1. Sob uma definição generalizada, Cabala pode ser compreendida como "tratado
filosófico-religioso hebraico, que pretende resumir uma religião secreta que se
supõe haver coexistido com a religião popular dos hebreus". Porém, esta é uma
definição extremamente simplificada que omite diversos aspectos significativos.
A origem etimológica da palavra Cabala encontra-se no hebraico como
qabbalah e é comumente grafada de diversas formas: Kabbalah, Qabbala, cabbala,
cabbalah, kabala, kabalah, kabbala. Originalmente, significa recepção ou
recebimento, no sentido metafórico de "recebimento do ensinamento" ou
"recebimento da sabedoria".
Nos meios de estudo filosóficos e ocultistas, a Cabala é uma doutrina mística do
judaísmo que tem por objetivo conhecer Deus e o Universo através de um
ensinamento restrito aos seres espiritualmente iluminados. Porém, segundo o
Rabino Joseph Saltoun, a Cabala é mais democrática e acessível: ''A cabala é uma
sabedoria universal que está na essência de todas as religiões, por isso qualquer
pessoa pode estudar e praticar''.
Uma das formas de obter o conhecimento superior seria através da
interpretação correta de textos sagrados, inclusive a Bíblia. Não apenas da
mensagem explícita, mas também dos códigos implícitos infiltrados na grafia destes
livros.
Estes antigos manuscritos são as bases do misticismo judaico que se
desenvolveu ao longo da história e nos quais encontram-se elementos que
posteriormente seriam reconhecidos como elementos pertencentes à Cabala. Entre
eles estão o Bahir (publicado no início do século XII e impresso apenas em meados
do século XVII), o Zohar (conjunto de textos sobre a Torah com uma abordagem
mística da natureza divina, natureza da alma, universo, bem e mal, entre outros), e
o Sefer Yetzirah (Livro da Luz - antigo texto do hebraico de período histórico não
determinado).
O estudo da Cabala pode ser dividido em duas partes. A Cabala Teórica que
tem por objetivo compreender o equilíbrio do universo pelo estudo das energias
espirituais oriundas de Deus e dos códigos numéricos ocultos no texto original. A
Cabala Mágica que possibilita interferir em acontecimentos práticos através da
meditação ou recitação dos nomes sagrados de Deus, expressos em 72
combinações de letras do alfabeto hebraico.
A Alma e a Cabala
Alguns pontos comuns entre o Zohar e a tradição da Cabala são encontrados
quando referem-se aos elementos que compõem a alma. Segundo esta análise, a
alma humana é composta de três partes distintas que são plenamente despertas
apenas em indivíduos evoluídos espiritualmente.
O nefesh é comum a todos os seres humanos e passa a integrar o indivíduo no
momento de seu nascimento. É a fonte da natureza física e psicológica. É
considerado a parte inferior (irracional) da alma que está associado aos instintos e
desejos físicos. O ruach é a parte mediana responsável por virtudes morais e
capacidade de distinção entre o bem e o mal. O ruach é desenvolvido ao longo da
vida e depende da nobreza de valores de cada indivíduo, como suas crenças e
ações. O neshamah é a alma superior. É o elemento determinante que distingue o
ser humano de outras formas de vida e está relacionada diretamente ao intelecto.
Também é desenvolvido no decorrer da vida.
2. Ainda, no Raaya Meheimna (manuscrito
posteriormente incorporado ao Zohar) há alusões
a outros dois elementos: o chayyah (permite ao
homem a percepção do poder divino) e o yehidah
(nível mais elevado que permite total integração
com Deus).
Há também elementos que se manifestam
eventualmente na alma humana. O Ruach
HaKodesh permite a capacidade profética. O
Neshamah Yeseira permite uma maior
profundidade espiritual ao judeu durante o
Shabbat (descanso semanal que, segundo o
judaísmo, foi ordenado por Deus). Esta habilidade
adquirida pela alma pode se desenvolver ou
retroceder totalmente, de acordo com a fé do
judeu. O Neshoma Kedosha que se manifesta nos
judeus ao atingirem a maioridade e está relacionado ao estudo dos mandamentos
da Torah. Assim como o Neshamah Yeseira, o Neshoma Kedosha também está
passível de desenvolvimento ou regressão, dependendo do empenho de cada
indivíduo.
Entretanto, segundo estudiosos (como o Rabino Joseph Saltoun), a Cabala
também aplica-se em diversas áreas dos conhecimentos e necessidades humanas,
tantos espirituais como físicas. É possível, por exemplo, compreender a origem da
alma, relacionamentos afetivos, destino e livre arbítrio, por exemplo.
A Cabala e suas conexões
O estudo cabalístico não se limita ao universo judaico. A partir do século XVIII
houve um processo de popularização da Cabala entre diversas tradições ocultistas;
favorecendo sua infiltração e conexão com outras faces do esoterismo, até mesmo
no ocidente. Desse modo, variações cristãs da Cabala passaram a ser estudadas. A
Cabala também passou a integrar e combinar-se em correntes neopagãs.
Jesus Cristo poderia ter sido um conhecedor dos mistérios cabalísticos. O
Heptameron (tratado medieval de magia) utiliza-se de símbolos cabalísticos. Na
idade Média, devido à intolerância religiosa, o estudo da Cabala era secreto. Vários
sistemas de Magia utilizam a cabala como referência. O ocultista francês Eliphas
Levi foi um dos estudiosos cabalísticos. A Cabala Hermética (como é conhecida no
Ocidente) foi abordada pelo ocultista inglês Aleister Crownley; assim como o
Amanhecer Dourado de George Cecil Jones. Em 1922, foi fundado pelo Rabino
Berg, na cidade de Jerusalém, o Centro de Estudos da Cabala, que favoreceu sua
disseminação além dos limites do judaísmo.
A Árvore da Vida
A Árvore da Vida é um recurso simbológico que representa alguns conceitos
cabalísticos. É formada por dez Sephira que emanam de Ain Soph, que é a
representação da própria natureza divina da qual deriva cada sephira. Cada uma
das dez sephira representa uma dimensão para a realidade. Assim, cada uma
funciona como um canal que conduz a "Luz do Mundo Infinito" até o homem.
3. Graficamente, as sephira estão alinhadas em três colunas que estão
interligadas por meio de vinte e duas conexões. Estão dispostas em camadas
triangulares sendo que cada uma está relacionada a um plano: Emanações
(Atziluth), Criações (Beriah), Formações (Yetzirah) e Ações (Asiyah). As dez
sephiras que compõem a Cabala são Keter, Chochma, Biná, Chesed, Gevurah,
Tiferet, Netzach, Hod, Yesod e Malchut.
A Cabala no século XXI
Atualmente, a Cabala atingiu um nível de popularidade suficiente a ponto de
serem oferecidos cursos de interpretação cabalística com ênfase em aspectos
práticos da vida cotidiana. Personalidades como Madonna e Mick Jagger aderiram
ao estudo da Cabala. Ainda, há um Centro de Estudos da Cabala em São Paulo e
Rio de Janeiro.
Se, de certa forma, esta popularidade obtida pode relegar a Cabala à condição
de uma simples ferramenta de auto-ajuda e autoconhecimento; por outro lado, há
a democratização de uma tradição milenar e poderosa, que coloca-se ao alcance de
qualquer cidadão que deseje evoluir nos planos espirituais e materiais da própria
existência.
Por Spectrum