SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 1
© Luís Veríssimo e Edições ASA, 2021
1
O desafio do relativismo cultural
Em 1966, uma rapariga de dezassete anos chamada Fauziya Kassindja chegou ao Aeroporto
Internacional de Newark e pediu asilo. Tinha fugido do seu país natal, o Togo, pequena nação do oeste
africano, para escapar ao que ali as pessoas chamam “excisão”. A excisão é uma intervenção
desfiguradora, por vezes chamada «circuncisão feminina», embora tenha poucas semelhanças com essa
prática judaica. É mais frequentemente referida, pelo menos nos jornais de países ocidentais, como
“mutilação genital feminina”.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a prática está disseminada por vinte e seis
países africanos, sendo em cada ano objeto de «excisão» dois milhões de raparigas. Nalguns casos a
excisão é parte de um elaborado ritual tribal, realizado em pequenas aldeias tradicionais, e as raparigas
anseiam submeter-se a ele porque isso assinala a sua aceitação no mundo adulto. Noutros casos, a
prática é realizada por famílias citadinas em jovens que lhe resistem desesperadamente.
Fauziya Kassindja era a mais jovem de cinco filhas de uma família muçulmana devota. O seu pai,
proprietário de uma bem-sucedida empresa de camionagem, opunha-se à excisão, e tinha capacidade
de se opor à tradição por causa da sua riqueza. As suas primeiras quatro filhas casaram sem ser
mutiladas. Mas quando Fauziya tinha dezasseis anos, ele morreu subitamente. Fauziya ficou então sob
tutela do avô, que ajustou para ela um casamento e se preparava para a submeter à excisão. Fauziya
ficou aterrorizada e a mãe e a irmã mais velha ajudaram-na a fugir. A mãe, tendo ficado sem recursos,
teve de pedir desculpas formais e submeter-se à autoridade do patriarca que ofendeu.
Entretanto, na América, Fauziya foi detida durante dois anos enquanto as autoridades decidiam o
que fazer. Por fim foi-lhe concedido asilo, mas não sem antes se tornar o centro de uma controvérsia
sobre a forma como devemos encarar as práticas culturais de outros povos. Uma série de artigos no
New York Times favoreceu a ideia de que a excisão é uma prática bárbara merecedora de condenação.
Outros observadores mostraram-se relutantes em ser tão peremptórios – vive e deixa viver, afirmaram;
afinal é provável a nossa cultura parecer igualmente estranha para eles.
Vamos supor que estamos inclinados a aceitar que a excisão é má. Estaríamos nós apenas a
impor os padrões da nossa própria cultura? Se o relativismo cultural estiver correto, isso é tudo quanto
podemos fazer, pois não há um padrão cultural neutro a que possamos apelar. Mas, será isto verdade?
RACHELS, James, Elementos de Filosofia Moral, Lisboa, Gradiva, 2004.
1. Por que razão Fauziya Kassindja fugiu do seu país natal?
2. O que é a excisão?
3. Porque será que nos jornais de países ocidentais a excisão é conhecida como “mutilação
genital feminina”?
4. Porque será que as jovens de algumas aldeias anseiam submeter-se à excisão, ao passo que
as jovens de famílias citadinas lhe resistem desesperadamente?
5. Por que razão casos como o de Fauziya Kassindja representam um desafio para a forma
como encaramos a diversidade cultural?
6. O caso de Fauziya Kassindja tornou-se “o centro de uma controvérsia sobre a forma como
devemos encarar as práticas culturais de outros povos”: uns consideram que a excisão é uma
prática bárbara merecedora de condenação, outros afirmam que devemos tolerá-la. Qual
das perspetivas te parece mais adequada? Porquê?

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a relativismo moral ideias chave apoio filosofia

Desigualdades sociais
Desigualdades sociaisDesigualdades sociais
Desigualdades sociaiskikatitic
 
Madre Teresa de Calcutá
Madre Teresa de CalcutáMadre Teresa de Calcutá
Madre Teresa de CalcutáCamila Martins
 
Registros sobre mulheres surdas na História
 Registros sobre mulheres surdas na História Registros sobre mulheres surdas na História
Registros sobre mulheres surdas na HistóriaREVISTANJINGAESEPE
 
Sociologia ii aula 1 - Cultura e Sociedade
Sociologia ii   aula 1 - Cultura e SociedadeSociologia ii   aula 1 - Cultura e Sociedade
Sociologia ii aula 1 - Cultura e SociedadeCarmem Rocha
 
A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606
A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606
A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606Daniel de Melo
 
Paper sobre Sincretismo Afro Brasileiro
Paper sobre Sincretismo Afro BrasileiroPaper sobre Sincretismo Afro Brasileiro
Paper sobre Sincretismo Afro BrasileiroEdson L
 
APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...
APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...
APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...fabiana643509
 

Semelhante a relativismo moral ideias chave apoio filosofia (9)

Desigualdades sociais
Desigualdades sociaisDesigualdades sociais
Desigualdades sociais
 
Madre Teresa de Calcutá
Madre Teresa de CalcutáMadre Teresa de Calcutá
Madre Teresa de Calcutá
 
Registros sobre mulheres surdas na História
 Registros sobre mulheres surdas na História Registros sobre mulheres surdas na História
Registros sobre mulheres surdas na História
 
Sociologia ii aula 1 - Cultura e Sociedade
Sociologia ii   aula 1 - Cultura e SociedadeSociologia ii   aula 1 - Cultura e Sociedade
Sociologia ii aula 1 - Cultura e Sociedade
 
A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606
A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606
A019 EAE DM - A FRATERNIDADE ESSÊNIA - 20180606
 
Paper sobre Sincretismo Afro Brasileiro
Paper sobre Sincretismo Afro BrasileiroPaper sobre Sincretismo Afro Brasileiro
Paper sobre Sincretismo Afro Brasileiro
 
APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...
APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...
APznzaZGf6YLS_AKu0wJ24wpp-CHX290GR6lYMxWTtv0n9iMzhyscC4nkYhQhEH8LNAb2_sGA7phv...
 
Judeus e Negros
Judeus e NegrosJudeus e Negros
Judeus e Negros
 
Centelha Divina
Centelha DivinaCentelha Divina
Centelha Divina
 

Mais de JooCalas1

Ficha de trabalho - Filosofia 11º Filosofia da Ciência.docx
Ficha de trabalho - Filosofia 11º  Filosofia da Ciência.docxFicha de trabalho - Filosofia 11º  Filosofia da Ciência.docx
Ficha de trabalho - Filosofia 11º Filosofia da Ciência.docxJooCalas1
 
Valores 10 powerpoint natureza dos juizos morais
Valores 10 powerpoint natureza dos juizos moraisValores 10 powerpoint natureza dos juizos morais
Valores 10 powerpoint natureza dos juizos moraisJooCalas1
 
10 ano area integracao ethos pathos logos
10 ano area integracao ethos pathos logos10 ano area integracao ethos pathos logos
10 ano area integracao ethos pathos logosJooCalas1
 
como se controi a ciência filosofia da ciencia
como se controi a ciência filosofia da cienciacomo se controi a ciência filosofia da ciencia
como se controi a ciência filosofia da cienciaJooCalas1
 
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos moraisTeste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos moraisJooCalas1
 
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos moraisTeste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos moraisJooCalas1
 

Mais de JooCalas1 (6)

Ficha de trabalho - Filosofia 11º Filosofia da Ciência.docx
Ficha de trabalho - Filosofia 11º  Filosofia da Ciência.docxFicha de trabalho - Filosofia 11º  Filosofia da Ciência.docx
Ficha de trabalho - Filosofia 11º Filosofia da Ciência.docx
 
Valores 10 powerpoint natureza dos juizos morais
Valores 10 powerpoint natureza dos juizos moraisValores 10 powerpoint natureza dos juizos morais
Valores 10 powerpoint natureza dos juizos morais
 
10 ano area integracao ethos pathos logos
10 ano area integracao ethos pathos logos10 ano area integracao ethos pathos logos
10 ano area integracao ethos pathos logos
 
como se controi a ciência filosofia da ciencia
como se controi a ciência filosofia da cienciacomo se controi a ciência filosofia da ciencia
como se controi a ciência filosofia da ciencia
 
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos moraisTeste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
 
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos moraisTeste valores  Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
Teste valores Filosofia 10 o problema da natureza dos juizos morais
 

Último

LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...
LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...
LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...Francisco Márcio Bezerra Oliveira
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfHELENO FAVACHO
 
O que é arte. Definição de arte. História da arte.
O que é arte. Definição de arte. História da arte.O que é arte. Definição de arte. História da arte.
O que é arte. Definição de arte. História da arte.denisecompasso2
 
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretaçãoLENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretaçãoLidianePaulaValezi
 
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptx
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptxCartão de crédito e fatura do cartão.pptx
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptxMarcosLemes28
 
GÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptx
GÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptxGÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptx
GÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptxMARIADEFATIMASILVADE
 
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...MariaCristinaSouzaLe1
 
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.pptaula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.pptssuser2b53fe
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxTailsonSantos1
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfcomercial400681
 
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdf
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdfPROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdf
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdfHELENO FAVACHO
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéisines09cachapa
 
E a chuva ... (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...
E a chuva ...  (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...E a chuva ...  (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...
E a chuva ... (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...andreiavys
 
Conflitos entre: ISRAEL E PALESTINA.pdf
Conflitos entre:  ISRAEL E PALESTINA.pdfConflitos entre:  ISRAEL E PALESTINA.pdf
Conflitos entre: ISRAEL E PALESTINA.pdfjacquescardosodias
 
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfRecomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfFrancisco Márcio Bezerra Oliveira
 
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxResponde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxAntonioVieira539017
 
Estudar, para quê? Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
Estudar, para quê?  Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2Estudar, para quê?  Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
Estudar, para quê? Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2Maria Teresa Thomaz
 
Texto dramático com Estrutura e exemplos.ppt
Texto dramático com Estrutura e exemplos.pptTexto dramático com Estrutura e exemplos.ppt
Texto dramático com Estrutura e exemplos.pptjricardo76
 
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptxMonoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptxFlviaGomes64
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia TecnologiaPROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia TecnologiaHELENO FAVACHO
 

Último (20)

LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...
LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...
LISTA DE EXERCICIOS envolveto grandezas e medidas e notação cientifica 1 ANO ...
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
 
O que é arte. Definição de arte. História da arte.
O que é arte. Definição de arte. História da arte.O que é arte. Definição de arte. História da arte.
O que é arte. Definição de arte. História da arte.
 
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretaçãoLENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
LENDA DA MANDIOCA - leitura e interpretação
 
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptx
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptxCartão de crédito e fatura do cartão.pptx
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptx
 
GÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptx
GÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptxGÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptx
GÊNERO CARTAZ - o que é, para que serve.pptx
 
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
Aula 25 - A america espanhola - colonização, exploraçãp e trabalho (mita e en...
 
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.pptaula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
 
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdf
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdfPROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdf
PROJETO DE EXTENÇÃO - GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS.pdf
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
 
E a chuva ... (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...
E a chuva ...  (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...E a chuva ...  (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...
E a chuva ... (Livro pedagógico para ser usado na educação infantil e trabal...
 
Conflitos entre: ISRAEL E PALESTINA.pdf
Conflitos entre:  ISRAEL E PALESTINA.pdfConflitos entre:  ISRAEL E PALESTINA.pdf
Conflitos entre: ISRAEL E PALESTINA.pdf
 
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfRecomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
 
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxResponde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
 
Estudar, para quê? Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
Estudar, para quê?  Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2Estudar, para quê?  Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
Estudar, para quê? Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
 
Texto dramático com Estrutura e exemplos.ppt
Texto dramático com Estrutura e exemplos.pptTexto dramático com Estrutura e exemplos.ppt
Texto dramático com Estrutura e exemplos.ppt
 
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptxMonoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia TecnologiaPROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
PROJETO DE EXTENSÃO I - Radiologia Tecnologia
 

relativismo moral ideias chave apoio filosofia

  • 1. © Luís Veríssimo e Edições ASA, 2021 1 O desafio do relativismo cultural Em 1966, uma rapariga de dezassete anos chamada Fauziya Kassindja chegou ao Aeroporto Internacional de Newark e pediu asilo. Tinha fugido do seu país natal, o Togo, pequena nação do oeste africano, para escapar ao que ali as pessoas chamam “excisão”. A excisão é uma intervenção desfiguradora, por vezes chamada «circuncisão feminina», embora tenha poucas semelhanças com essa prática judaica. É mais frequentemente referida, pelo menos nos jornais de países ocidentais, como “mutilação genital feminina”. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a prática está disseminada por vinte e seis países africanos, sendo em cada ano objeto de «excisão» dois milhões de raparigas. Nalguns casos a excisão é parte de um elaborado ritual tribal, realizado em pequenas aldeias tradicionais, e as raparigas anseiam submeter-se a ele porque isso assinala a sua aceitação no mundo adulto. Noutros casos, a prática é realizada por famílias citadinas em jovens que lhe resistem desesperadamente. Fauziya Kassindja era a mais jovem de cinco filhas de uma família muçulmana devota. O seu pai, proprietário de uma bem-sucedida empresa de camionagem, opunha-se à excisão, e tinha capacidade de se opor à tradição por causa da sua riqueza. As suas primeiras quatro filhas casaram sem ser mutiladas. Mas quando Fauziya tinha dezasseis anos, ele morreu subitamente. Fauziya ficou então sob tutela do avô, que ajustou para ela um casamento e se preparava para a submeter à excisão. Fauziya ficou aterrorizada e a mãe e a irmã mais velha ajudaram-na a fugir. A mãe, tendo ficado sem recursos, teve de pedir desculpas formais e submeter-se à autoridade do patriarca que ofendeu. Entretanto, na América, Fauziya foi detida durante dois anos enquanto as autoridades decidiam o que fazer. Por fim foi-lhe concedido asilo, mas não sem antes se tornar o centro de uma controvérsia sobre a forma como devemos encarar as práticas culturais de outros povos. Uma série de artigos no New York Times favoreceu a ideia de que a excisão é uma prática bárbara merecedora de condenação. Outros observadores mostraram-se relutantes em ser tão peremptórios – vive e deixa viver, afirmaram; afinal é provável a nossa cultura parecer igualmente estranha para eles. Vamos supor que estamos inclinados a aceitar que a excisão é má. Estaríamos nós apenas a impor os padrões da nossa própria cultura? Se o relativismo cultural estiver correto, isso é tudo quanto podemos fazer, pois não há um padrão cultural neutro a que possamos apelar. Mas, será isto verdade? RACHELS, James, Elementos de Filosofia Moral, Lisboa, Gradiva, 2004. 1. Por que razão Fauziya Kassindja fugiu do seu país natal? 2. O que é a excisão? 3. Porque será que nos jornais de países ocidentais a excisão é conhecida como “mutilação genital feminina”? 4. Porque será que as jovens de algumas aldeias anseiam submeter-se à excisão, ao passo que as jovens de famílias citadinas lhe resistem desesperadamente? 5. Por que razão casos como o de Fauziya Kassindja representam um desafio para a forma como encaramos a diversidade cultural? 6. O caso de Fauziya Kassindja tornou-se “o centro de uma controvérsia sobre a forma como devemos encarar as práticas culturais de outros povos”: uns consideram que a excisão é uma prática bárbara merecedora de condenação, outros afirmam que devemos tolerá-la. Qual das perspetivas te parece mais adequada? Porquê?