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CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL
Precisamos fazer mais
Vanderley M. John *
E
grande o interesse em certifica-
ção de "edifícios verdes". Duas
metodologias estrangeiras co-
meçam a ser oferecidas no mercado
brasileiro: a norte-americana LEED e
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certificados é pequena, pois eles são
desenhados para identificar uma elite
de empreendimentos. O LEED estima
ter certificado 1 % do mercado dos EUA,
boa parte de edifícios pertencente a
órgãos públicos. Olhado do ponto de
vista do número de empreendimentos,
o impacto da certificação é pequeno.
Essas certificações são desenhadas
para destacar edifícios que adotem so-
luções muito avançadas, que atendam
problemas prioritários para a sustenta-
bilidade local. Diferente das certifica-
ções de qualidade, ela são, por defini-
ção, não escaláveis.
Algumas centenas ou milhares de
edifícios certificados, por si, não vão al-
terar a sustentabilidade da construção
brasileira a menos que estes empreen-
dimentos sejam indutores: inspirem no-
vos empreendedores, criem mercados
para produtos ecoeficentes e incenti-
vem inovações tecnológicas.
Não existem evidências de que só
o efeito indutor da certificação seja su-
ficiente para alterar substancialmente
a cadeia da construção, especialmen-
te em um país como o Brasil. A exis-
tência de mais de um sistema cria si-
nais confusos. Portanto, é possível que
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resultem apenas em um grupo edifíci-
os extremamente ecoeficientes, ilhas
dentro de um mundo, digamos, cinza.
Podemos produzir uma centena de
edifícios certificados por ano -o que
seria uma vitória- sem alterar a sus-
tentabilidade média da construção.
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senvolvimento sustentável e também
da política industrial. Por isto, os paí-
ses desenvolvidos têm seu próprios
sistemas. Um exemplo: nestes países,
diferentemente do Brasil, problemas
sociais, informalidade e mesmo quali-
dade já não são importantes. As certi-
ficações concentram-se em ecologia,
"green building".
Assim, é necessário combinar sis-
temas de certificação que premiem a
inovação e o avanço tecnológico de que
nosso setor é carente, com medidas
Só certificar não basta num país onde
77% das construções são auto-geridas
No caso do Brasil, a situação é bas-
tante complicada. Segundo o Ministé-
rio das Cidades, 77% das construções
brasileiras são "autogeridas", realizadas
sem participação de construtoras ou
agentes públicos. Parte importante é
favela. A maioria dos paulistanos, 73%
segundo a Prefeitura de São Paulo, vive
em casas, cuja esmagadora maioria é
produzida de forma autogerida.
Do ponto de vista dos fornecedores
de materiais, é este mercado que viabi-
liza (ou inviabiliza) soluções inovadoras.
A certificação dificilmente vai atingir este
setor. As soluções de grandes empre-
endimentos certificados talvez não se-
jam aplicáveis neste mercado.
O sistema de certificação dos paí-
ses desenvolvidos parte de um sofisti-
cado conjunto de políticas para o de-
concretas que criem condições de alte-
rar a construção comum, inclusive a
autogerida, pois esta é e sempre será
a maior parte do setor.
Um exemplo brasileiro de sucesso:
a introdução no mercado da bacia sa-
nitária de 6,8 litros, articulada dentro do
PBQP-H. Quanto tempo a indução sim-
ples levaria para concretizar este feito?
Precisaremos, portanto, desenvolver
nosso próprio sistema de certificação,
adequado aos nossos problemas, arti-
culado com um conjunto de ações e pla-
nos setoriais. Esta é a necessidade.
* ENGENHEIRO E PROFESSOR Pou-USP, Ê MEMBRO
DA CÂMARA AMBIENTAL DA INDÚSTRIA DA CONSTRU-
ÇÃO ClVIL E CONSELHBRO DO CONSELHO BRASILEIRO
DE CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL
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  • 1. CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL Precisamos fazer mais Vanderley M. John * E grande o interesse em certifica- ção de "edifícios verdes". Duas metodologias estrangeiras co- meçam a ser oferecidas no mercado brasileiro: a norte-americana LEED e a francesa HQE. Várias instituições de pesquisa brasileiras, dentre elas o IPT, estão discutindo metodologias próprias. Este interesse todo se justifica? Em primeiro lugar, certificação nada mais é que uma forma de comunicação. Aviso aos clientes: o edifício tal atende aos requisitos de tal metodologia. Em todo o mundo a quantidade de edifícios certificados é pequena, pois eles são desenhados para identificar uma elite de empreendimentos. O LEED estima ter certificado 1 % do mercado dos EUA, boa parte de edifícios pertencente a órgãos públicos. Olhado do ponto de vista do número de empreendimentos, o impacto da certificação é pequeno. Essas certificações são desenhadas para destacar edifícios que adotem so- luções muito avançadas, que atendam problemas prioritários para a sustenta- bilidade local. Diferente das certifica- ções de qualidade, ela são, por defini- ção, não escaláveis. Algumas centenas ou milhares de edifícios certificados, por si, não vão al- terar a sustentabilidade da construção brasileira a menos que estes empreen- dimentos sejam indutores: inspirem no- vos empreendedores, criem mercados para produtos ecoeficentes e incenti- vem inovações tecnológicas. Não existem evidências de que só o efeito indutor da certificação seja su- ficiente para alterar substancialmente a cadeia da construção, especialmen- te em um país como o Brasil. A exis- tência de mais de um sistema cria si- nais confusos. Portanto, é possível que em alguns mercados as certificações resultem apenas em um grupo edifíci- os extremamente ecoeficientes, ilhas dentro de um mundo, digamos, cinza. Podemos produzir uma centena de edifícios certificados por ano -o que seria uma vitória- sem alterar a sus- tentabilidade média da construção. Admitamos: um tragédia. senvolvimento sustentável e também da política industrial. Por isto, os paí- ses desenvolvidos têm seu próprios sistemas. Um exemplo: nestes países, diferentemente do Brasil, problemas sociais, informalidade e mesmo quali- dade já não são importantes. As certi- ficações concentram-se em ecologia, "green building". Assim, é necessário combinar sis- temas de certificação que premiem a inovação e o avanço tecnológico de que nosso setor é carente, com medidas Só certificar não basta num país onde 77% das construções são auto-geridas No caso do Brasil, a situação é bas- tante complicada. Segundo o Ministé- rio das Cidades, 77% das construções brasileiras são "autogeridas", realizadas sem participação de construtoras ou agentes públicos. Parte importante é favela. A maioria dos paulistanos, 73% segundo a Prefeitura de São Paulo, vive em casas, cuja esmagadora maioria é produzida de forma autogerida. Do ponto de vista dos fornecedores de materiais, é este mercado que viabi- liza (ou inviabiliza) soluções inovadoras. A certificação dificilmente vai atingir este setor. As soluções de grandes empre- endimentos certificados talvez não se- jam aplicáveis neste mercado. O sistema de certificação dos paí- ses desenvolvidos parte de um sofisti- cado conjunto de políticas para o de- concretas que criem condições de alte- rar a construção comum, inclusive a autogerida, pois esta é e sempre será a maior parte do setor. Um exemplo brasileiro de sucesso: a introdução no mercado da bacia sa- nitária de 6,8 litros, articulada dentro do PBQP-H. Quanto tempo a indução sim- ples levaria para concretizar este feito? Precisaremos, portanto, desenvolver nosso próprio sistema de certificação, adequado aos nossos problemas, arti- culado com um conjunto de ações e pla- nos setoriais. Esta é a necessidade. * ENGENHEIRO E PROFESSOR Pou-USP, Ê MEMBRO DA CÂMARA AMBIENTAL DA INDÚSTRIA DA CONSTRU- ÇÃO ClVIL E CONSELHBRO DO CONSELHO BRASILEIRO DE CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL 24 REVISTA NOTÍCIAS DA CONSTRUÇÃO