mundo: a urgência de
uma reforma do pensamento que se sintonize com a nova ótica, através da qual, o
mundo vem sendo redescoberta pelas ciências e transformado pela informática.

Pensador dos mais fecundos, entre os intelectuais que, desde meados do século XX,
vêm analisando as transformações do conhecimento no mundo atual, o sociólogo
Edgar Morin, neste último meio século de estudos e polêmicas tem se dedicado
essencialmente às pesquisas que podemos chamar de "sondagens de limiar", ou
melhor, sondagem dos "pontos de encontro/desencontro" entre as várias áreas do
conhecimento (científicas, culturais, filosóficas, literárias, etc.), em busca das novas
respostas (ou de uma nova ordem), que só uma nova consciência-de-mundo poderá
dar.

Tarefa difícil e desafiante que, a esta altura dos tempos, já extrapolou das fronteiras
dos "estudos avançados" da "esfera dos iniciados", -essa que vem sendo exercida por
E. Morin ( e outros guias iluminadores) começa a ser exigida a cada um de nós que,
bem ou mal, fazemos parte do mundo pensante. Abrir caminho para um número cada
vez maior de "pensantes" (professores, educadores, psicólogos e outros) que
assumam essa tarefa seminal, vem sendo, sem dúvida, o grande alvo perseguido pelo
sociólogo francês, em suas constantes viagens, seminários e colóquios pelas "sete
partidas do mundo".

Da imensa rede de fenômenos ou de temas, que vêm sendo pesquisados por Morin (e
concretizados em dezenas de textos e livros), destacamos um que é, inegavelmente,
basilar em seu pensamento: o confronto que vem sendo feito entre o mundo das
certezas, herdado da tradição (fundado na concepção cartesiano-newtoniana,
racionalmente explicável por leis naturais, simples e imutáveis), e o mundo das
incertezas, gerado pelo nosso tempo de transformações (mundo complexo,
desvendado pela Física einsteniana que põe em xeque as leis simples e imutáveis em
que se apoiava o conhecimento herdado).

Lembremos que uma das revolucionárias descobertas de nosso tempo é que a ciência
já não é o reino da certeza. Se por um lado, o conhecimento científico se constrói sobre
múltiplas certezas, por outro, deixou de ser o domínio da certeza absoluta, no plano
teórico. Pode-se dizer que o principal "nervo" do pensamento complexo proposto por
Morin é a busca de uma nova percepção de mundo, a partir de uma nova ótica: a da
complexidade. Em lugar da antiga percepção reducionista, cartesiana, propõe-se a
conquista de uma nova percepção sistêmica, pós-cartesiana, ainda em gestação. Claro
está que o conflito entre essas duas percepções ainda está longe de ser resolvido. Sua
solução, como sabemos, depende das transformações em processo no mundo. Mas,
ao mesmo tempo (como o alerta Morin) essas transformações dependem da crescente
conscientização dos homens, em relação a elas e ao novo lugar que cabe a cada um
de nós no novo universo.

Complexidade e transdisciplinaridade
A complexidade do novo mundo em processo é, pois, a nova perspectiva, através da
qual o novo conhecimento deve ser procurado. É essa a grande bandeira que Morin
vem levantando, em sua cruzada pelo mundo, instigando as pesquisas de um novo
saber e apontando o pensamento complexo e o método transdisciplinar, como
possíveis caminhos de busca.

Não há dúvida de que esse é o grande problema do Ensino e da Pesquisa, em nossos
dias: o do conhecimento a ser descoberto, não mais isolado como algo-em-si, mas em
suas complexas relações com o contexto a que pertence. É esse um dos impactos do
pensamento proposto por Morin. O tentarmos assumi-lo resulta em um verdadeiro
desafio à nossa capacidade de elaborarmos o nosso conhecimento, seja no sentido de
organizarmos, em "sínteses provisórias", a avalanche de informações que nos
assaltam por todos os lados; seja nas incertezas, que nos lançam em dúvida, quanto à
validade ou não do próprio processo de conhecer, que a nova ótica (imposta pela
complexidade dos fenômenos) veio pôr em questão. De onde provém o conhecimento?
Do objeto, em sua realidade objetiva, sem interferência do sujeito? Ou é produzido no
sujeito que encontra em si própria os critérios de avaliação e conceituação do objeto?
(Interrogações que as descobertas da física quântica veio suscitar...). Enfim, nos
rastros do pensamento complexo, o que nos importa ressaltar aqui é o fato de que, no
lugar do sujeito seguro, baseado em certezas absolutas (fundado no pensamento
tradicional: positivista, empirista, determinista), está hoje um sujeito interrogante que
(tal qual o aprendiz de feiticeiro), diante desse mundo belo/horrível, em acelerada
transformação (e que ele mesmo criou), tenta encontrar um novo centro ou novo
ponto de apoio, para uma nova ordem (mesmo que seja provisória), em meio ao
oceano de dúvidas e incertezas que o assaltam.

O eu - novo centro do mundo
É em torno desse "sujeito interrogante" e do poder formalizador de sua "palavra" (ou
forma de expressão), que gira hoje o interesse maior das pesquisas, nos vários
campos do saber, visando descobrir novas práticas que substituam as antigas já
superadas.

Em um mundo descentrado como o nosso, cada um de nós se torna um centro
responsável pela experimentação de novas práticas, sintonizadas com o novo
pensamento sistêmico. É o que vem sendo feito por pequenos grupos, em vários
campos da pesquisa e do ensino, através das mil veredas desse "sertão" pós-formal.
Não há caminho principal, nem centro orientador. Todos os caminhos são válidos. Tudo
depende do sujeito que está no centro da busca e do objeto-alvo. Essa é uma das
idéias básicas do pensamento complexo: em meio à multiplicidade de caminhos que se
abrem à investigação, é fundamental a existência de um centro comum a todas as
áreas interligadas: a presença de um eu pensante e do projeto (de vida e de busca do
saber) que ele ponha em ação.

Sem dúvida, uma das áreas em que o pensamento complexo (ou pensamento pós-
formal), vem causando maior impacto é o da Educação e do Ensino. Área que, por
natureza, deve ser a "cúpula" ou a síntese da sociedade (cujos valores e
conhecimentos de base, ela tem a tarefa de transmitir às novas gerações), nestes
tempos de mudanças estruturais, está sendo obrigada a exercer uma tarefa
aparentemente oposta: a de questionar tais "valores e conhecimentos de base" e
propor outros em substituição, sem traumatizar o sistema.

É esse, um dos "nós górdios" a ser desatado neste século que se inicia. Em A Cabeça
bem-feita, Morin dedica especial atenção ao impasse Sociedade-Escola e ao "buraco
negro" que vem engolindo as sucessivas tentativas de reforma.

   "...esse buraco negro que lhes é invisível, só seria visível se as mentes fossem
   reformadas. E aqui chegamos a um impasse: não se pode reformar uma
   instituição, sem uma prévia reforma das mentes, mas não se pode reformar
   as mentes, sem uma prévia reforma das instituições. Essa é uma
   impossibilidade lógica que produz um duplo bloqueio. Há resistências
   inacreditáveis a essa reforma, a um tempo, una e dupla. A imensa máquina da
   educação é rígida e inflexível, fechada, burocratizada. Muitos professores estão
   instalados em seus hábitos e autonomia disciplinares. [...] Para eles o desafio é
   invisível. [...] Mas é preciso começar e o começo pode ser desviante e marginal.
   [...] Como sempre, a iniciativa só pode partir de uma minoria, a princípio
   incompreendida, às vezes perseguida. Depois a idéia é disseminada e quando
   se difunde, torna-se força atuante." (op.cit.p.100 -grifos do autor)


Eis o "buraco negro" que é preciso neutralizar. Por um lado, pergunta-se: "Quem vai
educar os educadores. para esse novo ensino?" Por outro, sabe-se que a resposta
depende da multiplicação dos estudos experimentais, pelos pequenos grupos, e
envolvendo professores. Todas as experiências, no sentido de "articular os saberes",
em torno de projetos que dinamizem o conhecimento de modo fecundo, são positivas.
Mas principalmente aquelas que se desenvolvem no âmbito das ciências humanas. É a
imagem do homem que, afinal, está em jogo, como sempre esteve, em todas as
crises da cultura, pelas quais o mundo já passou. No século XVIII, na crise da
passagem do mundo clássico para o muno romântico, Rousseau já dizia: "Nosso
verdadeiro estudo é o da condição humana." Afirmação que Edgar Morin retoma, ao
defender o papel que as ciências humanas devem desempenhar no processo de
articulação dos saberes. Diz ele:
"Paradoxalmente, são as ciências humanas que, no momento atual , oferecem a
   mais fraca contribuição ao estudo da condição humana, precisamente porque
   estão desligadas, fragmentadas e compartimentadas. Essa situação esconde
   inteiramente a relação indivíduo/espécie/sociedade, e esconde o próprio ser
   humano. [...] Seria preciso conceber uma ciência antropossocial religada. [...] À
   espera dessa religação -desejada pelas ciências, mas ainda fora de seu
   alcance-, seria importante que o ensino de cada uma delas fosse orientado para
   a condição humana. Assim a Psicologia, tendo como diretriz o destino individual
   e subjetivo do ser humano, deveria mostrar que Homo sapiens também é,
   indissoluvelmente, Homo demens; que Homo faber é, ao mesmo tempo, Homo
   ludens; que Homo economicus é, ao mesmo tempo, Homo mythologicus;
   que Homo prosaicus é, ao mesmo tempo, Homo poeticus. A Sociologia seria
   orientada para nosso destino social; a Economia para nosso destino econômico;
   um ensino sobre os mitos e as religiões seria orientado para o destino mítico-
   religioso do ser humano. [...] Quanto à contribuição da História para o
   conhecimento da condição humana, deve incluir o destino, a um só tempo,
   determinado e aleatório da humanidade. [...] Todas as disciplinas, tanto das
   ciências naturais como das ciências humanas, podem ser moblizadas, hoje, de
   modo a convergir para a condição humana." (op.cit.p.42)


É nessa ordem de idéias que se insere a sugestão de Morin, de que a Literatura seja
escolhida, como um dos possíveis eixos transdisciplinares, nos futuros currículos. É
urgente a re-humanização e a rearticulação interativa do Ensino. Diz ele:

   "A Literatura teria certa superioridade sobre a história e a sociologia, na medida
   em que ela considera os indivíduos inseridos em um meio, uma sociedade, uma
   história pessoal. [...] Ela trata os seres enquanto sujeitos com suas paixões,
   seus sentimentos, seus amores, -coisas que, falando do singular, do concreto
   das individualidades, se tornam, na maior parte das vezes, apagadas pela
   sociologia." (Morin. Journeés...1998)


Pela nossa longa experiência docente, no âmbito da literatura, iríamos mais longe em
sua defesa, como possível elo para "religar os saberes", num currículo transdisciplinar.
Todos os atuais problemas ainda em aberto na esfera do conhecimento (o eu como
centro privilegiado ou como mero satélite do processo-de-conhecer; as relações
sujeito-objeto; a relatividade do conhecimento; a dialética reducionismo/holismo; etc.)
podem ser descobertos e melhor compreendidos, através da transfiguração literária.
Inclusive. é urgente que os "distraídos" descubram que a literatura (a autêntica, a
grande). longe de ser mero entretenimento, é um testemunho da incrível aventura
humana, desde suas origens míticas ou históricas, até o limiar desta era em gestação,
de que somos personagens-construtores (ou inconscientes espectadores).

Ainda nesse sentido, lembramos que, através dos tempos, a Literatura e as Artes em
geral têm sido os primeiros arautos do "novo" ou de uma nova cultura em germinação.
Isso, evidentemente, porque esse "novo" surge sempre na esfera da intuição e das
emoções e, de imediato, só pode ser expresso pela linguagem emotiva, metafórica.
Sua manifestação racional, através de códigos ou linguagens convencionais,
organizadas pela lógica comum, só é possível mais tarde, quando o novo fenômeno
começa a amadurecer. Tal como acontece no plano biológico, com o óvulo fecundado,
que leva tempo para adquirir a forma do ser, do qual é semente, e surge inicialmente
como algo informe.

É nesse ponto de emergência do "informe", em busca de uma nova forma, que está
hoje o mundo. E também estamos nós, aprisionados no cyberespaço sem limites, em
que o mundo se transformou, e que tanto pode levar-nos a uma nova e esplendorosa
civilização, quanto lançar-nos em uma nova barbárie. Edgar Morin está entre os que
nos alertam para o fato de que tudo depende de nós. E que a principal via de ação é a
busca do novo conhecimento -o da complexidade-, a partir da auto-conscientização do
eu, como força atuante no contexto em que lhe cumpre viver. Como diz Morin:

   "Uma cultura cyber está em vias de se expandir, mesmo que só possa ser
   alcançada por alguns privilegiados. Trata-se de uma revolução radical que
   marca o surgimento da sociedade pós-industrial e que implica no nascimento de
   um novo pensamento. [...] A cultura cyber é simultaneamente destruição e
   gênese". (Articuler...1998)
Cabe a cada um de nós, a escolha: ficarmos à margem da corrente ou mergulharmos
nela...

***
BIBLIOGRAFIA
MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita. RJ, Bertrand Brasil, 2000
____________. Journées thématiques. Paris, M. de 1' Éducation, 1998
____________. Articuler les savoirs. Paris, M. de 1' Éducation, 1999
____________. Complexidade e transdisciplinaridade. Natal EDUFRN, 1999
____________. A Inteligência da complexidade. SP, Peirópolis, 2000

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Morin

  • 1. ÓTICA DA COMPLEXIDADE – A ARTICULAÇÃO DOS SABERES NELLY NOVAES COELHO, Universidade de S. Paulo Há uma inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas e, por outro lado, realidades e problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais , transnacionais, globais, planetários. [...] A hiperespecialização impede de ver o global (que ela fragmenta em parcelas), bem como o essencial (que ela dilui). [...] o retalhamento das disciplinas (no Ensino) torna impossível apreender "o que é tecido junto", isto é, o complexo, segundo o sentido original do termo. Edgar Morin. 2000 Nessa lúcida síntese da atual realidade, no campo do saber institucionalizado, Edgar Morin toca no verdadeiro "nervo" da mutação em processo no mundo: a urgência de uma reforma do pensamento que se sintonize com a nova ótica, através da qual, o mundo vem sendo redescoberta pelas ciências e transformado pela informática. Pensador dos mais fecundos, entre os intelectuais que, desde meados do século XX, vêm analisando as transformações do conhecimento no mundo atual, o sociólogo Edgar Morin, neste último meio século de estudos e polêmicas tem se dedicado essencialmente às pesquisas que podemos chamar de "sondagens de limiar", ou melhor, sondagem dos "pontos de encontro/desencontro" entre as várias áreas do conhecimento (científicas, culturais, filosóficas, literárias, etc.), em busca das novas respostas (ou de uma nova ordem), que só uma nova consciência-de-mundo poderá dar. Tarefa difícil e desafiante que, a esta altura dos tempos, já extrapolou das fronteiras dos "estudos avançados" da "esfera dos iniciados", -essa que vem sendo exercida por E. Morin ( e outros guias iluminadores) começa a ser exigida a cada um de nós que, bem ou mal, fazemos parte do mundo pensante. Abrir caminho para um número cada vez maior de "pensantes" (professores, educadores, psicólogos e outros) que assumam essa tarefa seminal, vem sendo, sem dúvida, o grande alvo perseguido pelo sociólogo francês, em suas constantes viagens, seminários e colóquios pelas "sete partidas do mundo". Da imensa rede de fenômenos ou de temas, que vêm sendo pesquisados por Morin (e concretizados em dezenas de textos e livros), destacamos um que é, inegavelmente, basilar em seu pensamento: o confronto que vem sendo feito entre o mundo das certezas, herdado da tradição (fundado na concepção cartesiano-newtoniana, racionalmente explicável por leis naturais, simples e imutáveis), e o mundo das incertezas, gerado pelo nosso tempo de transformações (mundo complexo, desvendado pela Física einsteniana que põe em xeque as leis simples e imutáveis em que se apoiava o conhecimento herdado). Lembremos que uma das revolucionárias descobertas de nosso tempo é que a ciência já não é o reino da certeza. Se por um lado, o conhecimento científico se constrói sobre múltiplas certezas, por outro, deixou de ser o domínio da certeza absoluta, no plano teórico. Pode-se dizer que o principal "nervo" do pensamento complexo proposto por
  • 2. Morin é a busca de uma nova percepção de mundo, a partir de uma nova ótica: a da complexidade. Em lugar da antiga percepção reducionista, cartesiana, propõe-se a conquista de uma nova percepção sistêmica, pós-cartesiana, ainda em gestação. Claro está que o conflito entre essas duas percepções ainda está longe de ser resolvido. Sua solução, como sabemos, depende das transformações em processo no mundo. Mas, ao mesmo tempo (como o alerta Morin) essas transformações dependem da crescente conscientização dos homens, em relação a elas e ao novo lugar que cabe a cada um de nós no novo universo. Complexidade e transdisciplinaridade A complexidade do novo mundo em processo é, pois, a nova perspectiva, através da qual o novo conhecimento deve ser procurado. É essa a grande bandeira que Morin vem levantando, em sua cruzada pelo mundo, instigando as pesquisas de um novo saber e apontando o pensamento complexo e o método transdisciplinar, como possíveis caminhos de busca. Não há dúvida de que esse é o grande problema do Ensino e da Pesquisa, em nossos dias: o do conhecimento a ser descoberto, não mais isolado como algo-em-si, mas em suas complexas relações com o contexto a que pertence. É esse um dos impactos do pensamento proposto por Morin. O tentarmos assumi-lo resulta em um verdadeiro desafio à nossa capacidade de elaborarmos o nosso conhecimento, seja no sentido de organizarmos, em "sínteses provisórias", a avalanche de informações que nos assaltam por todos os lados; seja nas incertezas, que nos lançam em dúvida, quanto à validade ou não do próprio processo de conhecer, que a nova ótica (imposta pela complexidade dos fenômenos) veio pôr em questão. De onde provém o conhecimento? Do objeto, em sua realidade objetiva, sem interferência do sujeito? Ou é produzido no sujeito que encontra em si própria os critérios de avaliação e conceituação do objeto? (Interrogações que as descobertas da física quântica veio suscitar...). Enfim, nos rastros do pensamento complexo, o que nos importa ressaltar aqui é o fato de que, no lugar do sujeito seguro, baseado em certezas absolutas (fundado no pensamento tradicional: positivista, empirista, determinista), está hoje um sujeito interrogante que (tal qual o aprendiz de feiticeiro), diante desse mundo belo/horrível, em acelerada transformação (e que ele mesmo criou), tenta encontrar um novo centro ou novo ponto de apoio, para uma nova ordem (mesmo que seja provisória), em meio ao oceano de dúvidas e incertezas que o assaltam. O eu - novo centro do mundo É em torno desse "sujeito interrogante" e do poder formalizador de sua "palavra" (ou forma de expressão), que gira hoje o interesse maior das pesquisas, nos vários campos do saber, visando descobrir novas práticas que substituam as antigas já superadas. Em um mundo descentrado como o nosso, cada um de nós se torna um centro responsável pela experimentação de novas práticas, sintonizadas com o novo pensamento sistêmico. É o que vem sendo feito por pequenos grupos, em vários campos da pesquisa e do ensino, através das mil veredas desse "sertão" pós-formal.
  • 3. Não há caminho principal, nem centro orientador. Todos os caminhos são válidos. Tudo depende do sujeito que está no centro da busca e do objeto-alvo. Essa é uma das idéias básicas do pensamento complexo: em meio à multiplicidade de caminhos que se abrem à investigação, é fundamental a existência de um centro comum a todas as áreas interligadas: a presença de um eu pensante e do projeto (de vida e de busca do saber) que ele ponha em ação. Sem dúvida, uma das áreas em que o pensamento complexo (ou pensamento pós- formal), vem causando maior impacto é o da Educação e do Ensino. Área que, por natureza, deve ser a "cúpula" ou a síntese da sociedade (cujos valores e conhecimentos de base, ela tem a tarefa de transmitir às novas gerações), nestes tempos de mudanças estruturais, está sendo obrigada a exercer uma tarefa aparentemente oposta: a de questionar tais "valores e conhecimentos de base" e propor outros em substituição, sem traumatizar o sistema. É esse, um dos "nós górdios" a ser desatado neste século que se inicia. Em A Cabeça bem-feita, Morin dedica especial atenção ao impasse Sociedade-Escola e ao "buraco negro" que vem engolindo as sucessivas tentativas de reforma. "...esse buraco negro que lhes é invisível, só seria visível se as mentes fossem reformadas. E aqui chegamos a um impasse: não se pode reformar uma instituição, sem uma prévia reforma das mentes, mas não se pode reformar as mentes, sem uma prévia reforma das instituições. Essa é uma impossibilidade lógica que produz um duplo bloqueio. Há resistências inacreditáveis a essa reforma, a um tempo, una e dupla. A imensa máquina da educação é rígida e inflexível, fechada, burocratizada. Muitos professores estão instalados em seus hábitos e autonomia disciplinares. [...] Para eles o desafio é invisível. [...] Mas é preciso começar e o começo pode ser desviante e marginal. [...] Como sempre, a iniciativa só pode partir de uma minoria, a princípio incompreendida, às vezes perseguida. Depois a idéia é disseminada e quando se difunde, torna-se força atuante." (op.cit.p.100 -grifos do autor) Eis o "buraco negro" que é preciso neutralizar. Por um lado, pergunta-se: "Quem vai educar os educadores. para esse novo ensino?" Por outro, sabe-se que a resposta depende da multiplicação dos estudos experimentais, pelos pequenos grupos, e envolvendo professores. Todas as experiências, no sentido de "articular os saberes", em torno de projetos que dinamizem o conhecimento de modo fecundo, são positivas. Mas principalmente aquelas que se desenvolvem no âmbito das ciências humanas. É a imagem do homem que, afinal, está em jogo, como sempre esteve, em todas as crises da cultura, pelas quais o mundo já passou. No século XVIII, na crise da passagem do mundo clássico para o muno romântico, Rousseau já dizia: "Nosso verdadeiro estudo é o da condição humana." Afirmação que Edgar Morin retoma, ao defender o papel que as ciências humanas devem desempenhar no processo de articulação dos saberes. Diz ele:
  • 4. "Paradoxalmente, são as ciências humanas que, no momento atual , oferecem a mais fraca contribuição ao estudo da condição humana, precisamente porque estão desligadas, fragmentadas e compartimentadas. Essa situação esconde inteiramente a relação indivíduo/espécie/sociedade, e esconde o próprio ser humano. [...] Seria preciso conceber uma ciência antropossocial religada. [...] À espera dessa religação -desejada pelas ciências, mas ainda fora de seu alcance-, seria importante que o ensino de cada uma delas fosse orientado para a condição humana. Assim a Psicologia, tendo como diretriz o destino individual e subjetivo do ser humano, deveria mostrar que Homo sapiens também é, indissoluvelmente, Homo demens; que Homo faber é, ao mesmo tempo, Homo ludens; que Homo economicus é, ao mesmo tempo, Homo mythologicus; que Homo prosaicus é, ao mesmo tempo, Homo poeticus. A Sociologia seria orientada para nosso destino social; a Economia para nosso destino econômico; um ensino sobre os mitos e as religiões seria orientado para o destino mítico- religioso do ser humano. [...] Quanto à contribuição da História para o conhecimento da condição humana, deve incluir o destino, a um só tempo, determinado e aleatório da humanidade. [...] Todas as disciplinas, tanto das ciências naturais como das ciências humanas, podem ser moblizadas, hoje, de modo a convergir para a condição humana." (op.cit.p.42) É nessa ordem de idéias que se insere a sugestão de Morin, de que a Literatura seja escolhida, como um dos possíveis eixos transdisciplinares, nos futuros currículos. É urgente a re-humanização e a rearticulação interativa do Ensino. Diz ele: "A Literatura teria certa superioridade sobre a história e a sociologia, na medida em que ela considera os indivíduos inseridos em um meio, uma sociedade, uma história pessoal. [...] Ela trata os seres enquanto sujeitos com suas paixões, seus sentimentos, seus amores, -coisas que, falando do singular, do concreto das individualidades, se tornam, na maior parte das vezes, apagadas pela sociologia." (Morin. Journeés...1998) Pela nossa longa experiência docente, no âmbito da literatura, iríamos mais longe em sua defesa, como possível elo para "religar os saberes", num currículo transdisciplinar. Todos os atuais problemas ainda em aberto na esfera do conhecimento (o eu como centro privilegiado ou como mero satélite do processo-de-conhecer; as relações sujeito-objeto; a relatividade do conhecimento; a dialética reducionismo/holismo; etc.) podem ser descobertos e melhor compreendidos, através da transfiguração literária. Inclusive. é urgente que os "distraídos" descubram que a literatura (a autêntica, a grande). longe de ser mero entretenimento, é um testemunho da incrível aventura humana, desde suas origens míticas ou históricas, até o limiar desta era em gestação, de que somos personagens-construtores (ou inconscientes espectadores). Ainda nesse sentido, lembramos que, através dos tempos, a Literatura e as Artes em geral têm sido os primeiros arautos do "novo" ou de uma nova cultura em germinação.
  • 5. Isso, evidentemente, porque esse "novo" surge sempre na esfera da intuição e das emoções e, de imediato, só pode ser expresso pela linguagem emotiva, metafórica. Sua manifestação racional, através de códigos ou linguagens convencionais, organizadas pela lógica comum, só é possível mais tarde, quando o novo fenômeno começa a amadurecer. Tal como acontece no plano biológico, com o óvulo fecundado, que leva tempo para adquirir a forma do ser, do qual é semente, e surge inicialmente como algo informe. É nesse ponto de emergência do "informe", em busca de uma nova forma, que está hoje o mundo. E também estamos nós, aprisionados no cyberespaço sem limites, em que o mundo se transformou, e que tanto pode levar-nos a uma nova e esplendorosa civilização, quanto lançar-nos em uma nova barbárie. Edgar Morin está entre os que nos alertam para o fato de que tudo depende de nós. E que a principal via de ação é a busca do novo conhecimento -o da complexidade-, a partir da auto-conscientização do eu, como força atuante no contexto em que lhe cumpre viver. Como diz Morin: "Uma cultura cyber está em vias de se expandir, mesmo que só possa ser alcançada por alguns privilegiados. Trata-se de uma revolução radical que marca o surgimento da sociedade pós-industrial e que implica no nascimento de um novo pensamento. [...] A cultura cyber é simultaneamente destruição e gênese". (Articuler...1998) Cabe a cada um de nós, a escolha: ficarmos à margem da corrente ou mergulharmos nela... *** BIBLIOGRAFIA MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita. RJ, Bertrand Brasil, 2000 ____________. Journées thématiques. Paris, M. de 1' Éducation, 1998 ____________. Articuler les savoirs. Paris, M. de 1' Éducation, 1999 ____________. Complexidade e transdisciplinaridade. Natal EDUFRN, 1999 ____________. A Inteligência da complexidade. SP, Peirópolis, 2000