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Intimidação pela tortura
Intimidação é o ato de fazer com que outros façam o que alguém quer, através do
medo. A intimidação é a resultante do desajuste da compulsão competitiva normal
de dominância inter-relacional, geralmente vista em animais, mas que é mais
completamente modulada por forças sociais em seres humanos.
Tortura é a imposição de dor física ou psicológica por crueldade, intimidação,
punição, para obtenção de uma confissão, informação ou simplesmente por prazer
da pessoa que tortura.
Sabemos que ninguém jamais toma o poder com a intenção de largá-lo. O poder
não é um meio, é um fim em si. Não se estabelece uma ditadura com o fito de
salvaguardar uma revolução; faz-se a revolução para estabelecer a ditadura. O
objetivo da perseguição é a perseguição. O objetivo da tortura é a tortura. O
objetivo do poder é o poder."
George Orwell; 1984.
Depoimentos forjados; confissões
falsas.
Ao comparecerem perante o Conselho de Justiça, muitos réus denunciaram como
foram induzidos a assinarem depoimentos forja-dos, na fase do inquérito policial,
O pânico e o medo provocado pelas sevícias levaram alguns réus a assinar os papéis
que lhe apresentavam.
Confissões falsas
Devido às torturas aplicadas aos réus na fase do inquérito po-licial, muitos revelaram,
à Justiça Militar, a falsidade de seus depoi-mentos, feitos com o objetivo de fazer
cessar a violência que se abatia sobre eles.
Para o artigo 99 do Código de Processo Penal Militar, o inqué-rito policial “é apuração
sumária dos fatos” e “tem o caráter de instrução provisória, cuja finalidade precípua é
a de ministrar ele-mentos necessários à propositura da ação penal”.

É garantia constitucional que nenhuma prova terá valor se não é submetida ao crivo da
defesa, tendo o réu o direito de exami-ná-la e contestá-la, no momento mesmo em
que ela é produzida diante os que irão julgá-lo.
Consequências da tortura
ÉPOCA – Quais são as consequências da tortura?
Rejali – Além de destruir as vítimas, a tortura pode destruir os torturadores. É
comum quem submete os outros à tortura ter problemas como alcoolismo, violência
familiar e distúrbios psicológicos sérios. Para os governos, a tortura é negativa
porque destrói os setores de inteligência.
A manipulação psicológica, a humilhação, a privação sensorial e as posturas forçadas
causam tanto dano, estresse e angústias como a tortura física

Impactos sobre a personalidade
Alguns prisioneiros tiveram sua personalidade de tal modo afetada pelas sevicias,
que passaram a acatar, para sobreviverem, todas as imposições de seus carcereiros
Marcas da tortura
Em muitos presos políticos, a tortura não deixou marcas físicas, pois foram tomados
os devidos cuidados para evita-las. Prova disso, foi um descuido do DOI-CODI-Il
Exército, que permitiu encontrar, nos autos de um processo de São Paulo, um
documento revelador das orientações dadas às equipes de interrogatório nos
órgãos de repressão:
Em outras ocasiões, as estruturas ósseas dos torturados não resistiam aos
espancamentos, como ocorreu com o estudante Al-berto Vinicius Meio do
Nascimento, 23 anos, durante sessão de torturas que sofreu na OBAN, em São
Paulo, no dia 5 de dezembro de 1970.
São comuns também os casos de perfuração dos tímpanos.
Não apenas exames médicos comprovaram a prática de tortu-ras, nos cárceres, de
réus por motivos políticos. Na opinião do pai de um deles, em carta ao juiz-auditor
de São Paulo, em 1970, houve quem não camuflasse o cinismo, filho dileto da
prepotência:
Assistência medica a tortura
(...) que o Dr. Coutinho, médico da Ilha das Flores, era o encarregado de aplicar
estimulantes quando os torturados desmaiavam (...)
Outros depoimentos, tomados nas diversas Auditorias brasilei-ras, reproduzem
situações semelhantes, seja no médico que favorece a prática de sevícias, seja
daquele que procura reanimar a vítima ou ainda dos que eram convocados para
tratar de prisioneiros políticos:
Médicos legistas
Da leitura desses relatos, se obtém a certeza da conivência e mesmo participação
direta de médicos e enfermeiros na pratica de torturas. Algumas vezes, estas
praticas chegaram ao limite da resis-tência dos atingidos, ocorrendo morte.
Os médicos que, frequentemente, forneceram laudos falsos acobertando sinais
evidentes de tortura, também ocultaram a real causa mortis daqueles que foram
assassinados.

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Intimidação e tortura: consequências da violência

  • 1. Intimidação pela tortura Intimidação é o ato de fazer com que outros façam o que alguém quer, através do medo. A intimidação é a resultante do desajuste da compulsão competitiva normal de dominância inter-relacional, geralmente vista em animais, mas que é mais completamente modulada por forças sociais em seres humanos. Tortura é a imposição de dor física ou psicológica por crueldade, intimidação, punição, para obtenção de uma confissão, informação ou simplesmente por prazer da pessoa que tortura. Sabemos que ninguém jamais toma o poder com a intenção de largá-lo. O poder não é um meio, é um fim em si. Não se estabelece uma ditadura com o fito de salvaguardar uma revolução; faz-se a revolução para estabelecer a ditadura. O objetivo da perseguição é a perseguição. O objetivo da tortura é a tortura. O objetivo do poder é o poder." George Orwell; 1984.
  • 2. Depoimentos forjados; confissões falsas. Ao comparecerem perante o Conselho de Justiça, muitos réus denunciaram como foram induzidos a assinarem depoimentos forja-dos, na fase do inquérito policial, O pânico e o medo provocado pelas sevícias levaram alguns réus a assinar os papéis que lhe apresentavam. Confissões falsas Devido às torturas aplicadas aos réus na fase do inquérito po-licial, muitos revelaram, à Justiça Militar, a falsidade de seus depoi-mentos, feitos com o objetivo de fazer cessar a violência que se abatia sobre eles. Para o artigo 99 do Código de Processo Penal Militar, o inqué-rito policial “é apuração sumária dos fatos” e “tem o caráter de instrução provisória, cuja finalidade precípua é a de ministrar ele-mentos necessários à propositura da ação penal”. É garantia constitucional que nenhuma prova terá valor se não é submetida ao crivo da defesa, tendo o réu o direito de exami-ná-la e contestá-la, no momento mesmo em que ela é produzida diante os que irão julgá-lo.
  • 3. Consequências da tortura ÉPOCA – Quais são as consequências da tortura? Rejali – Além de destruir as vítimas, a tortura pode destruir os torturadores. É comum quem submete os outros à tortura ter problemas como alcoolismo, violência familiar e distúrbios psicológicos sérios. Para os governos, a tortura é negativa porque destrói os setores de inteligência. A manipulação psicológica, a humilhação, a privação sensorial e as posturas forçadas causam tanto dano, estresse e angústias como a tortura física Impactos sobre a personalidade Alguns prisioneiros tiveram sua personalidade de tal modo afetada pelas sevicias, que passaram a acatar, para sobreviverem, todas as imposições de seus carcereiros
  • 4. Marcas da tortura Em muitos presos políticos, a tortura não deixou marcas físicas, pois foram tomados os devidos cuidados para evita-las. Prova disso, foi um descuido do DOI-CODI-Il Exército, que permitiu encontrar, nos autos de um processo de São Paulo, um documento revelador das orientações dadas às equipes de interrogatório nos órgãos de repressão: Em outras ocasiões, as estruturas ósseas dos torturados não resistiam aos espancamentos, como ocorreu com o estudante Al-berto Vinicius Meio do Nascimento, 23 anos, durante sessão de torturas que sofreu na OBAN, em São Paulo, no dia 5 de dezembro de 1970. São comuns também os casos de perfuração dos tímpanos. Não apenas exames médicos comprovaram a prática de tortu-ras, nos cárceres, de réus por motivos políticos. Na opinião do pai de um deles, em carta ao juiz-auditor de São Paulo, em 1970, houve quem não camuflasse o cinismo, filho dileto da prepotência:
  • 5. Assistência medica a tortura (...) que o Dr. Coutinho, médico da Ilha das Flores, era o encarregado de aplicar estimulantes quando os torturados desmaiavam (...) Outros depoimentos, tomados nas diversas Auditorias brasilei-ras, reproduzem situações semelhantes, seja no médico que favorece a prática de sevícias, seja daquele que procura reanimar a vítima ou ainda dos que eram convocados para tratar de prisioneiros políticos: Médicos legistas Da leitura desses relatos, se obtém a certeza da conivência e mesmo participação direta de médicos e enfermeiros na pratica de torturas. Algumas vezes, estas praticas chegaram ao limite da resis-tência dos atingidos, ocorrendo morte. Os médicos que, frequentemente, forneceram laudos falsos acobertando sinais evidentes de tortura, também ocultaram a real causa mortis daqueles que foram assassinados.