O documento resume as discussões de uma conferência sobre os desafios atuais do Brasil. Ele denuncia (1) a ofensiva do Estado contra povos indígenas e comunidades tradicionais, (2) a criminalização de movimentos sociais que lutam por direitos, e (3) as consequências negativas de grandes projetos de infraestrutura e eventos esportivos. Ele também critica (1) a terceirização e precarização do trabalho, (2) a falta de reforma urbana e saneamento, e (3) o modelo energético
Carta do 4o Seminário da 5a Semana Social Brasileira
1. CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL
Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, Justiça e Paz
Carta do 4º Seminário da 5ª Semana Social Brasileira
Nós, participantes do 4º Seminário da 5ª Semana Social Brasileira - SSB, reunidos em Brasília entre
os dias 20 a 22 de maio de 2013, oriundos das mais diversas realidades do Brasil, refletimos a
conjuntura atual à luz do tema Estado para que e para quem enos alimentamos pela mística do bem
viver partilhada aqui a partir da experiência dos nossos irmãos indígenas latino americanos.
Fizemosmemória dos frutos produzidos pelas semanas sociais anteriores, destacando o Grito dos
Excluídos, os Plebiscitos Populares, a Assembleia Popular, o Jubileu Sul, importantes espaços de
mobilização, de denúncia e de partilha. Com indignação, vimos e refletimos como o capital, em sua
fase neoliberal e nesse momento de crise mundial, através do Estado brasileiro tem orquestrado uma
ofensiva violenta e cruel, atuando através do judiciário, legislativo, executivo e dos meios de
comunicação. Diante disso nos dirigimos à sociedade para denunciar:
A ofensiva contra os povos e comunidades tradicionais operacionalizada em diversas
frentes, com destaque para a proposta de alteração da Constituição, com falta de diálogo e
recrudescimento de ações contra os povos, se configura como um verdadeiro terrorismo de
Estado. Violências vêm sendo cometidas pela própria Polícia Federal, principalmente nas
ações de reintegração de posse, e no Congresso Nacional há uma campanha anti
comunidades tradicionais e indígenas que se desenvolve com a PEC 215, engendrada pela
bancada ruralista, que objetiva transferir as atribuições constitucionais do poder executivo
em reconhecer os territórios indígenas e quilombolas para o legislativo. O próprio governo
reforça estas ações através da Portaria 303 da Advocacia Geral da União, das declarações da
ministra da Casa Civil e do ministro da Justiça, e da suspensão das demarcações no Paraná,
visivelmente atendendo aos interesses dos ruralistas.
A criminalização que vem ocorrendo sobre comunidades, povos e movimentos sociais, que
de forma legítima vêm lutando e resistindo pela efetivação dos seus direitos. No bojo dessa
repressão condenamos o decreto 7957 da Presidência da República, que legaliza a
intervenção e a repressão militarizada.
O crescente extermínio da juventude, principalmente pobre e negra, e a proposta de redução
da maioridade penal que vem sendo amplamente difundidapelos meios de comunicação,
desconsiderando a necessidade de implementação depolíticas públicas efetivas para
juventude, o fortalecimento da rede de proteção da criança e do adolescente, medidas sócio-
educativas, e a falta de educação pública de qualidade que respeite a diversidade.
2. A remoção de milhares de famílias para dar lugar às obras para realização de grandes
eventos como a Copa das Confederações ea Copa do Mundo, e grandes obras de infra-
estrutura como portos, aeroportos, rodovias e hidrelétricas, com total desrespeito e violação
aos direitos humanos, principalmente aos direitos das mulheres,da população de rua e de
vendedores ambulantes.
Oamplo processo de terceirização que assola a todos os trabalhadores e trabalhadoras, com
retiradade direitos, precarizaçãodo trabalho, baixos salários e elevaçãodo índice de mortes e
acidentes de trabalho. As iniciativas de privatização da previdência que estipulou teto para
aposentadoria, agora ameaça com previdência privada o setor público, prejudicando a
aposentadoria das gerações futuras.
A ausência de uma reforma urbana, o déficit habitacional,de saneamento básico, da coleta
seletiva feita pelos catadores, e de uma política de mobilidade urbana, que garanta o
transporte público que favoreça a população na disponibilização de equipamentos com baixo
custoe de boa qualidade.
Ao modelo energético que garante grandes lucros as empresas transnacionais, e penaliza a
população com altas tarifas e degrada o meio ambiente. Também a implantação de parques
de energia eólica, na forma como vem se dando na região nordeste produz passivos
ambientais, sociais, e principalmente a perca de território.
Aos leilões do petróleo e das hidrelétricas que entregam trilhões de reais em riquezas do
povo brasileiro a ganância de empresas privadas e a acionistas estrangeiros. E a entrega das
riquezas minerais através do novo marco regulatório.
A liberação dos transgênicos e o uso de agrotóxicos, muito dos quais banidos em outros
países, colocando em risco a saúde da população, elevando a incidência de várias doenças e
problemas, entre eles a má formação do feto, abortos, suicídios e o câncer.
A criminalização das organizações da sociedade civil e a não regulamentação do marco
regulatório da parceria entre governo e sociedade.
Diante desse cenário desafiante, nós reafirmamos nosso compromisso com:
A luta e resistência dos povos e comunidades tradicionais rurais e urbanas. Vemos a recente
articulação desse segmento como sinal de esperança e luz a caminho do bem viver. Os
povos indígenas e comunidades tradicionais, a partir de suas experiências próprias de bem
viver, são exemplos para a reconstrução de um outro Estado.Nos somamos a Campanha
Nacional pela Regularização do Território das Comunidades Tradicionais Pesqueiras, que
3. visa o reconhecimento do território como espaço de reprodução social, cultural, econômico,
ancestral.
A refundação do Estado brasileiro, através de um reforma política que garanta o
financiamento público de campanha e a regulamentação de medidas de democracia direta,
medidas de democratização do judiciário, da reforma urbana, agrária e tributária. É central
fortalecermos a luta pela democratização dos meios de comunicação e sua regulamentação,
conforme plataforma construída no âmbito do Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação – FNDC.
O capitalismo e o projeto neoliberal demonstra plenamente sua falência em todos os cantos do
mundo. O atual nível de desenvolvimento produtivo, tecnológico e científico demonstra que é
necessária a construção de uma sociedade alternativa que seja justa e inclusiva.
Um projeto popular fundamentado nos princípios da cooperação, da complementariedade e da
solidariedade, que busca acumular forças populares e institucionais por una nova libertação. São
muitas as lutas, organizações e iniciativas que resistem e demonstram que uma outra sociedade e
Estado que queremos está em curso.
Brasília, 22 de maio de 2013