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Reconto do Conto Feliz Aniversário, de Clarice Lispector no gênero notícia.
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                         3º “B” News
Idosa discrimina a falsidade afetiva de
seus parentes em sua própria festa de
             aniversário.

                                                                                 27 setembro de 2012.


                                                      forma possível, portando-se de maneira


        N
                 o último final de semana na          arrogante, perante a família do marido. Este não
                 cidade do Rio de Janeiro, em uma     fora porque não queria ver os irmãos. Em
                 região entre a Copacabana e a        seguida, chegou outra nora, a de Ipanema, um
Zona Norte da cidade aconteceu uma festa de           bairro nobre vizinho à Copacabana. Ambas as
aniversário em homenagem ao 89º aniversário           noras, a de Olaria e Ipanema, nem se olhavam,
de D. Anita, onde teve desfecho nada agradável.       deixando transparecer um conflito entre elas.
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afetiva dos familiares, e a aniversariante, que       Antecipadamente, a homenageada da festa
permaneceu sentada sempre no mesmo lugar,             também fora colocada diante da mesa,
observou tudo imóvel e muda, até que um               arrumada, para esperar os convidados e,
determinado momento seu limite extrapola e D.         consequentemente, não atrasar Zilda na
Anita denuncia, com gestos e palavras, toda a         organização da festa. A nonagenária captava,
farsa ali embutida, acabando com a falsa festa.       atenciosamente, tudo o que acontecia ao seu
          Tudo se iniciou com a chegada de uma        redor, escutava todas as conversas e
das noras da aniversariante, que reside em            comentários expressos de cada um dos
Olaria, bairro localizado na zona norte. Ela trazia   presentes. Isso tudo lhe causou um nojo
consigo os três filhos e trajava-se da melhor         excessivo e repugnante que ia se acumulando
                                                      no decorrer da festa.
                                                               Após a chegada das noras, de Olaria e
                                                      Ipanema, o restante da família começou a
                                                      chegar e a encher a sala, tornando o ambiente
                                                      ruidoso e inaugurando a festa. Neste instante, a
                                                      aniversariante em sua seriedade, não se
                                                      expressava mais nem com um olhar. José, seu
                                                      filho mais velho, anunciou a idade da mãe,
                                                      mostrando uma admiração para aqueles que se
                                                      encontravam na festa. Manuel, irmão e sócio de
                                                      José, também levantou a voz e anunciou os
                                                      oitenta e nove anos que ali se comemoravam,
                                                      entretanto sua esposa o reprimiu diante da sua
                                                      atitude. Dentre os convidados, nem todos
                                                      levaram     presentes     e   aqueles     que   a
presentearam, foram desconsiderados por Zilda.          perguntando se não iria fazer mal, enfurecida
Esta se aproveitava dos presentes para benefício        respondeu-lhe agressivamente, atingindo a todos
próprio e resmungava quando algum não lhe               os presentes com palavras fortes e agressivas.
servia.                                                 Depois que bebeu o vinho, a aniversariante
         Quando chegou a hora dos parabéns,             permaneceu com um olhar fixo e silencioso, esta
todos ficam envoltos à mesa, Zilda que havia            atitude foi considerada pelos familiares um ato
escrito 89 em um pedaço de papel que ninguém,           infantil da nonagenária, manifestado através das
ao menos, perguntou ou disse nada a respeito            risadas.
da ideia dela em por a idade daquela forma                        A festa estava acabada. Alguns se
sobre o bolo. Na hora dos parabéns, José                encontravam sentados e reflexivos, as crianças
começou as palmas e devido ao seu olhar                 continuavam brincando ater o fim da tarde. A
autoritário, todos começaram a cantar. A vela foi       aniversariante recebeu um beijo de cada um
apagada por um bisneto e, logo após, a lâmpada          como se fosse uma estranha perante aquele
foi acesa e alguns gritaram: “Viva mamãe!”, “Viva       grupo que ali se reunia.
vovó!”. Surgiu inclusive, um “Viva d. Anita”, dito                José que era o encarregado de fazer o
pela primeira vez no conto e pela vizinha, uma          discurso não sabia o que dizer, aguardava uma
pessoa fora da rede de parentesco.                      frase “Que não vinha”. Todos esperavam o
         A senhora permaneceu passiva até vir a         discurso que se alongava silenciosamente. José,
cortar o bolo e neste momento, ela rompeu sua           então, disse “Até o ano que vem” e Manoel
imagem de mulher digna. A associação que a              complementou “No ano que vem nos veremos
mesma fazia entre o cortar e matar assemelhava          diante do bolo aceso!”, houve certo receio em
o aniversário a um funeral, bem como a                  tais palavras. Toda cena conceituada pela
organização das cadeiras. A aniversariante,             aniversariante como uma encenação teatral, em
através de um monólogo interior, ressaltou o seu        que há a falência da linguagem verbal através do
desprezo por ter gerado seres marcados pela             esforço de falar bonito diante dos parentes.
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denotando uma maneira grosseira de se pensar            veremos, mamãe!” e ela acarinhada grita que
a família. Daqueles apenas Rodrigo, filho de            não é surda, e intimamente, que não é idiota. Na
Cordélia, era digno e lhe trazia orgulho.               hora de despedida, alguns conseguiram olhar
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sentir dos seus filhos, pois eles haviam nascido        Não sabiam, mas olhavam sorrindo uns para os
de uma união rica em valores. Entretanto, via a         outros. “Até o ano que vem” era a única coisa
falsidade estampada no rosto de cada um deles.          que sabiam dizer.
De repente, D. Anita cospe no chão e este é o                     O triste e falso aniversário de D. Anita
momento em que chega ao seu limite, expondo             lhe causou muita repugnância, pois a situação de
um reflexo da desestruturação familiar em seu           completar mais um ano de vida deveria ser de
extremo. Após este ato, Zilda se exaltou e disse        alegria e satisfação para a família e naquela
que a mãe nunca tinha feito isso, percebendo            situação ocorreu justamente o oposto porque as
que todos consentiam, ela assumiu o fato da             relações entre os familiares aconteceram de
velha estar agindo deste modo constantemente.           maneira forçada e tudo funcionou no plano do
De súbito, a velha pediu um copo de vinho e isso        “parecer ser”.
causou surpresa a todos. A neta negou-lhe



                                                                                      Repórteres:
                                                                            Cássio Soriano, nº 10
                                                                           Natachi Carvalho, nº 11
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                                                     Cruzeiro do Sul-Acre, 27 de setembro de 2012.
                                                                                  Jornal 3”B” News

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Conto feliz aniversário de Clarice Lispector no gênero notícia

  • 1. Reconto do Conto Feliz Aniversário, de Clarice Lispector no gênero notícia. Conto da obra "Laços de Família” 1ª edição 3º “B” News Idosa discrimina a falsidade afetiva de seus parentes em sua própria festa de aniversário. 27 setembro de 2012. forma possível, portando-se de maneira N o último final de semana na arrogante, perante a família do marido. Este não cidade do Rio de Janeiro, em uma fora porque não queria ver os irmãos. Em região entre a Copacabana e a seguida, chegou outra nora, a de Ipanema, um Zona Norte da cidade aconteceu uma festa de bairro nobre vizinho à Copacabana. Ambas as aniversário em homenagem ao 89º aniversário noras, a de Olaria e Ipanema, nem se olhavam, de D. Anita, onde teve desfecho nada agradável. deixando transparecer um conflito entre elas. A festa foi organizada e realizada na casa de sua A aniversariante morava com sua filha filha Zilda, com quem ela morava. Na ocasião se Zilda, a única entre seis irmãos que tinha espaço encontraram presente os familiares para e tempo para abrigá-la. Zilda arrumou toda a parabenizar-lhe, entretanto não havia a presença festa cedo com todos os apetrechos necessários. afetiva dos familiares, e a aniversariante, que Antecipadamente, a homenageada da festa permaneceu sentada sempre no mesmo lugar, também fora colocada diante da mesa, observou tudo imóvel e muda, até que um arrumada, para esperar os convidados e, determinado momento seu limite extrapola e D. consequentemente, não atrasar Zilda na Anita denuncia, com gestos e palavras, toda a organização da festa. A nonagenária captava, farsa ali embutida, acabando com a falsa festa. atenciosamente, tudo o que acontecia ao seu Tudo se iniciou com a chegada de uma redor, escutava todas as conversas e das noras da aniversariante, que reside em comentários expressos de cada um dos Olaria, bairro localizado na zona norte. Ela trazia presentes. Isso tudo lhe causou um nojo consigo os três filhos e trajava-se da melhor excessivo e repugnante que ia se acumulando no decorrer da festa. Após a chegada das noras, de Olaria e Ipanema, o restante da família começou a chegar e a encher a sala, tornando o ambiente ruidoso e inaugurando a festa. Neste instante, a aniversariante em sua seriedade, não se expressava mais nem com um olhar. José, seu filho mais velho, anunciou a idade da mãe, mostrando uma admiração para aqueles que se encontravam na festa. Manuel, irmão e sócio de José, também levantou a voz e anunciou os oitenta e nove anos que ali se comemoravam, entretanto sua esposa o reprimiu diante da sua atitude. Dentre os convidados, nem todos levaram presentes e aqueles que a
  • 2. presentearam, foram desconsiderados por Zilda. perguntando se não iria fazer mal, enfurecida Esta se aproveitava dos presentes para benefício respondeu-lhe agressivamente, atingindo a todos próprio e resmungava quando algum não lhe os presentes com palavras fortes e agressivas. servia. Depois que bebeu o vinho, a aniversariante Quando chegou a hora dos parabéns, permaneceu com um olhar fixo e silencioso, esta todos ficam envoltos à mesa, Zilda que havia atitude foi considerada pelos familiares um ato escrito 89 em um pedaço de papel que ninguém, infantil da nonagenária, manifestado através das ao menos, perguntou ou disse nada a respeito risadas. da ideia dela em por a idade daquela forma A festa estava acabada. Alguns se sobre o bolo. Na hora dos parabéns, José encontravam sentados e reflexivos, as crianças começou as palmas e devido ao seu olhar continuavam brincando ater o fim da tarde. A autoritário, todos começaram a cantar. A vela foi aniversariante recebeu um beijo de cada um apagada por um bisneto e, logo após, a lâmpada como se fosse uma estranha perante aquele foi acesa e alguns gritaram: “Viva mamãe!”, “Viva grupo que ali se reunia. vovó!”. Surgiu inclusive, um “Viva d. Anita”, dito José que era o encarregado de fazer o pela primeira vez no conto e pela vizinha, uma discurso não sabia o que dizer, aguardava uma pessoa fora da rede de parentesco. frase “Que não vinha”. Todos esperavam o A senhora permaneceu passiva até vir a discurso que se alongava silenciosamente. José, cortar o bolo e neste momento, ela rompeu sua então, disse “Até o ano que vem” e Manoel imagem de mulher digna. A associação que a complementou “No ano que vem nos veremos mesma fazia entre o cortar e matar assemelhava diante do bolo aceso!”, houve certo receio em o aniversário a um funeral, bem como a tais palavras. Toda cena conceituada pela organização das cadeiras. A aniversariante, aniversariante como uma encenação teatral, em através de um monólogo interior, ressaltou o seu que há a falência da linguagem verbal através do desprezo por ter gerado seres marcados pela esforço de falar bonito diante dos parentes. insensatez e pensou “como se cuspisse”, José repete “No ano que vem nos denotando uma maneira grosseira de se pensar veremos, mamãe!” e ela acarinhada grita que a família. Daqueles apenas Rodrigo, filho de não é surda, e intimamente, que não é idiota. Na Cordélia, era digno e lhe trazia orgulho. hora de despedida, alguns conseguiram olhar A senhora naquele momento relembrou nos olhos dos outros sem receio e faltava-lhes a do seu casamento e do orgulho que poderia ultima palavra, que não sabiam dizer qual era. sentir dos seus filhos, pois eles haviam nascido Não sabiam, mas olhavam sorrindo uns para os de uma união rica em valores. Entretanto, via a outros. “Até o ano que vem” era a única coisa falsidade estampada no rosto de cada um deles. que sabiam dizer. De repente, D. Anita cospe no chão e este é o O triste e falso aniversário de D. Anita momento em que chega ao seu limite, expondo lhe causou muita repugnância, pois a situação de um reflexo da desestruturação familiar em seu completar mais um ano de vida deveria ser de extremo. Após este ato, Zilda se exaltou e disse alegria e satisfação para a família e naquela que a mãe nunca tinha feito isso, percebendo situação ocorreu justamente o oposto porque as que todos consentiam, ela assumiu o fato da relações entre os familiares aconteceram de velha estar agindo deste modo constantemente. maneira forçada e tudo funcionou no plano do De súbito, a velha pediu um copo de vinho e isso “parecer ser”. causou surpresa a todos. A neta negou-lhe Repórteres: Cássio Soriano, nº 10 Natachi Carvalho, nº 11 Luna Natacha, nº 23 Cruzeiro do Sul-Acre, 27 de setembro de 2012. Jornal 3”B” News