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CEZAR VIANA LUCENA
Terceiro Setor: Parcerias com a Administração Pública e o Controle
exercido pelo Ministério Público, Tribunal de Contas e Sociedade.
Monografia apresentada como requisito parcial à
obtenção do grau de Bacharel em Direito. Curso
de Direito, Núcleo de Ciências Humanas e Sociais
Aplicadas da Universidade Positivo.
Orientador: Professor Doutor Fernando Borges
Mânica.
CURITIBA
2012
2
Dedico o presente trabalho aos meus
pais, que no auge de sua simplicidade,
mesmo em meio as maiores adversidades
e dificuldades enfrentadas em nossa
criação, jamais permitiram que eu
trilhasse outro caminho que não o da
educação.
3
AGRADECIMENTOS
Meus sinceros agradecimentos vão ao meu orientador, Doutor Fernando
Mânica, que com sua sabedoria e paciência nos orientou ao longo do presente
estudo, aos meus amigos, que sempre compreensíveis souberam nos auxiliar de
alguma forma, mesmo nos momentos mais difíceis quando do desenvolvimento
do presente estudo, aos meus pais, razão precípua de minha existência e por
quem todos os esforços sempre valerão apena.
4
“O sucesso nasce do querer, da
determinação e persistência em se chegar
a um objetivo. Mesmo não atingindo o
alvo, quem busca e vence obstáculos, no
mínimo fará coisas admiráveis." (José de
Alencar).
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...............................................................................................................6
1. TERCEIRO SETOR: CONCEITO, HISTÓRICO E MARCO REGULATÓRIO10
1.1 CONCEITO.........................................................................................................10
1.2 HISTÓRICO DO TERCEIRO SETOR............................................................15
1.3 MARCO REGULATÓRIO NO BRASIL .........................................................18
1.3.1 Título de Utilidade Pública.........................................................................20
1.3.2 Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social -
CEBAS.......................................................................................................................21
1.3.3 Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP´s23
1.3.4 – Organizações Sociais – OS´s ................................................................25
2. INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE FORMALIZAÇÃO DE PARCERIAS ENTRE
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E TERCEIRO SETOR...........................................28
2.1 Convênios .........................................................................................................28
2.2 Contratos Administrativos............................................................................31
2.3 Contratos de Gestão.......................................................................................34
2.4 Termos de Parcerias.......................................................................................38
3. FISCALIZAÇÃO DAS PARCERIAS ENTRE TERCEIRO SETOR E
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ..................................................................................40
3.1 Controle Interno...............................................................................................48
3.2 Tribunal de Contas..........................................................................................51
3.3 Ministério Público ...........................................................................................55
3.4 Controle Social.................................................................................................58
4 – CONCLUSÃO........................................................................................................63
BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................................63
6
LISTADE SIGLAS
OS – Organização Social
OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
CEBAS – Certificado de Entidade Beneficente e Assistência Social
ONG – Organização não governamental
MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado
GESET – Gerência de Estudos Setoriais
7
RESUMO
A presente monografia pretende abordar o Terceiro Setor, suas características e seu marco
regulatório, no tocante a suas titulações e instrumentos de formalização de parcerias, a forma do
seu desenvolvimento, bem como pretende explorar com maior clareza de detalhes como tem sido
observada as parcerias deste com o Estado à luz da Constituição, da legislação esparsa e da
sociedade.
Verificar-se-á também como tem se desenvolvido a fiscalização destas mesmas parcerias com o
Estado, no âmbito do Controle Externo exercido pela Administração Pública e ainda em relação à
fiscalização exercida externa a Administração, pelos Tribunais de Contas, Ministério Público e a
Sociedade.
Palavras-chave: Terceiro Setor; Administração Pública; Parcerias; Controle Externo
8
INTRODUÇÃO
Não pertencente à esfera estatal, tão pouco a esfera de mercado, o
Terceiro Setor por assim dizer, recebe essa nomenclatura justamente por não
estar dotado de quaisquer características que o equipare aos dois primeiros
setores da sociedade.
Ainda que haja no Brasil resquício de atuação de entidades com suas
mesmas características que remontam ao início do século passado, foi somente a
partir da década de 1970 do século XX que se passa a classifica-las desta forma.
Esta modalidade de pessoa jurídica adquiriu força no bojo das
transformações trazidas pela reforma do Estado Brasileiro, que em meados dos
anos de 1980, em meio às transformações em sua conjuntura política, vivia uma
forte crise caracterizada entre outros motivos por interferências acentuadas do
Estado na esfera produtiva, desviando-o de suas funções primordiais, causando
distorções no modelo de desenvolvimento adotado, chegando à sua fase mais
insustentável em meados da década de 1990.
O Terceiro Setor, em meio a muitas transformações idealizadas no Projeto
de Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro surgiu como uma alternativa que
visava o estabelecimento de alianças entre a Sociedade e o Estado, o que André
Pablo Falconer chama de “nova e grande promessa: a renovação do espaço
público, o resgate da solidariedade e da cidadania, a humanização do capitalismo
e, se possível, a superação da pobreza”.
O Estado então deixa a sua hegemonia na execução de suas atividades e
passa a fomentar a execução destas mesmas atividades pelos particulares, com a
fiscalização deste, sem, no entanto haver transferências de responsabilidades
pelo ente público, apenas quanto a sua execução.
São instituídos a partir de então marcos regulatórios das entidades
pertencentes a essa modalidade de pessoas jurídicas, tais como as Organizações
Sociais (OS) pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas
atividades sociais sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao
desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à
cultura e à saúde e que encontra-se prevista na Lei 9.637/98.
9
A Lei 9.790/99 trás entre outras previsões a possibilidade de concessão de
título de Organização Social Civil de Interesse Público – OSCIP pessoas jurídicas
de direito privado, sem fins lucrativos, comprometidas com o desenvolvimento de
serviços de interesse público, em forma de colaboração com o estado.
Pelos meios postos a disposição, verifica-se a partir de então um
crescimento vertiginoso das parcerias entre a Administração Pública e as
entidades do Terceiro Setor, tais como os Contratos de Gestão, firmados entre
Estado e Organizações Sociais para gestão de hospitais públicos, Instituições de
Ensino. Ou ainda por meio do firmamento de Convênios em que o Estado
fomenta determinada atividade de interesse público desenvolvida por um
particular.
Não obstante ao fato do Terceiro Setor estar revestido de interesses
públicos, desprovido na sua essência de almejar lucros e no fato de não se tratar
de atividade de mercancia, é comum as distorções no tocante a malversação do
dinheiro público empregado na realização dos fins a que se destinam, fazendo
desta forma imperioso verificar a forma de fiscalização destas parcerias entre
Terceiro Setor e Administração Pública, o Controle exercido internamente a
Administração Pública, bem como na sua forma Externa, exercitada pelos
Tribunais de Contas, pelo Ministério Público e ainda o Controle Social que se
exerce em relação a estas avenças, pelos meios postos a disposição da
sociedade.
10
1. TERCEIRO SETOR: CONCEITO, HISTÓRICO E MARCO REGULATÓRIO
1.1 CONCEITO
Para uma boa compreensão sobre o que de fato é o Terceiro Setor, ou o
Third Sector1 quando cunhado pela vez primeira, nestes termos, na década de 60
do século XX, necessário se faz que compreendamos quais são os dois primeiros
setores da sociedade, ou seja, o primeiro e o segundo setores, respectivamente.
Karina Ribeiro Fernandes já afirmara a
Grande confusão de conceitos e nomenclaturas quando se trata do
terceiro setor. Surge sempre uma gama de termos como sociedade civil,
sociedade sem fins lucrativos, organizações não governamentais
(ONGs), entre outros, que provocam grande confusão, pois encerram
aspectos jurídicos e organizacionais relevantes para qualquer tipo de
conclusão.2
Fernando Borges Mânica alerta que
O uso indiscriminado da expressão acabou por tornar o conceito de
Terceiro Setor, “albergue” para todos os modelos de entidade que não se
enquadrem no conceito dos outros dois setores. Essa ausência de uma
definição precisa da expressão faz com que sua utilização muitas vezes
mais confunda do que explique.3
Nessa tarefa, contaremos com as palavras de Dirley Junior Cunha, que
aduz para o fim de identificar cada dos atores componentes dos três setores, que
O primeiro setor é o Estado e sua Administração Direta e Indireta; o
segundo setor, representado pelo mercado, no qual vigora a livre
iniciativa de fins lucrativos, e que é reservado, em regra, à iniciativa
privada, e o Terceiro Setor, que é marcado pela presença de entidades
da sociedade civil, de natureza privada, sem fins lucrativos.4
1 MÂNICA. Fernando Borges. Terceiro setor e imunidade tributária: teoria e prática.
Fernando Borges Mânica. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 57.
2 FERNANDES, Ribeiro Karina. Constituição de redes organizacionais como uma nova forma
de gestão das organizações do terceiro setor. 2004, p.123.
3 MÂNICA, F. B., “Panorama Histórico Legislativo do Terceiro Setor no Brasil: do
Conceito de Terceiro Setor à Lei das OSCIP”, In: OLIVEIRA, G. J. de. (coord.) “Terceiro Setor,
Empresas e Estado: Novas Fronteiras entre o Público e o Privado”. Belo Horizonte: Fórum.
2007, p. 163-194.
4 CUNHA, Dirley Junior. Curso de Direito Administrativo. 6ª edição. São Paulo:
Juspodivm, 2008, p. 189.
11
É exatamente essa a questão a ser levada em conta. O Terceiro Setor não
se encontra acima ou abaixo, antes ou depois dos demais setores; mas entre o
Estado e o mercado. 5
Silvio Luiz os conceitua nesse mesmo sentido, todavia, invertendo a ordem
estrutural para o fim de colocar o Mercado no primeiro setor e o Estado na
sequência, conforme se extrai:
Terceiro Setor indica os entes que estão situados entre os setores
empresarial (primeiro setor) e estatal (segundo setor). Os entes que
integram o Terceiro Setor são entes privados, não vinculados à
organização centralizada ou descentralizada da Administração Pública,
que não almejam entre seus objetivos sociais o lucro e que prestam
serviços em áreas de relevante interesse social e público. 6
Nas palavras de Boaventura de Sousa Santos:
O Terceiro setor é uma designação residual e vaga com que se pretende
dar conta de um vastíssimo conjunto de organizações sociais que não
são nem estatais nem mercantis, ou seja, organizações sociais que, por
um lado, sendo privadas, não visam fins lucrativos, e, por outro lado,
sendo animadas por objetivos sociais, públicos ou coletivos. 7
Coadunamos com a conceituação de Boaventura Sousa Santos quando
define o Terceiro Setor como sendo uma conceituação “residual e vaga” 8, tendo
em vista a abrangência com que se identifica entidades pertencentes a esse setor
da sociedade, dedicadas as mais diferenciadas finalidades e com nominações
jurídicas bastante peculiares.
Nas palavras de Gustavo Henrique Justino de Olveira
O Terceiro Setor pode ser entendido como o conjunto de atividades
voluntárias, desenvolvidas por organizações privadas não
governamentais e sem ânimo de lucro (associações ou fundações),
realizadas em prol da sociedade, independentemente dos demais
5 MÂNICA, Fernando Borges. Panorama histórico legislativo do Terceiro Setor no
Brasil: do conceito de Terceiro Setor à Lei das OSCIP. In: OLIVEIRA, Gustavo J. de. (coord.)
Terceiro Setor, Empresas e Estado: novas fronteiras entre o público e o privado. Belo
Horizonte: Fórum, 2007, p. 163-194.
6 ROCHA, Silvio Luis Ferreira. Terceiro Setor. 1ª edição. São Paulo: Malheiros, 2003,
pág.13.
7 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma reinvenção solidária e participativa do
Estado. In: BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos, WILHEIM, Jorge e SOLA, Lourdes (orgs.).
Sociedade e Estado em transformação. São Paulo: UNESP; Brasília: ENAP, 1999. p.250-251.
8 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma reinvenção solidária e participativa do
Estado. In: BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos, WILHEIM, Jorge e SOLA, Lourdes (orgs.).
Sociedade e Estado em transformação. São Paulo: UNESP; Brasília: ENAP, 1999. p.250-251.
12
setores (Estado e mercado), embora com eles possa firmar parcerias e
deles possa receber investimentos (públicos e privados). 9
Para Silvio Luiz, os entes que integram o Terceiro Setor são entes
privados, não vinculados à organização centralizada ou descentralizada da
Administração Pública, que não almejam entre seus objetivos sociais o lucro e
que prestam serviços em áreas de relevante interesse social e público. 10
Sobre as atividades do Terceiro Setor, Leandro Marins de Sousa as
enxerga como sendo “toda ação, sem intuito lucrativo, praticada por pessoa física
ou jurídica de natureza privada, como expressão da participação popular, que
tenha por finalidade a promoção de um direito social ou seus princípios”. 11
Andrea Fernandes Nunes, afirma que as entidades do Terceiro Setor, são
“um conjunto de organizações de origem privada e finalidade não lucrativa, cujo
objetivo é promover o bem estar social através de ações assistenciais, culturais e
de promoção da cidadania”. 12
Rubem César Fernandes tem o Terceiro Setor como o:
Composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela
ênfase na participação voluntária, num âmbito não governamental,
dando continuidade às práticas tradicionais da caridade, da filantropia,
do mecenato e expandindo o seu sentido para outros domínios, graças,
sobretudo, á incorporação do conceito de cidadania e de suas múltiplas
manifestações na sociedade civil. 13
Dirley Junior Cunha também dá a sua contribuição acerca da definição das
atividades exercidas pelos entes do Terceiro Setor, que de acordo com este
exercem atividades de interesse social e coletivo e que, por esse motivo, recebem
incentivos do estado, que desempenha, em relação a elas, uma atividade de
fomento. Tais entidades são conhecidas por entes de cooperação ou entidades
paraestatais, que colaboram ou cooperam com o Estado no desempenho de uma
9 OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino de. Estado contratual, direito ao
desenvolvimento e parceria público-privada. In: TALAMINI, Eduardo et al. (Coord.). Parceria
público-privada: uma abordagem multidisciplinar. São Paulo: RT, 2005. p. 83-119.
10 ROCHA, Silvio Luis Ferreira. Terceiro Setor. 1ª edição. São Paulo: Malheiros, 2003,
pág.13.
11 SOUZA. Leandro Marins de. Tributação do Terceiro Setor no Brasil, São Paulo:
Editora Dialética. 2004. p. 96.
12 NUNES Andrea Fernandes. Terceiro Setor – Fiscalização e Outras Formas de
Controle, 2002, p.23., Recife, Editora Nossa Livraria.
13 FERNANDES, Ribeiro Karina. O que é o Terceiro Setor?. São Paulo: Paz e terra,
1997, pág. 23.
13
atividade de interesse coletivo, embora não integrem, residindo apenas ao lado
dele. 14
Não menos importante, pelo contrário, deixamos a opinião de Fernando
Borges Mânica estrategicamente por último nessa escala de definições, tendo em
vista que o mesmo traz uma contribuição a mais, quando afirma que o Terceiro
Setor é o
Conjunto das pessoas jurídicas de direito privado, constituídas de
acordo com a legislação civil sob a forma de associações ou fundações,
as quais desenvolvam (i) atividades de defesa e promoção de quaisquer
direitos previstos pela Constituição ou (ii) prestem serviços de interesse
público. 15
Pois bem, é pegando uma carona na douta opinião de Fernando Borges
Mânica que traçamos breve paralelo entre as referidas entidades (fundação e
associação) para afirmar que independente da nomenclatura ou finalidade que
venha a adquirir será sempre entendida como uma Associação ou Fundação
(pública ou privada).
No tocante às Fundações, estas podem ser tanto públicas quanto privadas.
Se pública, somente poderá sua instituição ocorrer mediante lei específica,
cabendo à lei complementar, no caso das fundações, definir a área de sua
atuação (Constituição Federal, art. 37, XIX).
Acerca do tema, Maria Sylvia Zanella Di Pietro aduz que:
A fundação instituída pelo Poder Público caracteriza-se por ser um
patrimônio, total ou parcialmente público, a que a lei atribui
personalidade jurídica de direito público ou privado, para consecução de
fins público; quando tem personalidade pública, o seu regime jurídico é
idêntico ao das autarquias, sendo por isso mesmo, chamada de
autarquia fundacional, em oposição a autarquia corporativa. As
fundações de direito privado regem-se pelo Direito Civil em tudo o que
não for derrogado pelo direito público. 16
Já a fundação privada, na qual define o Professor Venosa como sendo
“uma universalidade de bens (patrimônio) destinada a um fim determinado, de
14 CUNHA, Dirley Junior. Curso de Direito Administrativo. 6ª edição. São Paulo:
Juspodivm, 2008, pag. 189.
15 MÂNICA, Fernando Borges. Terceiro Setor e Imunidade Tributária. Belo Horizonte:
Fórum, 2005, p. 65.
16 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas,
2006. p.420.
14
interesse coletivo” 17, estas nascerão na forma dos artigos 63 e 63 do Código Civil
Brasileiro, de forma que em consonância com o mesmo diploma legal por
escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o
fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la. 18
No que se refere à segunda natureza jurídica de entidades do Terceiro
Setor, as Associações, são as mais comuns, possuem previsão Constitucional do
artigo 5º, inciso XVII, da Constituição Federal de 1988 e regulação no artigo 53 da
Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro), fazendo constar no caput do referido
que “Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem
para fins não econômicos”. 19
Para PAES “associação é uma modalidade de agrupamento dotado de
personalidade jurídica, sendo pessoa jurídica de direito privado voltada à
realização de interesses de seus associados ou de uma finalidade de interesse
social”. 20
Maria Sylvia Zanella Di Pietro 21 entende como sendo entidades integrantes
do terceiro setor os serviços sociais autônomos, as entidades de apoio, as
organizações sociais e as organizações da sociedade civil de interesse público.
Estas duas últimas que por sinal dedicaremos um tópico no presente para tratá-
las especificamente.
O Terceiro Setor, especificamente divide muitas opiniões. Existe quem o
defenda e acredite na sua manutenção enquanto setor da sociedade, bem como
existem os críticos ferrenhos, que enxerga o Terceiro Setor como sendo um mero
ideário, de promoção de “pilantropia”.
Maria da Glória Marcondes Gohn, pesquisadora da UNICAMP afirma que
“o terceiro setor é um tipo de “Frankenstein”: grande, heterogêneo, construído de
pedaços, desajeitado, com múltiplas facetas”. 22
17 VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública:
uma análise crítica. Belo Horizonte: Fórum, 2006. Citando: ALVES. Associações, Sociedades e
Fundações no novo Código Civil de 2002: perfil e adaptações, p. 55-56.
18 BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm > Acesso em: 15/04/2012.
19 BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm > Acesso em: 16/04/2012.
20 PÃES, José Eduardo Sabo. Fundações, Associações e entidades de Interesse
social. 6ª. ed. Brasília: Jurídica, 2006, p. 63.
21 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 19.ed. São Paulo: Atlas,p.
22 GOHN, Maria da Glória. Mídia, terceiro setor e MST: impactos sobre o futuro das
cidades e do campo. Maria da Glória Gohn. Petrópolis: Vozes, 2000. p.60.
15
Enquanto que na visão de Montaño, o Terceiro Setor é um instrumento da
estratégia neoliberal visto como “uma nova modalidade de trato à questão
social”.23
O autor afirma ainda que
A parceria entre o Estado e o “Terceiro Setor” tem a clara função
ideológica de encobrir o fundo, a essência do fenômeno, ser parte da
estratégia de reestruturação do capital, e feitichizá-lo em ‘transferência’,
levando à população a um enfrentamento/aceitação deste processo
dentro dos níveis de conflitividade institucional aceitáveis para a
manutenção do sistema, e ainda mais, para a manutenção da atual
estratégia do capital e seu projeto hegemônico: o neoliberalismo. 24
1.2 HISTÓRICO DO TERCEIRO SETOR
O Terceiro Setor, traduzido do inglês Third Sector25, conforme já citado em
tópico anterior, foi nestes termos cunhado pela primeira vez, em meados de 1970
nos Estados Unidos, como forma designar a nova modalidade de organismos
componente da sociedade, que não se confunde com o setor de mercado, dentre
outros fatores, por não ter finalidade econômica ou lucrativa, bem como não se
confundindo com o ente estatal, tendo em vista a sua forma de manutenção e de
gestão, surgindo desta forma como um setor estranho aos demais existentes até
então.
Entretanto, apesar de recente os estudos acerca do Terceiro Setor,
remontam dos séculos XVI e XVII, as primeiras instituições com características
notadamente do Terceiro Setor, que nesta época, em meio a Europa de dissídios,
desenvolviam trabalhos sociais de cunho político e religioso.
Foi por volta de 1800, reflexo da Revolução Industrial, que surge às
associações patronais e os sindicatos de trabalhadores, sendo que este último
daria ensejo aos primeiros partidos políticos, como forma de organizar a defesa
dos interesses da classe junto ao estado.
23 MONTAÑO, Carlos. Políticas Sociais e Estatais e “Terceiro Sector”: O projeto
neoliberal para a atuação resposta à “Questão Social”. I Coloquio Brasil/Uruguay: "Questao
urbana, políticas sociais e servico social". Escola de Servico Social - UFRJ. Río de Janeiro, 2002.
p.11-12.
24 MONTAÑO, Carlos. Terceiro setor e questão social: crítica ao padrão emergente de
intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002. P27.
25 MÂNICA, Fernando Borges. Panorama histórico-legislativo do Terceiro Setor no
Brasil: do conceito de Terceiro Setor à Lei das OSCIP. In: OLIVEIRA, Gustavo J. de. (coord.)
Terceiro Setor, Empresas e Estado: novas fronteiras entre o público e o privado. Belo
Horizonte: Fórum, 2007, p. 163-194.
16
Durante esse período, peculiar foi à atuação destas entidades com
características de organizações civis, tendo em vista que as mesmas sofreram
forte influencia do Estado e da Igreja, tornando-se órgãos de participação
massiva, entretanto, com hierarquias controladoras e centralizadoras.
Esse período histórico do Estado Moderno está intimamente ligado a fase
de ascensão do Estado Absolutista e o pré-capitalismo, de fortes tensões entre a
burguesia liberal contra a aristocracia, bem como da burocracia socialista e a
burguesia. E foi nessa fase explosiva que a sociedade civil foi aos poucos se
afirmando perante o Estado, que por sua vez, no bojo das transformações sociais
foi obrigado a conduzir os regimes autoritários vigentes à época a regimes
democráticos.
No Brasil o Terceiro Setor tem como marco inicial a década de 1970, onde
pela primeira vez o termo foi utilizado para definir as entidades sem fins lucrativos,
não pertencentes ao ente estatal ou ainda desprovido de características de um
organismo de mercado, todavia, hibrida aos dois setores, formando um terceiro
setor, com suas peculiaridades.
No Brasil, conforme o relatório Gerência de Estudos Setoriais - GESET:
A participação das entidades sem fins lucrativos no Brasil é datada
no final do século XIX. Pode-se até mesmo citar o exemplo das Santas
Casas que remontam mais atrás, na segunda metade do século XVI, e
trás consigo uma tradição da presença das igrejas cristãs que direta ou
indiretamente atuavam prestando assistência à comunidade. Toma-se
como destaque a Igreja Católica, que com suporte do Estado, era
responsável pela maior parte das entidades que prestavam algum tipo de
assistência às comunidades mais necessitadas, que ficavam às margens
das políticas sociais básicas de saúde e educação. A atuação das
Igrejas, concomitante com o Estado, durou todo o período colonial, até
início do século XIX. 26
Como se extrai do Caderno MARE - Organizações Sociais27, a ascensão
do Terceiro Setor no Brasil confunde-se com a crise do Estado moderno, que
nesta época foi objeto de vultosas discussões em todo mundo acerca do
verdadeiro papel do Estado.
26 GESET - Gerência de Estudos Setoriais. Terceiro Setor e o Desenvolvimento Social.
AS/GEET. Relato Setorial nº 03, julho de 2001. Pg.6-7 Disponível:
http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento
/relato/tsetor.pdf Acessado em: 01-05-2001.
27 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da
Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília:
Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do
estado; v. 2).
17
No Brasil os debates relativos à atuação do Estado se fizeram também
necessárias a partir da década de 1980, logo após a fase de transição
democrática Brasileira, tendo em vista as imperfeições do modelo de
desenvolvimento adotado, de forma que na década 1990 alcançou a sua fase
mais insustentável, já que o modelo, obsoleto, dava grande ênfase à esfera
produtiva, por via das interferências diretamente realizadas pelo Estado, o que
levou a um forte desequilíbrio, desviou o mesmo Estado de suas funções
primordiais, fato que acarretou em sérias distorções de mercado.
De acordo com o mesmo projeto de reestruturação do Estado Brasileiro, o
país passava por uma séria crise de cunho fiscal
Caracterizada pela crescente perda do crédito por parte do Estado e pela
poupança pública que se torna negativa; (ii) o esgotamento da estratégia
estatizante de intervenção do Estado, a qual se reveste de várias formas:
o Estado do bem-estar social nos países desenvolvidos, a estratégia de
substituição de importações no terceiro mundo, e o estatismo nos países
comunistas; e (iii) a superação da forma de administrar o Estado.
Isto é, a superação da administração pública burocrática, que no Brasil se
acentuou na década de 1990, e onde seguindo as tendências mundiais, ensejou
no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, que teve por escopo um:
(1) o ajustamento fiscal duradouro; (2) reformas econômicas orientadas
para o mercado, que, acompanhadas de uma política industrial e
tecnológica, garantissem a concorrência interna criando as condições
para o enfrentamento da competição internacional; (3) a reforma da
previdência social; (4) a inovação dos instrumentos de política social,
proporcionando maior abrangência e promovendo melhor qualidade para
os serviços sociais; e (5) a reforma do aparelho do Estado, com vistas a
aumentar sua “governança”, ou seja, sua capacidade de implementar de
forma eficiente políticas públicas.28
A implementação de Organizações Sociais é uma estratégia central do
Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado.
Seu propósito genérico foi o de:
[...] permitir e incentivar a publicização, ou seja, a produção não-lucrativa
pela sociedade de bens ou serviços públicos não-exclusivos de Estado.
[...] um novo modelo de administração pública, baseado no
estabelecimento de alianças estratégicas entre Estado e sociedade, quer
para atenuar disfunções operacionais daquele, quer para maximizar os
resultados da ação social em geral. Assim, o propósito central do Projeto
28 BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da
Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília:
Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do
estado; v. 2).
18
Organizações Sociais foi proporcionar um marco institucional de
transição de atividades estatais para o terceiro setor e, com isso,
contribuir para o aprimoramento da gestão pública estatal e não-
estatal.29
Segundo Andres Pablo Falconer, “na década de noventa, o Terceiro setor
surge como portador de uma nova e grande promessa: a renovação do espaço
público, o resgate da solidariedade e da cidadania, a humanização do capitalismo
e, se possível, a superação da pobreza”. 30
1.3 MARCO REGULATÓRIO NO BRASIL
A Constituição Federal de 1988, que veio selar a ideia de Estado
Democrático de Direito no Brasil, recém-saído do regime militar e ditatorial, prevê
em seu artigo 5º, inciso XVII, a plena liberdade de associação para fins lícitos,
como garantia.
Conforme se extrai do trabalho da Professora Flavia Mori Sarti “O Terceiro
Setor na Administração da Saúde Pública: OS ou OSCIP, quem administra?” 31
,
tem se como marco regulatório do Terceiro Setor no Brasil, a Lei Federal nº
9.790/99, conhecida como lei da OSCIP, que até de forma tardia foi editada no
país, que já trazia no cerne de sua evolução social as sociedades civis, passando
pela reforma do aparelho do Estado.
A lei surgiu do projeto elaborado pelo Conselho da Comunidade Solidária,
Conselho este que foi criado para o enfrentamento da pobreza e a exclusão social
no Brasil. A ação visava ordenar e regular as entidade sem fins lucrativos que
desempenhavam atividades de filantropia no país, que há época atuava na mais
completa desordem, em uma crescente, sem qualquer controle do Estado sobre
quem era e o que faziam essas entidades no Brasil.
29 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da
Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília:
Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do
estado; v. 2).
30 FALCONER, Andres Pablo. A Promessa do Terceiro Setor. Centro de Estudos em
Administração do Terceiro setor, Universidade de São Paulo.
31 SARTI. Flavia Mori; KIMURA, Wagner. O Terceiro Setor na Administração da Saúde
Pública: OS ou OSCIP, quem administra? Gestão de Políticas Públicas. Escola de Artes,
Ciências e Humanidades. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil. p.09-10
Disponível em:http://stoa.usp.br/wagnerk/files/-1/16702/trabalho+de+PPS+-
+professora+Flavia.pdf Acesso em: 01-05-2012.
19
Em 1997 iniciou-se, por encomenda do Governo Federal a elaboração do
Projeto, pelo Conselho da Comunidade.
Nesse período de elaboração do projeto, o Brasil vivenciava uma forte crise
econômica e de investimentos. O social do país caminhava de mal a pior e no
bojo dessa crescente piora, surgiam as entidades que atuavam na tentativa de
minimizar tais problemas.
Em julho de 1998 é encaminhado o anteprojeto de lei ao Presidente da
República Fernando Henrique Cardoso.
Dentre os principais aspectos do projeto, o mesmo visava um
fortalecimento do Terceiro Setor e atribuir ao Estado, por meio do maior número
possível de dispositivos legais, a eficiência, de forma a impedir que em meio a
essa forte proliferação de entidades voltadas ao assistencialismo viessem os
maus intencionados, na tentativa de lesionar o estado, bem como a sociedade. A
ideia era dar uma combatividade ao Estado, face aos que por ventura se
aventurassem em fazer “pilantropia”.
O anteprojeto iniciava com a proposição de definir a própria abrangência do
conceito de Terceiro Setor que, segundo o texto
inclui o amplo espectro das instituições filantrópicas dedicadas à
prestação de serviços nas áreas de saúde, educação e bem estar social.
Compreende também as organizações voltadas para a defesa dos
direitos de grupos específicos da população, como mulheres, negros e
povos indígenas, ou de proteção ao meio ambiente, promoção do
esporte, cultura e lazer. Além disso, engloba experiências de trabalho
voluntário, pelas quais cidadãos exprimem sua solidariedade através da
doação de tempo, trabalho e talento para causas sociais. 32
Lei Federal das OSCIP’s nº 9.790 foi promulgada em 23 de março de 1999.
Outro grande ator do Terceiro Setor, as Organizações Sociais – OS, foi
idealizado no bojo do advento da Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro, e
posteriormente foi amparado pela publicação da Lei Federal nº 9.637/98.
Fernando José Mesquita afirma que esse instituto surge como resposta à
decadência do modelo de governo totalitário e centralizador enraizado na
32 KIMURA, Wagner. OSCIP: Do Marco Regulatório no Terceiro Setor à
Desorganização. Gestão de Políticas Públicas. Escola de Artes, Ciências e Humanidades.
Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil. p.09-10 Disponível em:
http://stoa.usp.br/wagnerk/files/-1/16695/trabalho+de+TIGP+-+professor+Vaz.pdf Acesso em: 02-
05-2012.
20
burocratização da máquina pública. Tal percepção conduziu à ideia de reforma do
então sistema de administração praticado.
Após presenciar a ruína do antigo modelo de intervenção pública, exercida
em casos específicos, atuando apenas em setores fundamentais, e transferindo
ao particular a gestão dos demais ramos. O Estado, então, deixa de realizar
determinadas atividades e passa a fomentá-las e fiscalizá-las. 33
Para Flavia Mori Sarti a OS foi criada com o objetivo principal de atender a
necessidade de publicização de universidades, hospitais, centros de pesquisa,
bibliotecas e museus da administração estatal.
1.3.1 Título de Utilidade Pública
Denominados genericamente por títulos jurídicos, os certificados, títulos e
qualificações outorgados pelo Poder Público representam o reconhecimento ao
trabalho social desenvolvido pela entidade, como forma de diferenciá-la na
concessão de benefícios. Assim, designações como “Entidade de Utilidade
Pública”, “Entidade Beneficente de Assistência Social”, “Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público” e “Organização Social” consistem apenas
em títulos jurídicos e não traduzem uma forma de pessoa jurídica privada. 34
O título de Utilidade Pública Federal, regulado pela Lei 91/1935, foi o
primeiro dentro dessa concepção de sociedades civis, antes até que a própria
denominação Terceiro Setor, tão difundida nos dias atuais para definir as
entidades detentora de titulações concedidas pela Administração Pública.
Diz o artigo 1º da Lei 91/35 sobre os requisitos a concessão do título de
Utilidade Pública Federal:
As sociedades civis, as associações e as fundações constituidas no paiz
com o fim exclusivo de servir desinteressadamente á collectividade
podem ser declaradas de utilidade publica, provados os seguintes
requisitos: a) que adquiriram personalidade juridica; b) que estão em
effectivo funccionamento e servem desinteressadamente á
collectividade; c) que os cargos de sua diretoria, conselhos fiscais,
deliberativos ou consultivos não são remunerados35.
33 MESQUITA, Fernando José. Das organizações Sociais. Caderno Jurídico OAB/PR, nº
27, março 2012. p.07.
34 Carvalho Neto, Antonio Alves de. Transferências de recursos do orçamento da
União para organizações não-governamentais [manuscrito]: análise dos procedimentos de
concessão e controle/Antonio Alves de Carvalho Neto. – 2007, p.49.
35 BRASIL. Lei 91, de 28 de agosto de 1935. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/L0091.htm > Acesso em: 15/04/2012.
21
Segundo o Manual para Requerimento de Título de Utilidade Pública
Federal, a regulamentação da concessão do titulo de utilidade pública federal (Lei
nº 91/35, Decreto nº 50.517/61 e Portaria 11/90, da Secretaria de Justiça do MJ)
tem por fundamento teórico o entendimento de que se trata de um meio de que o
Governo se vale para apoiar entidades privadas que prestam serviços
necessários à coletividade, como a assistência social, o atendimento médico, a
pesquisa científica e a promoção da educação e da cultura. Para que as
instituições particulares possam receber o título, seus serviços devem ser
executados da mesma forma que o Governo os executaria, ou seja, sem
distinções de raça, credo, cor ou convicções políticas, ao público em geral e não
apenas aos associados, entre os usuários efetivos ou potenciais, e não tendo o
lucro por finalidade. 36
O título de utilidade pública federal existe em caráter precário, processado
no Ministério da Justiça e concedido via decreto pelo Presidente da República.
Tem competência para conceder Título de Utilidade Pública, os demais
entes federativos, além da união, Estados e Municípios, todavia, de validade
apenas junto ao ente concedente.
Vale lembrar que especificamente sobre os Títulos de Utilidade Pública,
que estes, sendo Federal, Estadual e/ou Municipal, não geram qualquer direito ao
detentor, devendo os benefícios à entidade detentoras ser observado apenas em
caso específicos e por conveniência do ente concedente.
Lei 91/1935:
Art. 3º Nenhum favor do Estado decorrerá do titulo de utilidade publica,
salvo a garantia do uso exclusivo, pela sociedade, associação ou
fundação, de emblemas, flammulas, bandeiras ou distinctivos proprios,
devidamente registrados no Ministerio da Justiça e a da menção do titulo
concedido. 37
1.3.2 Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social - CEBAS
A certificação das entidades beneficentes de assistência social e a isenção
de contribuições para a seguridade social serão concedidas às pessoas jurídicas
36 BRASIL. Boudens, Emile. Título de Utilidade Pública Federal. Câmara dos
Deputados. 2000.
37 BRASIL. Lei 91, de 28 de agosto de 1935. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/L0091.htm > Acesso em: 10/05/2012.
22
de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes
de assistência social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de
assistência social, saúde ou educação. 38
Com a edição da medida provisória 446/08, posteriormente convertida em
lei, o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS),
anteriormente concedido pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS,
com a publicação da Lei 12.101/09 passou a ser de responsabilidade dos
Ministérios da Educação, Saúde e Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
respectivamente de acordo com a área de atuação da entidade requerente,
ficando o Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, responsável apenas
pela fiscalização das entidades detentoras da titulação.
Na área da educação fará jus à certificação a entidade que comprovar o
atendimento dos requisitos do art. 3º e 13, da Lei nº 12.101, de 2009, além das
demais disposições legais e do regulamento.
Dentre as principais exigências estão o oferecimento de no mínimo, uma
bolsa de estudo integral para cada nove alunos pagantes, além de bolsas parciais
de 50%, quando necessárias para aplicação em gratuidade de pelo menos 20%
da receita anual efetivamente recebida nos termos da Lei no 9.870, de 23 de
novembro de 1999. Há ainda a possibilidade de computar na gratuidade o
montante destinado a ações assistenciais e programas de apoio a bolsistas, nos
termos e limites do regulamento. 39
Na área da educação para fins de certificação a entidade deve
necessariamente comprovar o atendimento dos requisitos do art. 4º e seguintes
da Lei nº 12.101, de 2009, sem prejuízo a outras disposições.
Dentre as principais exigências estão a de ofertar a prestação de seus
serviços ao SUS no percentual mínimo de 60%, ou comprovar a aplicação de
percentual da sua receita em gratuidade na área da saúde nos percentuais
exigidos pelo artigo 8º da Lei 12.201/2009, realizar projetos de apoio ao
desenvolvimento institucional do SUS, celebrando ajuste com a União, por
intermédio do Ministério da Saúde nas áreas de estudos de avaliação e
incorporação de tecnologias, capacitação de recursos humanos, pesquisas de
38 BRASIL. Lei 12.101, de 27 de novembro de 2009. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12101.htm > Acesso em: 10/05/2012.
39 BRASIL. Ministério da Educação. Disponível em: http://cebas.mec.gov.br/ Acessado em: 25-
05-2012
23
interesse público em saúde ou desenvolvimento de técnicas e operação de
gestão em serviços de saúde. 40
Será concedida a titulação de CEBAS à entidades de assistência social
que prestar serviços ou realizar ações assistenciais, de forma gratuita, continuada
e planejada, para os usuários e a quem deles necessitar, sem qualquer
discriminação, atendidos os requisitos de prestar os referidos serviços com
objetivo de habilitação e reabilitação de pessoa com deficiência e de promoção da
sua integração à vida comunitária, neste caso comprovando a oferta de, no
mínimo, 60% de sua capacidade de atendimento ao sistema de assistência social,
estar inscrita no respectivo Conselho Municipal de Assistência Social e integrar o
cadastro nacional de entidades e organizações de assistência social.
Ademais, a entidade de posse do Certificado de Entidade Beneficente de
Assistência Social (CEBAS) e que comprove não remunerar seus diretores,
aplicar os superávits financeiros na manutenção dos seus fins sociais,
mantenham-se em dia com suas Certidões Negativas de débitos e ainda
cumpram obrigações acessórias tributárias poderá pleitear entre outros
benefícios, a isenção das contribuições previdenciárias de que trata os artigo 22 e
23 da Lei 8.2.12/91.
1.3.3 Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP´s
As Organizações Sociais Civis de Interesse Público – OSCIP´s, são
entidades, comumente conhecidas como ONG´s ou Associações, que tem por
único diferencial o título de “Utilidade Pública”, concedido pelo Ministério da
Justiça, ligado ao Governo Federal e que lhes dá a condição de celebrar termos
de parceria com a administração pública.
O seu marco regulatório se dá por força da lei 9.790, de 23 de março de
1999 e em linhas gerais as OSCIP´s são alternativas confiáveis da administração
pública no concernente aos convênios, já que para obter o certificado de
Organização Social Civil de Interesse Público a OSCIP se submete a uma forte
40 BRASIL. Ministério da Educação. Disponível em: http://cebas.mec.gov.br/ Acessado em: 25-
05-2012.
24
fiscalização do estado, analisando principalmente a transparência da gestão da
entidade e adequar-se a uma bateria de exigências do estado.
O artigo 1º da lei 9.790/99, em sua transcrição mais literal, aduz que
“podem qualificar-se como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, desde que os
respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos
instituídos por esta Lei”.
Conforme define Luis Patrone Regules, as Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público são “as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins
lucrativos, destinadas ao cumprimento de serviços de interesse público,
colaboradoras da ação estatal nas áreas sociais definidas pela lei 9.790/1999,
criadas e geridas exclusivamente por particulares, qualificadas e continuamente
fiscalizadas pelo estado, sob a égide de regime jurídico especial – adoção de
normas de direito privado com as derrogações originárias do regime jurídico de
direito público”. 41
A titulação nos termos do artigo 3º, I, da Lei 9.790/99 poderá ser concedida
as pessoas jurídicas de direito privado que tenham por atuação a promoção da
assistência social, da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e
artístico, gratuita da educação, da saúde, da segurança alimentar e nutricional,
defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do
desenvolvimento sustentável, promoção do voluntariado, do desenvolvimento
econômico e social e combate à pobreza, de direitos estabelecidos, construção de
novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar, promoção
da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros
valores universais, estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias
alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e
científicos, vedada a concessão as pessoas jurídicas de que trata o artigo 2º da
mesma lei.
Sem prejuízo a outras exigências a entidade que pleiteia o referido título de
OSCIP deverá ter em seus Estatuto Social previsão, bem como atuar em
observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade, economicidade e de eficiência, adoção de práticas e gestão
41 REGULES, Luis Eduardo Patrone. Terceiro Setor: Regime Jurídico das OSCIPs. São
Paulo: Editora Método, 2006. p. 139.
25
administrativa, necessárias e suficientes a coibir a obtenção, de forma individual
ou coletiva, de benefícios ou vantagens pessoais, em decorrência da participação
no respectivo processo decisório, constituição de Conselho Fiscal ou órgão
equivalente, dotado de competência para opinar sobre os relatórios de
desempenho financeiro e contábil, e sobre as operações patrimoniais realizadas,
emitindo pareceres para os organismos superiores da entidade; previsão de que,
em caso de dissolução ou perda da titulação, o patrimônio será transferido a
entidade também qualificada como OSCIP; declarar se institui ou não
remuneração aos dirigentes, devendo ainda observar princípios da contabilidade,
publicidade das demonstrações financeiras, a realização de auditoria e a
prestação de contas de todos os recursos e bens de origem pública.
Entre outras, o principal benefício da qualificação como OSCIP, prevista da
Lei 9.790/99, é a de permitir com que a entidade possa celebrar termos de
parceria com a administração pública e possa remunerar dirigentes que
efetivamente atuem na gestão executiva ou prestem serviços específicos à
organização. 42
1.3.4 – Organizações Sociais – OS´s
Organizações Sociais (OS) são um modelo de organização pública não
estatal destinado a absorver atividades publicizáveis mediante qualificação
específica. Trata-se de uma forma de propriedade pública não estatal, constituída
pelas associações civis sem fins lucrativos, que não são propriedade de nenhum
indivíduo ou grupo e estão orientadas diretamente para o atendimento do
interesse público. 43
Nos termos da Lei federal nº. 9.637, de 18.5.1998, o Poder Executivo
poderá qualificar como Organizações Sociais (OS) pessoas jurídicas de direito
privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sociais sejam dirigidas ao ensino, à
pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do
42 BRASIL. Lei 9.790/99, de 23 de março de 1999. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9790.htm > Acesso em: 15/04/2012
43 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da
Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília:
Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do
estado; v. 2).
26
meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos os requisitos previstos nesse
mesmo diploma.
Portanto uma OS é uma entidade componente do Terceiro Setor,
qualificada desta forma pelo Estado e constitui-se em uma boa alternativa do
administrador público para gerir serviços públicos essenciais, tais como a
gerência de hospitais e estabelecimentos públicos de ensino. O contrato de
gestão é o instrumento que regulará as ações das OS44 para com o Estado.
José Eduardo Sabo Paes sintetiza bem as possibilidades de uma entidade
qualificada como Organização Social, seus meios de formalização de parcerias
com a Administração e obrigações:
“Qualificada como Organização Social, a entidade-fundação, associação
ou sociedade estará habilitada a receber recursos financeiros e
administrar bens e equipamentos, e pessoal do Estado. Em
contrapartida, para formação dessa parceria, a OS se obriga a firmar um
contrato de gestão com o poder público, por meio do qual são acordadas
metas de desempenho e assegurem a qualidade e a efetividade dos
serviços prestados ao poder público” 45.
Em relação aos requisitos exigidos pela Lei 9.637/99 para qualificação
como organização social, necessário se faz que comprovem o registro do seu ato
constitutivo onde contenha a: a) natureza social de seus objetivos relativos à
respectiva área de atuação, b) finalidade não lucrativa, com a obrigatoriedade de
investimento de seus excedentes financeiros no desenvolvimento das próprias
atividades, c) previsão expressa de a entidade ter, como órgãos de deliberação
superior e de direção, um conselho de administração e uma diretoria definidos
nos termos do estatuto, asseguradas àquele composição e atribuições normativas
e de controle básicas previstas nesta Lei, d) previsão de participação, no órgão
colegiado de deliberação superior, de representantes do Poder Público e de
membros da comunidade, de notória capacidade profissional e idoneidade moral,
e) composição e atribuições da diretoria, f) obrigatoriedade de publicação anual,
no Diário Oficial da União, dos relatórios financeiros e do relatório de execução do
contrato de gestão; g) no caso de associação civil, a aceitação de novos
44 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da
Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília:
Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do
estado; v. 2).
45 PAES, José Eduardo Sabo. Fundações e Entidades de Interesse Social: aspectos
jurídicos, administrativos, contábeis e tributários. 4ª Ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2004, pág.
101.
27
associados, na forma do estatuto; h) proibição de distribuição de bens ou de
parcela do patrimônio líquido em qualquer hipótese, inclusive em razão de
desligamento, retirada ou falecimento de associado ou membro da entidade;
i) previsão de incorporação integral do patrimônio, dos legados ou das doações
que lhe foram destinados, bem como dos excedentes financeiros decorrentes de
suas atividades, em caso de extinção ou desqualificação, ao patrimônio de outra
organização social qualificada no âmbito da União, da mesma área de atuação,
ou ao patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, na
proporção dos recursos e bens por estes alocados.
A principal vantagem da titulação encontra-se na possibilidade de firmar
Contratos de Gestão para com o Estado.
28
2. INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE FORMALIZAÇÃO DE PARCERIAS ENTRE
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E TERCEIRO SETOR
2.1 Convênios
Do latim conveniare “consideram-se convênios administrativos os ajustes
firmados por pessoas administrativas entre si, ou entre estas e entidades
particulares, com vistas a ser alcançado determinado objetivo de interesse
público”. 46
Marçal Justen Filho define convênio como sendo “um acordo de vontades,
em que pelo menos uma das partes integra a Administração Pública, por meio do
qual são conjugados esforços e (ou) recursos, visando disciplinar a atuação
harmônica e sem intuito lucrativo das partes, para o desempenho de
competências administrativas”. 47
Não obstante ao fato de Hely Lopes Meirelles afirmar que Convênio trata-
se de “acordo, mas não contrato” 48, na doutrina há autores que identificam
semelhanças entre ambos os instrumentos jurídicos, divergindo entre si quanto à
natureza jurídica do mesmo.
Para reforçar o seu posicionamento quanto à diferença existente entre
Convênios e os Contratos o próprio Hely Lopes Meirelles aponta distinções. De
acordo com o autor os instrumentos se dissociam à medida que
No contrato há sempre duas partes (podendo ter mais de dois
signatários) uma que pretende o objeto do ajuste (a obra, o serviço, etc),
outra que pretende a contraprestação correspondente (o preço ou
qualquer outra vantagem), diversamente do que ocorre no convenio, em
que não há partes, mas unicamente partícipes com as mesmas
pretensões. Por essa razão, no convenio a posição jurídica dos
signatários é uma só, idêntica para todos, podendo haver apenas
diversificação na cooperação de cada um, segundo suas possibilidades,
para a consecução de um objetivo comum, desejado por todos. 49
46 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
47 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos. São Paulo:
Editora Dialética, 2009. p. 998.
48 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 32ª
ed. 2006. Pg . 407, 408.
49 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 32ª
ed. 2006. Pg . 407, 408.
29
Entendimento do Tribunal de Contas da União é que “enquanto no
convênio os interesses das partes são convergentes, no contrato são opostos”. 50
Nesse sentido Maria Sylvia Zanella Di Pietro define “convênio como forma
de ajuste entre o Poder Público e entidades públicas ou privadas para a
realização de objetivos de interesse comum, mediante mútua colaboração”. 51
Já para Celso Antônio Bandeira de Mello “os convênios administrativos são
contratos em que as partes se compõem pela comunidade de interesses, pela
finalidade comum que as impulsiona”. 52
Ressalta-se que na prática os Convênios podem ser divididos em
Convênios Público-Públicos e Convênios Público-Privados, este último, objeto de
nosso estudo.
Em relação aos Convênios Público-Públicos, celebrado entre entes
federativos, estes foram pela vez primeira referenciados na legislação esparsa
quando da edição do Decreto-lei nº 200/1967, que teve por escopo principal a
reforma administrativa federal, de forma que o convênio era o instrumento de
observância há uma das diretrizes da citada reforma, qual seja a descentralização
da “administração Federal para a das unidades federadas” 53, um dos pilares da
reforma que incluía ainda o princípio do planejamento, da Coordenação,
delegação de competências e do controle, in verbis:
Art. 9º Os órgãos que operam na mesma área geográfica serão
submetidos à coordenação com o objetivo de assegurar a programação
e execução integrada dos serviços federais.
Parágrafo único. Quando ficar demonstrada a inviabilidade de
celebração de convênio (alínea b do § 1º do art. 10) com os órgãos
estaduais e municipais que exerçam atividades idênticas, os órgãos
federais buscarão com êles coordenar-se, para evitar dispersão de
esforços e de investimentos na mesma área geográfica.
10) com os órgãos estaduais e municipais que exerçam atividades
idênticas, os órgãos federais buscarão com êles coordenar-se, para
evitar dispersão de esforços e de investimentos na mesma área
geográfica.
Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal
deverá ser amplamente descentralizada.
50 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações e
jurisprudência do TCU/Tribunal de Contas da União. – 4ª edição revisada, atualizada e
ampliada – Brasília: TCU, Secretaria Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial
de Editoração e Publicações, 2010. Pg. 836.
51 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas, 22ª
ed. 2009. p. 336.
52 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed.
Malheiros Editores. São Paulo: 2011, pg. 670/671.
53 BRASIL. Decreto Lei nº 200 de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm Acessado: 20/07/2012.
30
§ 1º A descentralização será posta em prática em três planos
principais:
a) dentro dos quadros da Administração Federal, distinguindo-se
claramente o nível de direção do de execução;
b) da Administração Federal para a das unidades federadas,
quando estejam devidamente aparelhadas e mediante convênio;
c) da Administração Federal para a órbita privada, mediante
contratos ou concessões.
§ 2° Em cada órgão da Administração Federal, os serviços que
compõem a estrutura central de direção devem permanecer liberados
das rotinas de execução e das tarefas de mera formalização de atos
administrativos, para que possam concentrar-se nas atividades de
planejamento, supervisão, coordenação e contrôle.
§ 3º A Administração casuística, assim entendida a decisão de
casos individuais, compete, em princípio, ao nível de execução,
especialmente aos serviços de natureza local, que estão em contato com
os fatos e com o público.
§ 4º Compete à estrutura central de direção o estabelecimento das
normas, critérios, programas e princípios, que os serviços responsáveis
pela execução são obrigados a respeitar na solução dos casos
individuais e no desempenho de suas atribuições.
§ 5º Ressalvados os casos de manifesta impraticabilidade ou
inconveniência, a execução de programas federais de caráter
nitidamente local deverá ser delegada, no todo ou em parte, mediante
convênio, aos órgãos estaduais ou municipais incumbidos de serviços
correspondentes.
§ 6º Os órgãos federais responsáveis pelos programas conservarão
a autoridade normativa e exercerão contrôle e fiscalização
indispensáveis sôbre a execução local, condicionando-se a liberação dos
recursos ao fiel cumprimento dos programas e convênios.
§ 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento,
coordenação, supervisão e contrôle e com o objetivo de impedir o
crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração
procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas,
recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante
contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente
desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução.
§ 8º A aplicação desse critério está condicionada, em qualquer
caso, aos ditames do interesse público e às conveniências da segurança
nacional. 54
Os convênios de cooperação entre esses entes Federativos fora
recepcionado pela Constituição de 1967, e posteriormente na Constituição de
1988 previsto nos artigos 71, inciso VI, bem ainda no artigo 199, 1º, de forma
implícita, havendo ainda com a emenda 19/98 nova redação ao artigo 241 da CF,
em que passou a prevê a gestão associada de serviços públicos.
Em relação aos Convênios entre a Administração Pública e Particulares,
também conhecido como Convênios “tout court”, este encontra-se previsto no
Decreto 6170/2007, que trata da “transferências de recursos da União mediante
convênios e contratos de repasse”, na Lei 8.666/93, mais precisamente artigo
54 BRASIL. Decreto Lei nº 200 de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm Acessado: 20/07/2012.
31
116, que entre outras, prevê a aplicabilidade das disposições ali contidas, no
concernente as licitações e contratos da Administração Pública também aos
Convênios.
Artigo 116 da lei 8.666/93:
Art. 116. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos
convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres
celebrados por órgãos e entidades da Administração. 55
O decreto 6.170/07 define no seu artigo introdutório convênio como sendo
o:
Acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento que discipline a
transferência de recursos financeiros de dotações consignadas nos
Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União e tenha como
partícipe, de um lado, órgão ou entidade da administração pública
federal, direta ou indireta, e, de outro lado, órgão ou entidade da
administração pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta,
ou ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando a execução de
programa de governo, envolvendo a realização de projeto, atividade,
serviço, aquisição de bens ou evento de interesse recíproco, em regime
de mútua cooperação. 56
Conforme ensina Maria Sylvia Zanella de Pietro, o convênio é
Normalmente utilizado quando o Poder Público quer incentivar a
iniciativa privada de interesse público. Ao invés de o Estado
desempenhar, ele mesmo, determinada atividade, ele opta por incentivar
ou auxiliar o particular que queira fazê-lo, por meio de auxílios
financeiros ou subvenções, financiamentos, favores fiscais etc. A forma
usual de concretizar esse incentivo é o convênio. 57
2.2 Contratos Administrativos
José dos Santos Carvalho Filho conceitua “contrato administrativo como o
ajuste firmado entre a Administração Pública e um particular, regulado
basicamente pelo direito público, e tendo por objeto uma atividade que, de alguma
forma, traduza interesse público”. 58
55 BRASIL. Lei 8.666 de 21 de junho de 1993. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm Acesso em: 17/07/2012.
56 BRASIL. Decreto 6.170 de 25 de julho de 2007. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6170.htm Acesso em:
17/09/2012.
57 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20ª. ed. São Paulo: Atlas,
2007. P. 298.
58 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2011. Pg. 168-169
32
Diogenes Gasparini define Contrato Administrativo como sendo "ato
plurilateral ajustado pela Administração Pública ou por quem lhe faça às vezes
com certo particular, cuja vigência e condições de execução a cargo do particular
podem ser instabilizadas pela Administração Pública, ressalvados os interesses
patrimoniais do contratante particular". 59
Para Celso Antonio Bandeira de Mello "é um tipo de avença travada entre a
Administração e terceiros na qual, por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do
tipo de objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas
assujeitam-se a cambiáveis imposições de interesse público, ressalvados os
interesses patrimoniais do contratante privado” 60.
Este último Doutrinador faz questão de distinguir os Contratos de Direito
Privado da Administração dos Contratos Administrativos, objeto do presente
estudo, no sentido de que o primeiro rege-se quanto ao conteúdo e seus efeitos
pelo direito privado, a exemplo da compra, venda ou locação de um imóvel junto a
um particular para instalação de uma repartição pública, e o segundo reger-se-
iam pelo Direito Administrativo, tendo como objeto de avença a concessão de
serviço público, contrato de obra pública ou a concessão e uso de bem público 61.
Acerca dos Contratos Administrativos Maria Sylvia Zanella di Pietro aponta
algumas características que segundo esta serve de pressuposto para
caracterização do mesmo:
1) Presença da Administração Pública como poder público - nos
Contratos Administrativos a Administração Pública aparecerá sempre em
condição de supremacia em relação ao particular, buscando o
atendimento do interesse público; 2) Finalidade Pública – segundo Di
Pietro, “Esta é uma característica presente em todos os atos e contratos
da Administração Pública, ainda que regido pelo direito privado”; 3)
Obediência a forma prescrita em lei –o contrato deve observar as
exigências constantes, vigentes, do nosso ordenamento jurídico acerca
da forma e dos requisitos; 4) Procedimento legal – “A lei estabelece
determinados procedimentos obrigatórios para a celebração de contratos
e que podem variar de uma modalidade para outra, compreendendo
medidas como autorização legislativa, avaliação, motivação, autorização
pela autoridade competente, indicação de recursos orçamentários e
licitação”. Procedimento Legal – atendimento de procedimentos
“estabelecendo determinados procedimentos obrigatórios para a
celebração de contratos e que podem variar de uma modalidade para
outra, compreendendo medidas como autorização legislativa, avaliação,
59 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 9ª edição, revista e atualizada. São
Paulo: Saraiva, 2004, pg. 556.
60 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição.
Malheiros Editores: São Paulo, 2009, pg. 614 e 615.
61 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição.
Malheiros Editores: São Paulo, 2009, pg. 615
33
motivação, autorização pela autoridade competente, indicação de
recursos orçamentários e licitação”. 5) Contrato de Adesão – significa
dizer que “todas as cláusulas dos contratos administrativos são fixadas
unilateralmente pela Administração”. Ou seja, a administração
estabelecerá as condições da contratação pretendida, suas condições e
torna público ao interessados em figurar como parte contrária no pacto;
6) Natureza intuitu personae – nesta característica os Contratos
Administrativos que exigem na forma da lei o processo licitatório devem
necessariamente ser direcionada a pessoa do contraente, vedada a
subcontratação, cessão ou transferência do objeto licitado, em
consonância com a lei 8.666/93; 7) Clausulas Exorbitantes - “cláusulas
exorbitantes aquelas que não seriam comuns ou que seriam ilícitas em
contrato celebrado entre particulares, por conferirem privilégios a uma
das partes (a Administração) em relação a outra; elas colocam a
Administração em posição de supremacia sobre o contratado”
Exigências de garantia, alteração e rescisão unilateral, fiscalização,
aplicação de penalidades, anulação, retomada de objetos e restrições ao
uso da “Exceptio non adimpleti contractus”, são algumas das cláusulas
mais recorrentes. Ademais, incide ainda a característica da 8)
mutabilidade, que na sua essência decorre de das clausulas
exorbitantes, e que confere a administração a prerrogativa de
unilateralmente alterar cláusulas e/ou mesmo denunciá-lo antes do prazo
pactuado no instrumento. 62
Superado o campo das definições, se faz mister analisar a disciplina legal
dessa modalidade de instrumento de formalização de parceria pela Administração
Pública. Segundo o Professor José dos Santos Carvalho Filho “diversamente da
Constituição anterior, que silenciava sobre o assunto, a vigente estabelece desde
logo a competência legislativa para dispor sobre contratos”. 63
O artigo 22 da Constituição Federal de 1988 aduz ser competência
privativa da União legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em
todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e
fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecendo o
disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia
mista, nos termos do art. 173, § 1º, III. 64
Hely Lopes Meirelles afirma que "é nulo o contrato administrativo omisso
em pontos fundamentais, ou firmado sem licitação quando exigida, ou resultante
de licitação irregular ou fraudada no julgamento". 65
62 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20ª. ed. São Paulo: Atlas,
2007. pg. 243-265
63 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 169.
64 BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm Acessado: 29/07/2012
65 MEIRELLES. Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 11. ed. atual. São
Paulo: Malheiros, 1996. p.177.
34
2.3 Contratos de Gestão
Surgido no bojo da reforma do aparelho do Estado, em meio as
transformações que modificaram a esfera de atuação deste, no que concerne as
prestações de serviços, o Contrato de Gestão, pode ser classificado como sendo
o instrumento de acordo entre o Poder Público e a Administração Pública, direta e
indireta, ou ainda com aquelas entidades qualificadas por este mesmo poder
público como organizações sociais, pertencentes ao Terceiro Setor.
Conforme aponta Maria Sylvia Zanella de Di Pietro sobre o histórico do
Contrato de Gestão, o referido teria sido inspiração francesa, e no Brasil:
Os primeiros contratos de gestão com empresas estatais foram
celebrados, na esfera federal, com a Companhia Vale do Rio Doce -
CVRD e a Petróleo Brasileiro S.A - PETROBRÁS (ambos com base no
Decreto n. 137, de 27.5.91, que instituiu o Programa de Gestão das
Empresas Estatais). Também foi celebrado contrato de gestão com o
Serviço Social Autônomo Associação das Pioneiras Sociais, antiga
Fundação das Pioneiras Sociais (fundação governamental); essa
transformação parece ter tido por objetivo aproximar a entidade dos
antigos serviços sociais autônomos (SESI, SESC, SENAI etc.),
considerados como entidades paraestatais, porém não integrantes da
Administração Indireta. Por sua vez, aquela mesma entidade parece ter
inspirado a instituição das organizações sociais. 66
Na tentativa de defini-lo, Diógenes Gasparini classifica o Contrato de
Gestão como o “ajuste celebrado pelo Poder Público com órgãos e entidades da
Administração direta, indireta e entidades privadas qualificadas como
organizações sociais, para lhes ampliar a autonomia gerencial, orçamentária e
financeira ou para lhes prestar variados auxílios e lhes fixar metas de
desempenho na consecução de seus objetivos”. 67
Alexandre de Moraes o define como “o avençado entre o Poder Público e
determinada entidade estatal, fixando-se um plano de metas para essa, ao
mesmo tempo em que aquele se compromete a assegurar maior autonomia e
liberdade gerencial, orçamentária e financeira ao contratado na consecução de
seus objetivos”. 68
66 DI PIETRO. Maria Sylvia Zanella. Contratos de Gestão. Contratualização do
Controle Administrativo sobre a Administração Indireta e sobre as Organizações Sociais.
Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br. Acesso em 29.07.2012.
67 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 7ª ed. rev. e atual, São Paulo: Saraiva,
2002. pg. 602-603.
68 MORAES, Alexandre de. Reforma administrativa. São Paulo: Atlas, 1998. pg. 55.
35
Na obra de Hely Lopes Meirelles trata-se como o “instrumento jurídico
básico dessa forma de parceria entre o setor público e o privado. Embora a lei
denomine este instrumento de contrato, na verdade trata-se de um acordo
operacional entre a Administração e a entidade privada”. 69
Ao tecer essa definição, o autor refere-se ao parágrafo 8º, do artigo 37 da
Constituição Federal de 1988, incluído pela Emenda Constitucional 19/98, e que
apesar de referir genericamente a contrato em seu texto legal, é o dispositivo
principal fundamento legal a esse instrumento de formalização de parceria que já
era mesmo que timidamente utilizado na Administração Pública, o Contrato de
Gestão.
Ao questionar a natureza jurídica do Contrato de Gestão, Hely Lopes
Meirelles inaugura um grande debate da doutrina jurídica pátria acerca do referido
instrumento legal, à medida que ambos os autores discordam da nomenclatura
contratual que lhe foi atribuída, dentre outros fatores por não possui as
características intrínsecas da teoria geral dos contratos.
Celso Antonio Bandeira de Mello poderia ser classificado como o grande
crítico a figura do Contrato de Gestão. Segundo o mesmo não existe uma
definição que abranja o que a lei tentou nominar com a inserção de tal figura
jurídica “contratual”, pois trata-se de duas realidades “visceralmente distintas” 70.
O dispositivo Constitucional nascido pela emenda 19/98, previu ao mesmo tempo
a possibilidade de firmamento de “contratos” com entes da própria administração
pública e ainda deixou a salvo a possibilidade destes pactuarem com o que Celso
Antonio Bandeira de Mello chamou de “pessoas alheias ao Estado”, referindo-se
as Organizações Sociais.
Quanto a “contratar” com as referidas Organizações Sociais, Bandeira de
Mello até aceita como sendo uma definição legal a prevista do artigo 5º da lei
9.637/98, ao afirmar que
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, entende-se por contrato de gestão o
instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como
organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes
para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas
no art. 1º.
69 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Editora
Malheiros, 2001. p.366.
70 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed.
Malheiros Editores. São Paulo: 2011 pg. 224.
36
Agora a aceitar a possibilidade de uma definição que abranja ambas as
figuras, ou mesmo a possibilidade da Administração Pública “contratar” com a
própria Administração Pública, Bandeira de Mello definiu por improvável, tratando
ainda o instrumento jurídico como verdadeiro “arremedo de contratos, e
encenação sem nenhum valor jurídico”, fazendo lembrar que os citados “contratos
de gestão” fora “inspiração de práticas administrativas francesas”, que se
estabelecera em um ambiente jurídico distinto ao nosso.
Sobre o tema, Maria Sylvia Zanella Di Pitro deu a sua contribuição no
sentido de contestar a condição contratual do instrumento:
Mesmo em se tratando de contrato de gestão entre entidade da
Administração Indireta e o Poder Público, a natureza efetivamente
contratual do ajuste pode ser contestada, tendo em vista que a
existência de interesses opostos e contraditórios constitui uma das
características presentes nos contratos em geral e ausente no contrato
de gestão, pois é inconcebível que os interesses visados pela
Administração Direta e Indireta sejam diversos. É incontestável que a
sua natureza se aproxima muito mais dos convênios do que dos
contratos propriamente ditos. 71
José dos Santos Carvalho Filho72 “a despeito da denominação adotada,
não há propriamente contrato nesse tipo de ajuste, mas sim verdadeiro convênio,
pois que, embora sejam pactos bilaterais, não há a contraposição de interesses
que caracteriza os contratos em geral”.
Para assentar o entendimento quanto a natureza jurídica do Contrato de
Gestão, que como visto na maior parte da doutrina é compreendida como sendo a
de Convênio, mister se faz a transcrição em parte do voto da lavra do Eminente
Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Brito, no julgamento da ADI
1923/DF:
Conforme visto, a Magna Carta franqueia à iniciativa privada a
prestação de vários serviços de relevância pública e permite (até mesmo
determina) que o Poder Público fomente essas atividades, inclusive
mediante transpasse de recursos públicos. E o fato é que todos os
serviços enumerados no art. 1º da Lei 9.637/98 são do tipo “não
exclusivos do Estado”, dando-se que as pessoas jurídicas de direito
privado sem fins lucrativos, ali igualmente contempladas, são passíveis
de qualificação como organizações sociais. Daí o chamado “contrato de
gestão” consistir, em linhas gerais, num convênio. Não exatamente num
contrato de direito público, senão nominalmente.
30. Neste passo, calha invocar a doutrina de Hely Lopes Meirelles, para
quem “no contrato as partes têm interesses diversos e opostos; no
71 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo, 23ª ed., Editora Atlas, São
Paulo, 2010, p.336.
72 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 339.
37
convênio os partícipes têm interesses comuns e coincidentes”. É como
também ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, nesta clara dicção: os
“convênios e consórcios diferem da generalidade dos contratos
administrativos porque, ao contrário destes, não há interesses
contrapostos das partes, mas interesses coincidentes”. Ainda Marçal
Justen Filho, a saber: “no chamado ‘convênio administrativo’, a avença é
instrumento de realização de um determinado e específico objetivo, em
que os interesses não se contrapõem – ainda que haja prestações
específicas e individualizadas, a cargo de cada partícipe”. Ora, no caso
da celebração, entre Estado e organização social, de “contrato de
gestão”, impossível deixar de reconhecer a presença de interesses tão
recíprocos quanto convergentes. A entidade privada “contratante” tem
objetivos de natureza social e finalidade não lucrativa (alíneas “a” e “b”
do inciso I do art. 2º da Lei 9.637/98). Objetivos e finalidades
compartilhados com o Poder Público. Donde José dos Santos Carvalho
Filho averbar, categórico:
“Devidamente qualificadas, as organizações sociais celebram com o
Poder Público o que a lei denominou de contratos de gestão, com o
objetivo de formar a parceria necessária ao fomento e à execução das
atividades já mencionadas. A despeito da denominação adotada, não há
propriamente contrato nesse tipo de ajuste, mas sim verdadeiro
convênio, pois que, embora sejam pactos bilaterais, não há a
contraposição de interesses que caracteriza os contratos em geral; há,
isto sim, uma cooperação entre os pactuantes, visando a objetivos de
interesses comuns. Sendo paralelos e comuns os interesses
perseguidos, esse tipo de negócio jurídico melhor há de enquadrar-se
como convênio.”
31. Pois bem, da conclusão de que o “contrato de gestão” é, na verdade,
um convênio, toma corpo o juízo técnico de que, em princípio, há
desnecessidade de processo licitatório para a sua celebração.
Demonstrada a divergência quanto à natureza jurídica do Contrato de
Gestão, à medida que alguns o apontam como sendo um convênio, outros como
termo de parceria e outros a instrumentos análogos, se faz mister demonstrar
características outras que emanam do Contrato de Gestão. Ainda que de forma
repetitiva, cumpre ressaltar que o Contrato de Gestão é um instrumento de
formalização de parceria entre o Poder Público e seus entes da administração
direta ou indireta, esta última da qual fazem parte também as Organizações
Sociais, pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades
sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico,
à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde.
No âmbito institucional, conforme se extrai do “Caderno MARE v.2”
da reforma do Estado, os Contratos de Gestão tem por “propósito contribuir ou
reforçar o atingimento de objetivos de políticas públicas por intermédio do
38
desenvolvimento de um programa de melhoria de gestão, com vistas a alcançar
uma superior qualidade de produto ou serviço prestado ao cidadão”. 73
Sua regulação está prevista no âmbito Constitucional no parágrafo 8º, do
artigo 37 da Constituição Federal de 1988, inserido por advento da Emenda
Constitucional 19/98, e na legislação esparsa, está contida no Artigo 5º da Lei
8.666/93.
2.4 Termo de Parceria
O Termo de Parceria, pode ser definido como sendo o instrumento de
formalização de parcerias entre a Administração Pública e aquelas entidades
qualificadas por este como Organizações Sociais Civis de Interesse Público,
conhecidas também como OSCIP´s.
Disciplinado na Lei Federal 9.790/99 o Termo de Parceria, está “assim
considerado o instrumento passível de ser firmado entre o Poder Público e as
entidades qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse
Público destinado à formação de vínculo de cooperação entre as partes, para o
fomento e a execução das atividades de interesse público”74.
Como bem reforça Fernando Borges Mânica e Gustavo H. Justino de
Oliveira, a “atuação das OSCIPs, dirige-se diretamente ao atendimento do
interesse público e não do atendimento de uma necessidade da Administração
Pública” 75.
Conforme ensina Tarso Cabral Violin o termo de parceria foi assim “criado
durante o que chamou de “onda gerencial”, que influenciou a Administração
Pública brasileira, desde a divulgação do Plano Diretor do MARE“76 com vistas a
reforma do aparelho do Estado na década de 90 do século XX.
O Termo de Parceria assim como as OSCIPs está regulado pela Lei
9.790/1999, que em seu artigo 9º o prevê como “o instrumento passível de ser
73 BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Secretaria da
Reforma do Estado Organizações sociais. Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério
da Administração e Reforma do Estado, 1997. p. 36.
74 BRASIL. Lei 9.790 de 23 de março de 1999. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9790.htm Acessado: 21/07/2012.
75 MÂNICA, Fernando Borges. OLIVEIRA, Gustavo H. Justino. Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público: Termo de Parceria e Licitação. Artigo. Boletim de Direito
Administrativo, São Paulo, ano XXI, n. 9, p. 1010-1025, set. 2005.
76 VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública:
uma análise crítica. Belo Horizonte: Fórum, 2006. p. 263.
39
firmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas como Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público destinado à formação de vínculo de
cooperação entre as partes, para o fomento e a execução das atividades de
interesse público”.
Ressalta-se nessa modalidade de avença a desnecessidade de licitação,
haja vista que não se trata de uma espécie contratual, podendo conforme o
Decreto 3.100/1999, que também serve de parâmetro para essa modalidade de
instrumento, a escolha da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público,
para a celebração do Termo de Parceria, ser feita por meio de publicação de
edital de concursos de projetos pelo órgão estatal parceiro para obtenção de bens
e serviços e para a realização de atividades, eventos, consultorias, cooperação
técnica e assessoria, todavia, havendo na jurisprudência divergências quanto a
esta afirmação.
40
3. FISCALIZAÇÃO DAS PARCERIAS ENTRE TERCEIRO SETOR E
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
Talvez o grande cerne do presente estudo, nos incumbirá neste terceiro
capítulo o papel de tentar demonstrar do modo mais aclarado possível as formas
de ocorrência do controle fiscalizador das parcerias firmadas entre o poder
público e as entidades pertencentes ao Terceiro Setor.
Preliminarmente, mister se faz ressaltar que para tal emergiremos ao
campo das conceituações acerca do controle da Administração Pública, já que é
do instituto que emana as principais e mais efetivas ferramentas de controle dos
atos da administração pública.
Não existe uma certeza quanto à origem etimológica da palavra, todavia,
“no Direito pátrio, o vocábulo controle foi introduzido e consagrado por Seabra
Fagundes desde a publicação de sua insuperável monografia ‘O Controle dos
Atos Administrativos pelo Poder Judiciário’”.77
Hely Lopes Meirelles aduz sobre controle, de forma genérica, como “a
faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade
exerce sobre a conduta funcional de outro”. 78
Mais especificamente sobre o controle da Administração Pública, Maria
Sylvia Zanella Di Pietro afirma consistir no “poder de fiscalização e correção que
sobre ela exercem os órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, com
o objetivo de garantir a conformidade de sua atuação com os princípios que lhe
são impostos pelo ordenamento jurídico”.
Na mesma toada, José dos Santos Carvalho Filho define como sendo “o
conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos por meio dos quais se exerce
o poder de fiscalização e de revisão da atividade administrativa em qualquer das
esferas de Poder.”79
Para Patrícia Cardoso Rodrigues de Souza trata-se do “Poder-dever de
inspeção, registro, exame, fiscalização pela própria Administração, pelos demais
poderes e pela sociedade, exercidos sobre conduta funcional de um poder, órgão
77 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 23ª Ed. São Paulo:
Malheiros, 1990. Pg. 544.
78 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 36ª. ed. São Paulo:
Editora Malheiros, 2010. p.697
79 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009. Pg. 893.
41
ou autoridade com o fim precípuo de garantir a atuação da Administração em
conformidade com os padrões fixados pelo ordenamento jurídico”. 80
Para Marçal Justen Filho tratam-se de “mecanismos jurídicos de controle
da atividade administrativa destinados a verificar a regularidade dos atos
administrativos e a reprimir os desvios ocorridos”. 81
Sintetizando todos os entendimentos supracitados acerca do vocábulo
controle, aplicado à Administração Pública, Evandro Martins Guerra nos dá um
grande contribuição quando ensina que:
Controle da Administração Pública é a possibilidade de verificação,
inspeção, exame, pela própria Administração, por outros Poderes ou por
qualquer cidadão, da efetiva correção na conduta gerencial de um Poder,
órgão ou autoridade, no escopo de garantir atuação conforme aos
modelos desejados anteriormente planejados, gerando uma aferição
sistemática. Trata-se, na verdade de poder-dever, já que, uma vez
determinado em lei, não poderá ser renunciado ou postergado, sob pena
de responsabilização por omissão do agente infrator. 82
Romeu Felipe Bacellar Filho, especificamente sobre o surgimento do
Controle da Administração Pública, afirma que esta foi uma necessidade advinda
principalmente como um reforço a ideia de Estado Democrático de Direito, algo
ainda recente no âmbito Brasil, e que teve por escopo proporcionar mecanismos
aos agentes externos à Estrutura Administrativa, sem qualquer ligação ou
interesse próprio em relação à atividade controlada. Nesse sentido é que
destacamos as palavras de Bacellar quando ressalta que:
Desde o advento do Estado Social e Democrático de Direito, constatou-
se a necessidade do estabelecimento de mecanismos de controle que
possam ser exercidos por agentes que estejam fora da estrutura
administrativa e que sejam, por assim dizer, totalmente desvinculados e
imparciais em relação à atividade que será objeto do controle. 83
A principal finalidade do Controle efetuado sobre a Administração Pública
pelos meios postos a disposição é a fiscalização dos seus atos, prezando desta
forma pela correta aplicação dos recursos, o atendimento aos melhores princípios
80 SOUZA, Patrícia Cardoso Rodrigues de. Controle da Administração Pública. In:
MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Curso Prático de Direito Administrativo. 2ª Ed. Belo Horizonte:
Del Rey, 2004, Pg.150.
81 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva,
2009. Pg. 980.
82 GERRA, Evandro Martins. Fiscalização e Controle da Atividade Financeira. In:
GERRA, Evandro Martins. Os Controles Externo e Interno da Administração Pública. 2ª ed.
Belo Horizonte: Fórum, 2007. Parte II, p. 89-284.
83 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva
do modelo de gestão Pública Gerencial. Belo Horizonte: Fórum, 2007. Pg. 118.
42
da boa administração, bem ainda verificar se o agente público está cumprindo
com as meta estabelecidas no que concerne ao Plano Plurianual – PPA, Lei de
Diretrizes Orçamentárias, na Lei Orçamentária Anual – LOA, no atinente a
possibilidade de cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, coibindo
excessos se o controle se der prévio ou concomitante ao ato ou no caso do objeto
do presente estudo, a parceria entre Administração Pública e entidade do Terceiro
Setor.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro sobre finalidade do Controle Administrativo,
leciona que “é a de assegurar que Administração atue em consonância com os
princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico, como os princípios da
legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação,
impessoalidade” 84 afirmando ainda que “em determinadas circunstâncias,
abrange também o controle chamado de mérito e que diz respeito aos aspectos
discricionários da atuação administrativa” 85.
José dos Santos Carvalho Filho nos ensina que o controle tem o fito de
“assegurar a garantia dos administrados e da própria Administração no sentido de
ver alcançados seus objetivos, devendo sempre atuar em conformidade com
padrões fixados na lei e buscar o interesse da coletividade, além de garantir que
não sejam vulnerados direitos subjetivos dos indivíduos nem as diretrizes
administrativas”. 86
O autor aduz ainda que o referido “controle tem a natureza de um princípio
fundamental da Administração Pública, não podendo ser dispensado ou recusado
por nenhum órgão administrativo, devendo ser exercido em todos os níveis de
poder” 87.
Não obstante a existência na doutrina pátria de outras classificações optar-
se-á no presente estudo por demonstrar a forma mais aceita, por assim dizer,
sobre o Controle da Administração Pública. De acordo com esta classificação o
Controle em questão pode-se dar tanto na sua forma interna, pela via
Administrativa, processando-se dentro do próprio poder público um Sistema de
84 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª. ed. São Paulo: Atlas,
2009. pg. 724.
85 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª. ed. São Paulo: Atlas,
2009. pg. 724.
86 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 19ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009. Pg. 98.
87 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 19ª ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2009. Pg. 810.
43
Controle, ou ainda na sua forma Externa de Controle, que pode ser exercido pelo
Poder Legislativo, com o suporte do Tribunal de Contas, pela via Judicial por
intermédio do Ministério Público ou ainda por um terceiro meio contido dentro da
ideia de Controle Externo, qual seja o Controle Social, que por sua vez poderá se
valer, individualmente ou em grupo, de ferramentas postas à disposição pela lei
para o exercício desta prerrogativa.
Essa classificação segundo a doutrina de Rodrigo Pironti de Castro se dá
quanto à localização do controle 88
, que por sua vez subdivide-se na forma interna
à Administração Pública ou ainda de forma Externa.
Evandro Martins Guerra conceitua o Controle Externo como sendo
Aquele desempenhado por órgão apartado do outro controlado, tendo
por finalidade a efetivação de mecanismos, visando garantir a plena
eficácia das ações de gestão governamental, porquanto a Administração
pública deve ser fiscalizada, na gestão dos interesses da sociedade, por
órgão de fora de suas partes, impondo atuação em consonância com os
princípios determinados pelo ordenamento jurídico, como os da
legalidade, legitimidade, economicidade, moralidade, publicidade,
motivação, impessoalidade, entre outro. 89
O Controle Externo nas palavras de Marçal Justen Filho consiste “na
submissão da atividade administrativa à fiscalização exercitada por órgãos
externos à estrutura do Poder que os praticou”. 90
Rodrigo Pironti Aguirre de Castro afirma que “o controle externo da
Administração pública, em suma, é aquele exercido pelo Poder Legislativo com
apoio dos Tribunais de Contas, pelo Poder Judiciário e pela sociedade através do
Controle Social” 91, entendimento este que reforça o objeto de estudos nos tópicos
subsequentes.
Nos valemos da explicação de José Afonso da Silva para o fim de
diferenciar o Controle Interno, da segunda forma de Controle, o Externo. Segundo
o autor
A Constituição estabelece que os Poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário, manterão, de forma integrada, o controle interno. Trata-se de
controle de natureza administrativa, exercido sobre funcionários
88 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Controle Interno da Administração Pública:
uma perspectiva do modelo de gestão administrativa. Orientador: Romeu Felipe Bacelar Filho.
Tese de Mestrado. Pontífice Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2007. Pg. 104.
89 GUERRA, Evandro Martins. Os controle Externo e interno da administração pública.
2ª Ed. Ver. E ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2005. Pg. 108.
90 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 4ª Ed.
2009. Pg. 991.
91 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva
do modelo de gestão Pública Gerencial. Belo Horizonte: Fórum, 2007. pg. 118
44
encarregados de executar os programas orçamentários e da aplicação
do dinheiro público, por seus superiores hierárquicos: ministros,
diretores, chefes de divisão, etc. (...) O controle externo é, pois, função
do Poder Legislativo, sendo de competência do Congresso Nacional no
âmbito federal, das Assembleias Legislativas nos Estados, da Câmara
Legislativa no Distrito Federal e das Câmaras Municipais nos Municípios
como o auxílio dos respectivos Tribunais de Contas. Consiste, assim, na
atuação da função fiscalizadora do povo, através de seus
representantes, sobre a administração financeira e orçamentária. É,
portanto, um controle de natureza política, no Brasil, mas sujeito à prévia
apreciação técnico-administrativa do Tribunal de Contas competente,
que, assim, se apresenta como órgão técnico, e suas decisões
administrativas, não jurisdicionais, como, às vezes, se sustenta, à vista
da expressão ‘julgar as contas’ referida à sua atividade (art. 71, I). 92
Controle Externo que por sua vez é a forma de fiscalização das Parcerias
firmadas entre Administração Pública e as entidades do Terceiro Setor, e do qual
daremos maior ênfase no presente capítulo.
Segundo Janaina Schoenmaker 93 “com a expansão da destinação dos
recursos públicos ao Terceiro Setor para prestação de serviços de interesse
público, chama a atenção o controle sobre ele exercido”.
E completa afirmando que para muitos autores, esse dever de controle e
prestação de contas decorreriam do princípio republicano, que, no entanto, não é
unanime na doutrina pátria, cabendo demonstrar a douta opinião do Ministro
Carlos Ayres Brito a respeito deste princípio que fundamenta o Controle Externo.
Segundo o autor:
Tão elevado prestígio conferido ao controle externo e a quem dele mais
se ocupa, funcionalmente, é reflexo direto do princípio republicano. Pois,
numa República, impõe-se responsabilidade jurídica pessoal a todo
aquele que tenha por competência (e consequente dever) cuidar de tudo
que é de todos, assim do prisma da decisão como do prisma da gestão.
E tal responsabilidade implica o compromisso da melhor decisão e da
melhor administração possíveis. Donde a exposição de todos eles (os
que decidem sobre a “res publica” e os que a gerenciam) à comprovação
do estrito cumprimento dos princípios constitucionais e preceitos legais
que lhes sejam especificamente exigidos. A começar, naturalmente, pela
prestação de contas das sobreditas gestões orçamentária, financeira,
patrimonial, contábil e operacional.
É essa responsabilidade jurídica pessoal (verdadeiro elemento
conceitual da República enquanto forma de governo) que demanda ou
que exige, assim, todo um aparato orgânico-funcional de controle
externo. 94
92 SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 15ª Ed. Malheiros
Editores, 1998. Pg 716/718.
93 SCHOENMAKER, Janaina. Controle das parcerias entre o Estado e o Terceiro Setor
pelos Tribunais de Contas. Belo horizonte: Fórum, 2011. p.73.
94 BRITTO, Carlos Ayres. O Regime Constitucional dos Tribunais de Contas. Revista
Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº. 9, dezembro, 2001.
Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 22-09-2012.
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Parcerias entre Terceiro Setor e Estado

  • 1. CEZAR VIANA LUCENA Terceiro Setor: Parcerias com a Administração Pública e o Controle exercido pelo Ministério Público, Tribunal de Contas e Sociedade. Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Curso de Direito, Núcleo de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da Universidade Positivo. Orientador: Professor Doutor Fernando Borges Mânica. CURITIBA 2012
  • 2. 2 Dedico o presente trabalho aos meus pais, que no auge de sua simplicidade, mesmo em meio as maiores adversidades e dificuldades enfrentadas em nossa criação, jamais permitiram que eu trilhasse outro caminho que não o da educação.
  • 3. 3 AGRADECIMENTOS Meus sinceros agradecimentos vão ao meu orientador, Doutor Fernando Mânica, que com sua sabedoria e paciência nos orientou ao longo do presente estudo, aos meus amigos, que sempre compreensíveis souberam nos auxiliar de alguma forma, mesmo nos momentos mais difíceis quando do desenvolvimento do presente estudo, aos meus pais, razão precípua de minha existência e por quem todos os esforços sempre valerão apena.
  • 4. 4 “O sucesso nasce do querer, da determinação e persistência em se chegar a um objetivo. Mesmo não atingindo o alvo, quem busca e vence obstáculos, no mínimo fará coisas admiráveis." (José de Alencar).
  • 5. 5 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...............................................................................................................6 1. TERCEIRO SETOR: CONCEITO, HISTÓRICO E MARCO REGULATÓRIO10 1.1 CONCEITO.........................................................................................................10 1.2 HISTÓRICO DO TERCEIRO SETOR............................................................15 1.3 MARCO REGULATÓRIO NO BRASIL .........................................................18 1.3.1 Título de Utilidade Pública.........................................................................20 1.3.2 Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social - CEBAS.......................................................................................................................21 1.3.3 Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP´s23 1.3.4 – Organizações Sociais – OS´s ................................................................25 2. INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE FORMALIZAÇÃO DE PARCERIAS ENTRE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E TERCEIRO SETOR...........................................28 2.1 Convênios .........................................................................................................28 2.2 Contratos Administrativos............................................................................31 2.3 Contratos de Gestão.......................................................................................34 2.4 Termos de Parcerias.......................................................................................38 3. FISCALIZAÇÃO DAS PARCERIAS ENTRE TERCEIRO SETOR E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ..................................................................................40 3.1 Controle Interno...............................................................................................48 3.2 Tribunal de Contas..........................................................................................51 3.3 Ministério Público ...........................................................................................55 3.4 Controle Social.................................................................................................58 4 – CONCLUSÃO........................................................................................................63 BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................................63
  • 6. 6 LISTADE SIGLAS OS – Organização Social OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público CEBAS – Certificado de Entidade Beneficente e Assistência Social ONG – Organização não governamental MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado GESET – Gerência de Estudos Setoriais
  • 7. 7 RESUMO A presente monografia pretende abordar o Terceiro Setor, suas características e seu marco regulatório, no tocante a suas titulações e instrumentos de formalização de parcerias, a forma do seu desenvolvimento, bem como pretende explorar com maior clareza de detalhes como tem sido observada as parcerias deste com o Estado à luz da Constituição, da legislação esparsa e da sociedade. Verificar-se-á também como tem se desenvolvido a fiscalização destas mesmas parcerias com o Estado, no âmbito do Controle Externo exercido pela Administração Pública e ainda em relação à fiscalização exercida externa a Administração, pelos Tribunais de Contas, Ministério Público e a Sociedade. Palavras-chave: Terceiro Setor; Administração Pública; Parcerias; Controle Externo
  • 8. 8 INTRODUÇÃO Não pertencente à esfera estatal, tão pouco a esfera de mercado, o Terceiro Setor por assim dizer, recebe essa nomenclatura justamente por não estar dotado de quaisquer características que o equipare aos dois primeiros setores da sociedade. Ainda que haja no Brasil resquício de atuação de entidades com suas mesmas características que remontam ao início do século passado, foi somente a partir da década de 1970 do século XX que se passa a classifica-las desta forma. Esta modalidade de pessoa jurídica adquiriu força no bojo das transformações trazidas pela reforma do Estado Brasileiro, que em meados dos anos de 1980, em meio às transformações em sua conjuntura política, vivia uma forte crise caracterizada entre outros motivos por interferências acentuadas do Estado na esfera produtiva, desviando-o de suas funções primordiais, causando distorções no modelo de desenvolvimento adotado, chegando à sua fase mais insustentável em meados da década de 1990. O Terceiro Setor, em meio a muitas transformações idealizadas no Projeto de Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro surgiu como uma alternativa que visava o estabelecimento de alianças entre a Sociedade e o Estado, o que André Pablo Falconer chama de “nova e grande promessa: a renovação do espaço público, o resgate da solidariedade e da cidadania, a humanização do capitalismo e, se possível, a superação da pobreza”. O Estado então deixa a sua hegemonia na execução de suas atividades e passa a fomentar a execução destas mesmas atividades pelos particulares, com a fiscalização deste, sem, no entanto haver transferências de responsabilidades pelo ente público, apenas quanto a sua execução. São instituídos a partir de então marcos regulatórios das entidades pertencentes a essa modalidade de pessoas jurídicas, tais como as Organizações Sociais (OS) pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sociais sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde e que encontra-se prevista na Lei 9.637/98.
  • 9. 9 A Lei 9.790/99 trás entre outras previsões a possibilidade de concessão de título de Organização Social Civil de Interesse Público – OSCIP pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, comprometidas com o desenvolvimento de serviços de interesse público, em forma de colaboração com o estado. Pelos meios postos a disposição, verifica-se a partir de então um crescimento vertiginoso das parcerias entre a Administração Pública e as entidades do Terceiro Setor, tais como os Contratos de Gestão, firmados entre Estado e Organizações Sociais para gestão de hospitais públicos, Instituições de Ensino. Ou ainda por meio do firmamento de Convênios em que o Estado fomenta determinada atividade de interesse público desenvolvida por um particular. Não obstante ao fato do Terceiro Setor estar revestido de interesses públicos, desprovido na sua essência de almejar lucros e no fato de não se tratar de atividade de mercancia, é comum as distorções no tocante a malversação do dinheiro público empregado na realização dos fins a que se destinam, fazendo desta forma imperioso verificar a forma de fiscalização destas parcerias entre Terceiro Setor e Administração Pública, o Controle exercido internamente a Administração Pública, bem como na sua forma Externa, exercitada pelos Tribunais de Contas, pelo Ministério Público e ainda o Controle Social que se exerce em relação a estas avenças, pelos meios postos a disposição da sociedade.
  • 10. 10 1. TERCEIRO SETOR: CONCEITO, HISTÓRICO E MARCO REGULATÓRIO 1.1 CONCEITO Para uma boa compreensão sobre o que de fato é o Terceiro Setor, ou o Third Sector1 quando cunhado pela vez primeira, nestes termos, na década de 60 do século XX, necessário se faz que compreendamos quais são os dois primeiros setores da sociedade, ou seja, o primeiro e o segundo setores, respectivamente. Karina Ribeiro Fernandes já afirmara a Grande confusão de conceitos e nomenclaturas quando se trata do terceiro setor. Surge sempre uma gama de termos como sociedade civil, sociedade sem fins lucrativos, organizações não governamentais (ONGs), entre outros, que provocam grande confusão, pois encerram aspectos jurídicos e organizacionais relevantes para qualquer tipo de conclusão.2 Fernando Borges Mânica alerta que O uso indiscriminado da expressão acabou por tornar o conceito de Terceiro Setor, “albergue” para todos os modelos de entidade que não se enquadrem no conceito dos outros dois setores. Essa ausência de uma definição precisa da expressão faz com que sua utilização muitas vezes mais confunda do que explique.3 Nessa tarefa, contaremos com as palavras de Dirley Junior Cunha, que aduz para o fim de identificar cada dos atores componentes dos três setores, que O primeiro setor é o Estado e sua Administração Direta e Indireta; o segundo setor, representado pelo mercado, no qual vigora a livre iniciativa de fins lucrativos, e que é reservado, em regra, à iniciativa privada, e o Terceiro Setor, que é marcado pela presença de entidades da sociedade civil, de natureza privada, sem fins lucrativos.4 1 MÂNICA. Fernando Borges. Terceiro setor e imunidade tributária: teoria e prática. Fernando Borges Mânica. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 57. 2 FERNANDES, Ribeiro Karina. Constituição de redes organizacionais como uma nova forma de gestão das organizações do terceiro setor. 2004, p.123. 3 MÂNICA, F. B., “Panorama Histórico Legislativo do Terceiro Setor no Brasil: do Conceito de Terceiro Setor à Lei das OSCIP”, In: OLIVEIRA, G. J. de. (coord.) “Terceiro Setor, Empresas e Estado: Novas Fronteiras entre o Público e o Privado”. Belo Horizonte: Fórum. 2007, p. 163-194. 4 CUNHA, Dirley Junior. Curso de Direito Administrativo. 6ª edição. São Paulo: Juspodivm, 2008, p. 189.
  • 11. 11 É exatamente essa a questão a ser levada em conta. O Terceiro Setor não se encontra acima ou abaixo, antes ou depois dos demais setores; mas entre o Estado e o mercado. 5 Silvio Luiz os conceitua nesse mesmo sentido, todavia, invertendo a ordem estrutural para o fim de colocar o Mercado no primeiro setor e o Estado na sequência, conforme se extrai: Terceiro Setor indica os entes que estão situados entre os setores empresarial (primeiro setor) e estatal (segundo setor). Os entes que integram o Terceiro Setor são entes privados, não vinculados à organização centralizada ou descentralizada da Administração Pública, que não almejam entre seus objetivos sociais o lucro e que prestam serviços em áreas de relevante interesse social e público. 6 Nas palavras de Boaventura de Sousa Santos: O Terceiro setor é uma designação residual e vaga com que se pretende dar conta de um vastíssimo conjunto de organizações sociais que não são nem estatais nem mercantis, ou seja, organizações sociais que, por um lado, sendo privadas, não visam fins lucrativos, e, por outro lado, sendo animadas por objetivos sociais, públicos ou coletivos. 7 Coadunamos com a conceituação de Boaventura Sousa Santos quando define o Terceiro Setor como sendo uma conceituação “residual e vaga” 8, tendo em vista a abrangência com que se identifica entidades pertencentes a esse setor da sociedade, dedicadas as mais diferenciadas finalidades e com nominações jurídicas bastante peculiares. Nas palavras de Gustavo Henrique Justino de Olveira O Terceiro Setor pode ser entendido como o conjunto de atividades voluntárias, desenvolvidas por organizações privadas não governamentais e sem ânimo de lucro (associações ou fundações), realizadas em prol da sociedade, independentemente dos demais 5 MÂNICA, Fernando Borges. Panorama histórico legislativo do Terceiro Setor no Brasil: do conceito de Terceiro Setor à Lei das OSCIP. In: OLIVEIRA, Gustavo J. de. (coord.) Terceiro Setor, Empresas e Estado: novas fronteiras entre o público e o privado. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 163-194. 6 ROCHA, Silvio Luis Ferreira. Terceiro Setor. 1ª edição. São Paulo: Malheiros, 2003, pág.13. 7 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma reinvenção solidária e participativa do Estado. In: BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos, WILHEIM, Jorge e SOLA, Lourdes (orgs.). Sociedade e Estado em transformação. São Paulo: UNESP; Brasília: ENAP, 1999. p.250-251. 8 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma reinvenção solidária e participativa do Estado. In: BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos, WILHEIM, Jorge e SOLA, Lourdes (orgs.). Sociedade e Estado em transformação. São Paulo: UNESP; Brasília: ENAP, 1999. p.250-251.
  • 12. 12 setores (Estado e mercado), embora com eles possa firmar parcerias e deles possa receber investimentos (públicos e privados). 9 Para Silvio Luiz, os entes que integram o Terceiro Setor são entes privados, não vinculados à organização centralizada ou descentralizada da Administração Pública, que não almejam entre seus objetivos sociais o lucro e que prestam serviços em áreas de relevante interesse social e público. 10 Sobre as atividades do Terceiro Setor, Leandro Marins de Sousa as enxerga como sendo “toda ação, sem intuito lucrativo, praticada por pessoa física ou jurídica de natureza privada, como expressão da participação popular, que tenha por finalidade a promoção de um direito social ou seus princípios”. 11 Andrea Fernandes Nunes, afirma que as entidades do Terceiro Setor, são “um conjunto de organizações de origem privada e finalidade não lucrativa, cujo objetivo é promover o bem estar social através de ações assistenciais, culturais e de promoção da cidadania”. 12 Rubem César Fernandes tem o Terceiro Setor como o: Composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela ênfase na participação voluntária, num âmbito não governamental, dando continuidade às práticas tradicionais da caridade, da filantropia, do mecenato e expandindo o seu sentido para outros domínios, graças, sobretudo, á incorporação do conceito de cidadania e de suas múltiplas manifestações na sociedade civil. 13 Dirley Junior Cunha também dá a sua contribuição acerca da definição das atividades exercidas pelos entes do Terceiro Setor, que de acordo com este exercem atividades de interesse social e coletivo e que, por esse motivo, recebem incentivos do estado, que desempenha, em relação a elas, uma atividade de fomento. Tais entidades são conhecidas por entes de cooperação ou entidades paraestatais, que colaboram ou cooperam com o Estado no desempenho de uma 9 OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino de. Estado contratual, direito ao desenvolvimento e parceria público-privada. In: TALAMINI, Eduardo et al. (Coord.). Parceria público-privada: uma abordagem multidisciplinar. São Paulo: RT, 2005. p. 83-119. 10 ROCHA, Silvio Luis Ferreira. Terceiro Setor. 1ª edição. São Paulo: Malheiros, 2003, pág.13. 11 SOUZA. Leandro Marins de. Tributação do Terceiro Setor no Brasil, São Paulo: Editora Dialética. 2004. p. 96. 12 NUNES Andrea Fernandes. Terceiro Setor – Fiscalização e Outras Formas de Controle, 2002, p.23., Recife, Editora Nossa Livraria. 13 FERNANDES, Ribeiro Karina. O que é o Terceiro Setor?. São Paulo: Paz e terra, 1997, pág. 23.
  • 13. 13 atividade de interesse coletivo, embora não integrem, residindo apenas ao lado dele. 14 Não menos importante, pelo contrário, deixamos a opinião de Fernando Borges Mânica estrategicamente por último nessa escala de definições, tendo em vista que o mesmo traz uma contribuição a mais, quando afirma que o Terceiro Setor é o Conjunto das pessoas jurídicas de direito privado, constituídas de acordo com a legislação civil sob a forma de associações ou fundações, as quais desenvolvam (i) atividades de defesa e promoção de quaisquer direitos previstos pela Constituição ou (ii) prestem serviços de interesse público. 15 Pois bem, é pegando uma carona na douta opinião de Fernando Borges Mânica que traçamos breve paralelo entre as referidas entidades (fundação e associação) para afirmar que independente da nomenclatura ou finalidade que venha a adquirir será sempre entendida como uma Associação ou Fundação (pública ou privada). No tocante às Fundações, estas podem ser tanto públicas quanto privadas. Se pública, somente poderá sua instituição ocorrer mediante lei específica, cabendo à lei complementar, no caso das fundações, definir a área de sua atuação (Constituição Federal, art. 37, XIX). Acerca do tema, Maria Sylvia Zanella Di Pietro aduz que: A fundação instituída pelo Poder Público caracteriza-se por ser um patrimônio, total ou parcialmente público, a que a lei atribui personalidade jurídica de direito público ou privado, para consecução de fins público; quando tem personalidade pública, o seu regime jurídico é idêntico ao das autarquias, sendo por isso mesmo, chamada de autarquia fundacional, em oposição a autarquia corporativa. As fundações de direito privado regem-se pelo Direito Civil em tudo o que não for derrogado pelo direito público. 16 Já a fundação privada, na qual define o Professor Venosa como sendo “uma universalidade de bens (patrimônio) destinada a um fim determinado, de 14 CUNHA, Dirley Junior. Curso de Direito Administrativo. 6ª edição. São Paulo: Juspodivm, 2008, pag. 189. 15 MÂNICA, Fernando Borges. Terceiro Setor e Imunidade Tributária. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 65. 16 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p.420.
  • 14. 14 interesse coletivo” 17, estas nascerão na forma dos artigos 63 e 63 do Código Civil Brasileiro, de forma que em consonância com o mesmo diploma legal por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la. 18 No que se refere à segunda natureza jurídica de entidades do Terceiro Setor, as Associações, são as mais comuns, possuem previsão Constitucional do artigo 5º, inciso XVII, da Constituição Federal de 1988 e regulação no artigo 53 da Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro), fazendo constar no caput do referido que “Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. 19 Para PAES “associação é uma modalidade de agrupamento dotado de personalidade jurídica, sendo pessoa jurídica de direito privado voltada à realização de interesses de seus associados ou de uma finalidade de interesse social”. 20 Maria Sylvia Zanella Di Pietro 21 entende como sendo entidades integrantes do terceiro setor os serviços sociais autônomos, as entidades de apoio, as organizações sociais e as organizações da sociedade civil de interesse público. Estas duas últimas que por sinal dedicaremos um tópico no presente para tratá- las especificamente. O Terceiro Setor, especificamente divide muitas opiniões. Existe quem o defenda e acredite na sua manutenção enquanto setor da sociedade, bem como existem os críticos ferrenhos, que enxerga o Terceiro Setor como sendo um mero ideário, de promoção de “pilantropia”. Maria da Glória Marcondes Gohn, pesquisadora da UNICAMP afirma que “o terceiro setor é um tipo de “Frankenstein”: grande, heterogêneo, construído de pedaços, desajeitado, com múltiplas facetas”. 22 17 VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica. Belo Horizonte: Fórum, 2006. Citando: ALVES. Associações, Sociedades e Fundações no novo Código Civil de 2002: perfil e adaptações, p. 55-56. 18 BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm > Acesso em: 15/04/2012. 19 BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm > Acesso em: 16/04/2012. 20 PÃES, José Eduardo Sabo. Fundações, Associações e entidades de Interesse social. 6ª. ed. Brasília: Jurídica, 2006, p. 63. 21 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 19.ed. São Paulo: Atlas,p. 22 GOHN, Maria da Glória. Mídia, terceiro setor e MST: impactos sobre o futuro das cidades e do campo. Maria da Glória Gohn. Petrópolis: Vozes, 2000. p.60.
  • 15. 15 Enquanto que na visão de Montaño, o Terceiro Setor é um instrumento da estratégia neoliberal visto como “uma nova modalidade de trato à questão social”.23 O autor afirma ainda que A parceria entre o Estado e o “Terceiro Setor” tem a clara função ideológica de encobrir o fundo, a essência do fenômeno, ser parte da estratégia de reestruturação do capital, e feitichizá-lo em ‘transferência’, levando à população a um enfrentamento/aceitação deste processo dentro dos níveis de conflitividade institucional aceitáveis para a manutenção do sistema, e ainda mais, para a manutenção da atual estratégia do capital e seu projeto hegemônico: o neoliberalismo. 24 1.2 HISTÓRICO DO TERCEIRO SETOR O Terceiro Setor, traduzido do inglês Third Sector25, conforme já citado em tópico anterior, foi nestes termos cunhado pela primeira vez, em meados de 1970 nos Estados Unidos, como forma designar a nova modalidade de organismos componente da sociedade, que não se confunde com o setor de mercado, dentre outros fatores, por não ter finalidade econômica ou lucrativa, bem como não se confundindo com o ente estatal, tendo em vista a sua forma de manutenção e de gestão, surgindo desta forma como um setor estranho aos demais existentes até então. Entretanto, apesar de recente os estudos acerca do Terceiro Setor, remontam dos séculos XVI e XVII, as primeiras instituições com características notadamente do Terceiro Setor, que nesta época, em meio a Europa de dissídios, desenvolviam trabalhos sociais de cunho político e religioso. Foi por volta de 1800, reflexo da Revolução Industrial, que surge às associações patronais e os sindicatos de trabalhadores, sendo que este último daria ensejo aos primeiros partidos políticos, como forma de organizar a defesa dos interesses da classe junto ao estado. 23 MONTAÑO, Carlos. Políticas Sociais e Estatais e “Terceiro Sector”: O projeto neoliberal para a atuação resposta à “Questão Social”. I Coloquio Brasil/Uruguay: "Questao urbana, políticas sociais e servico social". Escola de Servico Social - UFRJ. Río de Janeiro, 2002. p.11-12. 24 MONTAÑO, Carlos. Terceiro setor e questão social: crítica ao padrão emergente de intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002. P27. 25 MÂNICA, Fernando Borges. Panorama histórico-legislativo do Terceiro Setor no Brasil: do conceito de Terceiro Setor à Lei das OSCIP. In: OLIVEIRA, Gustavo J. de. (coord.) Terceiro Setor, Empresas e Estado: novas fronteiras entre o público e o privado. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 163-194.
  • 16. 16 Durante esse período, peculiar foi à atuação destas entidades com características de organizações civis, tendo em vista que as mesmas sofreram forte influencia do Estado e da Igreja, tornando-se órgãos de participação massiva, entretanto, com hierarquias controladoras e centralizadoras. Esse período histórico do Estado Moderno está intimamente ligado a fase de ascensão do Estado Absolutista e o pré-capitalismo, de fortes tensões entre a burguesia liberal contra a aristocracia, bem como da burocracia socialista e a burguesia. E foi nessa fase explosiva que a sociedade civil foi aos poucos se afirmando perante o Estado, que por sua vez, no bojo das transformações sociais foi obrigado a conduzir os regimes autoritários vigentes à época a regimes democráticos. No Brasil o Terceiro Setor tem como marco inicial a década de 1970, onde pela primeira vez o termo foi utilizado para definir as entidades sem fins lucrativos, não pertencentes ao ente estatal ou ainda desprovido de características de um organismo de mercado, todavia, hibrida aos dois setores, formando um terceiro setor, com suas peculiaridades. No Brasil, conforme o relatório Gerência de Estudos Setoriais - GESET: A participação das entidades sem fins lucrativos no Brasil é datada no final do século XIX. Pode-se até mesmo citar o exemplo das Santas Casas que remontam mais atrás, na segunda metade do século XVI, e trás consigo uma tradição da presença das igrejas cristãs que direta ou indiretamente atuavam prestando assistência à comunidade. Toma-se como destaque a Igreja Católica, que com suporte do Estado, era responsável pela maior parte das entidades que prestavam algum tipo de assistência às comunidades mais necessitadas, que ficavam às margens das políticas sociais básicas de saúde e educação. A atuação das Igrejas, concomitante com o Estado, durou todo o período colonial, até início do século XIX. 26 Como se extrai do Caderno MARE - Organizações Sociais27, a ascensão do Terceiro Setor no Brasil confunde-se com a crise do Estado moderno, que nesta época foi objeto de vultosas discussões em todo mundo acerca do verdadeiro papel do Estado. 26 GESET - Gerência de Estudos Setoriais. Terceiro Setor e o Desenvolvimento Social. AS/GEET. Relato Setorial nº 03, julho de 2001. Pg.6-7 Disponível: http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento /relato/tsetor.pdf Acessado em: 01-05-2001. 27 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do estado; v. 2).
  • 17. 17 No Brasil os debates relativos à atuação do Estado se fizeram também necessárias a partir da década de 1980, logo após a fase de transição democrática Brasileira, tendo em vista as imperfeições do modelo de desenvolvimento adotado, de forma que na década 1990 alcançou a sua fase mais insustentável, já que o modelo, obsoleto, dava grande ênfase à esfera produtiva, por via das interferências diretamente realizadas pelo Estado, o que levou a um forte desequilíbrio, desviou o mesmo Estado de suas funções primordiais, fato que acarretou em sérias distorções de mercado. De acordo com o mesmo projeto de reestruturação do Estado Brasileiro, o país passava por uma séria crise de cunho fiscal Caracterizada pela crescente perda do crédito por parte do Estado e pela poupança pública que se torna negativa; (ii) o esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado, a qual se reveste de várias formas: o Estado do bem-estar social nos países desenvolvidos, a estratégia de substituição de importações no terceiro mundo, e o estatismo nos países comunistas; e (iii) a superação da forma de administrar o Estado. Isto é, a superação da administração pública burocrática, que no Brasil se acentuou na década de 1990, e onde seguindo as tendências mundiais, ensejou no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, que teve por escopo um: (1) o ajustamento fiscal duradouro; (2) reformas econômicas orientadas para o mercado, que, acompanhadas de uma política industrial e tecnológica, garantissem a concorrência interna criando as condições para o enfrentamento da competição internacional; (3) a reforma da previdência social; (4) a inovação dos instrumentos de política social, proporcionando maior abrangência e promovendo melhor qualidade para os serviços sociais; e (5) a reforma do aparelho do Estado, com vistas a aumentar sua “governança”, ou seja, sua capacidade de implementar de forma eficiente políticas públicas.28 A implementação de Organizações Sociais é uma estratégia central do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Seu propósito genérico foi o de: [...] permitir e incentivar a publicização, ou seja, a produção não-lucrativa pela sociedade de bens ou serviços públicos não-exclusivos de Estado. [...] um novo modelo de administração pública, baseado no estabelecimento de alianças estratégicas entre Estado e sociedade, quer para atenuar disfunções operacionais daquele, quer para maximizar os resultados da ação social em geral. Assim, o propósito central do Projeto 28 BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do estado; v. 2).
  • 18. 18 Organizações Sociais foi proporcionar um marco institucional de transição de atividades estatais para o terceiro setor e, com isso, contribuir para o aprimoramento da gestão pública estatal e não- estatal.29 Segundo Andres Pablo Falconer, “na década de noventa, o Terceiro setor surge como portador de uma nova e grande promessa: a renovação do espaço público, o resgate da solidariedade e da cidadania, a humanização do capitalismo e, se possível, a superação da pobreza”. 30 1.3 MARCO REGULATÓRIO NO BRASIL A Constituição Federal de 1988, que veio selar a ideia de Estado Democrático de Direito no Brasil, recém-saído do regime militar e ditatorial, prevê em seu artigo 5º, inciso XVII, a plena liberdade de associação para fins lícitos, como garantia. Conforme se extrai do trabalho da Professora Flavia Mori Sarti “O Terceiro Setor na Administração da Saúde Pública: OS ou OSCIP, quem administra?” 31 , tem se como marco regulatório do Terceiro Setor no Brasil, a Lei Federal nº 9.790/99, conhecida como lei da OSCIP, que até de forma tardia foi editada no país, que já trazia no cerne de sua evolução social as sociedades civis, passando pela reforma do aparelho do Estado. A lei surgiu do projeto elaborado pelo Conselho da Comunidade Solidária, Conselho este que foi criado para o enfrentamento da pobreza e a exclusão social no Brasil. A ação visava ordenar e regular as entidade sem fins lucrativos que desempenhavam atividades de filantropia no país, que há época atuava na mais completa desordem, em uma crescente, sem qualquer controle do Estado sobre quem era e o que faziam essas entidades no Brasil. 29 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do estado; v. 2). 30 FALCONER, Andres Pablo. A Promessa do Terceiro Setor. Centro de Estudos em Administração do Terceiro setor, Universidade de São Paulo. 31 SARTI. Flavia Mori; KIMURA, Wagner. O Terceiro Setor na Administração da Saúde Pública: OS ou OSCIP, quem administra? Gestão de Políticas Públicas. Escola de Artes, Ciências e Humanidades. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil. p.09-10 Disponível em:http://stoa.usp.br/wagnerk/files/-1/16702/trabalho+de+PPS+- +professora+Flavia.pdf Acesso em: 01-05-2012.
  • 19. 19 Em 1997 iniciou-se, por encomenda do Governo Federal a elaboração do Projeto, pelo Conselho da Comunidade. Nesse período de elaboração do projeto, o Brasil vivenciava uma forte crise econômica e de investimentos. O social do país caminhava de mal a pior e no bojo dessa crescente piora, surgiam as entidades que atuavam na tentativa de minimizar tais problemas. Em julho de 1998 é encaminhado o anteprojeto de lei ao Presidente da República Fernando Henrique Cardoso. Dentre os principais aspectos do projeto, o mesmo visava um fortalecimento do Terceiro Setor e atribuir ao Estado, por meio do maior número possível de dispositivos legais, a eficiência, de forma a impedir que em meio a essa forte proliferação de entidades voltadas ao assistencialismo viessem os maus intencionados, na tentativa de lesionar o estado, bem como a sociedade. A ideia era dar uma combatividade ao Estado, face aos que por ventura se aventurassem em fazer “pilantropia”. O anteprojeto iniciava com a proposição de definir a própria abrangência do conceito de Terceiro Setor que, segundo o texto inclui o amplo espectro das instituições filantrópicas dedicadas à prestação de serviços nas áreas de saúde, educação e bem estar social. Compreende também as organizações voltadas para a defesa dos direitos de grupos específicos da população, como mulheres, negros e povos indígenas, ou de proteção ao meio ambiente, promoção do esporte, cultura e lazer. Além disso, engloba experiências de trabalho voluntário, pelas quais cidadãos exprimem sua solidariedade através da doação de tempo, trabalho e talento para causas sociais. 32 Lei Federal das OSCIP’s nº 9.790 foi promulgada em 23 de março de 1999. Outro grande ator do Terceiro Setor, as Organizações Sociais – OS, foi idealizado no bojo do advento da Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro, e posteriormente foi amparado pela publicação da Lei Federal nº 9.637/98. Fernando José Mesquita afirma que esse instituto surge como resposta à decadência do modelo de governo totalitário e centralizador enraizado na 32 KIMURA, Wagner. OSCIP: Do Marco Regulatório no Terceiro Setor à Desorganização. Gestão de Políticas Públicas. Escola de Artes, Ciências e Humanidades. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil. p.09-10 Disponível em: http://stoa.usp.br/wagnerk/files/-1/16695/trabalho+de+TIGP+-+professor+Vaz.pdf Acesso em: 02- 05-2012.
  • 20. 20 burocratização da máquina pública. Tal percepção conduziu à ideia de reforma do então sistema de administração praticado. Após presenciar a ruína do antigo modelo de intervenção pública, exercida em casos específicos, atuando apenas em setores fundamentais, e transferindo ao particular a gestão dos demais ramos. O Estado, então, deixa de realizar determinadas atividades e passa a fomentá-las e fiscalizá-las. 33 Para Flavia Mori Sarti a OS foi criada com o objetivo principal de atender a necessidade de publicização de universidades, hospitais, centros de pesquisa, bibliotecas e museus da administração estatal. 1.3.1 Título de Utilidade Pública Denominados genericamente por títulos jurídicos, os certificados, títulos e qualificações outorgados pelo Poder Público representam o reconhecimento ao trabalho social desenvolvido pela entidade, como forma de diferenciá-la na concessão de benefícios. Assim, designações como “Entidade de Utilidade Pública”, “Entidade Beneficente de Assistência Social”, “Organização da Sociedade Civil de Interesse Público” e “Organização Social” consistem apenas em títulos jurídicos e não traduzem uma forma de pessoa jurídica privada. 34 O título de Utilidade Pública Federal, regulado pela Lei 91/1935, foi o primeiro dentro dessa concepção de sociedades civis, antes até que a própria denominação Terceiro Setor, tão difundida nos dias atuais para definir as entidades detentora de titulações concedidas pela Administração Pública. Diz o artigo 1º da Lei 91/35 sobre os requisitos a concessão do título de Utilidade Pública Federal: As sociedades civis, as associações e as fundações constituidas no paiz com o fim exclusivo de servir desinteressadamente á collectividade podem ser declaradas de utilidade publica, provados os seguintes requisitos: a) que adquiriram personalidade juridica; b) que estão em effectivo funccionamento e servem desinteressadamente á collectividade; c) que os cargos de sua diretoria, conselhos fiscais, deliberativos ou consultivos não são remunerados35. 33 MESQUITA, Fernando José. Das organizações Sociais. Caderno Jurídico OAB/PR, nº 27, março 2012. p.07. 34 Carvalho Neto, Antonio Alves de. Transferências de recursos do orçamento da União para organizações não-governamentais [manuscrito]: análise dos procedimentos de concessão e controle/Antonio Alves de Carvalho Neto. – 2007, p.49. 35 BRASIL. Lei 91, de 28 de agosto de 1935. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/L0091.htm > Acesso em: 15/04/2012.
  • 21. 21 Segundo o Manual para Requerimento de Título de Utilidade Pública Federal, a regulamentação da concessão do titulo de utilidade pública federal (Lei nº 91/35, Decreto nº 50.517/61 e Portaria 11/90, da Secretaria de Justiça do MJ) tem por fundamento teórico o entendimento de que se trata de um meio de que o Governo se vale para apoiar entidades privadas que prestam serviços necessários à coletividade, como a assistência social, o atendimento médico, a pesquisa científica e a promoção da educação e da cultura. Para que as instituições particulares possam receber o título, seus serviços devem ser executados da mesma forma que o Governo os executaria, ou seja, sem distinções de raça, credo, cor ou convicções políticas, ao público em geral e não apenas aos associados, entre os usuários efetivos ou potenciais, e não tendo o lucro por finalidade. 36 O título de utilidade pública federal existe em caráter precário, processado no Ministério da Justiça e concedido via decreto pelo Presidente da República. Tem competência para conceder Título de Utilidade Pública, os demais entes federativos, além da união, Estados e Municípios, todavia, de validade apenas junto ao ente concedente. Vale lembrar que especificamente sobre os Títulos de Utilidade Pública, que estes, sendo Federal, Estadual e/ou Municipal, não geram qualquer direito ao detentor, devendo os benefícios à entidade detentoras ser observado apenas em caso específicos e por conveniência do ente concedente. Lei 91/1935: Art. 3º Nenhum favor do Estado decorrerá do titulo de utilidade publica, salvo a garantia do uso exclusivo, pela sociedade, associação ou fundação, de emblemas, flammulas, bandeiras ou distinctivos proprios, devidamente registrados no Ministerio da Justiça e a da menção do titulo concedido. 37 1.3.2 Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social - CEBAS A certificação das entidades beneficentes de assistência social e a isenção de contribuições para a seguridade social serão concedidas às pessoas jurídicas 36 BRASIL. Boudens, Emile. Título de Utilidade Pública Federal. Câmara dos Deputados. 2000. 37 BRASIL. Lei 91, de 28 de agosto de 1935. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/L0091.htm > Acesso em: 10/05/2012.
  • 22. 22 de direito privado, sem fins lucrativos, reconhecidas como entidades beneficentes de assistência social com a finalidade de prestação de serviços nas áreas de assistência social, saúde ou educação. 38 Com a edição da medida provisória 446/08, posteriormente convertida em lei, o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), anteriormente concedido pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, com a publicação da Lei 12.101/09 passou a ser de responsabilidade dos Ministérios da Educação, Saúde e Desenvolvimento Social e Combate à Fome, respectivamente de acordo com a área de atuação da entidade requerente, ficando o Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, responsável apenas pela fiscalização das entidades detentoras da titulação. Na área da educação fará jus à certificação a entidade que comprovar o atendimento dos requisitos do art. 3º e 13, da Lei nº 12.101, de 2009, além das demais disposições legais e do regulamento. Dentre as principais exigências estão o oferecimento de no mínimo, uma bolsa de estudo integral para cada nove alunos pagantes, além de bolsas parciais de 50%, quando necessárias para aplicação em gratuidade de pelo menos 20% da receita anual efetivamente recebida nos termos da Lei no 9.870, de 23 de novembro de 1999. Há ainda a possibilidade de computar na gratuidade o montante destinado a ações assistenciais e programas de apoio a bolsistas, nos termos e limites do regulamento. 39 Na área da educação para fins de certificação a entidade deve necessariamente comprovar o atendimento dos requisitos do art. 4º e seguintes da Lei nº 12.101, de 2009, sem prejuízo a outras disposições. Dentre as principais exigências estão a de ofertar a prestação de seus serviços ao SUS no percentual mínimo de 60%, ou comprovar a aplicação de percentual da sua receita em gratuidade na área da saúde nos percentuais exigidos pelo artigo 8º da Lei 12.201/2009, realizar projetos de apoio ao desenvolvimento institucional do SUS, celebrando ajuste com a União, por intermédio do Ministério da Saúde nas áreas de estudos de avaliação e incorporação de tecnologias, capacitação de recursos humanos, pesquisas de 38 BRASIL. Lei 12.101, de 27 de novembro de 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12101.htm > Acesso em: 10/05/2012. 39 BRASIL. Ministério da Educação. Disponível em: http://cebas.mec.gov.br/ Acessado em: 25- 05-2012
  • 23. 23 interesse público em saúde ou desenvolvimento de técnicas e operação de gestão em serviços de saúde. 40 Será concedida a titulação de CEBAS à entidades de assistência social que prestar serviços ou realizar ações assistenciais, de forma gratuita, continuada e planejada, para os usuários e a quem deles necessitar, sem qualquer discriminação, atendidos os requisitos de prestar os referidos serviços com objetivo de habilitação e reabilitação de pessoa com deficiência e de promoção da sua integração à vida comunitária, neste caso comprovando a oferta de, no mínimo, 60% de sua capacidade de atendimento ao sistema de assistência social, estar inscrita no respectivo Conselho Municipal de Assistência Social e integrar o cadastro nacional de entidades e organizações de assistência social. Ademais, a entidade de posse do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) e que comprove não remunerar seus diretores, aplicar os superávits financeiros na manutenção dos seus fins sociais, mantenham-se em dia com suas Certidões Negativas de débitos e ainda cumpram obrigações acessórias tributárias poderá pleitear entre outros benefícios, a isenção das contribuições previdenciárias de que trata os artigo 22 e 23 da Lei 8.2.12/91. 1.3.3 Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP´s As Organizações Sociais Civis de Interesse Público – OSCIP´s, são entidades, comumente conhecidas como ONG´s ou Associações, que tem por único diferencial o título de “Utilidade Pública”, concedido pelo Ministério da Justiça, ligado ao Governo Federal e que lhes dá a condição de celebrar termos de parceria com a administração pública. O seu marco regulatório se dá por força da lei 9.790, de 23 de março de 1999 e em linhas gerais as OSCIP´s são alternativas confiáveis da administração pública no concernente aos convênios, já que para obter o certificado de Organização Social Civil de Interesse Público a OSCIP se submete a uma forte 40 BRASIL. Ministério da Educação. Disponível em: http://cebas.mec.gov.br/ Acessado em: 25- 05-2012.
  • 24. 24 fiscalização do estado, analisando principalmente a transparência da gestão da entidade e adequar-se a uma bateria de exigências do estado. O artigo 1º da lei 9.790/99, em sua transcrição mais literal, aduz que “podem qualificar-se como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, desde que os respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos instituídos por esta Lei”. Conforme define Luis Patrone Regules, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público são “as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, destinadas ao cumprimento de serviços de interesse público, colaboradoras da ação estatal nas áreas sociais definidas pela lei 9.790/1999, criadas e geridas exclusivamente por particulares, qualificadas e continuamente fiscalizadas pelo estado, sob a égide de regime jurídico especial – adoção de normas de direito privado com as derrogações originárias do regime jurídico de direito público”. 41 A titulação nos termos do artigo 3º, I, da Lei 9.790/99 poderá ser concedida as pessoas jurídicas de direito privado que tenham por atuação a promoção da assistência social, da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico, gratuita da educação, da saúde, da segurança alimentar e nutricional, defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável, promoção do voluntariado, do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza, de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar, promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais, estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos, vedada a concessão as pessoas jurídicas de que trata o artigo 2º da mesma lei. Sem prejuízo a outras exigências a entidade que pleiteia o referido título de OSCIP deverá ter em seus Estatuto Social previsão, bem como atuar em observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e de eficiência, adoção de práticas e gestão 41 REGULES, Luis Eduardo Patrone. Terceiro Setor: Regime Jurídico das OSCIPs. São Paulo: Editora Método, 2006. p. 139.
  • 25. 25 administrativa, necessárias e suficientes a coibir a obtenção, de forma individual ou coletiva, de benefícios ou vantagens pessoais, em decorrência da participação no respectivo processo decisório, constituição de Conselho Fiscal ou órgão equivalente, dotado de competência para opinar sobre os relatórios de desempenho financeiro e contábil, e sobre as operações patrimoniais realizadas, emitindo pareceres para os organismos superiores da entidade; previsão de que, em caso de dissolução ou perda da titulação, o patrimônio será transferido a entidade também qualificada como OSCIP; declarar se institui ou não remuneração aos dirigentes, devendo ainda observar princípios da contabilidade, publicidade das demonstrações financeiras, a realização de auditoria e a prestação de contas de todos os recursos e bens de origem pública. Entre outras, o principal benefício da qualificação como OSCIP, prevista da Lei 9.790/99, é a de permitir com que a entidade possa celebrar termos de parceria com a administração pública e possa remunerar dirigentes que efetivamente atuem na gestão executiva ou prestem serviços específicos à organização. 42 1.3.4 – Organizações Sociais – OS´s Organizações Sociais (OS) são um modelo de organização pública não estatal destinado a absorver atividades publicizáveis mediante qualificação específica. Trata-se de uma forma de propriedade pública não estatal, constituída pelas associações civis sem fins lucrativos, que não são propriedade de nenhum indivíduo ou grupo e estão orientadas diretamente para o atendimento do interesse público. 43 Nos termos da Lei federal nº. 9.637, de 18.5.1998, o Poder Executivo poderá qualificar como Organizações Sociais (OS) pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sociais sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do 42 BRASIL. Lei 9.790/99, de 23 de março de 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9790.htm > Acesso em: 15/04/2012 43 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do estado; v. 2).
  • 26. 26 meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos os requisitos previstos nesse mesmo diploma. Portanto uma OS é uma entidade componente do Terceiro Setor, qualificada desta forma pelo Estado e constitui-se em uma boa alternativa do administrador público para gerir serviços públicos essenciais, tais como a gerência de hospitais e estabelecimentos públicos de ensino. O contrato de gestão é o instrumento que regulará as ações das OS44 para com o Estado. José Eduardo Sabo Paes sintetiza bem as possibilidades de uma entidade qualificada como Organização Social, seus meios de formalização de parcerias com a Administração e obrigações: “Qualificada como Organização Social, a entidade-fundação, associação ou sociedade estará habilitada a receber recursos financeiros e administrar bens e equipamentos, e pessoal do Estado. Em contrapartida, para formação dessa parceria, a OS se obriga a firmar um contrato de gestão com o poder público, por meio do qual são acordadas metas de desempenho e assegurem a qualidade e a efetividade dos serviços prestados ao poder público” 45. Em relação aos requisitos exigidos pela Lei 9.637/99 para qualificação como organização social, necessário se faz que comprovem o registro do seu ato constitutivo onde contenha a: a) natureza social de seus objetivos relativos à respectiva área de atuação, b) finalidade não lucrativa, com a obrigatoriedade de investimento de seus excedentes financeiros no desenvolvimento das próprias atividades, c) previsão expressa de a entidade ter, como órgãos de deliberação superior e de direção, um conselho de administração e uma diretoria definidos nos termos do estatuto, asseguradas àquele composição e atribuições normativas e de controle básicas previstas nesta Lei, d) previsão de participação, no órgão colegiado de deliberação superior, de representantes do Poder Público e de membros da comunidade, de notória capacidade profissional e idoneidade moral, e) composição e atribuições da diretoria, f) obrigatoriedade de publicação anual, no Diário Oficial da União, dos relatórios financeiros e do relatório de execução do contrato de gestão; g) no caso de associação civil, a aceitação de novos 44 Brasil. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado/Secretaria da Reforma do Estado Organizações sociais. / Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. 74 p. (Cadernos MARE da reforma do estado; v. 2). 45 PAES, José Eduardo Sabo. Fundações e Entidades de Interesse Social: aspectos jurídicos, administrativos, contábeis e tributários. 4ª Ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2004, pág. 101.
  • 27. 27 associados, na forma do estatuto; h) proibição de distribuição de bens ou de parcela do patrimônio líquido em qualquer hipótese, inclusive em razão de desligamento, retirada ou falecimento de associado ou membro da entidade; i) previsão de incorporação integral do patrimônio, dos legados ou das doações que lhe foram destinados, bem como dos excedentes financeiros decorrentes de suas atividades, em caso de extinção ou desqualificação, ao patrimônio de outra organização social qualificada no âmbito da União, da mesma área de atuação, ou ao patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, na proporção dos recursos e bens por estes alocados. A principal vantagem da titulação encontra-se na possibilidade de firmar Contratos de Gestão para com o Estado.
  • 28. 28 2. INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE FORMALIZAÇÃO DE PARCERIAS ENTRE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E TERCEIRO SETOR 2.1 Convênios Do latim conveniare “consideram-se convênios administrativos os ajustes firmados por pessoas administrativas entre si, ou entre estas e entidades particulares, com vistas a ser alcançado determinado objetivo de interesse público”. 46 Marçal Justen Filho define convênio como sendo “um acordo de vontades, em que pelo menos uma das partes integra a Administração Pública, por meio do qual são conjugados esforços e (ou) recursos, visando disciplinar a atuação harmônica e sem intuito lucrativo das partes, para o desempenho de competências administrativas”. 47 Não obstante ao fato de Hely Lopes Meirelles afirmar que Convênio trata- se de “acordo, mas não contrato” 48, na doutrina há autores que identificam semelhanças entre ambos os instrumentos jurídicos, divergindo entre si quanto à natureza jurídica do mesmo. Para reforçar o seu posicionamento quanto à diferença existente entre Convênios e os Contratos o próprio Hely Lopes Meirelles aponta distinções. De acordo com o autor os instrumentos se dissociam à medida que No contrato há sempre duas partes (podendo ter mais de dois signatários) uma que pretende o objeto do ajuste (a obra, o serviço, etc), outra que pretende a contraprestação correspondente (o preço ou qualquer outra vantagem), diversamente do que ocorre no convenio, em que não há partes, mas unicamente partícipes com as mesmas pretensões. Por essa razão, no convenio a posição jurídica dos signatários é uma só, idêntica para todos, podendo haver apenas diversificação na cooperação de cada um, segundo suas possibilidades, para a consecução de um objetivo comum, desejado por todos. 49 46 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. 47 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos. São Paulo: Editora Dialética, 2009. p. 998. 48 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 32ª ed. 2006. Pg . 407, 408. 49 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 32ª ed. 2006. Pg . 407, 408.
  • 29. 29 Entendimento do Tribunal de Contas da União é que “enquanto no convênio os interesses das partes são convergentes, no contrato são opostos”. 50 Nesse sentido Maria Sylvia Zanella Di Pietro define “convênio como forma de ajuste entre o Poder Público e entidades públicas ou privadas para a realização de objetivos de interesse comum, mediante mútua colaboração”. 51 Já para Celso Antônio Bandeira de Mello “os convênios administrativos são contratos em que as partes se compõem pela comunidade de interesses, pela finalidade comum que as impulsiona”. 52 Ressalta-se que na prática os Convênios podem ser divididos em Convênios Público-Públicos e Convênios Público-Privados, este último, objeto de nosso estudo. Em relação aos Convênios Público-Públicos, celebrado entre entes federativos, estes foram pela vez primeira referenciados na legislação esparsa quando da edição do Decreto-lei nº 200/1967, que teve por escopo principal a reforma administrativa federal, de forma que o convênio era o instrumento de observância há uma das diretrizes da citada reforma, qual seja a descentralização da “administração Federal para a das unidades federadas” 53, um dos pilares da reforma que incluía ainda o princípio do planejamento, da Coordenação, delegação de competências e do controle, in verbis: Art. 9º Os órgãos que operam na mesma área geográfica serão submetidos à coordenação com o objetivo de assegurar a programação e execução integrada dos serviços federais. Parágrafo único. Quando ficar demonstrada a inviabilidade de celebração de convênio (alínea b do § 1º do art. 10) com os órgãos estaduais e municipais que exerçam atividades idênticas, os órgãos federais buscarão com êles coordenar-se, para evitar dispersão de esforços e de investimentos na mesma área geográfica. 10) com os órgãos estaduais e municipais que exerçam atividades idênticas, os órgãos federais buscarão com êles coordenar-se, para evitar dispersão de esforços e de investimentos na mesma área geográfica. Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada. 50 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU/Tribunal de Contas da União. – 4ª edição revisada, atualizada e ampliada – Brasília: TCU, Secretaria Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010. Pg. 836. 51 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas, 22ª ed. 2009. p. 336. 52 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. Malheiros Editores. São Paulo: 2011, pg. 670/671. 53 BRASIL. Decreto Lei nº 200 de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm Acessado: 20/07/2012.
  • 30. 30 § 1º A descentralização será posta em prática em três planos principais: a) dentro dos quadros da Administração Federal, distinguindo-se claramente o nível de direção do de execução; b) da Administração Federal para a das unidades federadas, quando estejam devidamente aparelhadas e mediante convênio; c) da Administração Federal para a órbita privada, mediante contratos ou concessões. § 2° Em cada órgão da Administração Federal, os serviços que compõem a estrutura central de direção devem permanecer liberados das rotinas de execução e das tarefas de mera formalização de atos administrativos, para que possam concentrar-se nas atividades de planejamento, supervisão, coordenação e contrôle. § 3º A Administração casuística, assim entendida a decisão de casos individuais, compete, em princípio, ao nível de execução, especialmente aos serviços de natureza local, que estão em contato com os fatos e com o público. § 4º Compete à estrutura central de direção o estabelecimento das normas, critérios, programas e princípios, que os serviços responsáveis pela execução são obrigados a respeitar na solução dos casos individuais e no desempenho de suas atribuições. § 5º Ressalvados os casos de manifesta impraticabilidade ou inconveniência, a execução de programas federais de caráter nitidamente local deverá ser delegada, no todo ou em parte, mediante convênio, aos órgãos estaduais ou municipais incumbidos de serviços correspondentes. § 6º Os órgãos federais responsáveis pelos programas conservarão a autoridade normativa e exercerão contrôle e fiscalização indispensáveis sôbre a execução local, condicionando-se a liberação dos recursos ao fiel cumprimento dos programas e convênios. § 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e contrôle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução. § 8º A aplicação desse critério está condicionada, em qualquer caso, aos ditames do interesse público e às conveniências da segurança nacional. 54 Os convênios de cooperação entre esses entes Federativos fora recepcionado pela Constituição de 1967, e posteriormente na Constituição de 1988 previsto nos artigos 71, inciso VI, bem ainda no artigo 199, 1º, de forma implícita, havendo ainda com a emenda 19/98 nova redação ao artigo 241 da CF, em que passou a prevê a gestão associada de serviços públicos. Em relação aos Convênios entre a Administração Pública e Particulares, também conhecido como Convênios “tout court”, este encontra-se previsto no Decreto 6170/2007, que trata da “transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse”, na Lei 8.666/93, mais precisamente artigo 54 BRASIL. Decreto Lei nº 200 de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm Acessado: 20/07/2012.
  • 31. 31 116, que entre outras, prevê a aplicabilidade das disposições ali contidas, no concernente as licitações e contratos da Administração Pública também aos Convênios. Artigo 116 da lei 8.666/93: Art. 116. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração. 55 O decreto 6.170/07 define no seu artigo introdutório convênio como sendo o: Acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento que discipline a transferência de recursos financeiros de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União e tenha como partícipe, de um lado, órgão ou entidade da administração pública federal, direta ou indireta, e, de outro lado, órgão ou entidade da administração pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, ou ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando a execução de programa de governo, envolvendo a realização de projeto, atividade, serviço, aquisição de bens ou evento de interesse recíproco, em regime de mútua cooperação. 56 Conforme ensina Maria Sylvia Zanella de Pietro, o convênio é Normalmente utilizado quando o Poder Público quer incentivar a iniciativa privada de interesse público. Ao invés de o Estado desempenhar, ele mesmo, determinada atividade, ele opta por incentivar ou auxiliar o particular que queira fazê-lo, por meio de auxílios financeiros ou subvenções, financiamentos, favores fiscais etc. A forma usual de concretizar esse incentivo é o convênio. 57 2.2 Contratos Administrativos José dos Santos Carvalho Filho conceitua “contrato administrativo como o ajuste firmado entre a Administração Pública e um particular, regulado basicamente pelo direito público, e tendo por objeto uma atividade que, de alguma forma, traduza interesse público”. 58 55 BRASIL. Lei 8.666 de 21 de junho de 1993. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm Acesso em: 17/07/2012. 56 BRASIL. Decreto 6.170 de 25 de julho de 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6170.htm Acesso em: 17/09/2012. 57 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20ª. ed. São Paulo: Atlas, 2007. P. 298. 58 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. Pg. 168-169
  • 32. 32 Diogenes Gasparini define Contrato Administrativo como sendo "ato plurilateral ajustado pela Administração Pública ou por quem lhe faça às vezes com certo particular, cuja vigência e condições de execução a cargo do particular podem ser instabilizadas pela Administração Pública, ressalvados os interesses patrimoniais do contratante particular". 59 Para Celso Antonio Bandeira de Mello "é um tipo de avença travada entre a Administração e terceiros na qual, por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do tipo de objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas assujeitam-se a cambiáveis imposições de interesse público, ressalvados os interesses patrimoniais do contratante privado” 60. Este último Doutrinador faz questão de distinguir os Contratos de Direito Privado da Administração dos Contratos Administrativos, objeto do presente estudo, no sentido de que o primeiro rege-se quanto ao conteúdo e seus efeitos pelo direito privado, a exemplo da compra, venda ou locação de um imóvel junto a um particular para instalação de uma repartição pública, e o segundo reger-se- iam pelo Direito Administrativo, tendo como objeto de avença a concessão de serviço público, contrato de obra pública ou a concessão e uso de bem público 61. Acerca dos Contratos Administrativos Maria Sylvia Zanella di Pietro aponta algumas características que segundo esta serve de pressuposto para caracterização do mesmo: 1) Presença da Administração Pública como poder público - nos Contratos Administrativos a Administração Pública aparecerá sempre em condição de supremacia em relação ao particular, buscando o atendimento do interesse público; 2) Finalidade Pública – segundo Di Pietro, “Esta é uma característica presente em todos os atos e contratos da Administração Pública, ainda que regido pelo direito privado”; 3) Obediência a forma prescrita em lei –o contrato deve observar as exigências constantes, vigentes, do nosso ordenamento jurídico acerca da forma e dos requisitos; 4) Procedimento legal – “A lei estabelece determinados procedimentos obrigatórios para a celebração de contratos e que podem variar de uma modalidade para outra, compreendendo medidas como autorização legislativa, avaliação, motivação, autorização pela autoridade competente, indicação de recursos orçamentários e licitação”. Procedimento Legal – atendimento de procedimentos “estabelecendo determinados procedimentos obrigatórios para a celebração de contratos e que podem variar de uma modalidade para outra, compreendendo medidas como autorização legislativa, avaliação, 59 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 9ª edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2004, pg. 556. 60 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição. Malheiros Editores: São Paulo, 2009, pg. 614 e 615. 61 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição. Malheiros Editores: São Paulo, 2009, pg. 615
  • 33. 33 motivação, autorização pela autoridade competente, indicação de recursos orçamentários e licitação”. 5) Contrato de Adesão – significa dizer que “todas as cláusulas dos contratos administrativos são fixadas unilateralmente pela Administração”. Ou seja, a administração estabelecerá as condições da contratação pretendida, suas condições e torna público ao interessados em figurar como parte contrária no pacto; 6) Natureza intuitu personae – nesta característica os Contratos Administrativos que exigem na forma da lei o processo licitatório devem necessariamente ser direcionada a pessoa do contraente, vedada a subcontratação, cessão ou transferência do objeto licitado, em consonância com a lei 8.666/93; 7) Clausulas Exorbitantes - “cláusulas exorbitantes aquelas que não seriam comuns ou que seriam ilícitas em contrato celebrado entre particulares, por conferirem privilégios a uma das partes (a Administração) em relação a outra; elas colocam a Administração em posição de supremacia sobre o contratado” Exigências de garantia, alteração e rescisão unilateral, fiscalização, aplicação de penalidades, anulação, retomada de objetos e restrições ao uso da “Exceptio non adimpleti contractus”, são algumas das cláusulas mais recorrentes. Ademais, incide ainda a característica da 8) mutabilidade, que na sua essência decorre de das clausulas exorbitantes, e que confere a administração a prerrogativa de unilateralmente alterar cláusulas e/ou mesmo denunciá-lo antes do prazo pactuado no instrumento. 62 Superado o campo das definições, se faz mister analisar a disciplina legal dessa modalidade de instrumento de formalização de parceria pela Administração Pública. Segundo o Professor José dos Santos Carvalho Filho “diversamente da Constituição anterior, que silenciava sobre o assunto, a vigente estabelece desde logo a competência legislativa para dispor sobre contratos”. 63 O artigo 22 da Constituição Federal de 1988 aduz ser competência privativa da União legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecendo o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III. 64 Hely Lopes Meirelles afirma que "é nulo o contrato administrativo omisso em pontos fundamentais, ou firmado sem licitação quando exigida, ou resultante de licitação irregular ou fraudada no julgamento". 65 62 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20ª. ed. São Paulo: Atlas, 2007. pg. 243-265 63 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 169. 64 BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm Acessado: 29/07/2012 65 MEIRELLES. Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 11. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 1996. p.177.
  • 34. 34 2.3 Contratos de Gestão Surgido no bojo da reforma do aparelho do Estado, em meio as transformações que modificaram a esfera de atuação deste, no que concerne as prestações de serviços, o Contrato de Gestão, pode ser classificado como sendo o instrumento de acordo entre o Poder Público e a Administração Pública, direta e indireta, ou ainda com aquelas entidades qualificadas por este mesmo poder público como organizações sociais, pertencentes ao Terceiro Setor. Conforme aponta Maria Sylvia Zanella de Di Pietro sobre o histórico do Contrato de Gestão, o referido teria sido inspiração francesa, e no Brasil: Os primeiros contratos de gestão com empresas estatais foram celebrados, na esfera federal, com a Companhia Vale do Rio Doce - CVRD e a Petróleo Brasileiro S.A - PETROBRÁS (ambos com base no Decreto n. 137, de 27.5.91, que instituiu o Programa de Gestão das Empresas Estatais). Também foi celebrado contrato de gestão com o Serviço Social Autônomo Associação das Pioneiras Sociais, antiga Fundação das Pioneiras Sociais (fundação governamental); essa transformação parece ter tido por objetivo aproximar a entidade dos antigos serviços sociais autônomos (SESI, SESC, SENAI etc.), considerados como entidades paraestatais, porém não integrantes da Administração Indireta. Por sua vez, aquela mesma entidade parece ter inspirado a instituição das organizações sociais. 66 Na tentativa de defini-lo, Diógenes Gasparini classifica o Contrato de Gestão como o “ajuste celebrado pelo Poder Público com órgãos e entidades da Administração direta, indireta e entidades privadas qualificadas como organizações sociais, para lhes ampliar a autonomia gerencial, orçamentária e financeira ou para lhes prestar variados auxílios e lhes fixar metas de desempenho na consecução de seus objetivos”. 67 Alexandre de Moraes o define como “o avençado entre o Poder Público e determinada entidade estatal, fixando-se um plano de metas para essa, ao mesmo tempo em que aquele se compromete a assegurar maior autonomia e liberdade gerencial, orçamentária e financeira ao contratado na consecução de seus objetivos”. 68 66 DI PIETRO. Maria Sylvia Zanella. Contratos de Gestão. Contratualização do Controle Administrativo sobre a Administração Indireta e sobre as Organizações Sociais. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br. Acesso em 29.07.2012. 67 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 7ª ed. rev. e atual, São Paulo: Saraiva, 2002. pg. 602-603. 68 MORAES, Alexandre de. Reforma administrativa. São Paulo: Atlas, 1998. pg. 55.
  • 35. 35 Na obra de Hely Lopes Meirelles trata-se como o “instrumento jurídico básico dessa forma de parceria entre o setor público e o privado. Embora a lei denomine este instrumento de contrato, na verdade trata-se de um acordo operacional entre a Administração e a entidade privada”. 69 Ao tecer essa definição, o autor refere-se ao parágrafo 8º, do artigo 37 da Constituição Federal de 1988, incluído pela Emenda Constitucional 19/98, e que apesar de referir genericamente a contrato em seu texto legal, é o dispositivo principal fundamento legal a esse instrumento de formalização de parceria que já era mesmo que timidamente utilizado na Administração Pública, o Contrato de Gestão. Ao questionar a natureza jurídica do Contrato de Gestão, Hely Lopes Meirelles inaugura um grande debate da doutrina jurídica pátria acerca do referido instrumento legal, à medida que ambos os autores discordam da nomenclatura contratual que lhe foi atribuída, dentre outros fatores por não possui as características intrínsecas da teoria geral dos contratos. Celso Antonio Bandeira de Mello poderia ser classificado como o grande crítico a figura do Contrato de Gestão. Segundo o mesmo não existe uma definição que abranja o que a lei tentou nominar com a inserção de tal figura jurídica “contratual”, pois trata-se de duas realidades “visceralmente distintas” 70. O dispositivo Constitucional nascido pela emenda 19/98, previu ao mesmo tempo a possibilidade de firmamento de “contratos” com entes da própria administração pública e ainda deixou a salvo a possibilidade destes pactuarem com o que Celso Antonio Bandeira de Mello chamou de “pessoas alheias ao Estado”, referindo-se as Organizações Sociais. Quanto a “contratar” com as referidas Organizações Sociais, Bandeira de Mello até aceita como sendo uma definição legal a prevista do artigo 5º da lei 9.637/98, ao afirmar que Art. 5º Para os efeitos desta Lei, entende-se por contrato de gestão o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas no art. 1º. 69 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2001. p.366. 70 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. Malheiros Editores. São Paulo: 2011 pg. 224.
  • 36. 36 Agora a aceitar a possibilidade de uma definição que abranja ambas as figuras, ou mesmo a possibilidade da Administração Pública “contratar” com a própria Administração Pública, Bandeira de Mello definiu por improvável, tratando ainda o instrumento jurídico como verdadeiro “arremedo de contratos, e encenação sem nenhum valor jurídico”, fazendo lembrar que os citados “contratos de gestão” fora “inspiração de práticas administrativas francesas”, que se estabelecera em um ambiente jurídico distinto ao nosso. Sobre o tema, Maria Sylvia Zanella Di Pitro deu a sua contribuição no sentido de contestar a condição contratual do instrumento: Mesmo em se tratando de contrato de gestão entre entidade da Administração Indireta e o Poder Público, a natureza efetivamente contratual do ajuste pode ser contestada, tendo em vista que a existência de interesses opostos e contraditórios constitui uma das características presentes nos contratos em geral e ausente no contrato de gestão, pois é inconcebível que os interesses visados pela Administração Direta e Indireta sejam diversos. É incontestável que a sua natureza se aproxima muito mais dos convênios do que dos contratos propriamente ditos. 71 José dos Santos Carvalho Filho72 “a despeito da denominação adotada, não há propriamente contrato nesse tipo de ajuste, mas sim verdadeiro convênio, pois que, embora sejam pactos bilaterais, não há a contraposição de interesses que caracteriza os contratos em geral”. Para assentar o entendimento quanto a natureza jurídica do Contrato de Gestão, que como visto na maior parte da doutrina é compreendida como sendo a de Convênio, mister se faz a transcrição em parte do voto da lavra do Eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Brito, no julgamento da ADI 1923/DF: Conforme visto, a Magna Carta franqueia à iniciativa privada a prestação de vários serviços de relevância pública e permite (até mesmo determina) que o Poder Público fomente essas atividades, inclusive mediante transpasse de recursos públicos. E o fato é que todos os serviços enumerados no art. 1º da Lei 9.637/98 são do tipo “não exclusivos do Estado”, dando-se que as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, ali igualmente contempladas, são passíveis de qualificação como organizações sociais. Daí o chamado “contrato de gestão” consistir, em linhas gerais, num convênio. Não exatamente num contrato de direito público, senão nominalmente. 30. Neste passo, calha invocar a doutrina de Hely Lopes Meirelles, para quem “no contrato as partes têm interesses diversos e opostos; no 71 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo, 23ª ed., Editora Atlas, São Paulo, 2010, p.336. 72 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 339.
  • 37. 37 convênio os partícipes têm interesses comuns e coincidentes”. É como também ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, nesta clara dicção: os “convênios e consórcios diferem da generalidade dos contratos administrativos porque, ao contrário destes, não há interesses contrapostos das partes, mas interesses coincidentes”. Ainda Marçal Justen Filho, a saber: “no chamado ‘convênio administrativo’, a avença é instrumento de realização de um determinado e específico objetivo, em que os interesses não se contrapõem – ainda que haja prestações específicas e individualizadas, a cargo de cada partícipe”. Ora, no caso da celebração, entre Estado e organização social, de “contrato de gestão”, impossível deixar de reconhecer a presença de interesses tão recíprocos quanto convergentes. A entidade privada “contratante” tem objetivos de natureza social e finalidade não lucrativa (alíneas “a” e “b” do inciso I do art. 2º da Lei 9.637/98). Objetivos e finalidades compartilhados com o Poder Público. Donde José dos Santos Carvalho Filho averbar, categórico: “Devidamente qualificadas, as organizações sociais celebram com o Poder Público o que a lei denominou de contratos de gestão, com o objetivo de formar a parceria necessária ao fomento e à execução das atividades já mencionadas. A despeito da denominação adotada, não há propriamente contrato nesse tipo de ajuste, mas sim verdadeiro convênio, pois que, embora sejam pactos bilaterais, não há a contraposição de interesses que caracteriza os contratos em geral; há, isto sim, uma cooperação entre os pactuantes, visando a objetivos de interesses comuns. Sendo paralelos e comuns os interesses perseguidos, esse tipo de negócio jurídico melhor há de enquadrar-se como convênio.” 31. Pois bem, da conclusão de que o “contrato de gestão” é, na verdade, um convênio, toma corpo o juízo técnico de que, em princípio, há desnecessidade de processo licitatório para a sua celebração. Demonstrada a divergência quanto à natureza jurídica do Contrato de Gestão, à medida que alguns o apontam como sendo um convênio, outros como termo de parceria e outros a instrumentos análogos, se faz mister demonstrar características outras que emanam do Contrato de Gestão. Ainda que de forma repetitiva, cumpre ressaltar que o Contrato de Gestão é um instrumento de formalização de parceria entre o Poder Público e seus entes da administração direta ou indireta, esta última da qual fazem parte também as Organizações Sociais, pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde. No âmbito institucional, conforme se extrai do “Caderno MARE v.2” da reforma do Estado, os Contratos de Gestão tem por “propósito contribuir ou reforçar o atingimento de objetivos de políticas públicas por intermédio do
  • 38. 38 desenvolvimento de um programa de melhoria de gestão, com vistas a alcançar uma superior qualidade de produto ou serviço prestado ao cidadão”. 73 Sua regulação está prevista no âmbito Constitucional no parágrafo 8º, do artigo 37 da Constituição Federal de 1988, inserido por advento da Emenda Constitucional 19/98, e na legislação esparsa, está contida no Artigo 5º da Lei 8.666/93. 2.4 Termo de Parceria O Termo de Parceria, pode ser definido como sendo o instrumento de formalização de parcerias entre a Administração Pública e aquelas entidades qualificadas por este como Organizações Sociais Civis de Interesse Público, conhecidas também como OSCIP´s. Disciplinado na Lei Federal 9.790/99 o Termo de Parceria, está “assim considerado o instrumento passível de ser firmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público destinado à formação de vínculo de cooperação entre as partes, para o fomento e a execução das atividades de interesse público”74. Como bem reforça Fernando Borges Mânica e Gustavo H. Justino de Oliveira, a “atuação das OSCIPs, dirige-se diretamente ao atendimento do interesse público e não do atendimento de uma necessidade da Administração Pública” 75. Conforme ensina Tarso Cabral Violin o termo de parceria foi assim “criado durante o que chamou de “onda gerencial”, que influenciou a Administração Pública brasileira, desde a divulgação do Plano Diretor do MARE“76 com vistas a reforma do aparelho do Estado na década de 90 do século XX. O Termo de Parceria assim como as OSCIPs está regulado pela Lei 9.790/1999, que em seu artigo 9º o prevê como “o instrumento passível de ser 73 BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Secretaria da Reforma do Estado Organizações sociais. Secretaria da Reforma do Estado. Brasília: Ministério da Administração e Reforma do Estado, 1997. p. 36. 74 BRASIL. Lei 9.790 de 23 de março de 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9790.htm Acessado: 21/07/2012. 75 MÂNICA, Fernando Borges. OLIVEIRA, Gustavo H. Justino. Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público: Termo de Parceria e Licitação. Artigo. Boletim de Direito Administrativo, São Paulo, ano XXI, n. 9, p. 1010-1025, set. 2005. 76 VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro Setor e as Parcerias com a Administração Pública: uma análise crítica. Belo Horizonte: Fórum, 2006. p. 263.
  • 39. 39 firmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público destinado à formação de vínculo de cooperação entre as partes, para o fomento e a execução das atividades de interesse público”. Ressalta-se nessa modalidade de avença a desnecessidade de licitação, haja vista que não se trata de uma espécie contratual, podendo conforme o Decreto 3.100/1999, que também serve de parâmetro para essa modalidade de instrumento, a escolha da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, para a celebração do Termo de Parceria, ser feita por meio de publicação de edital de concursos de projetos pelo órgão estatal parceiro para obtenção de bens e serviços e para a realização de atividades, eventos, consultorias, cooperação técnica e assessoria, todavia, havendo na jurisprudência divergências quanto a esta afirmação.
  • 40. 40 3. FISCALIZAÇÃO DAS PARCERIAS ENTRE TERCEIRO SETOR E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. Talvez o grande cerne do presente estudo, nos incumbirá neste terceiro capítulo o papel de tentar demonstrar do modo mais aclarado possível as formas de ocorrência do controle fiscalizador das parcerias firmadas entre o poder público e as entidades pertencentes ao Terceiro Setor. Preliminarmente, mister se faz ressaltar que para tal emergiremos ao campo das conceituações acerca do controle da Administração Pública, já que é do instituto que emana as principais e mais efetivas ferramentas de controle dos atos da administração pública. Não existe uma certeza quanto à origem etimológica da palavra, todavia, “no Direito pátrio, o vocábulo controle foi introduzido e consagrado por Seabra Fagundes desde a publicação de sua insuperável monografia ‘O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário’”.77 Hely Lopes Meirelles aduz sobre controle, de forma genérica, como “a faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro”. 78 Mais especificamente sobre o controle da Administração Pública, Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma consistir no “poder de fiscalização e correção que sobre ela exercem os órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, com o objetivo de garantir a conformidade de sua atuação com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico”. Na mesma toada, José dos Santos Carvalho Filho define como sendo “o conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos por meio dos quais se exerce o poder de fiscalização e de revisão da atividade administrativa em qualquer das esferas de Poder.”79 Para Patrícia Cardoso Rodrigues de Souza trata-se do “Poder-dever de inspeção, registro, exame, fiscalização pela própria Administração, pelos demais poderes e pela sociedade, exercidos sobre conduta funcional de um poder, órgão 77 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 23ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1990. Pg. 544. 78 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 36ª. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010. p.697 79 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. Pg. 893.
  • 41. 41 ou autoridade com o fim precípuo de garantir a atuação da Administração em conformidade com os padrões fixados pelo ordenamento jurídico”. 80 Para Marçal Justen Filho tratam-se de “mecanismos jurídicos de controle da atividade administrativa destinados a verificar a regularidade dos atos administrativos e a reprimir os desvios ocorridos”. 81 Sintetizando todos os entendimentos supracitados acerca do vocábulo controle, aplicado à Administração Pública, Evandro Martins Guerra nos dá um grande contribuição quando ensina que: Controle da Administração Pública é a possibilidade de verificação, inspeção, exame, pela própria Administração, por outros Poderes ou por qualquer cidadão, da efetiva correção na conduta gerencial de um Poder, órgão ou autoridade, no escopo de garantir atuação conforme aos modelos desejados anteriormente planejados, gerando uma aferição sistemática. Trata-se, na verdade de poder-dever, já que, uma vez determinado em lei, não poderá ser renunciado ou postergado, sob pena de responsabilização por omissão do agente infrator. 82 Romeu Felipe Bacellar Filho, especificamente sobre o surgimento do Controle da Administração Pública, afirma que esta foi uma necessidade advinda principalmente como um reforço a ideia de Estado Democrático de Direito, algo ainda recente no âmbito Brasil, e que teve por escopo proporcionar mecanismos aos agentes externos à Estrutura Administrativa, sem qualquer ligação ou interesse próprio em relação à atividade controlada. Nesse sentido é que destacamos as palavras de Bacellar quando ressalta que: Desde o advento do Estado Social e Democrático de Direito, constatou- se a necessidade do estabelecimento de mecanismos de controle que possam ser exercidos por agentes que estejam fora da estrutura administrativa e que sejam, por assim dizer, totalmente desvinculados e imparciais em relação à atividade que será objeto do controle. 83 A principal finalidade do Controle efetuado sobre a Administração Pública pelos meios postos a disposição é a fiscalização dos seus atos, prezando desta forma pela correta aplicação dos recursos, o atendimento aos melhores princípios 80 SOUZA, Patrícia Cardoso Rodrigues de. Controle da Administração Pública. In: MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Curso Prático de Direito Administrativo. 2ª Ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, Pg.150. 81 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 980. 82 GERRA, Evandro Martins. Fiscalização e Controle da Atividade Financeira. In: GERRA, Evandro Martins. Os Controles Externo e Interno da Administração Pública. 2ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2007. Parte II, p. 89-284. 83 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva do modelo de gestão Pública Gerencial. Belo Horizonte: Fórum, 2007. Pg. 118.
  • 42. 42 da boa administração, bem ainda verificar se o agente público está cumprindo com as meta estabelecidas no que concerne ao Plano Plurianual – PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias, na Lei Orçamentária Anual – LOA, no atinente a possibilidade de cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, coibindo excessos se o controle se der prévio ou concomitante ao ato ou no caso do objeto do presente estudo, a parceria entre Administração Pública e entidade do Terceiro Setor. Maria Sylvia Zanella Di Pietro sobre finalidade do Controle Administrativo, leciona que “é a de assegurar que Administração atue em consonância com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico, como os princípios da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação, impessoalidade” 84 afirmando ainda que “em determinadas circunstâncias, abrange também o controle chamado de mérito e que diz respeito aos aspectos discricionários da atuação administrativa” 85. José dos Santos Carvalho Filho nos ensina que o controle tem o fito de “assegurar a garantia dos administrados e da própria Administração no sentido de ver alcançados seus objetivos, devendo sempre atuar em conformidade com padrões fixados na lei e buscar o interesse da coletividade, além de garantir que não sejam vulnerados direitos subjetivos dos indivíduos nem as diretrizes administrativas”. 86 O autor aduz ainda que o referido “controle tem a natureza de um princípio fundamental da Administração Pública, não podendo ser dispensado ou recusado por nenhum órgão administrativo, devendo ser exercido em todos os níveis de poder” 87. Não obstante a existência na doutrina pátria de outras classificações optar- se-á no presente estudo por demonstrar a forma mais aceita, por assim dizer, sobre o Controle da Administração Pública. De acordo com esta classificação o Controle em questão pode-se dar tanto na sua forma interna, pela via Administrativa, processando-se dentro do próprio poder público um Sistema de 84 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª. ed. São Paulo: Atlas, 2009. pg. 724. 85 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª. ed. São Paulo: Atlas, 2009. pg. 724. 86 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 19ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. Pg. 98. 87 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 19ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. Pg. 810.
  • 43. 43 Controle, ou ainda na sua forma Externa de Controle, que pode ser exercido pelo Poder Legislativo, com o suporte do Tribunal de Contas, pela via Judicial por intermédio do Ministério Público ou ainda por um terceiro meio contido dentro da ideia de Controle Externo, qual seja o Controle Social, que por sua vez poderá se valer, individualmente ou em grupo, de ferramentas postas à disposição pela lei para o exercício desta prerrogativa. Essa classificação segundo a doutrina de Rodrigo Pironti de Castro se dá quanto à localização do controle 88 , que por sua vez subdivide-se na forma interna à Administração Pública ou ainda de forma Externa. Evandro Martins Guerra conceitua o Controle Externo como sendo Aquele desempenhado por órgão apartado do outro controlado, tendo por finalidade a efetivação de mecanismos, visando garantir a plena eficácia das ações de gestão governamental, porquanto a Administração pública deve ser fiscalizada, na gestão dos interesses da sociedade, por órgão de fora de suas partes, impondo atuação em consonância com os princípios determinados pelo ordenamento jurídico, como os da legalidade, legitimidade, economicidade, moralidade, publicidade, motivação, impessoalidade, entre outro. 89 O Controle Externo nas palavras de Marçal Justen Filho consiste “na submissão da atividade administrativa à fiscalização exercitada por órgãos externos à estrutura do Poder que os praticou”. 90 Rodrigo Pironti Aguirre de Castro afirma que “o controle externo da Administração pública, em suma, é aquele exercido pelo Poder Legislativo com apoio dos Tribunais de Contas, pelo Poder Judiciário e pela sociedade através do Controle Social” 91, entendimento este que reforça o objeto de estudos nos tópicos subsequentes. Nos valemos da explicação de José Afonso da Silva para o fim de diferenciar o Controle Interno, da segunda forma de Controle, o Externo. Segundo o autor A Constituição estabelece que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, manterão, de forma integrada, o controle interno. Trata-se de controle de natureza administrativa, exercido sobre funcionários 88 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Controle Interno da Administração Pública: uma perspectiva do modelo de gestão administrativa. Orientador: Romeu Felipe Bacelar Filho. Tese de Mestrado. Pontífice Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2007. Pg. 104. 89 GUERRA, Evandro Martins. Os controle Externo e interno da administração pública. 2ª Ed. Ver. E ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2005. Pg. 108. 90 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 4ª Ed. 2009. Pg. 991. 91 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva do modelo de gestão Pública Gerencial. Belo Horizonte: Fórum, 2007. pg. 118
  • 44. 44 encarregados de executar os programas orçamentários e da aplicação do dinheiro público, por seus superiores hierárquicos: ministros, diretores, chefes de divisão, etc. (...) O controle externo é, pois, função do Poder Legislativo, sendo de competência do Congresso Nacional no âmbito federal, das Assembleias Legislativas nos Estados, da Câmara Legislativa no Distrito Federal e das Câmaras Municipais nos Municípios como o auxílio dos respectivos Tribunais de Contas. Consiste, assim, na atuação da função fiscalizadora do povo, através de seus representantes, sobre a administração financeira e orçamentária. É, portanto, um controle de natureza política, no Brasil, mas sujeito à prévia apreciação técnico-administrativa do Tribunal de Contas competente, que, assim, se apresenta como órgão técnico, e suas decisões administrativas, não jurisdicionais, como, às vezes, se sustenta, à vista da expressão ‘julgar as contas’ referida à sua atividade (art. 71, I). 92 Controle Externo que por sua vez é a forma de fiscalização das Parcerias firmadas entre Administração Pública e as entidades do Terceiro Setor, e do qual daremos maior ênfase no presente capítulo. Segundo Janaina Schoenmaker 93 “com a expansão da destinação dos recursos públicos ao Terceiro Setor para prestação de serviços de interesse público, chama a atenção o controle sobre ele exercido”. E completa afirmando que para muitos autores, esse dever de controle e prestação de contas decorreriam do princípio republicano, que, no entanto, não é unanime na doutrina pátria, cabendo demonstrar a douta opinião do Ministro Carlos Ayres Brito a respeito deste princípio que fundamenta o Controle Externo. Segundo o autor: Tão elevado prestígio conferido ao controle externo e a quem dele mais se ocupa, funcionalmente, é reflexo direto do princípio republicano. Pois, numa República, impõe-se responsabilidade jurídica pessoal a todo aquele que tenha por competência (e consequente dever) cuidar de tudo que é de todos, assim do prisma da decisão como do prisma da gestão. E tal responsabilidade implica o compromisso da melhor decisão e da melhor administração possíveis. Donde a exposição de todos eles (os que decidem sobre a “res publica” e os que a gerenciam) à comprovação do estrito cumprimento dos princípios constitucionais e preceitos legais que lhes sejam especificamente exigidos. A começar, naturalmente, pela prestação de contas das sobreditas gestões orçamentária, financeira, patrimonial, contábil e operacional. É essa responsabilidade jurídica pessoal (verdadeiro elemento conceitual da República enquanto forma de governo) que demanda ou que exige, assim, todo um aparato orgânico-funcional de controle externo. 94 92 SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 15ª Ed. Malheiros Editores, 1998. Pg 716/718. 93 SCHOENMAKER, Janaina. Controle das parcerias entre o Estado e o Terceiro Setor pelos Tribunais de Contas. Belo horizonte: Fórum, 2011. p.73. 94 BRITTO, Carlos Ayres. O Regime Constitucional dos Tribunais de Contas. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº. 9, dezembro, 2001. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 22-09-2012.