O documento discute o que é arte. A autora define arte como produções humanas que mexem com os sentidos e pensamentos, incomodam e deslocam as pessoas, fazendo-as compreender a vida por novos pontos de vista. Ela também argumenta que nossas concepções de arte influenciam como ensinamos arte, e que é importante experienciar e refletir sobre diferentes produções culturais para ampliar as visões sobre arte.
Arte e sua função - Alexandre Linares e Ana Paula Dibbern
O_que_e_arte.pdf
1. O que é arte?
Dra.Susana Rangel Vieira da Cunha
Publicado no Jornal Cultural KORALLE, Porto Alegre, v. 6, p. 3 , maio
2006.
A música “O que será” (A flor da pele) de Chico Buarque de
Holanda traduz, parcialmente, o que entendo por arte. En-
tão, arte seria o: “Que me bole por dentro, Que brota à flor
da pele, Que me salta os olhos a me atraiçoar, O que não tem
receita, Que desacata a gente, que é revelia, O que não tem
descanso nem nunca terá, O que não tem limite, Que me
queima por dentro, Que me perturba o sono, O que não tem
juízo” . Ou seja, todas aquelas produções humanas que de
algum modo mexem com meus sentidos, com meus pensa-
mentos, me incomodam, me deslocam, me mobilizam e me
fazem compreender a vida por outros pontos de vista consi-
dero como produções artísticas. Entretanto, entendo que o
que me perturba não se dá numa relação imediata, esponta-
neístas entre eu e as coisas, o que me bole é produzido pelo
Gottfried Helnwein
The Disasters of War 13, 2007, mixed media (oil and acrylic on canvas)
2. meu conhecimento sensível e racional, pelas vivências, pelos contextos culturais que vivi e vivo e pela minha história pessoal e
social.
M inhas experiências como professora e pesquisadora no campo do ensino das artes visuais, têm mostrado que as pessoas atri-
buem sentido, valorizam e denominam determinadas produções como arte a partir de seus repertórios culturais, que por sua
vez estão imbricados com aquilo que se convencionou e se instituiu como arte. Como exemplo, lembro a exposição dos Impres-
sionistas no M ARGS. Nesta exposição havia unanimidade de que todas as peças expostas eram obras arte. Quem e o que pode-
ria contestá-las? Os discursos e as instituições, ao fixar que determinados objetos são obras de arte, passam a glamorizar pro-
duções em detrimento de outras, e ao dizerem, previamente, que isso ou aquilo é arte, furtam dos espectadores a possibilidade
do questionamento, da dúvida e de tomar decisões frente ao visto. A questão que coloco não é de categorizar ou classificar o
que é arte, mas instigar o posicionamento das pessoas frente as diferentes produções culturais e que elas possam ser perturba-
das, mexidas, desestabilizadas diante dos mais variados objetos, sejam eles os “etiquetados” , sejam aqueles objetos anônimos
que participam do nosso cotidiano.
Entendo que as concepções que formamos em torno da arte acabam formulando também nossos modos de ensinar arte, as-
sim, procuro tecer experiências com minhas alunas da graduação em Pedagogia, mesclando o pensamento sensível e conceitu-
al, uma vez que não existe processo de conhecimento em arte numa perspectiva apenas teórica ou experiencial, o conhecimen-
to neste campo necessita da mediação entre o reflexivo e poético. É conhecendo e pensando sobre as diferentes produções
simbólicas, vivenciando e entendendo os próprios processos expressivos que as pessoas ampliarão suas visões sobre a arte em
sua dimensão histórica, social, individual, expressiva, conceitual, cultural, simbólica e técnica.