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Avaliadores de
Artigo Científico
O avaliador
3
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Enap Escola Nacional de Administração Pública
Enap, 2021
SAIS - Área 2-A -70610-900 - Brasília, DF
Conteudista:
Claudio Paixão Anastácio de Paula (conteudista, 2021);
Eliane Pawlowski de Oliveira Araújo (conteudista, 2021);
Fernanda Oliveto (conteudista, 2021);
Keila Rêgo Mendes (conteudista, 2021);
Diretoria de Desenvolvimento Profissional.
3
Sumário
Unidade 1: O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico?..........................4
1.1 Por que ser avaliador?.................................................................................................................................... 4
1.2 Competências necessárias ao perfil do avaliador................................................................................. 8
1.3 Requisitos para uma avaliação de qualidade........................................................................................10
Referências..............................................................................................................................................................14
Unidade 2: A ética no processo editorial.............................................................................. 16
2.1 Aspectos éticos..............................................................................................................................................16
Referências..............................................................................................................................................................21
4
1.1 Por que ser avaliador?
O papel do avaliador é tão estratégico no processo editorial que, sem sua participação, o atual sistema
de publicações corre o risco de colapsar. Essa observação é importante, pois o número de periódicos
científicos tem crescido nos últimos anos e depende do trabalho voluntário de pesquisadores para avaliarem
os manuscritos. Um panorama desse cenário pode ser visto na pesquisa sobre revisão por pares feita
pelo Publons, principal plataforma de revisão acadêmica, publicada em 2018, que ouviu mais de 11 mil
pesquisadores de vários países. Segundo a pesquisa, os editores estão enviando mais convites para avaliação
do que há cinco anos e foi detectada a existência de uma “fadiga crescente de pareceristas”, de modo que os
editores precisam convidar mais avaliadores para que cada revisão seja realizada (SPINAK, 2019).
Resultado da pesquisa realizada pelo Publons:
Unidade 1: O que é preciso para ser um avaliador de
artigo científico?
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer o perfil de avaliador de artigo científico, identificando as
vantagens pessoais e profissionais que a função traz e as competências necessárias para desempenhar a função.
Neste módulo, serão apresentadas para você as vantagens de ser avaliador e as competências necessárias
ao perfil, além de reconhecer aspectos éticos para agir em situações de conflito.
O módulo 3 está estruturado da seguinte forma:
O avaliador
MÓDULO
3
• Unidade 1 – O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico?
• Unidade 2 – A ética no processo editorial
• Horas dedicadas à avaliação global por ano – 68,5 milhões.
• Mediana do tempo de avaliação – 16,4 dias.
• Mediana do tempo dedicado a escrever cada avaliação – 5 horas.
• 10% dos pareceristas são responsáveis por 50% das avaliações.
• Para 75% dos editores de periódicos a parte mais difícil é encontrar pareceristas dispostos.
• 42% dos pesquisadores rejeitam a solicitação de avaliação por estarem muito ocupados.
• 39% dos pareceristas nunca receberam capacitação sobre avaliação por pares.
5
É o avaliador quem auxilia os editores a decidirem se publicam, ou não, o manuscrito e assegura que
os melhores trabalhos sejam publicados, contribuindo para a qualidade do produto final que é a sua
disponibilização dentro de uma publicação científica para acesso pela sociedade. Sua função, conforme
destaca Rodrigues, Quartiero e Neubert (2015), implica o julgamento de um manuscrito e elaboração de
um parecer sobre ele, que traduz a recomendação de aceitação ou rejeição do material baseada em uma
argumentação fundamentada, a qual constitui o referencial para subsidiar a tomada de decisão do editor.
A presença do avaliador no processo editorial indica que houve uma avaliação crítica dos manuscritos
submetidos ao periódico, feita por um especialista, e pressupõe que foram observados princípios de
idoneidade na seleção e publicação do material. De acordo com Vasconcellos (2017), o avaliador possui
duas funções primordiais no processo editorial:
O processo de avaliação realizado por pares, no qual se insere o trabalho do avaliador, em geral, é bem-visto
pela comunidade acadêmica. Helena Shigaki e Roberto Patrus, ao relatarem duas pesquisas realizadas
sobre esse tema, verificaram que essa modalidade é avaliada positivamente pela maioria dos pesquisadores:
Os autores, entretanto, ao analisarem a literatura da área, verificaram também a existência de argumentos
contrários à revisão por pares, o que demonstra que o exercício dessa atividade precisa passar por
constantes reflexões e discussões visando seu aprimoramento. Entre esses argumentos estão: tempo e
atraso na publicação, abuso de poder, parcialidade, subjetividade, preconceito, julgamentos inadequados
ou inconsistentes, competição, desprezo e falta de sigilo.
Saiba mais:
Acesse outras análises relativas a essa pesquisa, trazidas por Ernesto Spinak,
clicando aqui.
• é responsável por auxiliar o editor na avaliação e seleção dos manuscritos submetidos ao periódico
(gatekeeping role); e
• auxilia o autor a melhorar seu trabalho por meio de críticas construtivas.
Em uma pesquisa realizada por Ware (2008), com 3.040 entrevistados, constatou-se que
93% concordam que a revisão por pares seja necessária, 85% concordam que ela ajuda a
melhorar a comunicação científica e, ainda, 83% acreditam que, sem a revisão por pares, não
haveria controle. Em outro estudo, realizado por Mulligan, Hall e Raphael (2013), com 4.037
entrevistados, 69% diziam estar satisfeitos com o atual sistema e 94% concordam que a
crescente melhoria da qualidade dos artigos publicados se deve ao processo de revisão por
pares. (SHIGAKI, PATRUS, 2016, p.110-111)
6
Saiba mais:
Você sabia? Uma iniciativa que pode minimizar alguns dos aspectos negativos da
avaliação de artigos científicos pode ser vista na utilização do Publons. De acesso
gratuito, a plataforma foi criada para registrar a contribuição dos avaliadores
encorajando-os a postar online suas experiências. Segundo Andrew Preston, um
dos seus criadores, a revisão por pares é um trabalho especializado que é descartado
logo após a publicação do artigo. A finalidade do Publons, portanto, é reunir e
armazenar esse conteúdo, promovendo discussões, evitando o “desperdício” de
ideias, sugestões e comentários feitos no processo de avaliação. Dessa forma, a
revisão por pares poderia ser vista como uma espécie de produção científica, assim
como as publicações e citações. (NASSI-CALÒ, 2015)
O sistema de avaliação por pares será visto mais adiante, quando você reconhecer os tipos de avaliação e
compreender, em detalhes, o processo avaliativo. Importante destacar, por ora, que essa modalidade não
é exclusiva dos processos editoriais científicos. Como menciona Vasconcellos (2017):
[…] o controle por pares é um mecanismo de avaliação de trabalhos científicos utilizado em
diversos meios, não só em periódicos científicos, mas também nos próprios programas de
pós-graduação (bancas de mestrado, doutorado, etc.) e em análises para concessões de
financiamentos por órgãos de fomento, por exemplo. Trata-se de “um processo baseado na
premissa de que os revisores são indivíduos competentes na área do artigo que avaliam, que
são independentes, objetivos e que dedicam seu melhor esforço à avaliação”. Ou seja, parte-
se da ideia de que os pares (especialistas na mesma área) dos próprios autores dos artigos
têm competências científicas e técnicas para analisar criticamente os elementos formais
e substanciais das pesquisas que se pretende divulgar ao meio acadêmico e à sociedade.
Assim, assegura-se à publicação um “selo de certificação, sinalizando que o trabalho foi
escrutinado pelos pares”. (VASCONCELLOS, 2017, p. 439)
A importância dos avaliadores no processo de publicação de artigos científicos pode ser vista também por
desencadear a criação de um círculo virtuoso: quando se tem um alto crivo de qualidade pelos avaliadores
na seleção dos manuscritos, a qualidade dos artigos publicados se torna alta, o que faz com que o periódico
também reflita essa qualidade e atraia o interesse de bons pesquisadores para a publicação de seus achados
de pesquisa naquela revista.
Um gargalo que existe nesse círculo é que a relevante atividade exercida pelo avaliador no processo editorial
de um periódico científico tem caráter voluntário, não havendo recebimento de pró-labore ou outro tipo de
remuneração pelo seu exercício. Esse fator gera uma série de consequências no processo editorial, já que
esse irá depender da predisposição do pesquisador em assumir tal encargo. Há de se destacar, todavia, a
existência de outros aspectos que são responsáveis por motivar um pesquisador a assumir essa função,
que não seja uma retribuição financeira.
7
Diante desse cenário, é comum pensar: mas o que o avaliador ganha com essa função?
A motivação para atuar como avaliador pode vir de diferentes situações. Há fatores ligados ao
currículo, já que os editores certificam a participação do pesquisador na atividade, o que pode
corresponder a algumas linhas a serem inseridas no currículo Lattes. Há o aspecto do prestígio
que isso traz ao jovem pesquisador ao ter essa atividade constando no rol das suas realizações
acadêmicas. Também pode haver algo relacionado à satisfação de cunho pessoal ou algum
aspecto subjetivo particular de cada indivíduo.
É possível, ainda, observar a existência de outros
motivos para que o pesquisador assuma essa
tarefa. Vasconcellos (2017, p. 441), por exemplo,
cita quatro razões para que uma pessoa atue como
avaliador de periódicos científicos: “fazer a sua
parte na comunidade acadêmica”, “apreciar ajudar
no aprimoramento dos artigos”, “gostar de ter
contato com os estudos antes de sua publicação”
(ou seja, conhecer o que está sendo produzido
nas pesquisas de ponta antes da divulgação
ampla) e “retribuir as avaliações feitas por outros
pareceristas aos próprios trabalhos”.
Esse sentimento de retribuição é um aspecto
relevante nessa atividade que tem demandado
cada vez mais novos pesquisadores em função
do grande volume de publicações. Conforme
mencionado por Nassi-Calò (2015), a motivação
imposta pela cultura “publish or perish” da ciência
tem contribuído para o expressivo aumento do
número de artigos: “o periódico de acesso aberto
PLoS ONE, por exemplo, publicou mais de 105 mil
artigos desde 2006, e o publisher Frontiers, mais
de 20 mil desde 2007. Se cada artigo for avaliado
por dois pareceristas, isso representa mais de 250
mil pareceristas apenas para esses publishers.”
(NASSI-CALÒ, 2015).
Também Silva (2018), ao elencar aspectos
motivadores para o trabalho como avaliador,
menciona a reciprocidade como fator motivador.
Para esse autor, quando o serviço é orientado pela
reciprocidade, a participação dos avaliadores pode
desempenhar um papel de autorrealização. Nesse
aspecto das recompensas individuais – e não
institucionais como as que foram apresentadas até
agora – outras motivações podem ser elencadas,
pois o processo de avaliação possibilita ao avaliador
desenvolver suas próprias habilidades como
pesquisador e autor ao avaliar trabalhos científicos
de terceiros, assim como ganhar experiência na
atividade ao desenvolver conhecimento técnico
sobre o processo se tornando um sujeito mais
capacitado. Esse último perpassa a habilidade
de poder aprimorar seu próprio trabalho pelo
aguçamento do seu senso crítico.
Conforme mencionam Deslandes e Silva (2013), a avaliação de um artigo científico, devido à sua
característica da revisão realizada por pares:
se aproxima do que a vertente antropológica maussiana1 denomina de dom ritual, um sistema
de trocas que se alicerça na tríade dar-receber-retribuir. Esse sistema, mais do que fazer
circular dádivas, materializadas como bens ou serviços, estabelece vínculos (de amizade ou
de rivalidade), obrigações e dívidas ético-morais. A dádiva ofertada ao outro estabelece a
oportunidade deste também exercitar o dom, demarcando um pertencimento àquela rede de
sociabilidade e uma afirmação de sua persona. (DESLANDES; SILVA, 2013, p. 421)
8
1.2 Competências necessárias ao perfil do avaliador
Conforme já mencionado, um dos ganhos que se obtêm da atividade de avaliador é a possibilidade de
desenvolver conhecimento técnico do processo pela experiência na atividade.
Esse aspecto é muito importante quando se fala de competências, porque o fato de ser pesquisador e
autor não implica, necessariamente, em ser um bom avaliador. Ninguém nasce avaliador. Não há nada de
místico no exercício dessa atividade que lhes faça acordar um dia como excelentes pareceristas sobre
determinado tema. Tampouco serão guiados por intuições que lhes falarão se o texto é fruto de plágio,
apresenta coerência metodológica ou contribuição relevante para a área.
Algumas competências necessárias para um bom desempenho nessa atividade podem ser oriundas
de características pessoais, enquanto outras podem ser aprendidas tanto pela experiência quanto pela
participação em capacitações específicas para o exercício da função.
Oprimeiroaspectoimportanteaserressaltadoéqueascompetênciascorrespondemaumtripécompostoportrês
dimensões – conhecimento, habilidade e atitude – relacionadas não somente aos aspectos técnicos, mas também
cognitivos, necessários ao bom desempenho de uma atividade. Conforme Santos (2011, p. 370) especifica:
O conhecimento corresponde a uma série de informações assimiladas e estruturadas pelo
indivíduo, que lhe permite entender o mundo, ou seja, trata-se da dimensão do saber. A
habilidade, por sua vez, está associada ao saber-fazer, ou seja, corresponde à capacidade de
aplicar e fazer uso produtivo do conhecimento adquirido e utilizá-lo em uma ação com vista ao
alcance de um propósito específico. Finalmente, a atitude é a dimensão do querer-saber-fazer,
que diz respeito aos aspectos sociais e afetivos relacionados ao trabalho. As três dimensões da
competência estão interligadas e são interdependentes. (SANTOS, 2011, p. 370, grifos nossos)
Esse entendimento deve ser acrescido dos aspectos levantados por Brandão (2009), para quem a
competênciaincorporatambémoscomportamentosadotadosnaexecuçãodastarefas.Assim,acompetência
englobaria, na atividade de avaliador, por exemplo, não apenas o conhecimento sobre determinado tema,
a capacidade de sugerir uma correção adequada no texto e a vontade de contribuir para que o artigo fique
adequado à publicação, mas, também, aspectos ético-comportamentais relacionados à confidencialidade,
honestidade, cortesia e profissionalismo.
Conhecimento
Habilidade
Competências
Atitude
Competências: CHA.
Fonte: CEPED/UFSC (2021).
9
Nessesentido,sãoesperadasdeumbomavaliadordeterminadascompetências,quevãodesdeocumprimento
de prazos e objetividade na análise até o conhecimento de ferramentas tecnológicas que auxiliam na avaliação,
como, ainda, imparcialidade, análises sem preconceitos ou prejulgamentos que possam implicar desprezo
pelo trabalho ou abuso de poder ao decidir pela publicação ou não do manuscrito.
Com base nesses elementos, podemos elencar algumas características que identificam um bom avaliador,
na visão de Maurício Pereira. Segundo esse autor, o bom avaliador é aquele que está disposto a colaborar na
avaliação e na melhoria do manuscrito que será por ele analisado.
Emtermosideais,precisasercompetentenaáreadequetrataoartigoeemmetodologiacientífica.
É conveniente que disponha de base sólida de conhecimentos sobre delineamento de pesquisas e
análisededados.Tambémdeveestarfamiliarizadocomavaliaçãodoefeitodoacasoeidentificação
de vieses. O trabalho do revisor é assinalar eventuais falhas e sugerir formas de aperfeiçoar o
texto. Se possível, fornecer comprovações para as afirmações que faz. O bom revisor é pontual
e cortês. Exerce papel de educador, quando a situação assim o requerer, emitindo comentários
construtivos e sugestões para melhorar a apresentação do artigo. (PEREIRA, 2011, p. 544)
é o que não responde prontamente às demandas ou formula parecer em termos pejorativos.
Também, aqueles que apenas anotam suas observações em termos telegráficos, sem mais
explicações: “Está bom”. “Pode publicar, eu conheço os autores, eles são muito bons”. “Está
ruim, quem escreveu não entende nada de metodologia científica”. Ou então, as anotações
se resumem a pontos de interrogação nas margens do texto, sem assinalar quais as falhas
detectadas e as recomendações correspondentes. Pareceres desse quilate são pouco úteis
para o autor do artigo e para o editor do periódico, pois não fornecem subsídios que auxiliem
a comunicação entre eles e a melhoria do texto. Um procedimento, também indesejável, é a
erudição excessiva. (PEREIRA, 2011, p. 544)
Na mesma linha, o autor elenca as características não desejáveis a um avaliador. Na descrição de Pereira
(2011, p. 544), o avaliador que deixa a desejar:
10
Ampliando a análise dessa perspectiva, o autor apresenta uma classificação para os avaliadores baseada
na articulação de dois conceitos: competência e dinamismo:
Tipos de revisor classificados segundo competência e dinamismo.
Fonte: Adaptado de Pereira (2011, p. 571).
De acordo com essa classificação, o avaliador preparado dinâmico seria aquele que executa bem o trabalho
de avaliação e o faz com rapidez. Já o Preparado Apático corresponderia ao avaliador que emite pareceres
breves, embora acertados e tem como ponto vulnerável a tendência à procrastinação.
Na linha dos avaliadores despreparados, o despreparado apático seria aquele que demora em responder as
demandas do editor e, quando o faz, peca pela incompetência. Por vezes, nem responde as demandas. Já
o avaliador despreparado dinâmico atenderia com rapidez e fluência as solicitações do editor, mas opinaria
sem base científica e, não raramente, utilizaria de uma “linguagem empolada” que dificultaria a compreensão
do parecer pelo autor e editor.
Veja você que coisa interessante! Pereira (2011) destaca que os avaliadores preparados dinâmicos podem
vir a mudar de categoria, tornando-se apáticos, se forem sobrecarregados com solicitações de emissão de
numerosos pareceres. Essa sobrecarga pode implicar a elaboração de uma análise superficial e confecção
de um parecer sem o nível de acurácia e contribuição adequados e esperados.
1.3 Requisitos para uma avaliação de qualidade
“[..] a reputação de um pesquisador se constrói não só pela
qualidade dos seus artigos, mas também pela qualidade da sua
revisão nos textos dos pares”. (DESLANDES, SILVA, 2013)
Para Suely Deslandes e Antônio Silva, a revisão por pares é essencial para se produzir ciência de qualidade, sendo
essa tarefa vista como uma atividade científica. Mas o que se pode considerar como uma avaliação de qualidade?
Propõe-se a responder a essa pergunta com outra pergunta: para que se avalia um artigo científico? Avalia-
se para referendar, ou não, que seu conteúdo está relacionado a uma investigação que observou a aplicação
de métodos e técnicas de forma coerente, baseou-se em referencial teórico consistente, trouxe contribuição
para a comunidade científica e para a sociedade e expressa o trabalho de pesquisadores interessados
em aprimorar um campo científico. Então, uma avaliação que busque ressaltar essas questões pode ser
considerada uma avaliação de qualidade.
11
Este deve ser o norte do trabalho que o avaliador se propõe a desenvolver: garantir que, no texto analisado,
esses elementos estejam presentes, constituindo essa tarefa como a contribuição para o processo de
comunicação científica e fortalecimento da ciência. Ao proceder assim, o avaliador atestará que aquele
conteúdo é um conteúdo confiável, colocando o aval junto à produção de pessoas que não se sabe quem
são, mas certos da seriedade daquilo que elas falam por meio do seu texto porque foi analisada e certificada
sua validade.
Dessa forma, para garantir que o objetivo ao analisar um artigo seja atendido, o avaliador deve se valer
de algumas orientações para não perder a finalidade maior do processo; senão, corre-se o risco de fazer
a avaliação pela avaliação. E isso é mais comum do que se imagina. Recebe-se o documento, pega-se as
diretrizes da revista, faz-se um checklist, elabora-se um relatório e está pronta a avaliação. Temerário, não?!
Nesse aspecto, o primeiro passo para realizar uma avaliação de qualidade é a percepção da sua
responsabilidade no processo. O editor confiou a você um manuscrito, e será o seu parecer (e o do
outro avaliador, visto que a avaliação normalmente envolve mais de um parecerista) que irá dizer
se aquele documento é adequado para ser divulgado por aquele periódico.
Retoma-se aqui a reflexão sobre a influência da Inteligência Artificial no processo editorial, destacando
seu impacto, agora, na avaliação dos artigos científicos. A reportagem “Máquina de criar artigos expõe
fragilidade da academia”, publicada no site Questão de Fato, em junho de 2021, destaca a preocupação
de pesquisadores com a fragilidade do sistema de controle de qualidade dos periódicos e suas nefastas
consequências, principalmente quando a falta de rigor possibilita a publicação de artigos que impactam a
saúde pública com informações inverídicas. “Para muitos cientistas, o aumento das fraudes nos artigos está
ligado às falhas da revisão por pares [...]” (SILVEIRA, 2021).
Saiba mais:
Acesse a reportagem na íntegra clicando aqui.
Além de casos em que os artigos científicos apresentaram conteúdo de “trollagem” (gíria de internet
relacionada à zombaria), há também publicações com temas de pesquisa inusitados. Esse tipo de artigo
despertou a atenção dos pesquisadores Meredith Carpenter e Lillian Fritz-Laylin, do Departamento de
Biologia Molecular da Universidade de Berkeley, que criaram um depósito virtual com artigos científicos
curiosos. Faz parte desse acervo um estudo que verificou se as garrafas de cerveja litro cheias são mais
ou menos resistentes que as vazias, podendo servir como instrumentos perigosos em uma disputa física e
fraturar o crânio humano. Nesse estudo, conforme relato da investigação publicado em outubro de 2009
no Journal of Forensic and Legal Medicine, foram testadas as propriedades do vidro jogando as garrafas de
uma torre. A constatação de que as garrafas cheias quebraram em uma energia de impacto de 30 J (mais de
3 kg), enquanto as vazias estouraram em 40 J (mais de 4 kg) demonstraram que essas energias realmente
ultrapassam o limite de fratura mínima do crânio humano, podendo ser perigosas em uma briga.
12
A reportagem sobre o tema nos aponta outro tipo de reflexão, a começar pelo título da matéria, que carrega
uma depreciação das pesquisas selecionadas ao chamá-las de “publicações científicas absurdas”. Sobre as
pesquisas, a relação dos estudos considerados curiosos nos leva a refletir sobre as várias linhas de pesquisa
científica existentes e repensar nossos valores e julgamentos: apesar de inusitadas, essas investigações
são ou não são sérias? Contribuem ou não para o crescimento de seus campos científicos? Note que a
pesquisa sobre a garrafa de cerveja foi publicada em um periódico cuja temática se relaciona à Medicina
Legal e Forense. Nesse contexto, será que a pesquisa pode ser considerada inusitada?
Saiba mais:
Acesse a reportagem na íntegra clicando aqui.
Na atividade de avaliação é fundamental, portanto, que os avaliadores assumam a responsabilidade da análise
e busquem contribuir para o aperfeiçoamento do campo científico no qual se inserem. Busquem contribuir
também para a melhor apresentação do propósito do artigo à sociedade, pois realizar a avaliação com seriedade
beneficia tanto o autor quanto a revista e o próprio avaliador. Mas como isso se configura na prática?
Mais adiante, será detalhado como conduzir a avaliação de um artigo. Aqui, o propósito é ser mais reflexivo
sobre essa responsabilidade, pois a decisão sobre aprovar, ou não, um artigo científico é fácil quando seu
conteúdo é excelente ou, no extremo oposto, quando o texto possui uma péssima qualidade. Considerando,
contudo, que a maioria dos manuscritos se encontra em posição intermediária, a aceitação ou rejeição
devem ser decididas por meio de uma análise criteriosa, como Pereira (2011) bem nos lembra.
Em linhas gerais, esse autor considera que a realização de uma avaliação de qualidade consiste em examinar
se o texto está em condições de ser publicado por meio da análise do conteúdo e da forma de apresentação,
o que pode ser verificado pela observação de cinco itens:
Apresentação
O artigo está adequadamente apresentado? Trata-se da melhor forma de divulgar os resultados da
investigação? O delineamento é apropriado para investigar o tema e alcançar o objetivo proposto?
Relevância
O artigo cobre tema importante para os leitores do periódico? O periódico escolhido é o local certo para
publicá-lo? O tema é relevante, original e há um objetivo claro?
Originalidade
Trata-se de assunto pouco pesquisado? O artigo acrescenta algo ao conhecimento existente?
13
Validade
O trabalho está de acordo com os princípios, usualmente aceitos, de metodologia científica? O autor é
cuidadoso na parte metodológica? Seu material é de boa qualidade? A evidência e a interpretação
apresentadas são suficientemente sólidas para publicação? As técnicas foram apropriadamente descritas?
Há vieses que podem comprometer a credibilidade dos resultados? A análise dos dados é apropriada? A
interpretação é adequada? Os pontos centrais de uma discussão, inclusive limitações metodológicas, estão
contemplados? A conclusão está suficientemente embasada nos resultados, na sua correta interpretação e
em relação com o objetivo da pesquisa? Há sugestões para futuras pesquisas?
Legibilidade
O texto é legível? As informações estão devidamente apresentadas no artigo, nos locais em que deviam estar?
A redação permite entendimento claro do enunciado e está de acordo com as boas normas de linguagem?
Por fim, a qualidade da avaliação irá se traduzir também no relacionamento que o avaliador mantém com
os outros atores do processo. De acordo com o Manual ANPAD de Boas Práticas da Publicação Científica,
o avaliador deve adotar um tom positivo, cordial e construtivo na avaliação. Caso encontre falhas, essas
devem ser apontadas, indicando-se o que pode ser feito para saná-las. Para tanto, o avaliador deve usar
adjetivos encorajadores (tais como interessante, criativo e ambicioso, seguidos de expressões como: no
entanto, ainda existem lacunas…), pois se deve ter em mente que o autor, ao ter ciência do parecer, precisa
se sentir motivado a aperfeiçoar o texto. Assim, cabe ao avaliador, nesse processo, possibilitar aos autores
uma flexibilidade que lhes permita continuar escrevendo o artigo que querem escrever, sem perder sua
identidade e o entusiasmo em compartilhar suas descobertas.
14
Referências
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análise da possibilidade de tutela jurídica para criações intelectuais produzidas com
sistemas de inteligência artificial. Res Severa Verum Gaudium, v. 5, n. 1, Porto Alegre, p. 179-
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/www.seer.ufrgs.br/resseveraverumgaudium/article/
view/104664/58955.
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acadêmicos: plágio ou meta-autoria? Logeion: Filosofia da Informação, v. 3, n. 1, p. 89-107, 30
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/revista.ibict.br/fiinf/article/view/3012/2761.
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DESLANDES, Suely F.; SILVA, Antônio Augusto Moura. Revisão por pares: crise de demanda
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15
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Perspectiva, 2019. Disponível em https://blog.scielo.org/blog/2019/02/05/de-pareceristas-
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VASCONCELLOS, Vinicius Gomes. Editorial: Controle por pares e a função do revisor – premissas
e orientações para uma avaliação consistente. Rev. Bras. de Direito Processual Penal, Porto
Alegre, vol. 3, n. 2, p. 437-458, mai.-ago. 2017. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v3i2.70.
ZIMAN, John. Public knowledge: an essay concerning the social Dimension of science. Cambridge:
Cambridge University Press, 1968.
16
2.1 Aspectos éticos
Para abordar os aspectos éticos envolvidos no processo editorial, convém inicialmente pensar sobre o
significado da palavra Ética. A Enciclopédia Einaudi a define, baseado na filosofia anglo-saxônica, como a
“análise racional dos conceitos e juízos de valor, incluindo o modo como se pode determinar a validade dessas
asserções” (KOLAKOWSKI, 1997, p. 339). A Ética se ocupa das normas que regem ou deveriam reger as
relações de cada indivíduo com os outros, bem como com os valores implícitos no comportamento individual.
Unidade 2: A ética no processo editorial
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer os aspectos éticos necessários para agir em situações
de conflito.
Saiba mais:
Você sabia? Originária do grego ethos, a palavra Ética tem seu significado associado a
caráter, costume ou modo de ser. Os romanos traduziram esse termo para o latim mos,
que significa costume.
Tanto ethos (caráter) como mos (costume) indicam um tipo de comportamento
especificamente humano que, contudo, não é natural: o homem não nasce com ele como
se fosse um instinto, mas o adquire ou conquista por hábito. Nesse sentido, Ética, por sua
etimologia, diz respeito a uma realidade humana que é construída histórica e socialmente
a partir das relações coletivas dos seres humanos nas sociedades onde nascem e vivem.
Para acessar a fonte, clique aqui.
O que seria, então, um comportamento ético no tocante ao processo editorial? Quais as normas devem reger
as relações envolvidas nesse processo? Para subsidiar a reflexão sobre esse tema, Silva, Araujo e Paula (2020)
trazem uma abordagem que irá nortear os pontos a serem destacados nesse tópico. Segundo os autores,
A função da Ética não é dar uma resposta descritiva, compreensiva, explicativa para essas
questões fundas ao sentido último da vida e da condição humana, mas é constituir-se,
eternamente, em ser uma questão que se põe sobre o humano pelo próprio humano – porque
a Ética foi concebida para nos colocar limites, para tornar nossa vida social comportável e
suportável. (SILVA; ARAUJO; PAULA, 2020, p. 75)
17
Pensando, pois, na ética relacionada aos limites e ao respeito às normas de conduta de cada sociedade,
que são estabelecidas por uma convenção socialmente aceita, percebe-se que ela se conforma na ação das
pessoas. Nesse sentido, deve-se pensar na ética relacionada às atividades que compreendem o processo
editorial manifesta na ação de seus atores. Essa análise perpassa ações ligadas, por exemplo, à redação
autêntica de um manuscrito para publicação, à avaliação idônea do artigo elaborado para comunicar
achados inéditos de pesquisa, à responsabilidade em manter acessível o documento confiado à revista por
um autor, dentre outros.
Nesse tópico serão apresentados alguns aspectos éticos relacionados ao processo editorial sem ser,
contudo, de uma forma exaustiva. O intuito é pontuar questões que sirvam como norte para subsidiar
sua atuação enquanto avaliador de artigos científicos e o alerte para não atuar de modo conivente com a
situação apresentada.
A princípio, serão abordados os aspectos éticos ligados diretamente ao autor como a autocitação
excessiva, que pode ser considerada como uma forma de impactar índices de citação e não é vista como
um comportamento adequado a um pesquisador quando da elaboração de um texto científico.
A ocorrência de plágio na elaboração do texto, por sua vez, é um exemplo que implica não apenas uma
questão ética, mas também uma questão jurídica. Apesar da palavra plágio não constar do ordenamento
jurídico brasileiro, o artigo 108 da Lei de Direitos Autorais responsabiliza por danos morais quem utilizar
uma obra intelectual sem indicar a autoria (PITHAN; VIDAL, 2013). O plágio adota diferentes formas, como
pode ser visto a seguir. Além da cópia de texto alheio sem indicar a referência, constitui também como outro
tipo de plágio o envio do mesmo manuscrito a várias publicações, com o texto sendo publicado mais de uma
vez (SPINAK, 2013).
Plágio.
Fonte: adaptado de Spinak (2013, online).
Tipo Comentário
Parafrasear Expressar as mesmas ideias com outra palavras, que pode chegar
até a reescrita completa, mantendo as mesmas ideias.
Repetir pesquisa Repetir os dados usando uma mesma metodologia e resultados
similares sem se referir ao trabalho anterior.
Fonte secundária Uso de fonte secundária, como um metanálise, mas apenas cita
fontes primárias.
Duplicação Usa trabalho e dados de estudos prévios.
Verbatim Copia texto alheio sem destacá-lo (aspas, itálico, parágrafo recuado
etc.) e não indica a referência.
Colaboração não ética Pesquisadores que trabalham juntos não declaram e se citam
mutuamente (scratch each other’s backs).
Atribuição enganosa Não indicar todos os autores que participaram do manuscrito, negar
créditos a colaboradores.
Replicação Enviar o trabalho a várias publicações, onde o manuscrito é publicado
mais de uma vez.
Fonte válida A referência não existe, não é correta, ou não tem os dados completos.
Completo Copiar o manuscrito completo e enviá-lo em nome próprio.
18
Outro aspecto relacionado ao autor é a questão
do produtivismo, que também envolve um
ordenamento ético. Entendido como uma excessiva
valorização da quantidade da produção acadêmica,
associada a uma desconsideração quanto à
qualidade do conteúdo publicado, esse fenômeno
ocorre em decorrência do fato dos pesquisadores
serem avaliados por sua produtividade. Um dos
riscos associados a essa prática se relaciona ao
fato do produto final da pesquisa científica (ou
seja, a publicação) poder se transformar em um fim
em si mesmo e não no resultado do processo de
produção de conhecimento. Decorre também da
pressão por publicar e o risco dessa superprodução
“corroer” a noção de solidariedade acadêmica,
entendida como um compromisso mútuo entre
os pesquisadores que disponibilizam o seu tempo
e expertise voluntariamente na avaliação de
manuscritos elaborados por seus pares (PATRUS;
DANTAS; SHIGAKI, 2015). Essa prática também
fere os critérios que são elencados por Pendergast
(2007), segundo o qual a publicação de um artigo
deve observar três critérios fundamentais que são
analisados no processo de avaliação: rigor teórico,
rigor metodológico e contribuição de valor.
Uma questão ética que envolve não apenas os
autores, mas também editores e avaliadores está
relacionada ao conflito de interesses. A pesquisa
ser patrocinada por uma empresa que está sendo
analisada na investigação, por exemplo, pode
comprometer e enviesar os resultados. Tem-se,
portanto, que o conflito de interesse corresponde a
uma situação em que a objetividade do julgamento
é comprometida por interesse de terceiros.
No tocante ao conflito de interesses relacionado à
avaliação do artigo, deve-se atentar para que não
haja interferências externas na avaliação justa do
manuscrito. Conforme menciona Pereira (2011),
nem editor, nem avaliador podem ter envolvimento
que limitem a objetividade de suas decisões em
relação aos artigos submetidos à publicação.
Julgando-se impossibilitado de aceitar a revisão, o
avaliador deve declinar do convite.
Saiba mais:
Veja outros aspectos ligados às questões éticas, publicados pelo Committee on
Publication Ethics (COPE), clicando aqui.
Neste, consta um documento interessante que apresenta um diagrama de como agir, por
exemplo, se há suspeita de que uma publicação é redundante ou duplicada, ou de que
houve plágio em um manuscrito. O documento, em espanhol, está disponível aqui.
Questões éticas podem estar também associadas às responsabilidades com as funções exercidas no
processo editorial. No tocante ao editor do periódico, fundamentar a decisão mais no fator de impacto do
que no interesse dos leitores é considerado um comportamento inadequado. Conforme menciona Pereira
(2011, p. 539), “o editor deve basear suas decisões de seleção e avaliação do artigo na validade do trabalho
e na sua importância para os leitores da revista, e não no sucesso comercial da mesma”.
O avaliador de artigo científico no processo editorial também está sujeito a dilemas éticos no exercício de
sua atividade. Pereira (2011) destaca algumas situações que devem ser conduzidas com cautela:
19
Fraude e viés
A fraude é considerada um erro intencional que se materializa, desde a demora no parecer, uso indevido
da ideia original em proveito próprio, até o retardamento da publicação. Já o viés pode, por exemplo, se
externar em crítica agressiva por discordância, acadêmica ou não, com as ideias do autor.
Respeito ao estilo do autor
As modificações recomendadas devem respeitar o estilo do autor. Não é adequado que o avaliador
substitua ou acrescente nomes, expressões, frases, textos, conceitos e proposições por motivo de gostar
ou não gostar da redação.
Preconceito editorial
Acontece, por exemplo, quando o avaliador tem posição favorável sobre a qualidade do artigo, antes de lê-
lo, e ele age motivado apenas pela inspeção superficial do texto, influenciado pelo idioma do artigo e local
de realização da pesquisa. Isso pressupõe, portanto, dar crédito antecipado a certos grupos, como aqueles
mais produtivos em termos científicos, e ser desfavorável a outros, de autores de regiões e locais menos
tradicionais em pesquisas científicas. Conforme destaca Pereira (2011):
É o que tem sido relatado sobre a conduta de editores e revisores de periódicos, ditos
internacionais, em relação a autores de nações periféricas. Há um inerente preconceito na
mente de alguns revisores com respeito a artigos de autores de países em desenvolvimento.
Algo assim: “Uma boa pesquisa não pode ter vindo de país em desenvolvimento”. O mesmo
tipo de preconceito apontado entre países também pode ocorrer no interior de um país: de
uma determinada região do Brasil, em face de trabalhos provenientes de outras regiões,
dos investigadores da capital em relação aos do interior, de uma instituição maior para uma
menor, de entidades públicas em relação às privadas e assim por diante.
Interesses corporativos
Muitos periódicos científicos são criados para dar vazão à produção da própria instituição ou de grupos
restritos de pesquisadores. Assim, as submissões do grupo e das pessoas próximas precisam ser aceitas
para que a instituição que representam seja bem cotada no processo, sendo que é exigido, aos demais
autores, o rigor da perfeição. Esse corporativismo constitui uma forma de desonestidade com a comunidade
científica por privilegiar algumas pessoas a outras, que têm as suas chances de publicação diminuídas ou
cortadas.
Interesses pessoais
Os avaliadores não devem usar o conhecimento do trabalho submetido, antes da publicação para favorecer
interesses próprios, e nem a equipe editorial deve usar as informações obtidas no trabalho para ganhos
particulares. Exemplo de atitude antiética é o avaliador recomendar recusa do original e utilizar a ideia
ou protelar a revisão por longo tempo, e, nesse ínterim, utilizar os dados para publicar artigo científico de
própria autoria.
20
Incapacidade do avaliador
Acontece quando o material é recusado por evidente desconhecimento do avaliador e do editor sobre
o tema, o método ou a forma de comunicação científica. Mas também pode ocorrer quando o artigo é
recusado para publicação porque o autor apontou limitações na investigação. Sobre essa última questão,
alertamos para o fato de que, nos bons periódicos, indicar as limitações da pesquisa e debatê-las constitui
aspecto positivo e, dentro de certos limites, não se configura como motivo para recusa do artigo.
Com esse tópico, você termina o estudo do conteúdo selecionado para esta unidade. Vamos fazer uma
verificação de como foi sua aprendizagem? Execute as atividades disponibilizadas a seguir e veja se você
compreendeu os principais pontos desenvolvidos. Qualquer dúvida, retorne ao texto!
21
Referências
BRAGA, Maria Elisa Rangel. Como escrever artigo científico. 2013. Disponível em
http:/
/aai.bireme.org/wp-content/blogs.dir/2/files/2013/08/Como-avaliar-artigo-
cientifico_2013.pdf
COLEÇÃO Os Pensadores. Os Pré-socráticos. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
FERREIRA, Manuel A.; CANELA, Renata; PINTO, Cláudia F. O processo editorial nos periódicos
e dicas para a publicação. Revista de Gestão e Secretariado, São Paulo, v. 5, n. 2, p. 01-22,
mai./ago. 2014. https:/
/www.revistagesec.org.br/secretariado/article/view/307.
GOMES, Valdir Pereira. O editor de revista científica: desafios da prática e da formação. Inf.
Inf., Londrina, v.15, n.1, p.147-172, jan./jun.2010. DOI 10.5433/1981-8920.2010v15n1p147
GONÇALVES, Jonas Rodrigo; COSTA, Danilo; GONÇALVES, João Carlos. Cumprimento dos
critérios Qualis periódicos no intuito de se configurar como uma revista acadêmica de
qualidade. Revista JRG de Estudos Acadêmicos, [S. l.], v.2, n.5, p.01–14, 2019. Disponível em:
http:/
/revistajrg.com/index.php/jrg/article/view/143.
GONDIM, Sonia. A face oculta do parecerista: Discussões éticas sobre o processo de
avaliação de mérito de trabalhos científicos. Organizações e Sociedade, 11(31), 195-199. 2004.
Disponível em https:/
/periodicos.ufba.br/index.php/revistaoes/article/view/10716
KOLAKOWSKI, Leszek. Ética: conceito, filosofia/filosofias. In: Enciclopédia Einaudi. v. 37. 1997.
PATRUS, Roberto; DANTAS, Douglas Cabral; SHIGAKI, Helena Belintani. O produtivismo
acadêmico e seus impactos na pós-graduação stricto sensu: uma ameaça à solidariedade
entre pares? Cad. EBAPE.BR, v. 13, nº 1, artigo 1, Rio de Janeiro, Jan./Mar. 2015. Disponível
em: https://www.scielo.br/j/cebape/a/HL7xXqvSVnf43TjFfQ4NVwt/?lang=pt&format=pdf.
PENDERGAST, Gerard. The art of reviewing. International Journal of Advertising, v. 26, n. 2,
p. 277-280, 2007
PEREIRA, Maurício Gomes. Artigos científicos: como redigir, publicar e avaliar. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan; 2011.
PHELAN, Steven.; FERREIRA, Manuel Aníbal S. P. Vasconcelos.; SALVADOR, Rommel. The
first twenty years of the Strategic Management Journal: 1980-1999. Strategic Management
Journal, v. 23, p. 1161-1168, 2002.
PINHO, José Antônio Gomes. Brevíssimo manual do editor: Considerações sobre submissão
e avaliação de artigos, o papel dos pareceristas e do editor de revistas científicas.
Organizações e Sociedade, 12(34), 169-173, 2005. Disponível em https:/
/periodicos.ufba.br/
index.php/revistaoes/article/view/10798/7746.
22
Referências
PITHAN, Lívia Haygert; VIDAL, Tatiane Regina Amando. O plágio acadêmico como um
problema ético, jurídico e pedagógico Direito & Justiça v. 39, n. 1, p. 77-82, jan./jun. 2013.
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leone/trabalho_ferias_julho_01_04.pdf.
REGIS, Fátima. Memória e esquecimento na Grécia Antiga: da complementaridade à
contradição. Logos, [S.l.], v. 4, n. 2, p. 20-24, jan. 2015. ISSN 1982-2391. Disponível em: https:/
/
www.academia.edu/2567478/Mem%C3%B3ria_e_Esquecimento_na_Gr%C3%A9cia_
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RODRIGUES, Camila Martins; SANTOS, Gildenir Carolino. A importância e o impacto da
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RODRIGUES, Rosângela Schwarz; QUARTIERO, Emanoel; NEUBERT, Patrícia. Periódicos
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ROSINHA, Raul C. Política editorial, aspectos a considerar. R. Biblioteconomia. Brasília,
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SCIELO. Critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos
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SERRA, Fernando A. Ribeiro; FERREIRA, Manuel Portugal. Proposta de um Modelo para o
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14, N.1. Janeiro/Março. 2015.
SERRA, Fernando A. Ribeiro; FIATES, Gabriela Gonçalves; FERREIRA, Manuel Portugal. Publicar
é difícil ou faltam competências? O desafio de pesquisar e publicar em revistas científicas na
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doi.org/10.1590/S1678-69712008000400004.
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Anastácio. O Fyborg e a ética da informação ou os limites de uma ética antropocêntrica.
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DOI: 10.35699/2316-770X.2020.29154. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/
revistadaufmg/article/view/29154.
23
Referências
SPINAK, Ernesto. Ética editorial e o problema do plágio [online]. SciELO em Perspectiva, 2013. Disponível
em https://blog.scielo.org/blog/2013/10/02/etica-editorial-e-o-problema-do-plagio
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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO. Caderno de
formação: formação de professores: educação cultura e desenvolvimento. v. 3. São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2010. Disponível em: http://www.acervodigital.unesp.br/handle/123456789/192
TRZESNIAK, Piotr. Cargos e funções associados à publicação científica: uma proposta de
nomenclatura. In: X Curso de editoração científica. Petrópolis, RJ: Associação Brasileira de
Editores Científicos, 2001
TRZESNIAK, Piotr. A estrutura editorial de um periódico científico. In: A. A. Z. P. Sabadini,M.
I. C. Sampaio, & S. H. Koller (Orgs.), Publicar em psicologia: um enfoque para a revista
científica (pp. 87-102). São Paulo: Associação Brasileira de Editores Científicos de Psicologia;
Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. 2009. Disponível em https://www.
researchgate.net/publication/233401784_A_estrutura_editorial_de_um_periodico_
cientifico?channel=doi&linkId=0912f50a40e800bf67000000&showFulltext=true
WEITZEL, Simone da Rocha. Os repositórios de e-prints como nova forma de organização
da produção científica: o caso da área das Ciências da Comunicação no Brasil. 2006. Tese
(Doutorado em Cultura e Informação) - Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2006. doi:10.11606/T.27.2006.tde-14052009-133509.
WEITZEL, Simone da Rocha. Fluxo da informação científica. In POBLACIÓN, Dinah Aguiar;
WITTER, Geraldina Porto; SILVA, José Fernando Modesto. Comunicação & produção científica:
contexto, indicadores e avaliação. Organizador. São Paulo: Angellara, 2006
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  • 2. 2 Enap Escola Nacional de Administração Pública Enap, 2021 SAIS - Área 2-A -70610-900 - Brasília, DF Conteudista: Claudio Paixão Anastácio de Paula (conteudista, 2021); Eliane Pawlowski de Oliveira Araújo (conteudista, 2021); Fernanda Oliveto (conteudista, 2021); Keila Rêgo Mendes (conteudista, 2021); Diretoria de Desenvolvimento Profissional.
  • 3. 3 Sumário Unidade 1: O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico?..........................4 1.1 Por que ser avaliador?.................................................................................................................................... 4 1.2 Competências necessárias ao perfil do avaliador................................................................................. 8 1.3 Requisitos para uma avaliação de qualidade........................................................................................10 Referências..............................................................................................................................................................14 Unidade 2: A ética no processo editorial.............................................................................. 16 2.1 Aspectos éticos..............................................................................................................................................16 Referências..............................................................................................................................................................21
  • 4. 4 1.1 Por que ser avaliador? O papel do avaliador é tão estratégico no processo editorial que, sem sua participação, o atual sistema de publicações corre o risco de colapsar. Essa observação é importante, pois o número de periódicos científicos tem crescido nos últimos anos e depende do trabalho voluntário de pesquisadores para avaliarem os manuscritos. Um panorama desse cenário pode ser visto na pesquisa sobre revisão por pares feita pelo Publons, principal plataforma de revisão acadêmica, publicada em 2018, que ouviu mais de 11 mil pesquisadores de vários países. Segundo a pesquisa, os editores estão enviando mais convites para avaliação do que há cinco anos e foi detectada a existência de uma “fadiga crescente de pareceristas”, de modo que os editores precisam convidar mais avaliadores para que cada revisão seja realizada (SPINAK, 2019). Resultado da pesquisa realizada pelo Publons: Unidade 1: O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico? Objetivo de aprendizagem Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer o perfil de avaliador de artigo científico, identificando as vantagens pessoais e profissionais que a função traz e as competências necessárias para desempenhar a função. Neste módulo, serão apresentadas para você as vantagens de ser avaliador e as competências necessárias ao perfil, além de reconhecer aspectos éticos para agir em situações de conflito. O módulo 3 está estruturado da seguinte forma: O avaliador MÓDULO 3 • Unidade 1 – O que é preciso para ser um avaliador de artigo científico? • Unidade 2 – A ética no processo editorial • Horas dedicadas à avaliação global por ano – 68,5 milhões. • Mediana do tempo de avaliação – 16,4 dias. • Mediana do tempo dedicado a escrever cada avaliação – 5 horas. • 10% dos pareceristas são responsáveis por 50% das avaliações. • Para 75% dos editores de periódicos a parte mais difícil é encontrar pareceristas dispostos. • 42% dos pesquisadores rejeitam a solicitação de avaliação por estarem muito ocupados. • 39% dos pareceristas nunca receberam capacitação sobre avaliação por pares.
  • 5. 5 É o avaliador quem auxilia os editores a decidirem se publicam, ou não, o manuscrito e assegura que os melhores trabalhos sejam publicados, contribuindo para a qualidade do produto final que é a sua disponibilização dentro de uma publicação científica para acesso pela sociedade. Sua função, conforme destaca Rodrigues, Quartiero e Neubert (2015), implica o julgamento de um manuscrito e elaboração de um parecer sobre ele, que traduz a recomendação de aceitação ou rejeição do material baseada em uma argumentação fundamentada, a qual constitui o referencial para subsidiar a tomada de decisão do editor. A presença do avaliador no processo editorial indica que houve uma avaliação crítica dos manuscritos submetidos ao periódico, feita por um especialista, e pressupõe que foram observados princípios de idoneidade na seleção e publicação do material. De acordo com Vasconcellos (2017), o avaliador possui duas funções primordiais no processo editorial: O processo de avaliação realizado por pares, no qual se insere o trabalho do avaliador, em geral, é bem-visto pela comunidade acadêmica. Helena Shigaki e Roberto Patrus, ao relatarem duas pesquisas realizadas sobre esse tema, verificaram que essa modalidade é avaliada positivamente pela maioria dos pesquisadores: Os autores, entretanto, ao analisarem a literatura da área, verificaram também a existência de argumentos contrários à revisão por pares, o que demonstra que o exercício dessa atividade precisa passar por constantes reflexões e discussões visando seu aprimoramento. Entre esses argumentos estão: tempo e atraso na publicação, abuso de poder, parcialidade, subjetividade, preconceito, julgamentos inadequados ou inconsistentes, competição, desprezo e falta de sigilo. Saiba mais: Acesse outras análises relativas a essa pesquisa, trazidas por Ernesto Spinak, clicando aqui. • é responsável por auxiliar o editor na avaliação e seleção dos manuscritos submetidos ao periódico (gatekeeping role); e • auxilia o autor a melhorar seu trabalho por meio de críticas construtivas. Em uma pesquisa realizada por Ware (2008), com 3.040 entrevistados, constatou-se que 93% concordam que a revisão por pares seja necessária, 85% concordam que ela ajuda a melhorar a comunicação científica e, ainda, 83% acreditam que, sem a revisão por pares, não haveria controle. Em outro estudo, realizado por Mulligan, Hall e Raphael (2013), com 4.037 entrevistados, 69% diziam estar satisfeitos com o atual sistema e 94% concordam que a crescente melhoria da qualidade dos artigos publicados se deve ao processo de revisão por pares. (SHIGAKI, PATRUS, 2016, p.110-111)
  • 6. 6 Saiba mais: Você sabia? Uma iniciativa que pode minimizar alguns dos aspectos negativos da avaliação de artigos científicos pode ser vista na utilização do Publons. De acesso gratuito, a plataforma foi criada para registrar a contribuição dos avaliadores encorajando-os a postar online suas experiências. Segundo Andrew Preston, um dos seus criadores, a revisão por pares é um trabalho especializado que é descartado logo após a publicação do artigo. A finalidade do Publons, portanto, é reunir e armazenar esse conteúdo, promovendo discussões, evitando o “desperdício” de ideias, sugestões e comentários feitos no processo de avaliação. Dessa forma, a revisão por pares poderia ser vista como uma espécie de produção científica, assim como as publicações e citações. (NASSI-CALÒ, 2015) O sistema de avaliação por pares será visto mais adiante, quando você reconhecer os tipos de avaliação e compreender, em detalhes, o processo avaliativo. Importante destacar, por ora, que essa modalidade não é exclusiva dos processos editoriais científicos. Como menciona Vasconcellos (2017): […] o controle por pares é um mecanismo de avaliação de trabalhos científicos utilizado em diversos meios, não só em periódicos científicos, mas também nos próprios programas de pós-graduação (bancas de mestrado, doutorado, etc.) e em análises para concessões de financiamentos por órgãos de fomento, por exemplo. Trata-se de “um processo baseado na premissa de que os revisores são indivíduos competentes na área do artigo que avaliam, que são independentes, objetivos e que dedicam seu melhor esforço à avaliação”. Ou seja, parte- se da ideia de que os pares (especialistas na mesma área) dos próprios autores dos artigos têm competências científicas e técnicas para analisar criticamente os elementos formais e substanciais das pesquisas que se pretende divulgar ao meio acadêmico e à sociedade. Assim, assegura-se à publicação um “selo de certificação, sinalizando que o trabalho foi escrutinado pelos pares”. (VASCONCELLOS, 2017, p. 439) A importância dos avaliadores no processo de publicação de artigos científicos pode ser vista também por desencadear a criação de um círculo virtuoso: quando se tem um alto crivo de qualidade pelos avaliadores na seleção dos manuscritos, a qualidade dos artigos publicados se torna alta, o que faz com que o periódico também reflita essa qualidade e atraia o interesse de bons pesquisadores para a publicação de seus achados de pesquisa naquela revista. Um gargalo que existe nesse círculo é que a relevante atividade exercida pelo avaliador no processo editorial de um periódico científico tem caráter voluntário, não havendo recebimento de pró-labore ou outro tipo de remuneração pelo seu exercício. Esse fator gera uma série de consequências no processo editorial, já que esse irá depender da predisposição do pesquisador em assumir tal encargo. Há de se destacar, todavia, a existência de outros aspectos que são responsáveis por motivar um pesquisador a assumir essa função, que não seja uma retribuição financeira.
  • 7. 7 Diante desse cenário, é comum pensar: mas o que o avaliador ganha com essa função? A motivação para atuar como avaliador pode vir de diferentes situações. Há fatores ligados ao currículo, já que os editores certificam a participação do pesquisador na atividade, o que pode corresponder a algumas linhas a serem inseridas no currículo Lattes. Há o aspecto do prestígio que isso traz ao jovem pesquisador ao ter essa atividade constando no rol das suas realizações acadêmicas. Também pode haver algo relacionado à satisfação de cunho pessoal ou algum aspecto subjetivo particular de cada indivíduo. É possível, ainda, observar a existência de outros motivos para que o pesquisador assuma essa tarefa. Vasconcellos (2017, p. 441), por exemplo, cita quatro razões para que uma pessoa atue como avaliador de periódicos científicos: “fazer a sua parte na comunidade acadêmica”, “apreciar ajudar no aprimoramento dos artigos”, “gostar de ter contato com os estudos antes de sua publicação” (ou seja, conhecer o que está sendo produzido nas pesquisas de ponta antes da divulgação ampla) e “retribuir as avaliações feitas por outros pareceristas aos próprios trabalhos”. Esse sentimento de retribuição é um aspecto relevante nessa atividade que tem demandado cada vez mais novos pesquisadores em função do grande volume de publicações. Conforme mencionado por Nassi-Calò (2015), a motivação imposta pela cultura “publish or perish” da ciência tem contribuído para o expressivo aumento do número de artigos: “o periódico de acesso aberto PLoS ONE, por exemplo, publicou mais de 105 mil artigos desde 2006, e o publisher Frontiers, mais de 20 mil desde 2007. Se cada artigo for avaliado por dois pareceristas, isso representa mais de 250 mil pareceristas apenas para esses publishers.” (NASSI-CALÒ, 2015). Também Silva (2018), ao elencar aspectos motivadores para o trabalho como avaliador, menciona a reciprocidade como fator motivador. Para esse autor, quando o serviço é orientado pela reciprocidade, a participação dos avaliadores pode desempenhar um papel de autorrealização. Nesse aspecto das recompensas individuais – e não institucionais como as que foram apresentadas até agora – outras motivações podem ser elencadas, pois o processo de avaliação possibilita ao avaliador desenvolver suas próprias habilidades como pesquisador e autor ao avaliar trabalhos científicos de terceiros, assim como ganhar experiência na atividade ao desenvolver conhecimento técnico sobre o processo se tornando um sujeito mais capacitado. Esse último perpassa a habilidade de poder aprimorar seu próprio trabalho pelo aguçamento do seu senso crítico. Conforme mencionam Deslandes e Silva (2013), a avaliação de um artigo científico, devido à sua característica da revisão realizada por pares: se aproxima do que a vertente antropológica maussiana1 denomina de dom ritual, um sistema de trocas que se alicerça na tríade dar-receber-retribuir. Esse sistema, mais do que fazer circular dádivas, materializadas como bens ou serviços, estabelece vínculos (de amizade ou de rivalidade), obrigações e dívidas ético-morais. A dádiva ofertada ao outro estabelece a oportunidade deste também exercitar o dom, demarcando um pertencimento àquela rede de sociabilidade e uma afirmação de sua persona. (DESLANDES; SILVA, 2013, p. 421)
  • 8. 8 1.2 Competências necessárias ao perfil do avaliador Conforme já mencionado, um dos ganhos que se obtêm da atividade de avaliador é a possibilidade de desenvolver conhecimento técnico do processo pela experiência na atividade. Esse aspecto é muito importante quando se fala de competências, porque o fato de ser pesquisador e autor não implica, necessariamente, em ser um bom avaliador. Ninguém nasce avaliador. Não há nada de místico no exercício dessa atividade que lhes faça acordar um dia como excelentes pareceristas sobre determinado tema. Tampouco serão guiados por intuições que lhes falarão se o texto é fruto de plágio, apresenta coerência metodológica ou contribuição relevante para a área. Algumas competências necessárias para um bom desempenho nessa atividade podem ser oriundas de características pessoais, enquanto outras podem ser aprendidas tanto pela experiência quanto pela participação em capacitações específicas para o exercício da função. Oprimeiroaspectoimportanteaserressaltadoéqueascompetênciascorrespondemaumtripécompostoportrês dimensões – conhecimento, habilidade e atitude – relacionadas não somente aos aspectos técnicos, mas também cognitivos, necessários ao bom desempenho de uma atividade. Conforme Santos (2011, p. 370) especifica: O conhecimento corresponde a uma série de informações assimiladas e estruturadas pelo indivíduo, que lhe permite entender o mundo, ou seja, trata-se da dimensão do saber. A habilidade, por sua vez, está associada ao saber-fazer, ou seja, corresponde à capacidade de aplicar e fazer uso produtivo do conhecimento adquirido e utilizá-lo em uma ação com vista ao alcance de um propósito específico. Finalmente, a atitude é a dimensão do querer-saber-fazer, que diz respeito aos aspectos sociais e afetivos relacionados ao trabalho. As três dimensões da competência estão interligadas e são interdependentes. (SANTOS, 2011, p. 370, grifos nossos) Esse entendimento deve ser acrescido dos aspectos levantados por Brandão (2009), para quem a competênciaincorporatambémoscomportamentosadotadosnaexecuçãodastarefas.Assim,acompetência englobaria, na atividade de avaliador, por exemplo, não apenas o conhecimento sobre determinado tema, a capacidade de sugerir uma correção adequada no texto e a vontade de contribuir para que o artigo fique adequado à publicação, mas, também, aspectos ético-comportamentais relacionados à confidencialidade, honestidade, cortesia e profissionalismo. Conhecimento Habilidade Competências Atitude Competências: CHA. Fonte: CEPED/UFSC (2021).
  • 9. 9 Nessesentido,sãoesperadasdeumbomavaliadordeterminadascompetências,quevãodesdeocumprimento de prazos e objetividade na análise até o conhecimento de ferramentas tecnológicas que auxiliam na avaliação, como, ainda, imparcialidade, análises sem preconceitos ou prejulgamentos que possam implicar desprezo pelo trabalho ou abuso de poder ao decidir pela publicação ou não do manuscrito. Com base nesses elementos, podemos elencar algumas características que identificam um bom avaliador, na visão de Maurício Pereira. Segundo esse autor, o bom avaliador é aquele que está disposto a colaborar na avaliação e na melhoria do manuscrito que será por ele analisado. Emtermosideais,precisasercompetentenaáreadequetrataoartigoeemmetodologiacientífica. É conveniente que disponha de base sólida de conhecimentos sobre delineamento de pesquisas e análisededados.Tambémdeveestarfamiliarizadocomavaliaçãodoefeitodoacasoeidentificação de vieses. O trabalho do revisor é assinalar eventuais falhas e sugerir formas de aperfeiçoar o texto. Se possível, fornecer comprovações para as afirmações que faz. O bom revisor é pontual e cortês. Exerce papel de educador, quando a situação assim o requerer, emitindo comentários construtivos e sugestões para melhorar a apresentação do artigo. (PEREIRA, 2011, p. 544) é o que não responde prontamente às demandas ou formula parecer em termos pejorativos. Também, aqueles que apenas anotam suas observações em termos telegráficos, sem mais explicações: “Está bom”. “Pode publicar, eu conheço os autores, eles são muito bons”. “Está ruim, quem escreveu não entende nada de metodologia científica”. Ou então, as anotações se resumem a pontos de interrogação nas margens do texto, sem assinalar quais as falhas detectadas e as recomendações correspondentes. Pareceres desse quilate são pouco úteis para o autor do artigo e para o editor do periódico, pois não fornecem subsídios que auxiliem a comunicação entre eles e a melhoria do texto. Um procedimento, também indesejável, é a erudição excessiva. (PEREIRA, 2011, p. 544) Na mesma linha, o autor elenca as características não desejáveis a um avaliador. Na descrição de Pereira (2011, p. 544), o avaliador que deixa a desejar:
  • 10. 10 Ampliando a análise dessa perspectiva, o autor apresenta uma classificação para os avaliadores baseada na articulação de dois conceitos: competência e dinamismo: Tipos de revisor classificados segundo competência e dinamismo. Fonte: Adaptado de Pereira (2011, p. 571). De acordo com essa classificação, o avaliador preparado dinâmico seria aquele que executa bem o trabalho de avaliação e o faz com rapidez. Já o Preparado Apático corresponderia ao avaliador que emite pareceres breves, embora acertados e tem como ponto vulnerável a tendência à procrastinação. Na linha dos avaliadores despreparados, o despreparado apático seria aquele que demora em responder as demandas do editor e, quando o faz, peca pela incompetência. Por vezes, nem responde as demandas. Já o avaliador despreparado dinâmico atenderia com rapidez e fluência as solicitações do editor, mas opinaria sem base científica e, não raramente, utilizaria de uma “linguagem empolada” que dificultaria a compreensão do parecer pelo autor e editor. Veja você que coisa interessante! Pereira (2011) destaca que os avaliadores preparados dinâmicos podem vir a mudar de categoria, tornando-se apáticos, se forem sobrecarregados com solicitações de emissão de numerosos pareceres. Essa sobrecarga pode implicar a elaboração de uma análise superficial e confecção de um parecer sem o nível de acurácia e contribuição adequados e esperados. 1.3 Requisitos para uma avaliação de qualidade “[..] a reputação de um pesquisador se constrói não só pela qualidade dos seus artigos, mas também pela qualidade da sua revisão nos textos dos pares”. (DESLANDES, SILVA, 2013) Para Suely Deslandes e Antônio Silva, a revisão por pares é essencial para se produzir ciência de qualidade, sendo essa tarefa vista como uma atividade científica. Mas o que se pode considerar como uma avaliação de qualidade? Propõe-se a responder a essa pergunta com outra pergunta: para que se avalia um artigo científico? Avalia- se para referendar, ou não, que seu conteúdo está relacionado a uma investigação que observou a aplicação de métodos e técnicas de forma coerente, baseou-se em referencial teórico consistente, trouxe contribuição para a comunidade científica e para a sociedade e expressa o trabalho de pesquisadores interessados em aprimorar um campo científico. Então, uma avaliação que busque ressaltar essas questões pode ser considerada uma avaliação de qualidade.
  • 11. 11 Este deve ser o norte do trabalho que o avaliador se propõe a desenvolver: garantir que, no texto analisado, esses elementos estejam presentes, constituindo essa tarefa como a contribuição para o processo de comunicação científica e fortalecimento da ciência. Ao proceder assim, o avaliador atestará que aquele conteúdo é um conteúdo confiável, colocando o aval junto à produção de pessoas que não se sabe quem são, mas certos da seriedade daquilo que elas falam por meio do seu texto porque foi analisada e certificada sua validade. Dessa forma, para garantir que o objetivo ao analisar um artigo seja atendido, o avaliador deve se valer de algumas orientações para não perder a finalidade maior do processo; senão, corre-se o risco de fazer a avaliação pela avaliação. E isso é mais comum do que se imagina. Recebe-se o documento, pega-se as diretrizes da revista, faz-se um checklist, elabora-se um relatório e está pronta a avaliação. Temerário, não?! Nesse aspecto, o primeiro passo para realizar uma avaliação de qualidade é a percepção da sua responsabilidade no processo. O editor confiou a você um manuscrito, e será o seu parecer (e o do outro avaliador, visto que a avaliação normalmente envolve mais de um parecerista) que irá dizer se aquele documento é adequado para ser divulgado por aquele periódico. Retoma-se aqui a reflexão sobre a influência da Inteligência Artificial no processo editorial, destacando seu impacto, agora, na avaliação dos artigos científicos. A reportagem “Máquina de criar artigos expõe fragilidade da academia”, publicada no site Questão de Fato, em junho de 2021, destaca a preocupação de pesquisadores com a fragilidade do sistema de controle de qualidade dos periódicos e suas nefastas consequências, principalmente quando a falta de rigor possibilita a publicação de artigos que impactam a saúde pública com informações inverídicas. “Para muitos cientistas, o aumento das fraudes nos artigos está ligado às falhas da revisão por pares [...]” (SILVEIRA, 2021). Saiba mais: Acesse a reportagem na íntegra clicando aqui. Além de casos em que os artigos científicos apresentaram conteúdo de “trollagem” (gíria de internet relacionada à zombaria), há também publicações com temas de pesquisa inusitados. Esse tipo de artigo despertou a atenção dos pesquisadores Meredith Carpenter e Lillian Fritz-Laylin, do Departamento de Biologia Molecular da Universidade de Berkeley, que criaram um depósito virtual com artigos científicos curiosos. Faz parte desse acervo um estudo que verificou se as garrafas de cerveja litro cheias são mais ou menos resistentes que as vazias, podendo servir como instrumentos perigosos em uma disputa física e fraturar o crânio humano. Nesse estudo, conforme relato da investigação publicado em outubro de 2009 no Journal of Forensic and Legal Medicine, foram testadas as propriedades do vidro jogando as garrafas de uma torre. A constatação de que as garrafas cheias quebraram em uma energia de impacto de 30 J (mais de 3 kg), enquanto as vazias estouraram em 40 J (mais de 4 kg) demonstraram que essas energias realmente ultrapassam o limite de fratura mínima do crânio humano, podendo ser perigosas em uma briga.
  • 12. 12 A reportagem sobre o tema nos aponta outro tipo de reflexão, a começar pelo título da matéria, que carrega uma depreciação das pesquisas selecionadas ao chamá-las de “publicações científicas absurdas”. Sobre as pesquisas, a relação dos estudos considerados curiosos nos leva a refletir sobre as várias linhas de pesquisa científica existentes e repensar nossos valores e julgamentos: apesar de inusitadas, essas investigações são ou não são sérias? Contribuem ou não para o crescimento de seus campos científicos? Note que a pesquisa sobre a garrafa de cerveja foi publicada em um periódico cuja temática se relaciona à Medicina Legal e Forense. Nesse contexto, será que a pesquisa pode ser considerada inusitada? Saiba mais: Acesse a reportagem na íntegra clicando aqui. Na atividade de avaliação é fundamental, portanto, que os avaliadores assumam a responsabilidade da análise e busquem contribuir para o aperfeiçoamento do campo científico no qual se inserem. Busquem contribuir também para a melhor apresentação do propósito do artigo à sociedade, pois realizar a avaliação com seriedade beneficia tanto o autor quanto a revista e o próprio avaliador. Mas como isso se configura na prática? Mais adiante, será detalhado como conduzir a avaliação de um artigo. Aqui, o propósito é ser mais reflexivo sobre essa responsabilidade, pois a decisão sobre aprovar, ou não, um artigo científico é fácil quando seu conteúdo é excelente ou, no extremo oposto, quando o texto possui uma péssima qualidade. Considerando, contudo, que a maioria dos manuscritos se encontra em posição intermediária, a aceitação ou rejeição devem ser decididas por meio de uma análise criteriosa, como Pereira (2011) bem nos lembra. Em linhas gerais, esse autor considera que a realização de uma avaliação de qualidade consiste em examinar se o texto está em condições de ser publicado por meio da análise do conteúdo e da forma de apresentação, o que pode ser verificado pela observação de cinco itens: Apresentação O artigo está adequadamente apresentado? Trata-se da melhor forma de divulgar os resultados da investigação? O delineamento é apropriado para investigar o tema e alcançar o objetivo proposto? Relevância O artigo cobre tema importante para os leitores do periódico? O periódico escolhido é o local certo para publicá-lo? O tema é relevante, original e há um objetivo claro? Originalidade Trata-se de assunto pouco pesquisado? O artigo acrescenta algo ao conhecimento existente?
  • 13. 13 Validade O trabalho está de acordo com os princípios, usualmente aceitos, de metodologia científica? O autor é cuidadoso na parte metodológica? Seu material é de boa qualidade? A evidência e a interpretação apresentadas são suficientemente sólidas para publicação? As técnicas foram apropriadamente descritas? Há vieses que podem comprometer a credibilidade dos resultados? A análise dos dados é apropriada? A interpretação é adequada? Os pontos centrais de uma discussão, inclusive limitações metodológicas, estão contemplados? A conclusão está suficientemente embasada nos resultados, na sua correta interpretação e em relação com o objetivo da pesquisa? Há sugestões para futuras pesquisas? Legibilidade O texto é legível? As informações estão devidamente apresentadas no artigo, nos locais em que deviam estar? A redação permite entendimento claro do enunciado e está de acordo com as boas normas de linguagem? Por fim, a qualidade da avaliação irá se traduzir também no relacionamento que o avaliador mantém com os outros atores do processo. De acordo com o Manual ANPAD de Boas Práticas da Publicação Científica, o avaliador deve adotar um tom positivo, cordial e construtivo na avaliação. Caso encontre falhas, essas devem ser apontadas, indicando-se o que pode ser feito para saná-las. Para tanto, o avaliador deve usar adjetivos encorajadores (tais como interessante, criativo e ambicioso, seguidos de expressões como: no entanto, ainda existem lacunas…), pois se deve ter em mente que o autor, ao ter ciência do parecer, precisa se sentir motivado a aperfeiçoar o texto. Assim, cabe ao avaliador, nesse processo, possibilitar aos autores uma flexibilidade que lhes permita continuar escrevendo o artigo que querem escrever, sem perder sua identidade e o entusiasmo em compartilhar suas descobertas.
  • 14. 14 Referências AMARAL, Ana Clara Sampaio Guedes. A inteligência artificial e o Direito do Autor: uma análise da possibilidade de tutela jurídica para criações intelectuais produzidas com sistemas de inteligência artificial. Res Severa Verum Gaudium, v. 5, n. 1, Porto Alegre, p. 179- 198, out. 2020. Disponível em https:/ /www.seer.ufrgs.br/resseveraverumgaudium/article/ view/104664/58955. ARAÚJO, Marcelo. O uso de inteligência artificial para a geração automatizada de textos acadêmicos: plágio ou meta-autoria? Logeion: Filosofia da Informação, v. 3, n. 1, p. 89-107, 30 set. 2016. Disponível em http:/ /revista.ibict.br/fiinf/article/view/3012/2761. BRAGA, Maria Elisa Rangel. Como escrever artigo científico. 2013. Disponível em http:/ /aai.bireme.org/wp-content/blogs.dir/2/files/2013/08/Como-avaliar-artigo- cientifico_2013.pdf. BRANDÃO, Hugo Pena. Aprendizagem, Contexto, Desempenho e Competência: um Estudo Multinível. Tese (Doutorado em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações). Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações – PGPSTO, Universidade de Brasília, Brasília. 2009. DESLANDES, Suely F.; SILVA, Antônio Augusto Moura. Revisão por pares: crise de demanda ou mudança de valores? Editorial. Cad. Saúde Pública 29 (3), Mar 2013. https:/ /doi. org/10.1590/S0102-311X2013000300001. NASSI-CALÒ, Lilian. Artigo analisa a saturação dos revisores por pares [online]. SciELO em Perspectiva, 2015. Disponível em: https:/ /blog.scielo.org/blog/2015/01/22/artigo-analisa- a-saturacao-dos-revisores-por-pares/. PEREIRA, Maurício Gomes. Artigos científicos: como redigir, publicar e avaliar. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011. RODRIGUES, Rosângela Schwarz; QUARTIERO, Emanoel; NEUBERT, Patrícia. Periódicos científicos brasileiros indexados na Web of Science e Scopus: estrutura editorial e elementos básicos. Informação & Sociedade: Estudos,[S. l.], v. 25, n. 2, p. 138, 2015. Disponível em: https:// periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ies/article/view/117. SANTOS,AleksandraPereira.Conhecimentos,habilidadeseatitudes:oconceitodecompetências no trabalho e seu uso no setor público. Revista do Serviço Público Brasília 62 (4): 369-386 out/ dez 2011. Disponível e: https://revista.enap.gov.br/index.php/RSP/article/view/78. SHIGAKI, Helena Belintani; PATRUS, Roberto. Avaliação de artigos científico em Administração: critérios e modelos de avaliadores experientes. Teoria e Prática em Administração (TPA), ISSN- e2238-104X, v. 6, n.2, 2016, p. 107-135. Disponivel em https://dialnet.unirioja.es/servlet/ articulo?codigo=5764290.
  • 15. 15 Referências SILVA, Wesley Mendes. Editorial. Reconhecimento da Contribuição do Avaliador Anônimo. Rev. adm. contemp. 22 (5) Sep-Oct 2018 https://doi.org/10.1590/1982-7849rac2018180281. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rac/a/xHBrFSkmZpbKBvhspbNMCwg/?lang=pt#. SILVEIRA, Evanildo. Máquina de criar artigos expõe fragilidade da academia. Questão de Ciência, [S.l.], 2021. Disponível em: https://revistaquestaodeciencia.com.br/questao-de-fato/2021/06/10/ maquina-de-criar-artigos-expoe-fragilidade-da-academia. Acesso em: 21 out. 2021. SPINAK, E. De pareceristas estrela a pareceristas fantasmas – Parte I [online]. SciELO em Perspectiva, 2019. Disponível em https://blog.scielo.org/blog/2019/02/05/de-pareceristas- estrela-a-pareceristas-fantasmas-parte-i/. VASCONCELLOS, Vinicius Gomes. Editorial: Controle por pares e a função do revisor – premissas e orientações para uma avaliação consistente. Rev. Bras. de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 3, n. 2, p. 437-458, mai.-ago. 2017. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v3i2.70. ZIMAN, John. Public knowledge: an essay concerning the social Dimension of science. Cambridge: Cambridge University Press, 1968.
  • 16. 16 2.1 Aspectos éticos Para abordar os aspectos éticos envolvidos no processo editorial, convém inicialmente pensar sobre o significado da palavra Ética. A Enciclopédia Einaudi a define, baseado na filosofia anglo-saxônica, como a “análise racional dos conceitos e juízos de valor, incluindo o modo como se pode determinar a validade dessas asserções” (KOLAKOWSKI, 1997, p. 339). A Ética se ocupa das normas que regem ou deveriam reger as relações de cada indivíduo com os outros, bem como com os valores implícitos no comportamento individual. Unidade 2: A ética no processo editorial Objetivo de aprendizagem Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer os aspectos éticos necessários para agir em situações de conflito. Saiba mais: Você sabia? Originária do grego ethos, a palavra Ética tem seu significado associado a caráter, costume ou modo de ser. Os romanos traduziram esse termo para o latim mos, que significa costume. Tanto ethos (caráter) como mos (costume) indicam um tipo de comportamento especificamente humano que, contudo, não é natural: o homem não nasce com ele como se fosse um instinto, mas o adquire ou conquista por hábito. Nesse sentido, Ética, por sua etimologia, diz respeito a uma realidade humana que é construída histórica e socialmente a partir das relações coletivas dos seres humanos nas sociedades onde nascem e vivem. Para acessar a fonte, clique aqui. O que seria, então, um comportamento ético no tocante ao processo editorial? Quais as normas devem reger as relações envolvidas nesse processo? Para subsidiar a reflexão sobre esse tema, Silva, Araujo e Paula (2020) trazem uma abordagem que irá nortear os pontos a serem destacados nesse tópico. Segundo os autores, A função da Ética não é dar uma resposta descritiva, compreensiva, explicativa para essas questões fundas ao sentido último da vida e da condição humana, mas é constituir-se, eternamente, em ser uma questão que se põe sobre o humano pelo próprio humano – porque a Ética foi concebida para nos colocar limites, para tornar nossa vida social comportável e suportável. (SILVA; ARAUJO; PAULA, 2020, p. 75)
  • 17. 17 Pensando, pois, na ética relacionada aos limites e ao respeito às normas de conduta de cada sociedade, que são estabelecidas por uma convenção socialmente aceita, percebe-se que ela se conforma na ação das pessoas. Nesse sentido, deve-se pensar na ética relacionada às atividades que compreendem o processo editorial manifesta na ação de seus atores. Essa análise perpassa ações ligadas, por exemplo, à redação autêntica de um manuscrito para publicação, à avaliação idônea do artigo elaborado para comunicar achados inéditos de pesquisa, à responsabilidade em manter acessível o documento confiado à revista por um autor, dentre outros. Nesse tópico serão apresentados alguns aspectos éticos relacionados ao processo editorial sem ser, contudo, de uma forma exaustiva. O intuito é pontuar questões que sirvam como norte para subsidiar sua atuação enquanto avaliador de artigos científicos e o alerte para não atuar de modo conivente com a situação apresentada. A princípio, serão abordados os aspectos éticos ligados diretamente ao autor como a autocitação excessiva, que pode ser considerada como uma forma de impactar índices de citação e não é vista como um comportamento adequado a um pesquisador quando da elaboração de um texto científico. A ocorrência de plágio na elaboração do texto, por sua vez, é um exemplo que implica não apenas uma questão ética, mas também uma questão jurídica. Apesar da palavra plágio não constar do ordenamento jurídico brasileiro, o artigo 108 da Lei de Direitos Autorais responsabiliza por danos morais quem utilizar uma obra intelectual sem indicar a autoria (PITHAN; VIDAL, 2013). O plágio adota diferentes formas, como pode ser visto a seguir. Além da cópia de texto alheio sem indicar a referência, constitui também como outro tipo de plágio o envio do mesmo manuscrito a várias publicações, com o texto sendo publicado mais de uma vez (SPINAK, 2013). Plágio. Fonte: adaptado de Spinak (2013, online). Tipo Comentário Parafrasear Expressar as mesmas ideias com outra palavras, que pode chegar até a reescrita completa, mantendo as mesmas ideias. Repetir pesquisa Repetir os dados usando uma mesma metodologia e resultados similares sem se referir ao trabalho anterior. Fonte secundária Uso de fonte secundária, como um metanálise, mas apenas cita fontes primárias. Duplicação Usa trabalho e dados de estudos prévios. Verbatim Copia texto alheio sem destacá-lo (aspas, itálico, parágrafo recuado etc.) e não indica a referência. Colaboração não ética Pesquisadores que trabalham juntos não declaram e se citam mutuamente (scratch each other’s backs). Atribuição enganosa Não indicar todos os autores que participaram do manuscrito, negar créditos a colaboradores. Replicação Enviar o trabalho a várias publicações, onde o manuscrito é publicado mais de uma vez. Fonte válida A referência não existe, não é correta, ou não tem os dados completos. Completo Copiar o manuscrito completo e enviá-lo em nome próprio.
  • 18. 18 Outro aspecto relacionado ao autor é a questão do produtivismo, que também envolve um ordenamento ético. Entendido como uma excessiva valorização da quantidade da produção acadêmica, associada a uma desconsideração quanto à qualidade do conteúdo publicado, esse fenômeno ocorre em decorrência do fato dos pesquisadores serem avaliados por sua produtividade. Um dos riscos associados a essa prática se relaciona ao fato do produto final da pesquisa científica (ou seja, a publicação) poder se transformar em um fim em si mesmo e não no resultado do processo de produção de conhecimento. Decorre também da pressão por publicar e o risco dessa superprodução “corroer” a noção de solidariedade acadêmica, entendida como um compromisso mútuo entre os pesquisadores que disponibilizam o seu tempo e expertise voluntariamente na avaliação de manuscritos elaborados por seus pares (PATRUS; DANTAS; SHIGAKI, 2015). Essa prática também fere os critérios que são elencados por Pendergast (2007), segundo o qual a publicação de um artigo deve observar três critérios fundamentais que são analisados no processo de avaliação: rigor teórico, rigor metodológico e contribuição de valor. Uma questão ética que envolve não apenas os autores, mas também editores e avaliadores está relacionada ao conflito de interesses. A pesquisa ser patrocinada por uma empresa que está sendo analisada na investigação, por exemplo, pode comprometer e enviesar os resultados. Tem-se, portanto, que o conflito de interesse corresponde a uma situação em que a objetividade do julgamento é comprometida por interesse de terceiros. No tocante ao conflito de interesses relacionado à avaliação do artigo, deve-se atentar para que não haja interferências externas na avaliação justa do manuscrito. Conforme menciona Pereira (2011), nem editor, nem avaliador podem ter envolvimento que limitem a objetividade de suas decisões em relação aos artigos submetidos à publicação. Julgando-se impossibilitado de aceitar a revisão, o avaliador deve declinar do convite. Saiba mais: Veja outros aspectos ligados às questões éticas, publicados pelo Committee on Publication Ethics (COPE), clicando aqui. Neste, consta um documento interessante que apresenta um diagrama de como agir, por exemplo, se há suspeita de que uma publicação é redundante ou duplicada, ou de que houve plágio em um manuscrito. O documento, em espanhol, está disponível aqui. Questões éticas podem estar também associadas às responsabilidades com as funções exercidas no processo editorial. No tocante ao editor do periódico, fundamentar a decisão mais no fator de impacto do que no interesse dos leitores é considerado um comportamento inadequado. Conforme menciona Pereira (2011, p. 539), “o editor deve basear suas decisões de seleção e avaliação do artigo na validade do trabalho e na sua importância para os leitores da revista, e não no sucesso comercial da mesma”. O avaliador de artigo científico no processo editorial também está sujeito a dilemas éticos no exercício de sua atividade. Pereira (2011) destaca algumas situações que devem ser conduzidas com cautela:
  • 19. 19 Fraude e viés A fraude é considerada um erro intencional que se materializa, desde a demora no parecer, uso indevido da ideia original em proveito próprio, até o retardamento da publicação. Já o viés pode, por exemplo, se externar em crítica agressiva por discordância, acadêmica ou não, com as ideias do autor. Respeito ao estilo do autor As modificações recomendadas devem respeitar o estilo do autor. Não é adequado que o avaliador substitua ou acrescente nomes, expressões, frases, textos, conceitos e proposições por motivo de gostar ou não gostar da redação. Preconceito editorial Acontece, por exemplo, quando o avaliador tem posição favorável sobre a qualidade do artigo, antes de lê- lo, e ele age motivado apenas pela inspeção superficial do texto, influenciado pelo idioma do artigo e local de realização da pesquisa. Isso pressupõe, portanto, dar crédito antecipado a certos grupos, como aqueles mais produtivos em termos científicos, e ser desfavorável a outros, de autores de regiões e locais menos tradicionais em pesquisas científicas. Conforme destaca Pereira (2011): É o que tem sido relatado sobre a conduta de editores e revisores de periódicos, ditos internacionais, em relação a autores de nações periféricas. Há um inerente preconceito na mente de alguns revisores com respeito a artigos de autores de países em desenvolvimento. Algo assim: “Uma boa pesquisa não pode ter vindo de país em desenvolvimento”. O mesmo tipo de preconceito apontado entre países também pode ocorrer no interior de um país: de uma determinada região do Brasil, em face de trabalhos provenientes de outras regiões, dos investigadores da capital em relação aos do interior, de uma instituição maior para uma menor, de entidades públicas em relação às privadas e assim por diante. Interesses corporativos Muitos periódicos científicos são criados para dar vazão à produção da própria instituição ou de grupos restritos de pesquisadores. Assim, as submissões do grupo e das pessoas próximas precisam ser aceitas para que a instituição que representam seja bem cotada no processo, sendo que é exigido, aos demais autores, o rigor da perfeição. Esse corporativismo constitui uma forma de desonestidade com a comunidade científica por privilegiar algumas pessoas a outras, que têm as suas chances de publicação diminuídas ou cortadas. Interesses pessoais Os avaliadores não devem usar o conhecimento do trabalho submetido, antes da publicação para favorecer interesses próprios, e nem a equipe editorial deve usar as informações obtidas no trabalho para ganhos particulares. Exemplo de atitude antiética é o avaliador recomendar recusa do original e utilizar a ideia ou protelar a revisão por longo tempo, e, nesse ínterim, utilizar os dados para publicar artigo científico de própria autoria.
  • 20. 20 Incapacidade do avaliador Acontece quando o material é recusado por evidente desconhecimento do avaliador e do editor sobre o tema, o método ou a forma de comunicação científica. Mas também pode ocorrer quando o artigo é recusado para publicação porque o autor apontou limitações na investigação. Sobre essa última questão, alertamos para o fato de que, nos bons periódicos, indicar as limitações da pesquisa e debatê-las constitui aspecto positivo e, dentro de certos limites, não se configura como motivo para recusa do artigo. Com esse tópico, você termina o estudo do conteúdo selecionado para esta unidade. Vamos fazer uma verificação de como foi sua aprendizagem? Execute as atividades disponibilizadas a seguir e veja se você compreendeu os principais pontos desenvolvidos. Qualquer dúvida, retorne ao texto!
  • 21. 21 Referências BRAGA, Maria Elisa Rangel. Como escrever artigo científico. 2013. Disponível em http:/ /aai.bireme.org/wp-content/blogs.dir/2/files/2013/08/Como-avaliar-artigo- cientifico_2013.pdf COLEÇÃO Os Pensadores. Os Pré-socráticos. São Paulo: Nova Cultural, 1996. FERREIRA, Manuel A.; CANELA, Renata; PINTO, Cláudia F. O processo editorial nos periódicos e dicas para a publicação. Revista de Gestão e Secretariado, São Paulo, v. 5, n. 2, p. 01-22, mai./ago. 2014. https:/ /www.revistagesec.org.br/secretariado/article/view/307. GOMES, Valdir Pereira. O editor de revista científica: desafios da prática e da formação. Inf. Inf., Londrina, v.15, n.1, p.147-172, jan./jun.2010. DOI 10.5433/1981-8920.2010v15n1p147 GONÇALVES, Jonas Rodrigo; COSTA, Danilo; GONÇALVES, João Carlos. Cumprimento dos critérios Qualis periódicos no intuito de se configurar como uma revista acadêmica de qualidade. Revista JRG de Estudos Acadêmicos, [S. l.], v.2, n.5, p.01–14, 2019. Disponível em: http:/ /revistajrg.com/index.php/jrg/article/view/143. GONDIM, Sonia. A face oculta do parecerista: Discussões éticas sobre o processo de avaliação de mérito de trabalhos científicos. Organizações e Sociedade, 11(31), 195-199. 2004. Disponível em https:/ /periodicos.ufba.br/index.php/revistaoes/article/view/10716 KOLAKOWSKI, Leszek. Ética: conceito, filosofia/filosofias. In: Enciclopédia Einaudi. v. 37. 1997. PATRUS, Roberto; DANTAS, Douglas Cabral; SHIGAKI, Helena Belintani. O produtivismo acadêmico e seus impactos na pós-graduação stricto sensu: uma ameaça à solidariedade entre pares? Cad. EBAPE.BR, v. 13, nº 1, artigo 1, Rio de Janeiro, Jan./Mar. 2015. Disponível em: https://www.scielo.br/j/cebape/a/HL7xXqvSVnf43TjFfQ4NVwt/?lang=pt&format=pdf. PENDERGAST, Gerard. The art of reviewing. International Journal of Advertising, v. 26, n. 2, p. 277-280, 2007 PEREIRA, Maurício Gomes. Artigos científicos: como redigir, publicar e avaliar. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011. PHELAN, Steven.; FERREIRA, Manuel Aníbal S. P. Vasconcelos.; SALVADOR, Rommel. The first twenty years of the Strategic Management Journal: 1980-1999. Strategic Management Journal, v. 23, p. 1161-1168, 2002. PINHO, José Antônio Gomes. Brevíssimo manual do editor: Considerações sobre submissão e avaliação de artigos, o papel dos pareceristas e do editor de revistas científicas. Organizações e Sociedade, 12(34), 169-173, 2005. Disponível em https:/ /periodicos.ufba.br/ index.php/revistaoes/article/view/10798/7746.
  • 22. 22 Referências PITHAN, Lívia Haygert; VIDAL, Tatiane Regina Amando. O plágio acadêmico como um problema ético, jurídico e pedagógico Direito & Justiça v. 39, n. 1, p. 77-82, jan./jun. 2013. Disponível em https:/ /www.unifac.edu.br/images/materiais_de_apoio/2015/ed_fisica/ leone/trabalho_ferias_julho_01_04.pdf. REGIS, Fátima. Memória e esquecimento na Grécia Antiga: da complementaridade à contradição. Logos, [S.l.], v. 4, n. 2, p. 20-24, jan. 2015. ISSN 1982-2391. Disponível em: https:/ / www.academia.edu/2567478/Mem%C3%B3ria_e_Esquecimento_na_Gr%C3%A9cia_ Antiga_Da_Complementaridade_%C3%A0_Contradi%C3%A7%C3%A3o. RODRIGUES, Camila Martins; SANTOS, Gildenir Carolino. A importância e o impacto da Publicação Contínua (PC) nos Periódicos Eletrônicos. Blog PPEC, Campinas, v.1, n.1, jan. 2019. ISSN 2526-9429. Disponível em http:/ /periodicos.sbu.unicamp.br/blog/index. php/2019/01/15/pc/. RODRIGUES, Rosângela Schwarz; QUARTIERO, Emanoel; NEUBERT, Patrícia. Periódicos científicos brasileiros indexados na Web of Science e Scopus: estrutura editorial e elementos básicos. Informação & Sociedade: Estudos,[S. l.], v. 25, n. 2, p. 138, 2015. Disponível em: https:// periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ies/article/view/117. ROSINHA, Raul C. Política editorial, aspectos a considerar. R. Biblioteconomia. Brasília, 17 (2), p. 249-258, jul/dez 1989. Disponível em https://brapci.inf.br/_repositorio/2011/07/ pdf_082340925f_0017733.pdf. SCIELO. Critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos científicos na Coleção SciELO Brasil. 2014. SERRA, Fernando A. Ribeiro; FERREIRA, Manuel Portugal. Proposta de um Modelo para o Instrumento de Avaliação pelos Pareceristas. Revista Ibero-Americana de Estratégia – RIAE Vol. 14, N.1. Janeiro/Março. 2015. SERRA, Fernando A. Ribeiro; FIATES, Gabriela Gonçalves; FERREIRA, Manuel Portugal. Publicar é difícil ou faltam competências? O desafio de pesquisar e publicar em revistas científicas na visão de editores e revisores internacionais. RAM, Rev. Adm. Mackenzie 9(4), Jun 2008. https:// doi.org/10.1590/S1678-69712008000400004. SILVA, Armando Malheiro; ARAUJO, Eliane Pawlowski Oliveira; PAULA, Claudio Paixão Anastácio. O Fyborg e a ética da informação ou os limites de uma ética antropocêntrica. Revista da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, v. 27, n. 1, p. 60–77, 2020. DOI: 10.35699/2316-770X.2020.29154. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/ revistadaufmg/article/view/29154.
  • 23. 23 Referências SPINAK, Ernesto. Ética editorial e o problema do plágio [online]. SciELO em Perspectiva, 2013. Disponível em https://blog.scielo.org/blog/2013/10/02/etica-editorial-e-o-problema-do-plagio STUMPF, Ida Regina Chitto. Passado e futuro das revistas científicas. Ciência da Informação, v. 25, n.3, 1996. Disponível em http://revista.ibict.br/ciinf/article/view/637/641 TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. A Pesquisa e a Produção de Conhecimentos. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO. Caderno de formação: formação de professores: educação cultura e desenvolvimento. v. 3. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. Disponível em: http://www.acervodigital.unesp.br/handle/123456789/192 TRZESNIAK, Piotr. Cargos e funções associados à publicação científica: uma proposta de nomenclatura. In: X Curso de editoração científica. Petrópolis, RJ: Associação Brasileira de Editores Científicos, 2001 TRZESNIAK, Piotr. A estrutura editorial de um periódico científico. In: A. A. Z. P. Sabadini,M. I. C. Sampaio, & S. H. Koller (Orgs.), Publicar em psicologia: um enfoque para a revista científica (pp. 87-102). São Paulo: Associação Brasileira de Editores Científicos de Psicologia; Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. 2009. Disponível em https://www. researchgate.net/publication/233401784_A_estrutura_editorial_de_um_periodico_ cientifico?channel=doi&linkId=0912f50a40e800bf67000000&showFulltext=true WEITZEL, Simone da Rocha. Os repositórios de e-prints como nova forma de organização da produção científica: o caso da área das Ciências da Comunicação no Brasil. 2006. Tese (Doutorado em Cultura e Informação) - Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006. doi:10.11606/T.27.2006.tde-14052009-133509. WEITZEL, Simone da Rocha. Fluxo da informação científica. In POBLACIÓN, Dinah Aguiar; WITTER, Geraldina Porto; SILVA, José Fernando Modesto. Comunicação & produção científica: contexto, indicadores e avaliação. Organizador. São Paulo: Angellara, 2006