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AS TERRAS DO ARACAJU

                                              *Bruno Henrique Santana Rezende

      Grandes charcos, salinas e sítios espalhados à beira mar. Essa poderia
ser uma superficial, mas importante, definição visual de Aracaju no início do
Século XIX. O sonho capitaneado por Ignácio Joaquim Barbosa deu certo,
conseguiu transformar um pequeno povoado, basicamente formado por
pescadores, em uma capital provincial.

      Em 17 de março de 1855 São Cristóvão deixa de ser a capital da
província de Sergipe Del Rey para dar lugar às terras do Aracaju. A justificativa
apresentada pelo então governo provincial era de caráter técnico, motivado,
conforme afirma Luís Antônio Barreto em publicação no Jornal Correio de
Sergipe (28/11/2004), “pelo crescimento econômico e pela melhoria social”. O
desenho da capital, feito pelo engenheiro Basílio Pirro, imitando um tabuleiro
de xadrez, foi algo inovador à época. Aracaju se constituía na segunda capital
brasileira a ser planejada, a primeira foi Teresina, em 1852.

      Uma importante informação a se destacar é que antes de 1855, Aracaju
já existia. Não nos moldes de uma cidade, mas como povoação. Por essas
terras, já se achava presente um pequeno povoado, que levava o nome de
Santo Antônio do Aracaju. Concentrava-se basicamente onde hoje fica o Bairro
Industrial e nas imediações da colina do Santo Antônio. Mas, como bem
afirmou Terezinha Oliva (2002, p. 30), “A capital concebida e projetada [...] não
seria estabelecida no Povoado de Santo Antônio, mas na praia”.

      No antigo povoado de Santo Antônio, já existia uma capela em devoção
ao santo que dá nome ao povoado e, como bem frisou a historiadora Maria
Nely Santos em seu livro Aracaju: um olhar sobre sua evolução (2008, p. 17)
“se havia uma capela, haviam devotos [...]. Senhores de engenho, sitiantes e
fazendeiros,   salineiros   e   pescadores   animaram     de    vida   a   pequena
comunidade”.




*Graduando em História pela Universidade federal de Sergipe, cursando Arquivologia,
ministrada pela Professora Maria Nely Santos. E-mail: bhsrezende@hotmail.com
Tal feito trouxe, normalmente, críticas e elogios. A recém criada cidade
desprovia de água encanada e de esgotamento sanitário, o que não era uma
especificidade de Aracaju, mas de diversas cidades mundo afora. Antônio
Samarone em As febres do Aracaju (2001, p. 21) afirma que somente “em 1909
começou a funcionar a distribuição de água canalizada na capital; e, em 1914
[...] implantou-se o sistema de esgotamento sanitário”. Mas esses não eram as
únicas queixas dos “primeiros aracajuanos”. A cidade era basicamente
constituída por órgãos públicos, não havia uma vida urbana organizada.

      Aos poucos a cidade tomava corpo, se consolidava como centro urbano
e iniciou-se um processo de “aracajuanização” da consciência popular.
Misturado ao imaginário dos que já habitavam o povoado de Santo Antônio,
aos poucos, a ideia de pertencimento à Aracaju foi tomando conta da cidade,
foi-se criando uma identidade própria, peculiar. É difícil entender como uma
cidade formada por pessoas dos mais diversos lugares pudesse ter um
sentimento de pertencimento próprio, mas Aracaju sempre foi abençoada pelos
encantos de sua natureza e isso pode ter sido um fator preponderante.

      Hoje, 158 anos depois do erguimento da nova capital, podemos ainda
ver alguns resquícios de nossa história, apesar da falta de políticas públicas
voltadas para a preservação de nosso patrimônio. Quando passamos em frente
ao Palácio Olímpio Campos, quando passeamos pela Av. Ivo do Prado
(conhecidamente Rua da Frente), quando cruzamos os calçadões das
Laranjeiras e João Pessoa, entre diversos outros lugares, podemos perceber
aspectos que nos levam a reflexão de como era a vida na Aracaju dos Séculos
XIX e XX.

      Hoje, podemos afirmar que o sonho idealizado por Ignácio Barbosa, de
ver nessas terras uma cidade bem estruturada e com vida própria, possa ser
concreto. Claro que como toda e qualquer cidade que se propõe ser grande,
Aracaju passa por problemas estruturais, mas isso não diminui o brilho e a
importância de nossa história. O nosso dever, enquanto sergipanos, é de não
deixar se perder na poeira do esquecimento as nossas características e a
nossa história. Preservar a memória da nossa capital é uma tarefa de todos.
Viva a terra dos cajueiros e dos papagaios, a princesinha da praia.

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  • 1. AS TERRAS DO ARACAJU *Bruno Henrique Santana Rezende Grandes charcos, salinas e sítios espalhados à beira mar. Essa poderia ser uma superficial, mas importante, definição visual de Aracaju no início do Século XIX. O sonho capitaneado por Ignácio Joaquim Barbosa deu certo, conseguiu transformar um pequeno povoado, basicamente formado por pescadores, em uma capital provincial. Em 17 de março de 1855 São Cristóvão deixa de ser a capital da província de Sergipe Del Rey para dar lugar às terras do Aracaju. A justificativa apresentada pelo então governo provincial era de caráter técnico, motivado, conforme afirma Luís Antônio Barreto em publicação no Jornal Correio de Sergipe (28/11/2004), “pelo crescimento econômico e pela melhoria social”. O desenho da capital, feito pelo engenheiro Basílio Pirro, imitando um tabuleiro de xadrez, foi algo inovador à época. Aracaju se constituía na segunda capital brasileira a ser planejada, a primeira foi Teresina, em 1852. Uma importante informação a se destacar é que antes de 1855, Aracaju já existia. Não nos moldes de uma cidade, mas como povoação. Por essas terras, já se achava presente um pequeno povoado, que levava o nome de Santo Antônio do Aracaju. Concentrava-se basicamente onde hoje fica o Bairro Industrial e nas imediações da colina do Santo Antônio. Mas, como bem afirmou Terezinha Oliva (2002, p. 30), “A capital concebida e projetada [...] não seria estabelecida no Povoado de Santo Antônio, mas na praia”. No antigo povoado de Santo Antônio, já existia uma capela em devoção ao santo que dá nome ao povoado e, como bem frisou a historiadora Maria Nely Santos em seu livro Aracaju: um olhar sobre sua evolução (2008, p. 17) “se havia uma capela, haviam devotos [...]. Senhores de engenho, sitiantes e fazendeiros, salineiros e pescadores animaram de vida a pequena comunidade”. *Graduando em História pela Universidade federal de Sergipe, cursando Arquivologia, ministrada pela Professora Maria Nely Santos. E-mail: bhsrezende@hotmail.com
  • 2. Tal feito trouxe, normalmente, críticas e elogios. A recém criada cidade desprovia de água encanada e de esgotamento sanitário, o que não era uma especificidade de Aracaju, mas de diversas cidades mundo afora. Antônio Samarone em As febres do Aracaju (2001, p. 21) afirma que somente “em 1909 começou a funcionar a distribuição de água canalizada na capital; e, em 1914 [...] implantou-se o sistema de esgotamento sanitário”. Mas esses não eram as únicas queixas dos “primeiros aracajuanos”. A cidade era basicamente constituída por órgãos públicos, não havia uma vida urbana organizada. Aos poucos a cidade tomava corpo, se consolidava como centro urbano e iniciou-se um processo de “aracajuanização” da consciência popular. Misturado ao imaginário dos que já habitavam o povoado de Santo Antônio, aos poucos, a ideia de pertencimento à Aracaju foi tomando conta da cidade, foi-se criando uma identidade própria, peculiar. É difícil entender como uma cidade formada por pessoas dos mais diversos lugares pudesse ter um sentimento de pertencimento próprio, mas Aracaju sempre foi abençoada pelos encantos de sua natureza e isso pode ter sido um fator preponderante. Hoje, 158 anos depois do erguimento da nova capital, podemos ainda ver alguns resquícios de nossa história, apesar da falta de políticas públicas voltadas para a preservação de nosso patrimônio. Quando passamos em frente ao Palácio Olímpio Campos, quando passeamos pela Av. Ivo do Prado (conhecidamente Rua da Frente), quando cruzamos os calçadões das Laranjeiras e João Pessoa, entre diversos outros lugares, podemos perceber aspectos que nos levam a reflexão de como era a vida na Aracaju dos Séculos XIX e XX. Hoje, podemos afirmar que o sonho idealizado por Ignácio Barbosa, de ver nessas terras uma cidade bem estruturada e com vida própria, possa ser concreto. Claro que como toda e qualquer cidade que se propõe ser grande, Aracaju passa por problemas estruturais, mas isso não diminui o brilho e a importância de nossa história. O nosso dever, enquanto sergipanos, é de não deixar se perder na poeira do esquecimento as nossas características e a nossa história. Preservar a memória da nossa capital é uma tarefa de todos. Viva a terra dos cajueiros e dos papagaios, a princesinha da praia.