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Defensor Público - VOL. 11
Defensoria Pública do Estado de
Minas Gerais / DP-MG
Defensor Público
ÍNDICE
DIREITO CONSTITUCIONAL, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO
1. Indivíduo, Sociedade e Estado...................................................................................................................................................................................01
2. Poder Constituinte......................................................................................................................................................................................................07
3. Interpretação e Aplicabilidade da Norma Constitucional ...........................................................................................................................................12
4. Controle de Constitucionalidade ................................................................................................................................................................................16
5. Princípios Fundamentais............................................................................................................................................................................................20
6. Direitos e Garantias Fundamentais............................................................................................................................................................................20
7. Organização do Estado..............................................................................................................................................................................................42
8. Organização dos Poderes..........................................................................................................................................................................................51
9. Funções Essenciais à Justiça ....................................................................................................................................................................................65
10. Defesa do Estado e das Instituições Democráticas.................................................................................................................................................66
11. Sistema Tributário Nacional .....................................................................................................................................................................................68
12. Ordem Econômica e Financeira...............................................................................................................................................................................72
13. Ordem Social............................................................................................................................................................................................................74
14. Disposições Constitucionais Gerais.........................................................................................................................................................................80
15. Disposições Constitucionais Transitórias.................................................................................................................................................................82
16. Constituição do Estado de Minas Gerais .................................................................................................................................................................93
17. Direito Tributário como direito público. Direito Tributário como direito obrigacional. Autonomia. Relação com outros ramos do direito ............ 146
18. Fontes do Direito Tributário. Fontes Formais e Fontes Materiais. Fontes Principais e secundárias. Legislação Tributária. Tratados. A Medida Provi-
sória e o Direito Tributário........................................................................................................................................................................................... 146
19. A Norma Tributária. Hipótese de Incidência Tributária e fato gerador. Aspectos da norma tributária. Incidência Tributária. Eficácia no tempo e no
espaço. Interpretação. Integração............................................................................................................................................................................... 148
20. Tributo. Conceito. Elementos essenciais. Tributos em espécie. Impostos. Taxas. Contribuição de Melhoria. Contribuições............................. 148
21. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar e o Sistema Constitucional Tributário. Legalidade Tributária. Capacidade Contributiva. Igualdade
Tributária. Uniformidade Tributária. Irretroatividade da Lei Tributária. Anterioridade da Lei Tributária. Vedação do efeito confiscatório. Vedação à limita-
ção de tráfego de pessoas ou bens. Imunidades. Personalização do imposto. Proibição de taxas com base de cálculo própria de imposto. Intributabili-
dade das rendas da dívida pública dos entes da Federação. Vedação à isenção heterônoma ................................................................................ 152
22. Competência Tributária. Competência Legislativa. Competência Arrecadatória.................................................................................................. 175
23. Obrigação Tributária. Fato Gerador. Sujeito Ativo. Sujeito Passivo ..................................................................................................................... 174
24. Responsabilidade Tributária. Sucessores. Terceiros. Por Infrações .................................................................................................................... 185
25. Crédito Tributário. Constituição. Suspensão. Extinção. Exclusão........................................................................................................................ 186
26. Garantias e privilégios do crédito tributário........................................................................................................................................................... 191
2
27. Ilícitos tributários. Crimes. Elisão e Evasão.......................................................................................................................................................... 191
28. Processo Administrativo Tributário e Processo Judicial Tributário ....................................................................................................................... 202
29. Orçamento público: princípios orçamentários da exclusividade, universalidade, unidade, anualidade, programação e
equilíbrio orçamentário................................................................................................................................................................................................ 216
30. Leis orçamentárias. Plano Plurianual. Lei de Diretrizes Orçamentárias. Lei Orçamentária Anual. Vedações orçamentárias............................. 226
31. Receitas públicas. Despesas Públicas. Precatórios. Controle interno e externo da atividade Financeira do Estado.......................................... 257
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 1
1. INDIVÍDUO, SOCIEDADE E ESTADO.
1. DEMOCRACIA E ESTADO DE DIREITO
A democracia, como realização de valores (igualdade, liberdade e dignidade
da pessoa) de convivência humana, é conceito mais abrangente do que o de
Estado de Direito, que surgiu como expressão jurídica da democracia liberal.
Seu conceito é tão histórico como o de democracia, e se enriquece de conteúdo
com o evolver dos tempos. A evolução histórica e a superação do liberalismo, a
que se vinculou o conceito de Estado de Direito, colocam em debate a questão
da sua sintonia com a sociedade democrática. O reconhecimento de sua insufi-
ciência gerou o conceito de Estado Social de Direito, nem sempre de conteúdo
democrático. Chega-se agora ao Estado Democrático de Direito que a Constitui-
ção acolhe no artigo 1o como um conceito-chave do regime adotado, tanto
quanto o são o conceito de Estado de direito democrático da Constituição da
República Portuguesa (artigo 2o) e o de Estado social e democrático de Direito
da Constituição Espanhola (artigo 1o).
O Estado Democrático de Direito concilia Estado Democrático e Estado
de Direito, mas não consiste apenas na reunião formal dos elementos desses
dois tipos de Estado. Revela, em verdade, um conceito novo que incorpora os
princípios daqueles dois conceitos, mas os supera, na medida em que agrega
um componente revolucionário de transformação do status quo. Para com-
preendê-lo, no entanto, teremos que passar em revista a evolução e caracte-
rísticas de seus componentes, para, no final, chegarmos ao conceito-síntese e
seu real significado.
2. ESTADO LIBERAL DE DIREITO
Na origem, como é sabido, o Estado de Direito era um conceito tipicamente
liberal. Constituía uma das garantias das constituições liberais burguesas. Daí
falar-se em Estado Liberal de Direito. Tinha como objetivo fundamental assegu-
rar o princípio da legalidade, segundo o qual toda atividade estatal havia de
submeter-se à lei. Suas características básicas foram: a) submissão ao império
da lei, que era a nota primária de seu conceito, sendo a lei considerada como
ato emanado formalmente do poder legislativo, composto de representantes do
povo, mas do povo-cidadão; b) divisão de poderes, que separa, de forma inde-
pendente e harmônica, os poderes legislativo, executivo e judiciário, como
técnica que assegure a produção das leis ao primeiro e a independência e
imparcialidade do último em face dos demais e das pressões dos poderosos
particulares; c) enunciado e garantia dos direitos individuais. Essas exigências
continuam a ser postulados básicos do Estado de Direito, que configura uma
grande conquista da civilização liberal.
A concepção liberal do Estado de Direito servira de apoio aos direitos do
homem, convertendo os súditos em cidadãos livres, consoante nota Verdù, a
qual, contudo, se tornara insuficiente, pelo que a expressão Estado de Direito
evoluíra, enriquecendo-se com conteúdo novo.
Houve, porém, concepções deformadoras do conceito de Estado de Di-
reito, pois é perceptível que seu significado depende da própria ideia que se
tem do Direito. Por isso, cabe razão a Carl Schmitt quando assinala que a
expressão “Estado de Direito”, pode ter tantos significados distintos como a
própria palavra “Direito” e designar tantas organizações quanto aquelas a
que se aplica a palavra “Estado”. Assim, acrescenta ele, há um Estado de
Direito feudal, outro estamental, outro burguês, outro nacional, outro social,
além de outros de acordo com o Direito natural, com o Direito racional e
com o Direito histórico. Disso deriva a ambiguidade da expressão Estado
de Direito, sem mais qualificativo que lhe indique conteúdo material. Em tal
caso, a tendência é adotar-se a concepção formal do Estado de Direito à
maneira de Forsthoff, ou de um Estado de Justiça, tomada a justiça como
um conceito absoluto, abstrato, idealista, espiritualista, que, no fundo,
encontra sua matriz no conceito hegeliano do Estado Ético, que fundamen-
tou a concepção do Estado fascista: “totalitário e ditatorial em que os direi-
tos e liberdades humanos ficam praticamente anulados e totalmente sub-
metidos ao arbítrio de um poder político onipotente e incontrolado, no qual
toda participação popular é sistematicamente negada em benefício da
minoria (na verdade, da elite) que controla o poder político e econômico.”
Diga-se, desde logo, que o Estado de Justiça, na formulação indicada, nada
tem a ver com o Estado submetido ao poder judiciário, que é um elemento
importante do Estado de Direito. Estado submetido ao juiz é Estado cujos
atos legislativos, executivos, administrativos e também judiciais ficam
sujeitos ao controle jurisdicional no que tange à legitimidade constitucional
e legal. É também uma abstração confundir Estado de Direito com uma
visão jus naturalista do Estado.
Por outro lado, se se concebe o Direito apenas como um conjunto de
normas estabelecidas pelo legislativo, o Estado de Direito passa a ser
Estado de Legalidade, ou Estado legislativo, o que constitui uma redução
deformante do Estado de Direito. Se o princípio da legalidade é um elemen-
to importante do conceito de Estado de Direito, nele não se realiza comple-
tamente.
A concepção jurídica de Kelsen também contribuiu para deformar o
conceito de Estado de Direito. Para ele, Estado e Direito são conceitos
idênticos. Na medida em que ele confunde Estado e ordem jurídica, todo
Estado há de ser Estado de Direito. Por isso, vota significativo desprezo a
esse conceito. Como na sua concepção, só é Direito o direito positivo,
como norma pura, desvinculada de qualquer conteúdo, chega-se, sem
dificuldade, a uma ideia formalista do Estado de Direito ou Estado Formal
de Direito, que serve também a interesses ditatoriais, como vimos. Pois, se
o Direito acaba se confundindo com mero enunciado formal da lei, destituí-
da de qualquer conteúdo, sem compromisso com a realidade política,
social, econômica, ideológica enfim (o que, no fundo, esconde uma ideolo-
gia reacionária), todo Estado acaba sendo Estado de Direito, ainda que seja
ditatorial. Essa doutrina converte o Estado de Direito em mero Estado
Legal. Em verdade, destrói qualquer ideia de Estado de Direito.
3. ESTADO SOCIAL DE DIREITO
O individualismo e o abstencionismo ou neutralismo do Estado liberal
provocaram imensas injustiças, e os movimentos sociais do século passado
e deste, especialmente, desvelando a insuficiência das liberdades burgue-
sas, permitiram que se tivesse consciência da necessidade da justiça
social, conforme nota Lucas Verdù, que acrescenta: “Mas o Estado de
Direito, que já não poderia justificar-se como liberal, necessitou, para en-
frentar a maré social, despojar-se de sua neutralidade, integrar, em seu
seio, a sociedade, sem renunciar ao primado do Direito. O Estado de Direi-
to, na atualidade, deixou de ser formal, neutro e individualista, para trans-
formar-se em Estado material de Direito, enquanto adota uma dogmática e
pretende realizar a justiça social.” Transforma-se em Estado Social de
Direito, onde o “qualificativo social refere à correção do individualismo
clássico liberal pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização
de objetivos de justiça social”. Caracteriza-se no propósito de compatibili-
zar, em um mesmo sistema, anota Elías Díaz, dois elementos: o capitalis-
mo, como forma de produção, e a consecução do bem-estar social geral,
servindo de base ao neocapitalismo típico do Welfare State.
Os regimes constitucionais ocidentais prometem, explícita ou implicita-
mente, realizar o Estado Social de Direito, quando definem um capítulo de
direitos econômicos e sociais. Expressas são as Constituições da Repúbli-
ca Federal Alemã e da Espanha, definindo os respectivos Estados como
sociais e democráticos de Direito.
Mas ainda é insuficiente a concepção do Estado Social de Direito, ain-
da que, como Estado Material de Direito, revele um tipo de Estado que
tende a criar uma situação de bem-estar geral que garanta o desenvolvi-
mento da pessoa humana. Sua ambiguidade, porém, é manifesta. Primeiro,
porque a palavra social está sujeita a várias interpretações. Todas as
ideologias, com sua própria visão do social e do Direito, podem acolher
uma concepção do Estado Social de Direito, menos a ideologia marxista
que não confunde o social com o socialista. A Alemanha nazista, a Itália
fascista, a Espanha franquista, Portugal salazarista, a Inglaterra de Chur-
chill e Attlee, a França, com a Quarta República, especialmente, e o Brasil,
desde a Revolução de 30 – bem observa Paulo Bonavides – foram “Esta-
dos sociais”, o que evidencia, conclui, “que o Estado social se compadece
com regimes políticos antagônicos, como sejam a democracia, o fascismo e
o nacional-socialismo”. Em segundo lugar, o importante não é o social,
qualificando o Estado, em lugar de qualificar o Direito. Talvez até por isso
se possa dar razão a Forsthoff, quando exprime a ideia de que Estado de
Direito e Estado Social não podem fundir-se no plano constitucional. O
próprio Elías Díaz, que reconhece a importância histórica do Estado Social
de Direito, não deixa de lembrar a suspeita quanto a “saber se e até que
ponto o neocapitalismo do Estado Social de Direito não estaria em realida-
de encobrindo uma forma muito mais matizada e sutil de ditadura do grande
capital, isto é, algo que no fundo poderia denominar-se, e tem-se denomi-
nado, neofascismo”. Ele não descarta essa possibilidade, admitindo que “o
DIREITO CONSTITUCIONAL
FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 2
grande capital encontrou fácil entrada nas novas estruturas demoliberais,
chegando assim a constituir-se como peça chave e central do Welfare
State. Ainda que institucionalizado no chamado Estado Social de Direito,
permanece sempre sob este – representada por seus grupos políticos e
econômicos mais reacionários e violentos – essa tendência e propensão do
capitalismo ao controle econômico monopolista e à utilização de métodos
políticos de caráter totalitário e ditatorial, visando a evitar, sobretudo, qual-
quer eventualidade realmente socialista”.
Por tudo isso, a expressão Estado Social de Direito manifesta-se carre-
gada de suspeição, ainda que se torne mais precisa quando se lhe adjunta
a palavra democrático como fizeram as Constituições da República Federal
da Alemanha e da República Espanhola para chamá-lo Estado Social e
Democrático de Direito. Mas aí, mantendo o qualificativo social ligado a
Estado, engasta-se aquela tendência neocapitalista e a petrificação do
Welfare State, com o conteúdo mencionado acima, delimitadora de qual-
quer passo à frente no sentido socialista. Talvez, para caracterizar um
Estado não socialista preocupado, no entanto, com a realização dos direitos
fundamentais de caráter social, fosse melhor manter a expressão Estado de
Direito que já tem uma conotação democratizante, mas, para retirar dele o
sentido liberal burguês individualista, qualificar a palavra Direito com o
social, com o que se definiria uma concepção jurídica mais progressista e
aberta, e então, em lugar de Estado Social de Direito, diríamos Estado de
Direito Social. Assim dissemos de outra feita, com base na Constituição de
1969, mas, não satisfeitos, acrescentamos: “Por que não avançar um pouco
mais e chegar a um conceito de Estado de Direito Econômico?”
4. O ESTADO DEMOCRÁTICO
As considerações supra mostram que o Estado de Direito, quer como
Estado Liberal de Direito, quer como Estado Social de Direito, nem sempre
caracteriza Estado Democrático. Este se funda no princípio da soberania
popular que “impõe a participação efetiva e operante do povo na coisa
pública, participação que não se exaure, como veremos, na simples forma-
ção das instituições representativas, que constituem um estágio da evolu-
ção do Estado Democrático, mas não o seu completo desenvolvimento”.
Visa, assim, realizar o princípio democrático como garantia geral dos direi-
tos fundamentais da pessoa humana. Nesse sentido, na verdade, contra-
põe-se ao Estado Liberal, pois, como lembra Paulo Bonavides, “a ideia
essencial do liberalismo não é a presença do elemento popular na forma-
ção da vontade estatal, nem tampouco a teoria igualitária de que todos têm
direito igual a essa participação ou que a liberdade é formalmente esse
direito”.
O Estado de Direito, como lembramos acima, é uma criação do libera-
lismo. Por isso, na doutrina clássica, repousa na concepção do Direito
natural, imutável e universal; daí decorre que a lei, que realiza o princípio
da legalidade, essência do conceito de Estado de Direito, é concebida
como norma jurídica geral e abstrata. A generalidade da lei constituía o
fulcro do Estado de Direito. Nela se assentaria o justo conforme a razão.
Dela, e só dela, defluiria a igualdade. “Sendo regra geral, a lei é regra para
todos.” O postulado da generalidade das leis foi ressuscitado por Carl
Schmitt sob a Constituição de Weimar, após ter sido abandonado sob a
influência de Laband, surgindo, em seu lugar, a divisão das leis em formais
e materiais. Essa restauração tem sentido ideológico preciso, pois que,
como lembra Franz Neumann, a teoria de que o Estado só pode governar
por meio de leis gerais se aplica a um sistema econômico de livre concor-
rência, e “o renascimento, sob a Constituição de Weimar, da noção da
generalidade das leis e sua aplicação indiscriminada às liberdades pesso-
ais, políticas e econômicas, foi assim usado como um dispositivo para
restringir o poder do Parlamento que já não mais representava exclusiva-
mente os interesses dos grandes latifundiários, dos capitalistas, do exército
e da burocracia. E então, o direito geral, dentro da esfera econômica, era
usado para conservar o sistema de propriedade existente e para protegê-lo
contra intervenção, sempre que esta fosse julgada incompatível com os
interesses dos grupos mencionados acima”.
Invoca-se, com frequência, a doutrina da vontade geral de Rousseau
para fundamentar a afirmativa de que a igualdade só pode ser atingida por
meio de normas gerais, mas esquece-se de que ele discutia o direito geral
com referência a uma sociedade em que só haveria pequenas propriedades
ou propriedades comuns. Não é, pois, fundamento válido para o postulado
da generalidade que embasa o liberalismo capitalista. De fato, a “proprie-
dade particular, que é sagrada e inviolável, de acordo com Rousseau, só é
propriedade até onde permanece como um direito individual e discriminado.
Se for considerada comum a todos os cidadãos, ficará sujeita a volonté
générale e poderá ser infringida ou negada. Assim o soberano não tem o
direito de tocar na propriedade de um ou de diversos cidadãos, embora
possa legitimamente tomar a propriedade de todos”.
Conclui-se daí que a igualdade do Estado de Direito, na concepção
clássica, se funda num elemento puramente formal e abstrato, qual seja a
generalidade das leis. Não tem base material que se realize na vida concre-
ta. A tentativa de corrigir isso, como vimos, foi a construção do Estado
Social de Direito, que, no entanto, não foi capaz de assegurar a justiça
social nem a autêntica participação democrática do povo no processo
político, de onde a concepção mais recente do Estado Democrático de
Direito, como Estado de legitimidade justa (ou Estado de Justiça material),
fundante de uma sociedade democrática, qual seja a que instaure um
processo de efetiva incorporação de todo o povo nos mecanismos do
controle das decisões, e de sua real participação nos rendimentos da
produção.
5. CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
A configuração do Estado Democrático de Direito não significa apenas
unir formalmente os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito.
Consiste, na verdade, na criação de um conceito novo, que leve em conta
os conceitos dos elementos componentes, mas os supera na medida em
que incorpora um componente revolucionário de transformação do status
quo. E aí se entremostra a extrema importância do art.1o. da Constituição
de 1988, quando afirma que a República Federativa do Brasil se constitui
em Estado Democrático de Direito, não como mera promessa de organizar
tal Estado, pois a Constituição aí já o está proclamando e fundando.
A Constituição portuguesa instaura o Estado de Direito Democrático,
com o “democrático” qualificando o Direito e não o Estado. Essa é uma
diferença formal entre ambas as Constituições. A nossa emprega a expres-
são mais adequada, cunhada pela doutrina, em que o “democrático” qualifi-
ca o Estado, o que irradia os valores da democracia sobre todos os seus
elementos constitutivos e, pois, também, sobre a ordem jurídica. O Direito,
assim, imantado por esses valores, se enriquece do sentir popular e terá
que ajustar-se ao interesse coletivo. Contudo, o texto da Constituição
portuguesa dá ao Estado de Direito Democrático o conteúdo básico que a
doutrina reconhece ao Estado Democrático de Direito, quando afirma que
ele é “baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos
e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização
política democráticas, que tem por objetivo assegurar a transição para o
socialismo mediante a realização da democracia econômica, social e cultu-
ral e o aprofundamento da democracia participativa”(art. 2o).
A democracia que o Estado Democrático de Direito realiza há de ser
um processo de convivência social numa sociedade livre, justa e solidária
(art. 3o, I), em que o poder emana do povo, deve ser exercido em proveito
do povo, diretamente ou por seus representantes eleitos (art.1o, parágrafo
único); participativa, porque envolve a participação crescente do povo no
processo decisório e na formação dos atos de governo; pluralista, porque
respeita a pluralidade de ideias, culturas e etnias e pressupõe assim o
diálogo entre opiniões e pensamentos divergentes e a possibilidade de
convivência de formas de organização e interesses diferentes na socieda-
de; há de ser um processo de liberação da pessoa humana das formas de
opressão que não depende apenas do reconhecimento formal de certos
direitos individuais, políticos e sociais, mas especialmente da vigência de
condições econômicas suscetíveis de favorecer o seu pleno exercício.
Não é Estado de democracia popular subordinado ao personalismo e
ao monismo político, mas tende a realizar a síntese do processo contraditó-
rio do mundo contemporâneo, manifestado entre os Estados capitalistas ou
neocapitalistas do ocidente e os Estados coletivistas do leste. Será, neste
quadrante, o tipo de Estado do futuro, superador das atuais antíteses Leste-
Oeste e Norte-Sul. É nesse sentido o pronunciamento de Elías Díaz:
“Desta forma, e sem querer chegar com isso apressadamente ‘à gran-
de síntese final’ ou a qualquer outra forma de ‘culminação da História’ (isto
deve ficar bem claro), cabe dizer que o Estado Democrático de Direito
aparece como a fórmula institucional em que atualmente, e sobretudo para
um futuro próximo, pode vir a concretizar-se o processo de convergência
em que podem ir concorrendo as concepções atuais da democracia e do
socialismo. A passagem do neocapitalismo ao socialismo nos países de
democracia liberal e, paralelamente, o crescente processo de despersonali-
zação e institucionalização jurídica do poder nos países de democracia
popular, constituem em síntese a dupla ação para esse processo de con-
vergência em que aparece o Estado Democrático de Direito.” O mesmo
autor, em outra obra, define-o como a institucionalização do poder popular
ou realização democrática do socialismo.
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 3
A Constituição de 1988, contudo, não chegou a estruturar um Estado
Democrático de Direito de conteúdo socialista, mas abre as perspectivas de
realização social profunda pela prática dos direitos sociais que ela inscreve
e pelo exercício dos instrumentos que oferece à cidadania que possibilita
concretizar as exigências de um Estado de justiça social fundado na digni-
dade da pessoa humana.
6. A LEI NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
O princípio da legalidade é também um princípio basilar do Estado Demo-
crático de Direito. É da essência do seu conceito subordinar-se à Constituição e
fundar-se na legalidade democrática. Sujeita-se, como todo Estado de Direito,
ao império da lei, mas da lei que realize o princípio da igualdade e da justiça, não
pela sua generalidade, mas pela busca da igualização das condições dos
socialmente desiguais. Deve-se, pois, ser destacada a relevância da lei no
Estado Democrático de Direito, não apenas quanto ao seu conceito formal de
ato jurídico abstrato, geral, obrigatório e modificativo da ordem jurídica existente,
mas também à sua função de regulamentação fundamental, produzida segundo
um procedimento constitucional qualificado. A lei é efetivamente o ato oficial de
maior realce na vida política. Ato de decisão política por excelência, é por meio
dela, enquanto emanada da atuação da vontade popular, que o poder estatal
propicia ao viver social modos predeterminados de conduta, de maneira que os
membros da sociedade saibam, de antemão, como guiar-se na realização de
seus interesses.
É precisamente no Estado Democrático de Direito que se ressalta a re-
levância da lei, pois ele não pode ficar limitado a um conceito de lei, como o
que imperou no Estado de Direito clássico. Pois ele tem que estar em
condições de realizar, mediante lei, intervenções que impliquem diretamen-
te uma alteração na situação da comunidade. Significa dizer: a lei não deve
ficar numa esfera puramente normativa, não pode ser apenas lei de arbitra-
gem, pois precisa influir na realidade social. E se a Constituição se abre
para as transformações políticas, econômicas e sociais que a sociedade
brasileira requer, a lei se elevará de importância, na medida em que, sendo
fundamental expressão do direito positivo, caracteriza-se como desdobra-
mento necessário do conteúdo da Constituição e aí exerce função trans-
formadora da sociedade, impondo mudanças sociais democráticas, ainda
que possa continuar a desempenhar uma função conservadora, garantindo
a sobrevivência de valores socialmente aceitos.
7. OS PRINCÍPIOS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Limitar-nos-emos a indicar esses princípios, sem entrar em pormeno-
res. São os seguintes:
a) princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar, que
o Estado Democrático de Direito se funda na legitimidade de uma
Constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de
supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes,
com as garantias de atuação livre da jurisdição constitucional;
b) princípio democrático que, nos termos da Constituição, há de consti-
tuir uma democracia representativa e participativa, pluralista, e que
seja a garantia geral da vigência e eficácia dos direitos fundamentais
(art.1o);
c) sistema de direitos fundamentais individuais, coletivos, sociais e cul-
turais (Títs. II, VII e VIII);
d) princípio da justiça social, referido no art.170, caput, no art. 193, co-
mo princípio da ordem econômica e da ordem social; como disse-
mos, a Constituição não prometeu a transição para o socialismo me-
diante a realização da democracia econômica, social e cultural e o
aprofundamento da democracia participativa, como o faz a Constitui-
ção portuguesa, mas abre-se ela, também, para a realização da de-
mocracia social e cultural, embora não avance significativamente ru-
mo à democracia econômica;
e) princípio da igualdade (art. 5o, caput, e inciso I);
f) princípio da divisão de poderes (art. 2o) e da independência do juiz
(art. 95);
g) princípio da legalidade (art. 5o, II);
h) princípio da segurança jurídica (art. 5o, XXXV a LXXII).
8. TAREFA FUNDAMENTAL DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DI-
REITO
A tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em
superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime demo-
crático que realize a justiça social. José Afonso Da Silva
19. TIPOS DE CONSTITUIÇÃO.
Classificação das Constituições: quanto ao conteúdo: materiais e
formas; quanto à forma: escritas e não escritas; quanto ao modo de elabo-
ração: dogmáticas e históricas; quanto à origem: populares (democráticas)
ou outorgadas; quanto à estabilidade: rígidas, flexíveis e semi-rígidas.
 A constituição material em sentido amplo, identifica-se com a or-
ganização total do Estado, com regime político; em sentido estrito,
designa as normas escritas ou costumeiras, inseridas ou não num
documento escrito, que regulam a estrutura do Estado, o organiza-
ção de seus órgãos e os direitos fundamentais.
 A constituição formal é o peculiar modo de existir do Estado, re-
duzido, sob forma escrita, a um documento solenemente estabele-
cido pelo poder constituinte e somente modificável por processos e
formalidades especiais nela própria estabelecidos.
 A constituição escrita é considerada, quando codificada e siste-
matizada num texto único, elaborado por um órgão constituinte,
encerrando todas as normas tidas como fundamentais sobre a es-
trutura do Estado, a organização dos poderes constituídos, seu
modo de exercício e limites de atuação e os direitos fundamentais.
 Não escrita, é a que cujas normas não constam de um documento
único e solene, baseando-se nos costumes, na jurisprudência e em
convenções e em textos constitucionais esparsos. Ex. constituição
inglesa.
 Constituição dogmática é a elaborada por um órgão constituinte,
e sistematiza os dogmas ou ideias fundamentais da teoria política
e do Direito dominantes no momento.
 Histórica ou costumeira: é a resultante de lenta formação históri-
ca, do lento evoluir das tradições, dos fatos sócio-políticos, que se
cristalizam como normas fundamentais da organização de deter-
minado Estado.
São populares as que se originam de um órgão constituinte composto
de representantes do povo, eleitos para o fim de elaborar e estabelecer a
mesma. (Cfs de 1891, 1934, 1946 e 1988).
 Outorgadas são as elaboradas e estabelecidas sem a participação
do povo, aquelas que o governante por si ou por interposta pessoa
ou instituição, outorga, impõe, concede ao povo. (Cfs 1824, 1937,
1967 e 1969).
 Rígida é a somente alterável mediante processos, solenidades e
exigências formais especiais, diferentes e mais difíceis que os de
formação das leis ordinárias ou complementares.
 Flexível é a que pode ser livremente modificada pelo legislador
segundo o mesmo processo de elaboração das leis ordinárias.
 Semi-rígida é a que contém uma parte rígida e uma flexível.
 Objeto: estabelecer a estrutura do Estado, a organização de seus
órgãos, o modo de aquisição do poder e a forma de seu exercício,
limites de sua atuação, assegurar os direitos e garantias dos indi-
víduos, fixar o regime político e disciplinar os fins sócio-
econômicos do Estado, bem como os fundamentos dos direitos
econômicos, sociais e culturais.
 Conteúdo: é variável no espaço e no tempo, integrando a multipli-
cidade no “uno”das instituições econômicas, jurídicas, políticas e
sociais na unidade múltipla da lei fundamental do Estado.
 Elementos: por sua generalidade, revela em sua estrutura norma-
tiva as seguintes categorias: a) elementos orgânicos: que se con-
têm nas normas que regulam a estrutura do Estado e do poder; b)
limitativos: que se manifestam nas normas que consubstanciam o
elenco dos direitos e garantias fundamentais; limitam a ação dos
poderes estatais e dão a tônica do Estado de Direito (individuais e
suas garantias, de nacionalidade, políticos); c) sócio-ideológicos:
consubstanciados nas normas sócio-ideológicas, que revelam a
caráter de compromisso das constituições modernas entre o Esta-
do individualista e o social intervencionista; d) de estabilização
constitucional: consagrados nas normas destinadas a assegurar a
solução dos conflitos constitucionais, a defesa da constituição, do
Estado e das instituições democráticas; e) formais de aplicabilida-
de: são os que se acham consubstanciados nas normas que esta-
tuem regras de aplicação das constituições, assim, o preâmbulo, o
dispositivo que contém as cláusulas de promulgação e as disposi-
ções transitórias, assim, as normas definidoras dos direitos e ga-
rantias fundamentais têm aplicação imediata.
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17. TEORIA GERAL DA CONSTITUIÇÃO:
CONCEITO, ORIGENS, CONTEÚDO, ESTRUTURA E
CLASSIFICAÇÃO. 18. SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO.
20. CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS.
A experiência histórica do século XX confirmou o estado como institui-
ção predominante nas sociedades humanas. Seu principal instrumento, a
constituição, é a fonte por excelência da teoria jurídica.
Lei máxima, que encerra as normas superiores da ordenação jurídica
de uma nação, a constituição define desde a forma do estado e do governo
até o complexo normativo e costumeiro referente ao poder político organi-
zado e aos direitos dos cidadãos. Todos os estados, seja qual for sua forma
de governo, desde que ajam de acordo com certas normas fundamentais e
possuam ordenamento jurídico, têm constituição. As constituições podem
ser escritas, como a brasileira, expressa num documento único e definido,
ou consuetudinárias, como a do Reino Unido, que se baseia num conjunto
de documentos, estatutos e práticas tradicionais aceitas pela sociedade.
Teorias tradicionais. Desde a Grécia clássica, desenvolveu-se no Oci-
dente europeu a convicção de que a comunidade política deve ser gover-
nada por lei embasada no direito natural. Foi Aristóteles, a partir do estudo
e classificação das diferentes formas de governo, quem desenvolveu o
conceito de constituição. Para ele havia três formas legítimas de organiza-
ção política: monarquia, ou governo de um só homem; aristocracia, ou
governo dos melhores; e democracia, governo de todos os cidadãos. As
formas ilegítimas que correspondem a cada uma das formas legítimas
seriam, respectivamente, tirania, oligarquia e demagogia. O melhor sistema
de governo seria o que combinasse elementos das três formas legítimas,
de modo que todos assegurassem seus direitos e aceitassem seus deve-
res, em nome do bem comum. Outro princípio aristotélico afirma que os
governantes são obrigados a prestar contas aos governados e que todos os
homens são iguais perante a lei. Esse princípio se aplicava, na antiga
Grécia, apenas aos homens livres e não aos escravos.
O aprimoramento da lei foi a maior contribuição de Roma à civilização
ocidental. Para os dirigentes romanos, a organização do estado correspon-
dia a uma lei racional, que refletia a organização do mundo.
A partir do momento em que se transformou na religião predominante
do Ocidente, o cristianismo defendeu uma concepção monárquica de
governo. Nos últimos anos do Império Romano, santo Agostinho postulava
que as constituições terrenas deviam, na medida do possível, corresponder
ao modelo da "cidade de Deus" e concentrar o poder num único soberano.
Segundo essa tese, que se firmou durante a Idade Média e deu sustenta-
ção ao absolutismo monárquico, o monarca recebia o mandato de Deus.
Os fundamentos teóricos do constitucionalismo moderno nasceram das
teorias sobre o contrato social, defendidas no século XVII por Thomas
Hobbes e John Locke, e no século seguinte por Jean-Jacques Rousseau.
De acordo com essas teorias, os indivíduos cediam, mediante um contrato
social, parte da liberdade absoluta que caracteriza o "estado de natureza"
pré-social, em troca da segurança proporcionada por um governo aceito por
todos.
Fundamentos constitucionais
Princípios básicos. Para cumprir suas funções, a constituição deve
harmonizar o princípio da estabilidade, na forma e no procedimento, com o
da flexibilidade, para adaptar-se às mudanças sociais, econômicas e tecno-
lógicas inevitáveis na vida de uma nação. Também deve prever alguma
forma de controle e prestação de contas do governo perante outros órgãos
do estado e determinar claramente as áreas de competência dos poderes
legislativo, executivo e judiciário.
Os princípios constitucionais podem agrupar-se, como é o caso da
constituição brasileira, em duas categorias: estrutural e funcional. Os pri-
meiros, como os que definem a federação e a república, são juridicamente
inalteráveis e não podem ser abolidos por emenda constitucional; os princí-
pios que se enquadram na categoria funcional, como os que dizem respeito
ao regime (no caso brasileiro, democracia representativa) e ao sistema de
governo (bicameralismo, presidencialismo e controle judicial) podem ser
modificados por reforma da constituição. A inobservância de qualquer
desses princípios, ou de outros deles decorrentes, está expressamente
referida na constituição brasileira como motivo de intervenção federal nos
estados.
As constituições podem ser flexíveis ou rígidas, conforme a maior ou
menor facilidade com que podem ser modificadas. As constituições flexí-
veis, como a britânica, são modificadas por meio de procedimentos legisla-
tivos normais; as constituições rígidas modificam-se mediante procedimen-
tos complexos, nos quais geralmente se exige maioria parlamentar qualifi-
cada.
Federação. A organização federal é o primeiro princípio fundamental
abordado pela constituição brasileira. Pressupõe a união indissolúvel de
estados autônomos e a existência de municípios também autônomos,
peculiaridade que distingue a federação brasileira da americana, por exem-
plo, na qual a questão da autonomia municipal é deixada à livre regulação
dos estados federados. Verifica-se assim que no Brasil a federação se
exprime juridicamente pelo desdobramento da personalidade estatal nacio-
nal na tríplice ordem de pessoas jurídicas de direito público constitucional:
União, estados e municípios. O Distrito Federal, sede do governo da União,
tem caráter especial.
A autonomia dos estados se expressa: (1) pelos princípios decorrentes
do governo próprio e da administração própria, com desdobramentos, nos
respectivos âmbitos regionais, dos poderes executivo, legislativo e judiciá-
rio; (2) pelo princípio dos poderes reservados, por força do qual todos os
poderes não conferidos expressa ou necessariamente à União ou aos
municípios competem ao estado federado.
O princípio da autonomia municipal, cujo desrespeito acarreta a inter-
venção federal, é mais restrito que o da autonomia estadual e exprime-se:
(1) pela eleição direta do prefeito, vice-prefeito e vereadores; e (2) pela
existência de administração própria, autônoma, no que concerne ao inte-
resse peculiar do município.
República. O princípio da forma republicana, cujo desrespeito também
motiva intervenção, desdobra-se, no sistema brasileiro, em três proposi-
ções: (1) temporariedade das funções eletivas, cuja duração, nos estados e
municípios, é limitada à das funções correspondentes no plano federal; (2)
inelegibilidade dos ocupantes de cargos do poder executivo para o período
imediato; e (3) responsabilidade pela administração, com obrigatória pres-
tação de contas.
Democracia representativa. Pela definição constitucional, democracia é
o regime em que todo poder emana do povo e em seu nome é exercido. O
princípio fundamental da representação está assegurado pela adoção de:
(1) sufrágio universal e direto; (2) votação secreta e (3) representação
proporcional dos partidos.
Sistema bicameral. O princípio do bicameralismo, ou sistema bicame-
ral, diz respeito à estruturação do poder legislativo em dois órgãos diferen-
tes. Por exemplo, a Câmara dos Comuns e a Câmara dos Lordes, no Reino
Unido; o Bundestag (câmara baixa) e o Bundesrat (câmara alta), na Alema-
nha; o Senado e a Câmara dos Representantes, nos Estados Unidos; e o
Senado Federal e a Câmara dos Deputados, no Brasil. A composição das
duas câmaras é sempre diferente em relação ao número de membros que
as integram, à extensão de seus poderes e, em alguns casos, no sistema
de recrutamento, como na Câmara dos Lordes, em que muitas cadeiras são
hereditárias.
Sistema presidencial. O presidencialismo é o sistema de governo repu-
blicano que se assenta na rigorosa separação de poderes e atribui ao
presidente da república grande parte da função governamental e a plenitu-
de do poder executivo. Nesse sistema, o presidente coopera na legislação,
orienta a política interna e internacional, assume a gestão superior das
finanças do estado, exerce o comando supremo das forças armadas e
escolhe livremente os ministros e assessores, que o auxiliam no desempe-
nho das respectivas funções, dentro dos programas, diretrizes e ordens
presidenciais. O sistema presidencialista vigente em muitos países baseia-
se em linhas gerais no padrão dos Estados Unidos, com variantes que não
alteram as características que o definem.
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 5
Sistema de controle judicial. Devido à organização federal e conse-
quente supremacia da constituição da república sobre as dos estados, bem
como à prevalência das normas constitucionais sobre a legislação ordinária,
atribui-se ao poder judiciário, concomitantemente com a função de julgar, a
de controlar a constitucionalidade das leis. Além disso, como as constitui-
ções geralmente asseguram que a lei não pode deixar de apreciar nenhu-
ma lesão do direito individual, compete também ao judiciário o controle
contencioso dos atos das autoridades.
Uma lei comum pode entrar em choque com algum artigo da constitui-
ção. Por isso, é necessário que exista um órgão de controle da constitucio-
nalidade das leis, que entra em ação antes de sua promulgação, como na
França, ou depois, como no Brasil, onde o Supremo Tribunal Federal pode
pronunciar-se por iniciativa própria ou quando solicitado.
Liberdades públicas. Conjunto de direitos inalienáveis do cidadão, in-
dependentes do arbítrio das autoridades, as liberdades públicas são garan-
tidas pelas constituições modernas, principalmente as seguintes: liberdade
religiosa; liberdade de imprensa e de manifestação do pensamento; liber-
dade de associação, política ou não, e de reunir-se em praça pública, sem
armas; inviolabilidade de domicílio e de correspondência; garantia contra
prisão arbitrária, confisco e expropriação; liberdade de locomover-se dentro
do território nacional e liberdade de sair do país. Todas essas prerrogativas
do cidadão são chamadas direitos individuais. Seu conjunto constitui a
liberdade (no singular), característica do estado de direito, oposto ao estado
policial e autoritário. As liberdades (no plural) são prerrogativas não da
pessoa, mas de grupos, classes e entidades.
Matérias regulamentadas. No que tange a sua formulação escrita, as
constituições do século XIX tendiam a ser breves e conter apenas as nor-
mas fundamentais. A partir da primeira guerra mundial, o texto constitucio-
nal passou a incluir princípios referentes a temas sociais, econômicos e
políticos, antes regulados por leis ordinárias.
Nas constituições modernas, geralmente as matérias regulamentadas
são: (1) soberania nacional, língua, bandeira e forças armadas; (2) direitos,
deveres e liberdades dos cidadãos; (3) princípios reguladores da política
social e da economia; (4) relações internacionais; (5) composição e estatuto
do governo e suas relações com as câmaras legislativas; (6) poder judiciá-
rio; (7) organização territorial do estado; (8) tribunal constitucional ou órgão
similar; e (9) procedimento para a reforma constitucional.
A constituição é geralmente elaborada por uma Assembleia constituinte
e por ela decretada e promulgada. Quando entra em vigor por decisão do
governante, diz-se que é outorgada; é o caso das constituições brasileiras
de 1824, outorgada por D. Pedro I; de 1937, que instituiu o Estado Novo; e
de 1967, imposta pelo governo militar. Historicamente, as constituições
outorgadas pelo monarca absoluto no exercício do poder, mesmo com
aprovação da representação popular, denominam-se cartas.
Constituições brasileiras
A primeira constituição do Brasil foi outorgada pelo imperador D. Pedro
I, depois de dissolvida a Assembleia Geral Constituinte, no tumultuado
período que se seguiu à independência. Datada de 24 de fevereiro de 1824,
seu projeto se deve, em boa parte, a José Joaquim Carneiro de Campos,
depois marquês de Caravelas, mas é indubitável que nele também colabo-
rou o jovem imperador. Em linhas gerais, assemelha-se ao projeto que se
discutia na Constituinte, de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada: calcavam-
se ambos na constituição espanhola de 1812. Tinha de particular a figura
do poder moderador, exercido pelo monarca.
No período da Regência, operou-se importante reforma constitucional
por meio do instrumento denominado Ato Adicional, de 12 de agosto de
1834, que criava as Assembleias Legislativas Provinciais. Seguiu-se a lei
de Interpretação ao Ato Adicional, de 12 de maio de 1840. Em 20 de julho
de 1847, um decreto imperial consagrou o regime parlamentarista e o cargo
de presidente do Conselho de Ministros.
Proclamada a república, em 15 de novembro de 1889, o marechal De-
odoro da Fonseca decretou a lei de Organização do Governo Provisório da
República dos Estados Unidos do Brasil, de autoria de Rui Barbosa, então
ministro da Fazenda e primeiro vice-chefe do governo. De Rui Barbosa são
ainda as principais emendas ao projeto de constituição, elaborado pela
chamada Comissão dos Cinco, que teve como presidente Joaquim Salda-
nha Marinho. Reunido o Congresso Constituinte, a primeira constituição
republicana foi promulgada em 24 de fevereiro de 1891. Consagrava o
princípio do unionismo (predomínio da União sobre os estados) e adotava o
recurso do habeas-corpus, garantia outorgada em favor de quem sofreu ou
pode sofrer coação ou violência por parte do poder público.
De cunho acentuadamente presidencialista, a constituição de 1891 foi
reformada ao tempo do governo Artur Bernardes, em 1926, para fortalecer
ainda mais o poder executivo. O quatriênio que se seguiu foi interrompido
pela revolução de 1930, que levou ao poder Getúlio Vargas, chefe da
Aliança Liberal e candidato derrotado às eleições de 1o de março, denunci-
adas como fraudulentas. Em 11 de novembro de 1930, Vargas decretou a
lei de Organização do Governo Provisório.
A segunda constituição republicana data de 16 de julho de 1934. Eleito
pela Assembleia Constituinte para um mandato de quatro anos, a expirar
em 1938, Vargas deu um golpe de estado e outorgou a constituição de
1937, que instituiu o Estado Novo. Essa constituição ampliava os poderes
do poder executivo e acolhia direitos de família e os direitos à educação e à
cultura.
A terceira constituição republicana, de 18 de setembro de 1946, encer-
rou a ditadura de Vargas e consagrou o restabelecimento da democracia no
país, conciliando diferentes tendências políticas. O legislativo voltou a
funcionar e o uso da propriedade foi condicionado ao bem-estar social.
A constituição de 1946 instituiu o salário mínimo, o direito de greve e o
ensino gratuito. A idade mínima para o exercício do voto baixou de 21 para
18 anos. Essa constituição foi emendada em 1961 para instituir o parlamen-
tarismo, durante a crise deflagrada pela renúncia do presidente Jânio
Quadros, mas a emenda foi revogada em janeiro de 1963.
O governo militar instaurado em 1964 procurou legitimar o autoritarismo
por meio de sucessivos atos institucionais, que desfiguraram progressiva-
mente a constituição. Só em 1967, porém, ela seria formalmente substituí-
da. Resultado do projeto preparado por uma comissão de juristas, convo-
cados pelo presidente Castelo Branco, e alterado pelo ministro da Justiça,
Carlos Medeiros Silva, a nova constituição foi aprovada pelo Congresso,
convocado para esse fim pelo Ato Adicional de 7 de dezembro de 1966.
A constituição de 1967 acabou com a eleição direta para presidente da
república e criou, para elegê-lo, um colégio eleitoral. Com ela foram sus-
pensas as garantias dos juízes e aprofundou-se a intervenção da União na
economia dos estados. Novas medidas, particularmente o Ato Institucional
n 5, foram alterando essa constituição até que, na crise deflagrada pela
doença do presidente Costa e Silva, uma junta militar assumiu o poder e
baixou, em 17 de outubro de 1969, a Emenda no 1, em substituição ao
projeto que o presidente pretendia apresentar. Tratava-se, na prática, de
uma nova constituição, que reforçou ainda mais o poder executivo ao
instituir as medidas de emergência e o estado de emergência.
A constituição de 1969 esvaziou-se com o progressivo esfacelamento
do regime militar. Em 1987, o presidente José Sarney, eleito ainda pelo
voto indireto, convocou a nova Assembleia Nacional Constituinte. A consti-
tuição por ela projetada, promulgada em 5 de outubro de 1988, devolveu
os poderes do legislativo e deu-lhe novas atribuições em matéria de política
econômico-financeira, orçamento, política nuclear e política de comunica-
ções. Criou também novos direitos individuais, coletivos e sociais e ampliou
particularmente os direitos do trabalhador. ©Encyclopaedia Britannica do
Brasil Publicações Ltda.
Presidencialismo
Adotado sob formas variadas em muitos países, o presidencialismo tem
como base doutrinária a teoria política de separação e controle recíproco
dos poderes, de Montesquieu, que pode ser resumida na sentença do
autor: "O poder deve limitar o poder."
Presidencialismo é o sistema de governo no qual os poderes, funções
e deveres de chefe de governo e de chefe de estado se reúnem numa só
pessoa e no qual o executivo, legislativo e judiciário são poderes indepen-
dentes entre si que funcionam em harmonia. Eleito pelo voto direto ou por
colégio eleitoral, para mandato com período determinado em lei constituci-
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 6
onal, o presidente não se subordina ao Parlamento nem pode nele interferir.
Entre suas atribuições estão a de liderar a vida política da nação, represen-
tar o país interna e externamente, comandar as forças armadas, firmar
tratados, encaminhar projetos de lei ao Congresso, responder pela adminis-
tração e pelas decisões nos setores do executivo e escolher os ministros de
estado.
O sistema presidencialista de governo foi criado nos Estados Unidos
pela constituição de 1787. Para limitar o poder do governo e garantir a
liberdade dos cidadãos, os constituintes rejeitaram o modelo parlamentar
britânico e estabeleceram a separação total do legislativo, executivo e
judiciário, com um sistema de pesos e contrapesos no qual cada poder
fiscaliza e contrabalança os demais, sem predomínio de nenhum deles. O
presidente americano é eleito por um colégio eleitoral, para um mandato de
quatro anos, com direito a concorrer uma vez à reeleição. O presidente não
precisa ter maioria no Congresso, mas em todas as questões de política
geral que envolvem a legislação ou gastos de verbas deve negociar com os
parlamentares para fazer aprovar seus projetos.
Nas eleições presidenciais americanas, o eleitor participa de todas as
etapas do processo: escolhe o candidato de cada partido nas eleições
primárias, elege o colégio eleitoral de cada estado e vota nos candidatos
vencedores nas primárias no dia das eleições nacionais gerais. O colégio
eleitoral, que escolhe o presidente, se compõe de delegados dos cinquenta
estados da nação. Cada estado elege um número de delegados equivalen-
te à representação que tem nas duas casas do Congresso. Parlamentares
eleitos não podem ser delegados. A eleição é praticamente direta porque os
delegados respeitam a vontade manifesta pelo voto popular, embora haja
exemplos de maioria mais expressiva no colégio eleitoral do que no voto
direto, como na eleição de Abraham Lincoln em 1860.
Em outras nações, o presidencialismo divergiu em muitos aspectos do
modelo americano. Nos países europeus em que a forma de governo é
republicana e o sistema parlamentarista, o presidente é eleito para um
mandato estabelecido por lei e ocupa a posição de chefe de estado, en-
quanto o primeiro-ministro exerce a função de chefe de governo. As atribui-
ções do presidente se assemelham às dos monarcas constitucionais. Na
Suíça o poder executivo é exercido pelo Conselho Federal, colegiado de
sete membros eleitos para um período de quatro anos pela Assembleia
Federal, que a cada ano elege um deles para o exercício da presidência.
Na América Latina, a tendência histórica tem sido o fortalecimento do
executivo sem equilíbrio entre os poderes, o que levou com frequência
muitas nações a ditaduras que prescindiam não só do legislativo e do
judiciário como da própria participação popular.
No Brasil, o presidencialismo estabelecido na constituição republicana
de 1891 passou por mudanças profundas, ocasionadas por conflitos políti-
cos, revoltas regionais civis, rebeliões militares e inquietação econômica
decorrente da grave crise financeira mundial de 1929. A revolução de 1930
deu início ao "presidencialismo forte" de Getúlio Vargas, que se prolongou
até 1945. Nas duas décadas seguintes, o presidencialismo pautou-se pela
constituição de 1946, com voto direto e popular. A intervenção militar de
1964 interrompeu o ciclo, substituído pela presidência dos generais, que se
revezaram no poder pelo voto indireto do Congresso, transformado em
colégio eleitoral. Com a constituição de 1988, o presidencialismo recuperou
características próximas às do sistema americano, com o fortalecimento do
legislativo e do judiciário. ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações
Ltda.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a lei
fundamental e suprema do Brasil, servindo de parâmetro de validade a
todas as demais espécies normativas, situando-se no topo da pirâmide
normativa. É a sétima a reger o Brasil desde a sua Independência.
Histórico
Desde 1964 estava o Brasil sob o regime da ditadura militar, e desde
1967 (particularmente subjugado às alterações decorrentes dos Atos
Institucionais) sob uma constituição imposta pelo governo.
O sistema de exceção, em que as garantias individuais e sociais eram
diminuídas (ou mesmo ignoradas), e cuja finalidade era garantir os
interesses da ditadura (internalizado em conceitos como segurança
nacional, restrição das garantias fundamentais, etc.) fez crescer, durante o
processo de abertura política, o anseio por dotar o Brasil de uma nova
Constituição, defensora dos valores democráticos. Anseio este que se
tornou necessidade após o fim da ditadura militar e a redemocratização do
Brasil, a partir de 1985.
Ideologias manifestas na Constituição
Independentemente das controvérsias de cunho político, a Constituição
Federal de 1988 assegurou diversas garantias constitucionais, com o
objetivo de dar maior efetividade aos direitos fundamentais, permitindo a
participação do Poder Judiciário sempre que houver lesão ou ameaça de
lesão a direitos.
Para demonstrar a mudança que estava havendo no sistema
governamental brasileiro, que saíra de um regime autoritário recentemente,
a constituição de 1988 qualificou como crimes inafiançáveis a tortura e as
ações armadas contra o estado democrático e a ordem constitucional,
criando assim dispositivos constitucionais para bloquear golpes de
quaisquer natureza.
Com a nova constituição, o direito maior de um cidadão que vive em
uma democracia foi conquistado: foi determinada a eleição direta para os
cargos de Presidente da República, Governador de Estado (e do Distrito
Federal), Prefeito, Deputado (Federal, Estadual e Distrital), Senador e
Vereador. A nova Constituição também previu uma maior responsabilidade
fiscal. Ela ainda ampliou os poderes do Congresso Nacional, tornando o
Brasil um país mais democrático.
Pela primeira vez uma Constituição brasileira define a função social da
propriedade privada urbana, prevendo a existência de instrumentos
urbanísticos que, interferindo no direito de propriedade (que a partir de
agora não mais seria considerado inviolável), teriam por objetivo romper
com a lógica da especulação imobiliária. A definição e regulamentação de
tais instrumentos, porém, deu-se apenas com a promulgação do Estatuto
da Cidade em 2001.
Estrutura
A Constituição de 1988 está dividida em 10 títulos (o preâmbulo não
conta como título). As temáticas de cada título são:
 Preâmbulo - introduz o texto constitucional. De acordo com a
doutrina majoritária, o preâmbulo não possui força de lei.
 Princípios Fundamentais - anuncia sob quais princípios será
dirigida a República Federativa do Brasil.
 Direitos e Garantias Individuais - elenca uma série de direitos e
garantias individuais, coletivos, sociais, de nacionalidade e
políticos. As garantias ali inseridas (muitas delas inexistentes em
Constituições anteriores) representaram um marco na história
brasileira.
 Organização do Estado - define o pacto federativo, alinhavando as
atribuições de cada ente da federação (União, Estados, Distrito
Federal e Municípios). Também define situações excepcionais de
intervenção nos entes federativos, além de versar sobre
administração pública e servidores públicos.
 Organização dos Poderes - define a organização e atribuições de
cada poder (Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder
Judiciário), bem como de seus agentes envolvidos. Também define
os processos legislativos (inclusive para emendar a Constituição).
 Defesa do Estado e das Instituições - trata do Estado de Defesa,
Estado de Sítio, das Forças Armadas e das Polícias.
 Tributação e Orçamento - define limitações ao poder de tributar do
Estado, organiza o sistema tributário e detalha os tipos de tributos
e a quem cabe cobrá-los. Trata ainda da repartição das receitas e
de normas para a elaboração do orçamento público.
 Ordem Econômica e Financeira - regula a atividade econômica e
também eventuais intervenções do Estado na economia. Discorre
ainda sobre as normas de política urbana, política agrícola e
política fundiária.
 Ordem Social - trata da Seguridade Social (incluindo Previdência
Social), Saúde, Assistência Social, Educação, Cultura, Desporto,
Meios de Comunicação Social, Ciência e Tecnologia, Meio
Ambiente, Família, além de dar atenção especial aos seguintes
segmentos: crianças, jovens, idosos e populações indígenas.
 Disposições Gerais - artigos esparsos versando sobre temáticas
variadas e que não foram inseridas em outros títulos em geral por
tratarem de assuntos muito específicos.
 Disposições Transitórias - faz a transição entre a Constituição
anterior e a nova. Também estão incluídos dispositivos de duração
determinada.
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Características
 Rigidez - Não é facilmente alterada a Constituição exige um
processo legislativo mais elaborado, consensual e solene para a
elaboração de emendas constitucionais de que o processo comum
exigido para todas as demais espécies normativas legais.
2. PODER CONSTITUINTE.
Jean dos Santos Diniz
1 - NOÇÕES
As normas constitucionais, por ocuparem o topo do ordenamento jurí-
dico, são providas de elaboração mais dificultosa do que aqueles ditados
pela própria ordem jurídica, que vêm de cunho ordinário.
Com as noções supracitadas, podemos conceituar o Poder Constituinte
como aquele poder capaz de criar, modificar ou implementar normas de
força constitucional.
2 - TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE
Nos Estados democráticos, a titularidade do poder constituinte perten-
ce ao povo, pois o Estado decorre da soberania popular.
Em razão de sua titularidade pertencer ao povo, o poder constituinte é
permanente, isto é, não se esgota em um ato de seu exercício, visto que o
povo não pode perder o direito de querer e de mudar à sua vontade.
3 - EXERCÍCIO DO PODER CONSTITUINTE
Embora na atualidade haja um consenso teórico em afirmar ser o povo
o titular do poder constituinte, o seu exercício nem sempre tem se realizado
democraticamente.
Assim, embora legitimamente o poder constituinte pertença sempre ao
povo, temos duas formas distintas para o seu exercício: outorga e assem-
bleia nacional constituinte.
A outorga é o estabelecimento da Constituição pelo próprio detentor
do poder, sem a participação popular. É ato unilateral do governante, que
auto-limita o seu poder e impõe as regras constitucionais ao povo.
A assembleia nacional constituinte é a forma típica de exercício do
poder constituinte, em que o povo, seu legítimo titular, democraticamente,
outorga poderes a seus representantes especialmente eleitos para a elabo-
ração da Constituição.
4 - ESPÉCIES DE PODER CONSTITUINTE
A doutrina costuma distinguir as seguintes espécies de poder consti-
tuinte: poder constituinte originário e poder constituinte derivado este tendo
como espécies o poder reformador, o decorrente e o revisor.
O poder constituinte originário (também denominado genuíno, pri-
mário ou de primeiro grau) é o poder de elaborar uma Constituição. Não
encontra limites no direito positivo anterior, não deve obediência a nenhuma
regra jurídica preexistente,
Assim, podemos caracterizar o poder constituinte originário como inici-
al, permanente, absoluto, soberano, ilimitado, incondicionado, permanente
e inalienável
O poder constituinte derivado (também denominado reformador, se-
cundário, instituído, constituído, de segundo grau, de reforma) é o poder
que se ramifica em três espécies:
O poder reformador que abrange as prerrogativas de modificar, imple-
mentar ou retirar dispositivos da Constituição.
O poder Constituinte decorrente que consagra o princípio federativo de
suas Unidades
É a alma d a autonomia das federações na forma de sua constituição,
assim, a todos os Estados, o Distrito Federal e até os Municípios este na
forma de lei orgânica poderão ter suas constituições específicas em decor-
rência do Poder Constituinte Originário.
Por fim, o poder constituinte revisor que como exemplo de nossa pró-
pria Constituição Federal, possibilita a revisão de dispositivos constitucio-
nais que necessitem de reformas, porém, esta não se confunde com refor-
ma em stricto senso pois, esta é de forma mais dificultosa, quorum ainda
mais específico, segundo as regras que ela estabelece. É o poder de
reforma, que permite a mudança da Constituição, adaptando-a a novas
necessidades, sem que para tanto seja preciso recorrer ao poder constituin-
te originário. É um poder derivado (porque instituído pelo poder constituinte
originário), subordinado (porque se encontra limitado pelas normas estabe-
lecidas pela própria Constituição, as quais não poderá contrariar, sob pena
de inconstitucionalidade) e condicionado (porque o seu modo de agir deve
seguir as regras previamente estabelecidas pela própria Constituição).
Essas limitações ao poder constituinte derivado (ou de reforma) são
comumente classificadas em três grandes grupos: limitações temporais,
limitações circunstanciais e limitações materiais.
As limitações temporais consistem na vedação, por determinado lap-
so temporal, de alterabilidade das normas constitucionais. A Constituição
insere norma proibitiva de reforma de seus dispositivos por um prazo de-
terminado. Não estão presentes na nossa vigente Constituição, sendo que
no Brasil só a Constituição do Império estabelecia esse tipo de limitação,
visto que, em seu art. 174, determinava que tão-só após quatro anos de
sua vigência poderia ser reformada.
As limitações circunstanciais evitam modificações na Constituição
em certas ocasiões anormais e excepcionais do país, em que possa estar
ameaçada a livre manifestação do órgão reformador. Busca-se afastar
eventual perturbação à liberdade e à independência dos órgãos incumbidos
da reforma. A atual Constituição consagra tais limitações, ao vedar a
emenda na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de
estado de sítio (art. 60, § 1º).
As limitações materiais excluem determinadas matérias ou conteúdo
da possibilidade de reforma, visando a assegurar a integridade da Consti-
tuição, impedindo que eventuais reformas provoquem a sua destruição ou
impliquem profunda mudança de sua identidade. Tais limitações podem ser
explícitas ou implícitas.
As limitações materiais explícitas correspondem àquelas matérias
que o constituinte definiu expressamente na Constituição como inalteráveis.
O próprio poder constituinte originário faz constar na sua obra um núcleo
imodificável. Tais limitações inserem-se, pois, expressamente, no texto
constitucional e são conhecidas por "cláusulas pétreas".
Na vigente Constituição, estão prescritas no art. 60, § 4º, segundo o
qual "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e
periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais".
As limitações materiais implícitas são aquelas matérias que, apesar
de não inseridas no texto constitucional, estão implicitamente fora do alcan-
ce do poder de reforma, sob pena de implicar a ruptura da ordem constitu-
cional. Isso porque, caso pudessem ser modificadas pelo poder constituinte
derivado, de nada adiantaria a previsão expressa das demais limitações.
São apontadas pela doutrina três importantes limitações materiais implíci-
tas, a saber:
(1) a titularidade do poder constituinte originário, pois uma reforma
constitucional não pode mudar o titular do poder que cria o próprio
poder reformador;
(2) a titularidade do poder constituinte derivado, pois seria um
despautério que o legislador ordinário estabelecesse novo titular de
um poder derivado só da vontade do constituinte originário; e
(3) o processo da própria reforma constitucional, senão poderiam
restar fraudadas as limitações explícitas impostas pelo constituinte
originário.
O poder constituinte decorrente é aquele atribuído aos Estados-
membros para se auto-organizarem mediante a elaboração de suas consti-
tuições estaduais, desde que respeitadas as regras limitativas impostas
pela Constituição Federal. Como se vê, também é um poder derivado,
limitado e condicionado, visto que é resultante do texto constitucional.
Fonte: Fonte:http://www.vemconcursos.com.br/opiniao/index.phtml?
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 8
A TEORIA DO PODER CONSTITUINTE
Conforme temos trabalhado até o momento, os teóricos do Direito
constitucional são quase unânimes em afirmar que o constitucionalismo
moderno começa a ser formado no processo que se inicia com a Magna
Carta na Inglaterra em 1215. Entretanto ali não está presente a ideia de
uma Assembleia Nacional Constituinte que elaborando uma Constituição
dará início a uma nova realidade constitucional, fruto da vontade de um
poder soberano e devendo se basear na vontade popular. Temos portanto
duas realidades constitucionais que hoje parecem, lentamente, gradual-
mente, se fundirem, mas que ainda são muito distintas.
Embora o Brasil tenha sofrido influência do Direito estadunidense a par-
tir da Constituição de 1891, que copiou diversas instituições dos Estados
Unidos da América como o federalismo, o presidencialismo, o seu modelo
bicameral, o modelo de suprema corte e o modelo de controle difuso de
constitucionalidade, nossa tradição constitucional é construída a partir do
modelo continental europeu, transformando o nosso constitucionalismo em
um dos mais ricos do mundo, pois promove a construção de um processo
de síntese, ainda inicial, dos dois grandes sistemas jurídicos modernos, o
que pode ser expresso no nosso controle misto de constitucionalidade das
leis, que infelizmente vem sofrendo ataques inconstitucionais que buscam
implantar o controle concentrado único, o que é contra a democracia e logo
inconstitucional.
Entretanto, há algo em comum entre o modelo estadunidense e o eu-
ropeu continental, não compartilhado pela Inglaterra: a existência de um
poder constituinte originário, inicial, soberano e de primeiro grau capaz de
romper com a ordem anterior e iniciar uma nova vida jurídica constitucional
com a nova Constituição.
Segundo a visão de diversos constitucionalistas, a diferenciação entre
Poder Constituinte e Poder Legislativo ordinário ganhou ênfase e concreti-
zação na Revolução Francesa, quando os Estados Gerais, por solicitação
do Terceiro Estado, se proclamaram como Assembleia Nacional Constituin-
te, sem nenhuma convocação formal.
Na França revolucionária (1789) foram superadas as velhas teorias que
determinavam a origem divina do poder, afirmando a partir de então que a
nação, o povo (seja diretamente ou através de uma assembleia representa-
tiva), era o titular da soberania, e, por isso, titular do Poder Constituinte.
Entendia-se então que a Constituição deveria ser a expressão da vontade
do povo nacional, a expressão da soberania popular. Ideias que podem
parecer um pouco românticas ou artificiais em uma construção teórica
transdisciplinar contemporânea. Podemos dizer que as dificuldades (ou
impossibilidade) contemporâneas para afirmar a existência de uma (única)
vontade popular, em sociedades de extrema complexidade, é bem maior
hoje que no passado, mas sempre estiveram presentes no Estado moder-
no. Por mais democrático que tenha sido qualquer poder constituinte vamos
encontrar no complexo jogo de poder por traz da constituinte aqueles que
tem a capacidade ou possibilidade de impor seus interesses com mais força
do que outros.
Podemos dizer que a elaboração geral da teoria do Poder Constituinte
nasceu, na cultura europeia, com SIEYES, pensador e revolucionário
francês do século XVIII. A concepção de soberania nacional na época
assim como a distinção entre poder constituinte e poderes constituídos com
poderes derivados do primeiro é contribuição do pensador revolucionário.
SIEYES afirmava que objetivo ou o fim da Assembleia representativa
de uma nação não pode ser outro do que aquele que ocorreria se a própria
população pudesse se reunir e deliberar no mesmo lugar. Ele acreditava
que não poderia haver tanta insensatez a ponto de alguém, ou um grupo,
na Assembleia geral, afirmar que os que ali estão reunidos devem tratar
dos assuntos particulares de uma pessoa ou de um determinado grupo.
A conclusão da escola clássica francesa colocando a Constituição co-
mo um certificado da vontade política do povo nacional sendo que para que
isto ocorra deve ser produto de uma Assembleia Constituinte representativa
da vontade deste povo, se opõe Hans Kelsen, que afirma que a Constitui-
ção provém de uma norma fundamental. Importante ressaltar neste ponto
que os conceitos dos diversos autores serão influenciados pela compreen-
são da natureza do Poder Constituinte: seja um poder de fato ou um poder
de Direito.
Um outro aspecto que devemos estudar sobre o Poder Constituinte é
relativo a sua amplitude. Alguns autores entendem que o poder constituinte
se limita a criação originária do Direito enquanto outros compreendem que
este poder constituinte é bem mais amplo incluindo uma criação derivada
do Direito através da reforma do texto constitucional, adaptando-o aos
processos de mudança sociocultural , e ainda o poder constituinte decorren-
te, característica essencial de uma federação, quando os entes federados
recebem (ou permanecem com) parcelas de soberania expressas na com-
petência legislativa constitucional.
Um terceiro aspecto a ser estudado, e sobre o qual também existem di-
vergências, diz respeito à titularidade do Poder Constituinte.
Para uma melhor compreensão desta matéria e de sua diversas com-
preensões, é necessário estudar separadamente cada um destes elemen-
tos. Não se pode vincular, como pretenderam alguns, o posicionamento
com relação à natureza do Poder Constituinte com a sua amplitude, e
mesmo com sua titularidade em determinados casos.
Finalmente o aspecto mais importante de todos é o estudo dos limites
ao pode constituinte tanto originário, como derivado e decorrente.
OS LIMITES DO PODER CONSTITUINTE
O poder constituinte derivado, ou de reforma, divide-se em dois: o po-
der de emenda e o poder de revisão, enquanto o poder originário pertence
a uma assembleia eleita com finalidade de elaborar a Constituição, deixan-
do de existir quando cumprida sua função, sendo um poder temporário, o
poder de reforma é um poder latente, que pode se manifestar a qualquer
momento, desde que cumpridos os requisitos formais e observados os seus
limites materiais.
O poder de reforma por meio de emendas pode em geral se manifestar
a qualquer tempo, sofrendo limites materiais, circunstanciais, formais e
algumas vezes temporais. Este poder consiste em alterar pontualmente
uma determinada matéria constitucional, adicionando, suprimindo, modifi-
cando alínea(s), inciso(s), artigo(s) da Constituição.
O poder de revisão em geral tem limites temporais, além dos limites
circunstanciais, formais e materiais, ocorrendo, em algumas Constituições,
sua manifestação periódica, como na Constituição portuguesa de 5 em 5
anos. Na nossa Constituição, houve a previsão de manifestação de poder
uma única vez não podendo ocorrer de novo pois estava prevista no Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias. A revisão é mais ampla que a
emenda, pois como sugere o nome trata-se de uma revisão sistêmica do
texto, respeitados os limites. No Brasil entretanto, a nossa revisão foi atípi-
ca, se manifestando através de emendas. Entretanto, bem ou mal feita, o
que ocorreu foi uma revisão, pois se deu, respeitados os aspectos formais
processuais da revisão prevista no ADCT.
Além do poder de reforma encontraremos nos estados federais (e ape-
nas nos estados federais) o poder decorrente que pertence aos entes
federados sejam dos estados membros no federalismo de dois níveis,
sejam dos estados membros e municípios no federalismo de três níveis.
Este poder também é subordinado e limitado, tendo limites expressos e
devendo respeitar os princípios fundamentais e estruturantes da Constitui-
ção Federal.
Quanto aos limites do poder constituinte podemos dizer o seguinte:
a) limites materiais: os limites materiais dizem respeito às matérias
que não podem ser objeto de emenda expressos ou implícitos;
b) os limites materiais implícitos dizem respeito a própria essência do
poder de reforma. Mesmo que não existam limites expressos, a
segurança jurídica exige que o poder de reforma não se transfor-
me, por falta de limites materiais, em um poder originário. O poder
de reforma pode modificar mantendo a essência da Constituição,
ou seja, os princípios fundantes e estruturantes da Constituição,
pois reforma não é construir outro mas modificar mantendo a estru-
tura e os fundamentos;
c) são portanto limites materiais implícitos o respeito aos princípios
fundamentais e estruturais da constituição, que só poderão ser
modificados através de outra assembleia constituinte, ou seja,
através de um outro poder constituinte originário;
d) o artigo 60 parágrafo 4 incisos I a IV da CF trazem os limites mate-
riais expressos, dispondo que é vedada emenda tendente a abolir
a forma federal, os direitos individuais e suas garantias, a separa-
ção de poderes e a democracia;
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Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 9
e) já estudamos a teoria da indivisibilidade dos direitos fundamentais
e podemos afirmar com muita tranquilidade que não podem existir
emendas que venham de alguma forma limitar os direitos individu-
ais, políticos, sociais e econômicos;
f) podem existir emendas sobre a separação de poderes, a democra-
cia, os direitos individuais e suas garantias e o federalismo, desde
que sejam para aperfeiçoar, jamais para restringir;
g) como já estudado no tomo II do Curso de Direito Constitucional, a
proteção ao federalismo, significa a proteção ao processo de des-
centralização essencial ao nosso federalismo centrífugo;
h) além dos limites materiais expressos no artigo 60 parágrafo 4 da
CF 88 encontramos limites circunstanciais, que proíbem emendas
ou revisão durante situações de grave comprometimento da estabi-
lidade democrática como o estado de sitio, estado de defesa e in-
tervenção federal;
i) como afirmado acima, existem limites materiais implícitos que re-
presentam a própria essência do poder constituinte derivado;
j) o poder de reforma, como o nome sugere, diz respeito a alteração
de elementos secundários de uma ordem jurídica, pois não é pos-
sível através de emenda ou revisão alterar os princípios fundamen-
tais ou estruturais de uma ordem constitucional;
k) os princípios fundamentais e estruturantes são a essência da
Constituição e mesmo que não haja clausula expressa que proíba
emenda ou revisão, a essência não pode ser alterada;
l) reforma significa alterar normas secundárias, as regras, mas, ja-
mais, a estrutura, a essência, o fundamento de uma ordem jurídica;
m) reforma não significa a construção de novo;
n) outro limite implícito obvio diz respeito as regras constitucionais re-
ferentes ao funcionamento ao poder constituinte de reforma;
o) estas regras não podem ser objeto de emenda;
p) as regras de funcionamento do poder constituinte derivado, o po-
der de reforma, por motivos óbvios, não podem ser objeto de
emenda ou revisão, pois, caso contrario estaríamos condenados a
mais absoluta insegurança jurídica;
q) além disto são limites ao poder de reforma, a proibição de revisão
antes de cinco anos contados da promulgação da Constituição (li-
mite temporal);
r) a proibição do funcionamento do poder de reforma (emendas ou
revisão) durante estado de defesa, de sitio ou intervenção federal
constituem limites circunstanciais como já mencionado;
s) os limites formais obrigam que a emenda de dê através de quorum
de 3 quintos em dois turnos de votação em seção bicameral en-
quanto a revisão (contrariando a lógica doutrinaria que exigia pro-
cesso mais qualificado) ocorreu em seção unicameral por maioria
absoluta (50% mais um de todos os representantes);
t) quanto aos limites temporais a Constituição de 88 estabeleceu que
a revisão ocorreria após cinco anos da promulgação da Constitui-
ção, não existindo limites temporais para a reforma por meio de
emendas;
Esta discussão não é nova e encontramos no clássicos do Direito
Constitucional nacional e estrangeira varias referencias a amplitude do
poder constituinte e o poder de reforma.
NELSON DE SOUZA SAMPAIO, afirmava que o poder reformador está
abaixo do Poder Constituinte e jamais poderá ser ilimitado como este. Seja
como se queira chamar este poder reformador, seja de Poder constituinte
constituído como faz SANCHES AGESTA; poder constituinte derivado
como faz PELAYO e BARACHO, ou poder constituinte instituído segundo
BURDEAU, devemos encará-lo como faz PONTES de MIRANDA, como
uma atividade constituidora diferida ou um poder constituinte de segundo
como faz também ROSAH RUSSOMANO.
A natureza do poder constituinte
Alguns autores entendem que o poder constituinte originário é o mo-
mento de passagem do poder ao Direito. É inegável que o poder constituin-
te originário é o momento maior de ruptura da ordem constitucional, onde o
poder de fato que se instala, forte o suficiente para romper com a ordem
estabelecida, é capaz de construir uma nova ordem sem nenhum tipo de
limite jurídico positivo na ordem com a qual está rompendo. Se entender-
mos o Direito como sendo sinônimo de lei positiva, posto pelo Estado, o
poder constituinte originário será apenas um poder de fato. E é justamente
neste ponto que reside sua força. É claro que não reduzimos o Direito nesta
perspectiva positivista já ultrapassada, que reduz o Direito à regra, trans-
formando construção do Direito em uma simples aplicação da receita pronta
da lei ao caso concreto. Entretanto isto será objeto de estudo mais adiante.
O que nos interessa agora é entender a força do poder constituinte originá-
rio como poder de fato, capaz de romper com a ordem vigente, e, portanto,
um poder ilegal e inconstitucional em relação a ordem com a qual rompe, e
pela qual não se limita. Esta afirmativa contém a essência da segurança
que busca o constitucionalismo moderno: a Constituição na sua essência
deve ser tão forte e perene que nenhum poder constituinte pode romper
com seus fundamentos e estrutura, mas somente um poder social tão forte,
que nem mesmo a Constituição poderá segurá-lo pois é o poder de trans-
formação social da própria história. Neste recurso do Direito Constitucional
ao poder social, ao poder de fato, transformador e histórico, reside sua
própria segurança, contra maiorias temporárias parlamentares que queiram
transformar toda a Constituição, escrevendo uma nova, procurando se
legitimar no voto que elegeu os representantes. A proteção contra o autori-
tarismo da maioria reside na exigência de poder social irresistível, única
justificativa para a ruptura constitucional. Defensores de tese contrária
procuram desenvolver mecanismos meramente representativos e consulti-
vos (plebiscitos e referendos) para legitimar uma alteração radical do texto
constitucional, que afete seus princípios fundamentais, criando na verdade
uma nova Constituição. Estes mecanismos são verdadeiros golpes contra a
segurança jurídica, que como disse, só pode ser rompida pela força social
irresistível que não se expressa em meras representações, pois quinhentos
não podem o que só milhões poderão. Pode-se afirmar entretanto que
estes milhões podem ser ouvidos em plebiscitos, mas como proteger estes
milhões da força de manipulação da propaganda na construção de uma
falsa vontade popular. Por isto nada pode substituir a mobilização popular,
única justificativa para rupturas constitucionais profundas.
Retornando à discussão inicial, podemos dizer, ao contrário, que, se
entendermos entretanto que o Direito não se resume ao direito positivo,
mas que está essencialmente ligado a ideia do justo, do correto, do direito,
estaremos no campo das várias correntes do pensamento do Direito natu-
ral. Neste sentido o Direito é sinônimo de justo, e logo a lei positiva pode ou
não conter o Direito, pois só será Direito se conter uma norma justa. O
conceito do que é justo muda em cada corrente do Direito natural, mas o
que há em comum nas varias teorias é a compreensão de que Direito é
diferente de lei. Seguindo esta hipótese, o poder constituinte originário será
um poder de Direito se representar o justo, o correto, o direito, e ao contrá-
rio, será um mero poder fato, ilegítimo, contra o Direito, se não representar
a ideia do justo, do correto, do direito.
Não nos filiamos ao pensamento do Direito natural por considerarmos
elitista, no sentido que ao se reconhecer que existe um direito justo anterior
e superior ao direito produzido pelo Estado, quem será a pessoa ou pesso-
as que dirão o justo. Quem terá o discurso legitimado. Se o justo está na
vontade divina, quem será o interprete desta vontade. Se o justo está na
razão do filósofo, qual será o filosofo que nos dirá o justo.
Por este motivo entendemos que só processos democráticos dialógicos
com ampla mobilização popular pode justificar uma ruptura, que sendo fato
irresistível se afirma com força, mas não de forma ilimitada. O Direito não
se encontra apenas no texto positivado, ou na decisão judicial, mas latente
na ideia de justiça dialogicamente compartilhada em processos democráti-
cos de transformação social, e será esta compreensão dialogicamente
compartilhada, em uma sociedade, em um determinado momento histórico,
que legitimará o Direito, sua compreensão democrática e sua transforma-
ção democrática, inclusive as rupturas constitucionais. O Poder constituinte
originário só será legítimo se sustentado por amplo processo democrático
dialógico que ultrapasse os estreitos limites da representação parlamentar e
penetre nos diversos fluxos comunicativos da complexa sociedade nacio-
nal.
Portanto podemos concluir que este poder de fato será também de Di-
reito, se efetivamente democrático, entendendo-se democrático, como um
processo dialógico amplo que envolva o debate dos mais variados interes-
ses e valores da sociedade nacional.
O Poder Constituinte decorrente
Outro aspecto referente a amplitude do Poder Constituinte diz respeito
ao Poder Constituinte decorrente, ou seja, o poder constituinte dos entes
federados, no nosso caso, Estados membros e Municípios. Já estudamos
Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos
Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 10
no nosso livro Direito Constitucional, tomo II, da Editora Mandamentos, as
características principais do Estado Federal. Naquele momento, deixamos
claro que o que difere o Estado Federal de outras formas descentralizadas
de organização territorial do Estado contemporâneo é a existência de um
poder constituinte decorrente, ou seja, a descentralização de competências
legislativas constitucionais, onde o ente federado elabora sua própria
constituição e a promulga, sem que seja possível ou necessário uma inter-
venção ou a aprovação desta Constituição por outra esfera de poder fede-
ral. Isto caracteriza a essência da Federação, a inexistência de hierarquia
entre os entes federados (União, Estado e Municípios no caso brasileiro),
pois cada uma das esferas de poder federal nos três níveis brasileiros,
participa da soberania, ou seja, detém parcelas de soberania, expressa na
suas competências legislativa constitucional, ou seja, no exercício do poder
constituinte derivado.
Não estamos afirmando que os estados membros, a União e os muni-
cípios são soberanos, pois soberano e o Estado Federal e a expressão
unitária da soberania, ou seja, sua manifestação integral, só ocorre no
Poder Constituinte Originário. O que afirmamos, é que no Estado Federal,
além de uma repartição de competências legislativas ordinárias, administra-
tivas e jurisdicionais, há também, e isto só ocorre no Estado Federal, uma
repartição de competências legislativas constitucionais. Esta repartição de
competências constitucionais implica na participação dos entes federados
na soberania do Estado, que se fragmenta nas suas manifestações.
Entretanto, este poder constituinte decorrente, embora represente a
manifestação de parcela de soberania, não é soberano, e por este motivo
deve ser um poder com limites jurídicos bem claros, limites estes que
podem ser materiais, formais, temporais e circunstanciais. No caso da
Constituição de 1988, esta estabelece limites materiais expressos e obvia-
mente implícitos, deixando para o poder constituinte decorrente, que é
temporário (assim como o originário), prever o seu funcionamento, e o
funcionamento do seu próprio poder de reforma e seus limites formais,
materiais, circunstanciais e temporais. O poder constituinte decorrente é
segundo grau (se dos Estados membros) e terceiro grau (se dos municí-
pios), subordinados a vontade do poder constituinte originário, expressa na
Constituição Federal. A repartição de competências no nosso Estado
federal ocorre da seguinte forma:
a) o Estado federal é composto de três círculos não hierarquizados:
União, Estados membros e Distrito Federal e os Municípios;
b) a Constituição Federal é a manifestação integral da soberania do
Estado Federal;
c) a União detém competências legislativas ordinárias, administrati-
vas, jurisdicionais e o poder constituinte derivado de reforma atra-
vés de emendas e revisão a Constituição do Estado Federal, atra-
vés do Legislativo da União;
d) os Estados membros detém competência legislativas ordinárias, ju-
risdicionais, administrativas e o poder constituinte decorrente, de
elaborar suas próprias constituições, além é claro, do poder de re-
forma de suas constituições;
e) os municípios detém competências legislativas ordinárias, adminis-
trativas ( não detém competências jurisdicionais) e competências
legislativas constitucionais, ou seja o poder constituinte decorrente
de elaborar suas constituições (chamadas de leis orgânicas) e ló-
gico o poder derivado de reforma de suas constituições;
f) o Distrito Federal também se tornou ente federado a partir de 1988
mas com características diferenciadas. O D.F. detém competên-
cias legislativas ordinárias e administrativas, que podem ser orga-
nizadas pelo seu poder constituinte decorrente (competência legis-
lativa constitucional própria), e possui o seu próprio Judiciário e
Ministério Público, que entretanto não poderão ser organizados por
sua constituinte, mas serão organizados pela União para o Distrito
Federal, por razão de segurança nacional. Detém, também, é cla-
ro, o poder de reformar sua Constituição (chamada também de Lei
Orgânica, o que não muda a sua natureza de poder constituinte
decorrente, portanto de Constituição.
Quanto aos limites do poder constituinte decorrente encontramos em
vários momentos na constituição Federal e são limites materiais expressos
e implícitos. Os limites expressos ocorrem todo momento que a Constitui-
ção distribui competências e normatiza condutas dos entes federados.
Quanto aos limites implícitos, estes são os princípios estruturantes e fun-
damentais da República, que se impõem a todos os entes federados como
por exemplo, a democracia, a separação de poderes, os direitos humanos,
a redução das desigualdades sociais e regionais, a dignidade humana,
entre outros.
Alguns entendem que a Constituição Federal deve ser quase que copi-
ada pelos entes federados o que no nosso entendimento é anti-federal. Se
a Constituição federal expressamente não mencionou mandamentos aos
entes federados, está livre o constituinte dos Estados e Municípios para
dispor, desde que respeitados os princípios que estruturam e fundamentam
a ordem constitucional federal. Por exemplo: se a Constituição Federal
prevê o quorum de três quintos em dois turno para emenda a Constituição
Federal, como norma regulamentadora do funcionamento do poder consti-
tuinte derivado federal, nada impede que o Estado Membro ou o Município
estabeleçam quorum diferente, desde que respeitados o princípio da rigidez
constitucional que caracteriza sua supremacia em relação as leis ordinárias
e complementares e respeitado o princípio da separação de poderes.
A TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE
Acredito que a resposta para a pergunta sobre quem deve ser o titular
do poder constituinte é clara para os cidadãos. Entretanto devemos res-
ponder a pergunta sobre quem é o titular deste poder nas suas várias
manifestações históricas.
Retornando a visão (talvez um pouco romântica) dos ´clássicos` da teo-
ria constitucional, encontramos no revolucionário SIÈYES a afirmação de
que ´a nação existe antes de tudo – é a origem de tudo. Sua vontade é
invariavelmente legal – é a própria lei`. Uma visão idealista importante
como construção do discurso do estado constitucional mas que obviamente
não resiste a uma análise histórica. Podemos mesmo perceber que a
construção conceitual da ideia de nação para SIÉYES se constitui numa
forma de legitimar a vontade do grupo no poder que atua em nome da
vontade da nação. De forma diferente, a ideia de nação como estudada no
Tomo II, constitui-se em numa construção histórica recente e não algo que
existe antes de tudo, mas uma criação do próprio absolutismo.
Como vimos, foi com SIEYES que surge a ideia de poder constituinte,
diferenciando este poder constituído, que não pode, na sua ação autônoma,
atingir as leis fundamentais contidas na Constituição, criada por um poder
constituinte, que, por sua vez, é produto da vontade da nação.
No Direito Constitucional brasileiro um autor importante é PINTO FER-
REIRA, que afirma que somente o povo tem a competência para exercer os
poderes de soberania. Quando analisa os termos `Convenção Constitucio-
nal´, ´Assembleia Constituinte´ e ´Convenção Nacional Constituinte´ afirma
que a assembleia constituinte é o corpo representativo escolhido a fim de
criar a Constituição. Existem para o autor dois tipos principais de organiza-
ção do poder constituinte. Um será o modelo da convenção constitucional,
que é o tipo primitivo onde existe uma assembleia eleita pelo povo para
elaborar a Constituição, e não há necessidade de ratificação popular. O
segundo modelo é o sistema popular direto, onde a Constituição é votada
pela convenção nacional e posteriormente é submetida à aprovação popu-
lar através do referendo. Para o autor, este segundo modelo está mais
próximo do espírito democrático.
Na história do Estado constitucional, o sujeito do poder constituinte, o
seu titular, pode ser individual ou coletivo, capacitado para criar ou revisar a
Constituição. Desta forma encontramos na história distorções graves da
teoria democrática, onde o titular é um Rei, um ditador, uma classe, um
grupo (o que óbvio está por detrás do titular individual), todos em nome do
povo ou legitimados por poderes outros que o poder que efetivamente os
sustenta. O discurso esconde a real fonte do poder, ou mais, o discurso
constitui uma fonte do poder ao disfarçar, encobrir sua origem. Entretanto
encontramos também, exemplos que poderes constituintes que de forma
diferentes, em graus diferentes, expressam a vontade de parcelas expres-
sivas do povo nacional.
Não há dúvida que a vontade do poder constituinte deve emanar de
mecanismos democráticos, que permitam que o processo de elaboração da
constituição assim como de sua reforma, seja aberto a ampla participação
popular, não apenas através de diálogo com os representantes eleitos, mas
através de legitima pressão da sociedade civil organizada.
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  • 1. Defensor Público - VOL. 11 Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais / DP-MG Defensor Público ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO 1. Indivíduo, Sociedade e Estado...................................................................................................................................................................................01 2. Poder Constituinte......................................................................................................................................................................................................07 3. Interpretação e Aplicabilidade da Norma Constitucional ...........................................................................................................................................12 4. Controle de Constitucionalidade ................................................................................................................................................................................16 5. Princípios Fundamentais............................................................................................................................................................................................20 6. Direitos e Garantias Fundamentais............................................................................................................................................................................20 7. Organização do Estado..............................................................................................................................................................................................42 8. Organização dos Poderes..........................................................................................................................................................................................51 9. Funções Essenciais à Justiça ....................................................................................................................................................................................65 10. Defesa do Estado e das Instituições Democráticas.................................................................................................................................................66 11. Sistema Tributário Nacional .....................................................................................................................................................................................68 12. Ordem Econômica e Financeira...............................................................................................................................................................................72 13. Ordem Social............................................................................................................................................................................................................74 14. Disposições Constitucionais Gerais.........................................................................................................................................................................80 15. Disposições Constitucionais Transitórias.................................................................................................................................................................82 16. Constituição do Estado de Minas Gerais .................................................................................................................................................................93 17. Direito Tributário como direito público. Direito Tributário como direito obrigacional. Autonomia. Relação com outros ramos do direito ............ 146 18. Fontes do Direito Tributário. Fontes Formais e Fontes Materiais. Fontes Principais e secundárias. Legislação Tributária. Tratados. A Medida Provi- sória e o Direito Tributário........................................................................................................................................................................................... 146 19. A Norma Tributária. Hipótese de Incidência Tributária e fato gerador. Aspectos da norma tributária. Incidência Tributária. Eficácia no tempo e no espaço. Interpretação. Integração............................................................................................................................................................................... 148 20. Tributo. Conceito. Elementos essenciais. Tributos em espécie. Impostos. Taxas. Contribuição de Melhoria. Contribuições............................. 148 21. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar e o Sistema Constitucional Tributário. Legalidade Tributária. Capacidade Contributiva. Igualdade Tributária. Uniformidade Tributária. Irretroatividade da Lei Tributária. Anterioridade da Lei Tributária. Vedação do efeito confiscatório. Vedação à limita- ção de tráfego de pessoas ou bens. Imunidades. Personalização do imposto. Proibição de taxas com base de cálculo própria de imposto. Intributabili- dade das rendas da dívida pública dos entes da Federação. Vedação à isenção heterônoma ................................................................................ 152 22. Competência Tributária. Competência Legislativa. Competência Arrecadatória.................................................................................................. 175 23. Obrigação Tributária. Fato Gerador. Sujeito Ativo. Sujeito Passivo ..................................................................................................................... 174 24. Responsabilidade Tributária. Sucessores. Terceiros. Por Infrações .................................................................................................................... 185 25. Crédito Tributário. Constituição. Suspensão. Extinção. Exclusão........................................................................................................................ 186 26. Garantias e privilégios do crédito tributário........................................................................................................................................................... 191
  • 2. 2 27. Ilícitos tributários. Crimes. Elisão e Evasão.......................................................................................................................................................... 191 28. Processo Administrativo Tributário e Processo Judicial Tributário ....................................................................................................................... 202 29. Orçamento público: princípios orçamentários da exclusividade, universalidade, unidade, anualidade, programação e equilíbrio orçamentário................................................................................................................................................................................................ 216 30. Leis orçamentárias. Plano Plurianual. Lei de Diretrizes Orçamentárias. Lei Orçamentária Anual. Vedações orçamentárias............................. 226 31. Receitas públicas. Despesas Públicas. Precatórios. Controle interno e externo da atividade Financeira do Estado.......................................... 257
  • 3. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 1 1. INDIVÍDUO, SOCIEDADE E ESTADO. 1. DEMOCRACIA E ESTADO DE DIREITO A democracia, como realização de valores (igualdade, liberdade e dignidade da pessoa) de convivência humana, é conceito mais abrangente do que o de Estado de Direito, que surgiu como expressão jurídica da democracia liberal. Seu conceito é tão histórico como o de democracia, e se enriquece de conteúdo com o evolver dos tempos. A evolução histórica e a superação do liberalismo, a que se vinculou o conceito de Estado de Direito, colocam em debate a questão da sua sintonia com a sociedade democrática. O reconhecimento de sua insufi- ciência gerou o conceito de Estado Social de Direito, nem sempre de conteúdo democrático. Chega-se agora ao Estado Democrático de Direito que a Constitui- ção acolhe no artigo 1o como um conceito-chave do regime adotado, tanto quanto o são o conceito de Estado de direito democrático da Constituição da República Portuguesa (artigo 2o) e o de Estado social e democrático de Direito da Constituição Espanhola (artigo 1o). O Estado Democrático de Direito concilia Estado Democrático e Estado de Direito, mas não consiste apenas na reunião formal dos elementos desses dois tipos de Estado. Revela, em verdade, um conceito novo que incorpora os princípios daqueles dois conceitos, mas os supera, na medida em que agrega um componente revolucionário de transformação do status quo. Para com- preendê-lo, no entanto, teremos que passar em revista a evolução e caracte- rísticas de seus componentes, para, no final, chegarmos ao conceito-síntese e seu real significado. 2. ESTADO LIBERAL DE DIREITO Na origem, como é sabido, o Estado de Direito era um conceito tipicamente liberal. Constituía uma das garantias das constituições liberais burguesas. Daí falar-se em Estado Liberal de Direito. Tinha como objetivo fundamental assegu- rar o princípio da legalidade, segundo o qual toda atividade estatal havia de submeter-se à lei. Suas características básicas foram: a) submissão ao império da lei, que era a nota primária de seu conceito, sendo a lei considerada como ato emanado formalmente do poder legislativo, composto de representantes do povo, mas do povo-cidadão; b) divisão de poderes, que separa, de forma inde- pendente e harmônica, os poderes legislativo, executivo e judiciário, como técnica que assegure a produção das leis ao primeiro e a independência e imparcialidade do último em face dos demais e das pressões dos poderosos particulares; c) enunciado e garantia dos direitos individuais. Essas exigências continuam a ser postulados básicos do Estado de Direito, que configura uma grande conquista da civilização liberal. A concepção liberal do Estado de Direito servira de apoio aos direitos do homem, convertendo os súditos em cidadãos livres, consoante nota Verdù, a qual, contudo, se tornara insuficiente, pelo que a expressão Estado de Direito evoluíra, enriquecendo-se com conteúdo novo. Houve, porém, concepções deformadoras do conceito de Estado de Di- reito, pois é perceptível que seu significado depende da própria ideia que se tem do Direito. Por isso, cabe razão a Carl Schmitt quando assinala que a expressão “Estado de Direito”, pode ter tantos significados distintos como a própria palavra “Direito” e designar tantas organizações quanto aquelas a que se aplica a palavra “Estado”. Assim, acrescenta ele, há um Estado de Direito feudal, outro estamental, outro burguês, outro nacional, outro social, além de outros de acordo com o Direito natural, com o Direito racional e com o Direito histórico. Disso deriva a ambiguidade da expressão Estado de Direito, sem mais qualificativo que lhe indique conteúdo material. Em tal caso, a tendência é adotar-se a concepção formal do Estado de Direito à maneira de Forsthoff, ou de um Estado de Justiça, tomada a justiça como um conceito absoluto, abstrato, idealista, espiritualista, que, no fundo, encontra sua matriz no conceito hegeliano do Estado Ético, que fundamen- tou a concepção do Estado fascista: “totalitário e ditatorial em que os direi- tos e liberdades humanos ficam praticamente anulados e totalmente sub- metidos ao arbítrio de um poder político onipotente e incontrolado, no qual toda participação popular é sistematicamente negada em benefício da minoria (na verdade, da elite) que controla o poder político e econômico.” Diga-se, desde logo, que o Estado de Justiça, na formulação indicada, nada tem a ver com o Estado submetido ao poder judiciário, que é um elemento importante do Estado de Direito. Estado submetido ao juiz é Estado cujos atos legislativos, executivos, administrativos e também judiciais ficam sujeitos ao controle jurisdicional no que tange à legitimidade constitucional e legal. É também uma abstração confundir Estado de Direito com uma visão jus naturalista do Estado. Por outro lado, se se concebe o Direito apenas como um conjunto de normas estabelecidas pelo legislativo, o Estado de Direito passa a ser Estado de Legalidade, ou Estado legislativo, o que constitui uma redução deformante do Estado de Direito. Se o princípio da legalidade é um elemen- to importante do conceito de Estado de Direito, nele não se realiza comple- tamente. A concepção jurídica de Kelsen também contribuiu para deformar o conceito de Estado de Direito. Para ele, Estado e Direito são conceitos idênticos. Na medida em que ele confunde Estado e ordem jurídica, todo Estado há de ser Estado de Direito. Por isso, vota significativo desprezo a esse conceito. Como na sua concepção, só é Direito o direito positivo, como norma pura, desvinculada de qualquer conteúdo, chega-se, sem dificuldade, a uma ideia formalista do Estado de Direito ou Estado Formal de Direito, que serve também a interesses ditatoriais, como vimos. Pois, se o Direito acaba se confundindo com mero enunciado formal da lei, destituí- da de qualquer conteúdo, sem compromisso com a realidade política, social, econômica, ideológica enfim (o que, no fundo, esconde uma ideolo- gia reacionária), todo Estado acaba sendo Estado de Direito, ainda que seja ditatorial. Essa doutrina converte o Estado de Direito em mero Estado Legal. Em verdade, destrói qualquer ideia de Estado de Direito. 3. ESTADO SOCIAL DE DIREITO O individualismo e o abstencionismo ou neutralismo do Estado liberal provocaram imensas injustiças, e os movimentos sociais do século passado e deste, especialmente, desvelando a insuficiência das liberdades burgue- sas, permitiram que se tivesse consciência da necessidade da justiça social, conforme nota Lucas Verdù, que acrescenta: “Mas o Estado de Direito, que já não poderia justificar-se como liberal, necessitou, para en- frentar a maré social, despojar-se de sua neutralidade, integrar, em seu seio, a sociedade, sem renunciar ao primado do Direito. O Estado de Direi- to, na atualidade, deixou de ser formal, neutro e individualista, para trans- formar-se em Estado material de Direito, enquanto adota uma dogmática e pretende realizar a justiça social.” Transforma-se em Estado Social de Direito, onde o “qualificativo social refere à correção do individualismo clássico liberal pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização de objetivos de justiça social”. Caracteriza-se no propósito de compatibili- zar, em um mesmo sistema, anota Elías Díaz, dois elementos: o capitalis- mo, como forma de produção, e a consecução do bem-estar social geral, servindo de base ao neocapitalismo típico do Welfare State. Os regimes constitucionais ocidentais prometem, explícita ou implicita- mente, realizar o Estado Social de Direito, quando definem um capítulo de direitos econômicos e sociais. Expressas são as Constituições da Repúbli- ca Federal Alemã e da Espanha, definindo os respectivos Estados como sociais e democráticos de Direito. Mas ainda é insuficiente a concepção do Estado Social de Direito, ain- da que, como Estado Material de Direito, revele um tipo de Estado que tende a criar uma situação de bem-estar geral que garanta o desenvolvi- mento da pessoa humana. Sua ambiguidade, porém, é manifesta. Primeiro, porque a palavra social está sujeita a várias interpretações. Todas as ideologias, com sua própria visão do social e do Direito, podem acolher uma concepção do Estado Social de Direito, menos a ideologia marxista que não confunde o social com o socialista. A Alemanha nazista, a Itália fascista, a Espanha franquista, Portugal salazarista, a Inglaterra de Chur- chill e Attlee, a França, com a Quarta República, especialmente, e o Brasil, desde a Revolução de 30 – bem observa Paulo Bonavides – foram “Esta- dos sociais”, o que evidencia, conclui, “que o Estado social se compadece com regimes políticos antagônicos, como sejam a democracia, o fascismo e o nacional-socialismo”. Em segundo lugar, o importante não é o social, qualificando o Estado, em lugar de qualificar o Direito. Talvez até por isso se possa dar razão a Forsthoff, quando exprime a ideia de que Estado de Direito e Estado Social não podem fundir-se no plano constitucional. O próprio Elías Díaz, que reconhece a importância histórica do Estado Social de Direito, não deixa de lembrar a suspeita quanto a “saber se e até que ponto o neocapitalismo do Estado Social de Direito não estaria em realida- de encobrindo uma forma muito mais matizada e sutil de ditadura do grande capital, isto é, algo que no fundo poderia denominar-se, e tem-se denomi- nado, neofascismo”. Ele não descarta essa possibilidade, admitindo que “o DIREITO CONSTITUCIONAL FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO
  • 4. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 2 grande capital encontrou fácil entrada nas novas estruturas demoliberais, chegando assim a constituir-se como peça chave e central do Welfare State. Ainda que institucionalizado no chamado Estado Social de Direito, permanece sempre sob este – representada por seus grupos políticos e econômicos mais reacionários e violentos – essa tendência e propensão do capitalismo ao controle econômico monopolista e à utilização de métodos políticos de caráter totalitário e ditatorial, visando a evitar, sobretudo, qual- quer eventualidade realmente socialista”. Por tudo isso, a expressão Estado Social de Direito manifesta-se carre- gada de suspeição, ainda que se torne mais precisa quando se lhe adjunta a palavra democrático como fizeram as Constituições da República Federal da Alemanha e da República Espanhola para chamá-lo Estado Social e Democrático de Direito. Mas aí, mantendo o qualificativo social ligado a Estado, engasta-se aquela tendência neocapitalista e a petrificação do Welfare State, com o conteúdo mencionado acima, delimitadora de qual- quer passo à frente no sentido socialista. Talvez, para caracterizar um Estado não socialista preocupado, no entanto, com a realização dos direitos fundamentais de caráter social, fosse melhor manter a expressão Estado de Direito que já tem uma conotação democratizante, mas, para retirar dele o sentido liberal burguês individualista, qualificar a palavra Direito com o social, com o que se definiria uma concepção jurídica mais progressista e aberta, e então, em lugar de Estado Social de Direito, diríamos Estado de Direito Social. Assim dissemos de outra feita, com base na Constituição de 1969, mas, não satisfeitos, acrescentamos: “Por que não avançar um pouco mais e chegar a um conceito de Estado de Direito Econômico?” 4. O ESTADO DEMOCRÁTICO As considerações supra mostram que o Estado de Direito, quer como Estado Liberal de Direito, quer como Estado Social de Direito, nem sempre caracteriza Estado Democrático. Este se funda no princípio da soberania popular que “impõe a participação efetiva e operante do povo na coisa pública, participação que não se exaure, como veremos, na simples forma- ção das instituições representativas, que constituem um estágio da evolu- ção do Estado Democrático, mas não o seu completo desenvolvimento”. Visa, assim, realizar o princípio democrático como garantia geral dos direi- tos fundamentais da pessoa humana. Nesse sentido, na verdade, contra- põe-se ao Estado Liberal, pois, como lembra Paulo Bonavides, “a ideia essencial do liberalismo não é a presença do elemento popular na forma- ção da vontade estatal, nem tampouco a teoria igualitária de que todos têm direito igual a essa participação ou que a liberdade é formalmente esse direito”. O Estado de Direito, como lembramos acima, é uma criação do libera- lismo. Por isso, na doutrina clássica, repousa na concepção do Direito natural, imutável e universal; daí decorre que a lei, que realiza o princípio da legalidade, essência do conceito de Estado de Direito, é concebida como norma jurídica geral e abstrata. A generalidade da lei constituía o fulcro do Estado de Direito. Nela se assentaria o justo conforme a razão. Dela, e só dela, defluiria a igualdade. “Sendo regra geral, a lei é regra para todos.” O postulado da generalidade das leis foi ressuscitado por Carl Schmitt sob a Constituição de Weimar, após ter sido abandonado sob a influência de Laband, surgindo, em seu lugar, a divisão das leis em formais e materiais. Essa restauração tem sentido ideológico preciso, pois que, como lembra Franz Neumann, a teoria de que o Estado só pode governar por meio de leis gerais se aplica a um sistema econômico de livre concor- rência, e “o renascimento, sob a Constituição de Weimar, da noção da generalidade das leis e sua aplicação indiscriminada às liberdades pesso- ais, políticas e econômicas, foi assim usado como um dispositivo para restringir o poder do Parlamento que já não mais representava exclusiva- mente os interesses dos grandes latifundiários, dos capitalistas, do exército e da burocracia. E então, o direito geral, dentro da esfera econômica, era usado para conservar o sistema de propriedade existente e para protegê-lo contra intervenção, sempre que esta fosse julgada incompatível com os interesses dos grupos mencionados acima”. Invoca-se, com frequência, a doutrina da vontade geral de Rousseau para fundamentar a afirmativa de que a igualdade só pode ser atingida por meio de normas gerais, mas esquece-se de que ele discutia o direito geral com referência a uma sociedade em que só haveria pequenas propriedades ou propriedades comuns. Não é, pois, fundamento válido para o postulado da generalidade que embasa o liberalismo capitalista. De fato, a “proprie- dade particular, que é sagrada e inviolável, de acordo com Rousseau, só é propriedade até onde permanece como um direito individual e discriminado. Se for considerada comum a todos os cidadãos, ficará sujeita a volonté générale e poderá ser infringida ou negada. Assim o soberano não tem o direito de tocar na propriedade de um ou de diversos cidadãos, embora possa legitimamente tomar a propriedade de todos”. Conclui-se daí que a igualdade do Estado de Direito, na concepção clássica, se funda num elemento puramente formal e abstrato, qual seja a generalidade das leis. Não tem base material que se realize na vida concre- ta. A tentativa de corrigir isso, como vimos, foi a construção do Estado Social de Direito, que, no entanto, não foi capaz de assegurar a justiça social nem a autêntica participação democrática do povo no processo político, de onde a concepção mais recente do Estado Democrático de Direito, como Estado de legitimidade justa (ou Estado de Justiça material), fundante de uma sociedade democrática, qual seja a que instaure um processo de efetiva incorporação de todo o povo nos mecanismos do controle das decisões, e de sua real participação nos rendimentos da produção. 5. CARACTERIZAÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO A configuração do Estado Democrático de Direito não significa apenas unir formalmente os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito. Consiste, na verdade, na criação de um conceito novo, que leve em conta os conceitos dos elementos componentes, mas os supera na medida em que incorpora um componente revolucionário de transformação do status quo. E aí se entremostra a extrema importância do art.1o. da Constituição de 1988, quando afirma que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, não como mera promessa de organizar tal Estado, pois a Constituição aí já o está proclamando e fundando. A Constituição portuguesa instaura o Estado de Direito Democrático, com o “democrático” qualificando o Direito e não o Estado. Essa é uma diferença formal entre ambas as Constituições. A nossa emprega a expres- são mais adequada, cunhada pela doutrina, em que o “democrático” qualifi- ca o Estado, o que irradia os valores da democracia sobre todos os seus elementos constitutivos e, pois, também, sobre a ordem jurídica. O Direito, assim, imantado por esses valores, se enriquece do sentir popular e terá que ajustar-se ao interesse coletivo. Contudo, o texto da Constituição portuguesa dá ao Estado de Direito Democrático o conteúdo básico que a doutrina reconhece ao Estado Democrático de Direito, quando afirma que ele é “baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas, que tem por objetivo assegurar a transição para o socialismo mediante a realização da democracia econômica, social e cultu- ral e o aprofundamento da democracia participativa”(art. 2o). A democracia que o Estado Democrático de Direito realiza há de ser um processo de convivência social numa sociedade livre, justa e solidária (art. 3o, I), em que o poder emana do povo, deve ser exercido em proveito do povo, diretamente ou por seus representantes eleitos (art.1o, parágrafo único); participativa, porque envolve a participação crescente do povo no processo decisório e na formação dos atos de governo; pluralista, porque respeita a pluralidade de ideias, culturas e etnias e pressupõe assim o diálogo entre opiniões e pensamentos divergentes e a possibilidade de convivência de formas de organização e interesses diferentes na socieda- de; há de ser um processo de liberação da pessoa humana das formas de opressão que não depende apenas do reconhecimento formal de certos direitos individuais, políticos e sociais, mas especialmente da vigência de condições econômicas suscetíveis de favorecer o seu pleno exercício. Não é Estado de democracia popular subordinado ao personalismo e ao monismo político, mas tende a realizar a síntese do processo contraditó- rio do mundo contemporâneo, manifestado entre os Estados capitalistas ou neocapitalistas do ocidente e os Estados coletivistas do leste. Será, neste quadrante, o tipo de Estado do futuro, superador das atuais antíteses Leste- Oeste e Norte-Sul. É nesse sentido o pronunciamento de Elías Díaz: “Desta forma, e sem querer chegar com isso apressadamente ‘à gran- de síntese final’ ou a qualquer outra forma de ‘culminação da História’ (isto deve ficar bem claro), cabe dizer que o Estado Democrático de Direito aparece como a fórmula institucional em que atualmente, e sobretudo para um futuro próximo, pode vir a concretizar-se o processo de convergência em que podem ir concorrendo as concepções atuais da democracia e do socialismo. A passagem do neocapitalismo ao socialismo nos países de democracia liberal e, paralelamente, o crescente processo de despersonali- zação e institucionalização jurídica do poder nos países de democracia popular, constituem em síntese a dupla ação para esse processo de con- vergência em que aparece o Estado Democrático de Direito.” O mesmo autor, em outra obra, define-o como a institucionalização do poder popular ou realização democrática do socialismo.
  • 5. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 3 A Constituição de 1988, contudo, não chegou a estruturar um Estado Democrático de Direito de conteúdo socialista, mas abre as perspectivas de realização social profunda pela prática dos direitos sociais que ela inscreve e pelo exercício dos instrumentos que oferece à cidadania que possibilita concretizar as exigências de um Estado de justiça social fundado na digni- dade da pessoa humana. 6. A LEI NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO O princípio da legalidade é também um princípio basilar do Estado Demo- crático de Direito. É da essência do seu conceito subordinar-se à Constituição e fundar-se na legalidade democrática. Sujeita-se, como todo Estado de Direito, ao império da lei, mas da lei que realize o princípio da igualdade e da justiça, não pela sua generalidade, mas pela busca da igualização das condições dos socialmente desiguais. Deve-se, pois, ser destacada a relevância da lei no Estado Democrático de Direito, não apenas quanto ao seu conceito formal de ato jurídico abstrato, geral, obrigatório e modificativo da ordem jurídica existente, mas também à sua função de regulamentação fundamental, produzida segundo um procedimento constitucional qualificado. A lei é efetivamente o ato oficial de maior realce na vida política. Ato de decisão política por excelência, é por meio dela, enquanto emanada da atuação da vontade popular, que o poder estatal propicia ao viver social modos predeterminados de conduta, de maneira que os membros da sociedade saibam, de antemão, como guiar-se na realização de seus interesses. É precisamente no Estado Democrático de Direito que se ressalta a re- levância da lei, pois ele não pode ficar limitado a um conceito de lei, como o que imperou no Estado de Direito clássico. Pois ele tem que estar em condições de realizar, mediante lei, intervenções que impliquem diretamen- te uma alteração na situação da comunidade. Significa dizer: a lei não deve ficar numa esfera puramente normativa, não pode ser apenas lei de arbitra- gem, pois precisa influir na realidade social. E se a Constituição se abre para as transformações políticas, econômicas e sociais que a sociedade brasileira requer, a lei se elevará de importância, na medida em que, sendo fundamental expressão do direito positivo, caracteriza-se como desdobra- mento necessário do conteúdo da Constituição e aí exerce função trans- formadora da sociedade, impondo mudanças sociais democráticas, ainda que possa continuar a desempenhar uma função conservadora, garantindo a sobrevivência de valores socialmente aceitos. 7. OS PRINCÍPIOS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO Limitar-nos-emos a indicar esses princípios, sem entrar em pormeno- res. São os seguintes: a) princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar, que o Estado Democrático de Direito se funda na legitimidade de uma Constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, com as garantias de atuação livre da jurisdição constitucional; b) princípio democrático que, nos termos da Constituição, há de consti- tuir uma democracia representativa e participativa, pluralista, e que seja a garantia geral da vigência e eficácia dos direitos fundamentais (art.1o); c) sistema de direitos fundamentais individuais, coletivos, sociais e cul- turais (Títs. II, VII e VIII); d) princípio da justiça social, referido no art.170, caput, no art. 193, co- mo princípio da ordem econômica e da ordem social; como disse- mos, a Constituição não prometeu a transição para o socialismo me- diante a realização da democracia econômica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa, como o faz a Constitui- ção portuguesa, mas abre-se ela, também, para a realização da de- mocracia social e cultural, embora não avance significativamente ru- mo à democracia econômica; e) princípio da igualdade (art. 5o, caput, e inciso I); f) princípio da divisão de poderes (art. 2o) e da independência do juiz (art. 95); g) princípio da legalidade (art. 5o, II); h) princípio da segurança jurídica (art. 5o, XXXV a LXXII). 8. TAREFA FUNDAMENTAL DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DI- REITO A tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime demo- crático que realize a justiça social. José Afonso Da Silva 19. TIPOS DE CONSTITUIÇÃO. Classificação das Constituições: quanto ao conteúdo: materiais e formas; quanto à forma: escritas e não escritas; quanto ao modo de elabo- ração: dogmáticas e históricas; quanto à origem: populares (democráticas) ou outorgadas; quanto à estabilidade: rígidas, flexíveis e semi-rígidas.  A constituição material em sentido amplo, identifica-se com a or- ganização total do Estado, com regime político; em sentido estrito, designa as normas escritas ou costumeiras, inseridas ou não num documento escrito, que regulam a estrutura do Estado, o organiza- ção de seus órgãos e os direitos fundamentais.  A constituição formal é o peculiar modo de existir do Estado, re- duzido, sob forma escrita, a um documento solenemente estabele- cido pelo poder constituinte e somente modificável por processos e formalidades especiais nela própria estabelecidos.  A constituição escrita é considerada, quando codificada e siste- matizada num texto único, elaborado por um órgão constituinte, encerrando todas as normas tidas como fundamentais sobre a es- trutura do Estado, a organização dos poderes constituídos, seu modo de exercício e limites de atuação e os direitos fundamentais.  Não escrita, é a que cujas normas não constam de um documento único e solene, baseando-se nos costumes, na jurisprudência e em convenções e em textos constitucionais esparsos. Ex. constituição inglesa.  Constituição dogmática é a elaborada por um órgão constituinte, e sistematiza os dogmas ou ideias fundamentais da teoria política e do Direito dominantes no momento.  Histórica ou costumeira: é a resultante de lenta formação históri- ca, do lento evoluir das tradições, dos fatos sócio-políticos, que se cristalizam como normas fundamentais da organização de deter- minado Estado. São populares as que se originam de um órgão constituinte composto de representantes do povo, eleitos para o fim de elaborar e estabelecer a mesma. (Cfs de 1891, 1934, 1946 e 1988).  Outorgadas são as elaboradas e estabelecidas sem a participação do povo, aquelas que o governante por si ou por interposta pessoa ou instituição, outorga, impõe, concede ao povo. (Cfs 1824, 1937, 1967 e 1969).  Rígida é a somente alterável mediante processos, solenidades e exigências formais especiais, diferentes e mais difíceis que os de formação das leis ordinárias ou complementares.  Flexível é a que pode ser livremente modificada pelo legislador segundo o mesmo processo de elaboração das leis ordinárias.  Semi-rígida é a que contém uma parte rígida e uma flexível.  Objeto: estabelecer a estrutura do Estado, a organização de seus órgãos, o modo de aquisição do poder e a forma de seu exercício, limites de sua atuação, assegurar os direitos e garantias dos indi- víduos, fixar o regime político e disciplinar os fins sócio- econômicos do Estado, bem como os fundamentos dos direitos econômicos, sociais e culturais.  Conteúdo: é variável no espaço e no tempo, integrando a multipli- cidade no “uno”das instituições econômicas, jurídicas, políticas e sociais na unidade múltipla da lei fundamental do Estado.  Elementos: por sua generalidade, revela em sua estrutura norma- tiva as seguintes categorias: a) elementos orgânicos: que se con- têm nas normas que regulam a estrutura do Estado e do poder; b) limitativos: que se manifestam nas normas que consubstanciam o elenco dos direitos e garantias fundamentais; limitam a ação dos poderes estatais e dão a tônica do Estado de Direito (individuais e suas garantias, de nacionalidade, políticos); c) sócio-ideológicos: consubstanciados nas normas sócio-ideológicas, que revelam a caráter de compromisso das constituições modernas entre o Esta- do individualista e o social intervencionista; d) de estabilização constitucional: consagrados nas normas destinadas a assegurar a solução dos conflitos constitucionais, a defesa da constituição, do Estado e das instituições democráticas; e) formais de aplicabilida- de: são os que se acham consubstanciados nas normas que esta- tuem regras de aplicação das constituições, assim, o preâmbulo, o dispositivo que contém as cláusulas de promulgação e as disposi- ções transitórias, assim, as normas definidoras dos direitos e ga- rantias fundamentais têm aplicação imediata.
  • 6. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 4 17. TEORIA GERAL DA CONSTITUIÇÃO: CONCEITO, ORIGENS, CONTEÚDO, ESTRUTURA E CLASSIFICAÇÃO. 18. SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO. 20. CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS. A experiência histórica do século XX confirmou o estado como institui- ção predominante nas sociedades humanas. Seu principal instrumento, a constituição, é a fonte por excelência da teoria jurídica. Lei máxima, que encerra as normas superiores da ordenação jurídica de uma nação, a constituição define desde a forma do estado e do governo até o complexo normativo e costumeiro referente ao poder político organi- zado e aos direitos dos cidadãos. Todos os estados, seja qual for sua forma de governo, desde que ajam de acordo com certas normas fundamentais e possuam ordenamento jurídico, têm constituição. As constituições podem ser escritas, como a brasileira, expressa num documento único e definido, ou consuetudinárias, como a do Reino Unido, que se baseia num conjunto de documentos, estatutos e práticas tradicionais aceitas pela sociedade. Teorias tradicionais. Desde a Grécia clássica, desenvolveu-se no Oci- dente europeu a convicção de que a comunidade política deve ser gover- nada por lei embasada no direito natural. Foi Aristóteles, a partir do estudo e classificação das diferentes formas de governo, quem desenvolveu o conceito de constituição. Para ele havia três formas legítimas de organiza- ção política: monarquia, ou governo de um só homem; aristocracia, ou governo dos melhores; e democracia, governo de todos os cidadãos. As formas ilegítimas que correspondem a cada uma das formas legítimas seriam, respectivamente, tirania, oligarquia e demagogia. O melhor sistema de governo seria o que combinasse elementos das três formas legítimas, de modo que todos assegurassem seus direitos e aceitassem seus deve- res, em nome do bem comum. Outro princípio aristotélico afirma que os governantes são obrigados a prestar contas aos governados e que todos os homens são iguais perante a lei. Esse princípio se aplicava, na antiga Grécia, apenas aos homens livres e não aos escravos. O aprimoramento da lei foi a maior contribuição de Roma à civilização ocidental. Para os dirigentes romanos, a organização do estado correspon- dia a uma lei racional, que refletia a organização do mundo. A partir do momento em que se transformou na religião predominante do Ocidente, o cristianismo defendeu uma concepção monárquica de governo. Nos últimos anos do Império Romano, santo Agostinho postulava que as constituições terrenas deviam, na medida do possível, corresponder ao modelo da "cidade de Deus" e concentrar o poder num único soberano. Segundo essa tese, que se firmou durante a Idade Média e deu sustenta- ção ao absolutismo monárquico, o monarca recebia o mandato de Deus. Os fundamentos teóricos do constitucionalismo moderno nasceram das teorias sobre o contrato social, defendidas no século XVII por Thomas Hobbes e John Locke, e no século seguinte por Jean-Jacques Rousseau. De acordo com essas teorias, os indivíduos cediam, mediante um contrato social, parte da liberdade absoluta que caracteriza o "estado de natureza" pré-social, em troca da segurança proporcionada por um governo aceito por todos. Fundamentos constitucionais Princípios básicos. Para cumprir suas funções, a constituição deve harmonizar o princípio da estabilidade, na forma e no procedimento, com o da flexibilidade, para adaptar-se às mudanças sociais, econômicas e tecno- lógicas inevitáveis na vida de uma nação. Também deve prever alguma forma de controle e prestação de contas do governo perante outros órgãos do estado e determinar claramente as áreas de competência dos poderes legislativo, executivo e judiciário. Os princípios constitucionais podem agrupar-se, como é o caso da constituição brasileira, em duas categorias: estrutural e funcional. Os pri- meiros, como os que definem a federação e a república, são juridicamente inalteráveis e não podem ser abolidos por emenda constitucional; os princí- pios que se enquadram na categoria funcional, como os que dizem respeito ao regime (no caso brasileiro, democracia representativa) e ao sistema de governo (bicameralismo, presidencialismo e controle judicial) podem ser modificados por reforma da constituição. A inobservância de qualquer desses princípios, ou de outros deles decorrentes, está expressamente referida na constituição brasileira como motivo de intervenção federal nos estados. As constituições podem ser flexíveis ou rígidas, conforme a maior ou menor facilidade com que podem ser modificadas. As constituições flexí- veis, como a britânica, são modificadas por meio de procedimentos legisla- tivos normais; as constituições rígidas modificam-se mediante procedimen- tos complexos, nos quais geralmente se exige maioria parlamentar qualifi- cada. Federação. A organização federal é o primeiro princípio fundamental abordado pela constituição brasileira. Pressupõe a união indissolúvel de estados autônomos e a existência de municípios também autônomos, peculiaridade que distingue a federação brasileira da americana, por exem- plo, na qual a questão da autonomia municipal é deixada à livre regulação dos estados federados. Verifica-se assim que no Brasil a federação se exprime juridicamente pelo desdobramento da personalidade estatal nacio- nal na tríplice ordem de pessoas jurídicas de direito público constitucional: União, estados e municípios. O Distrito Federal, sede do governo da União, tem caráter especial. A autonomia dos estados se expressa: (1) pelos princípios decorrentes do governo próprio e da administração própria, com desdobramentos, nos respectivos âmbitos regionais, dos poderes executivo, legislativo e judiciá- rio; (2) pelo princípio dos poderes reservados, por força do qual todos os poderes não conferidos expressa ou necessariamente à União ou aos municípios competem ao estado federado. O princípio da autonomia municipal, cujo desrespeito acarreta a inter- venção federal, é mais restrito que o da autonomia estadual e exprime-se: (1) pela eleição direta do prefeito, vice-prefeito e vereadores; e (2) pela existência de administração própria, autônoma, no que concerne ao inte- resse peculiar do município. República. O princípio da forma republicana, cujo desrespeito também motiva intervenção, desdobra-se, no sistema brasileiro, em três proposi- ções: (1) temporariedade das funções eletivas, cuja duração, nos estados e municípios, é limitada à das funções correspondentes no plano federal; (2) inelegibilidade dos ocupantes de cargos do poder executivo para o período imediato; e (3) responsabilidade pela administração, com obrigatória pres- tação de contas. Democracia representativa. Pela definição constitucional, democracia é o regime em que todo poder emana do povo e em seu nome é exercido. O princípio fundamental da representação está assegurado pela adoção de: (1) sufrágio universal e direto; (2) votação secreta e (3) representação proporcional dos partidos. Sistema bicameral. O princípio do bicameralismo, ou sistema bicame- ral, diz respeito à estruturação do poder legislativo em dois órgãos diferen- tes. Por exemplo, a Câmara dos Comuns e a Câmara dos Lordes, no Reino Unido; o Bundestag (câmara baixa) e o Bundesrat (câmara alta), na Alema- nha; o Senado e a Câmara dos Representantes, nos Estados Unidos; e o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, no Brasil. A composição das duas câmaras é sempre diferente em relação ao número de membros que as integram, à extensão de seus poderes e, em alguns casos, no sistema de recrutamento, como na Câmara dos Lordes, em que muitas cadeiras são hereditárias. Sistema presidencial. O presidencialismo é o sistema de governo repu- blicano que se assenta na rigorosa separação de poderes e atribui ao presidente da república grande parte da função governamental e a plenitu- de do poder executivo. Nesse sistema, o presidente coopera na legislação, orienta a política interna e internacional, assume a gestão superior das finanças do estado, exerce o comando supremo das forças armadas e escolhe livremente os ministros e assessores, que o auxiliam no desempe- nho das respectivas funções, dentro dos programas, diretrizes e ordens presidenciais. O sistema presidencialista vigente em muitos países baseia- se em linhas gerais no padrão dos Estados Unidos, com variantes que não alteram as características que o definem.
  • 7. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 5 Sistema de controle judicial. Devido à organização federal e conse- quente supremacia da constituição da república sobre as dos estados, bem como à prevalência das normas constitucionais sobre a legislação ordinária, atribui-se ao poder judiciário, concomitantemente com a função de julgar, a de controlar a constitucionalidade das leis. Além disso, como as constitui- ções geralmente asseguram que a lei não pode deixar de apreciar nenhu- ma lesão do direito individual, compete também ao judiciário o controle contencioso dos atos das autoridades. Uma lei comum pode entrar em choque com algum artigo da constitui- ção. Por isso, é necessário que exista um órgão de controle da constitucio- nalidade das leis, que entra em ação antes de sua promulgação, como na França, ou depois, como no Brasil, onde o Supremo Tribunal Federal pode pronunciar-se por iniciativa própria ou quando solicitado. Liberdades públicas. Conjunto de direitos inalienáveis do cidadão, in- dependentes do arbítrio das autoridades, as liberdades públicas são garan- tidas pelas constituições modernas, principalmente as seguintes: liberdade religiosa; liberdade de imprensa e de manifestação do pensamento; liber- dade de associação, política ou não, e de reunir-se em praça pública, sem armas; inviolabilidade de domicílio e de correspondência; garantia contra prisão arbitrária, confisco e expropriação; liberdade de locomover-se dentro do território nacional e liberdade de sair do país. Todas essas prerrogativas do cidadão são chamadas direitos individuais. Seu conjunto constitui a liberdade (no singular), característica do estado de direito, oposto ao estado policial e autoritário. As liberdades (no plural) são prerrogativas não da pessoa, mas de grupos, classes e entidades. Matérias regulamentadas. No que tange a sua formulação escrita, as constituições do século XIX tendiam a ser breves e conter apenas as nor- mas fundamentais. A partir da primeira guerra mundial, o texto constitucio- nal passou a incluir princípios referentes a temas sociais, econômicos e políticos, antes regulados por leis ordinárias. Nas constituições modernas, geralmente as matérias regulamentadas são: (1) soberania nacional, língua, bandeira e forças armadas; (2) direitos, deveres e liberdades dos cidadãos; (3) princípios reguladores da política social e da economia; (4) relações internacionais; (5) composição e estatuto do governo e suas relações com as câmaras legislativas; (6) poder judiciá- rio; (7) organização territorial do estado; (8) tribunal constitucional ou órgão similar; e (9) procedimento para a reforma constitucional. A constituição é geralmente elaborada por uma Assembleia constituinte e por ela decretada e promulgada. Quando entra em vigor por decisão do governante, diz-se que é outorgada; é o caso das constituições brasileiras de 1824, outorgada por D. Pedro I; de 1937, que instituiu o Estado Novo; e de 1967, imposta pelo governo militar. Historicamente, as constituições outorgadas pelo monarca absoluto no exercício do poder, mesmo com aprovação da representação popular, denominam-se cartas. Constituições brasileiras A primeira constituição do Brasil foi outorgada pelo imperador D. Pedro I, depois de dissolvida a Assembleia Geral Constituinte, no tumultuado período que se seguiu à independência. Datada de 24 de fevereiro de 1824, seu projeto se deve, em boa parte, a José Joaquim Carneiro de Campos, depois marquês de Caravelas, mas é indubitável que nele também colabo- rou o jovem imperador. Em linhas gerais, assemelha-se ao projeto que se discutia na Constituinte, de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada: calcavam- se ambos na constituição espanhola de 1812. Tinha de particular a figura do poder moderador, exercido pelo monarca. No período da Regência, operou-se importante reforma constitucional por meio do instrumento denominado Ato Adicional, de 12 de agosto de 1834, que criava as Assembleias Legislativas Provinciais. Seguiu-se a lei de Interpretação ao Ato Adicional, de 12 de maio de 1840. Em 20 de julho de 1847, um decreto imperial consagrou o regime parlamentarista e o cargo de presidente do Conselho de Ministros. Proclamada a república, em 15 de novembro de 1889, o marechal De- odoro da Fonseca decretou a lei de Organização do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, de autoria de Rui Barbosa, então ministro da Fazenda e primeiro vice-chefe do governo. De Rui Barbosa são ainda as principais emendas ao projeto de constituição, elaborado pela chamada Comissão dos Cinco, que teve como presidente Joaquim Salda- nha Marinho. Reunido o Congresso Constituinte, a primeira constituição republicana foi promulgada em 24 de fevereiro de 1891. Consagrava o princípio do unionismo (predomínio da União sobre os estados) e adotava o recurso do habeas-corpus, garantia outorgada em favor de quem sofreu ou pode sofrer coação ou violência por parte do poder público. De cunho acentuadamente presidencialista, a constituição de 1891 foi reformada ao tempo do governo Artur Bernardes, em 1926, para fortalecer ainda mais o poder executivo. O quatriênio que se seguiu foi interrompido pela revolução de 1930, que levou ao poder Getúlio Vargas, chefe da Aliança Liberal e candidato derrotado às eleições de 1o de março, denunci- adas como fraudulentas. Em 11 de novembro de 1930, Vargas decretou a lei de Organização do Governo Provisório. A segunda constituição republicana data de 16 de julho de 1934. Eleito pela Assembleia Constituinte para um mandato de quatro anos, a expirar em 1938, Vargas deu um golpe de estado e outorgou a constituição de 1937, que instituiu o Estado Novo. Essa constituição ampliava os poderes do poder executivo e acolhia direitos de família e os direitos à educação e à cultura. A terceira constituição republicana, de 18 de setembro de 1946, encer- rou a ditadura de Vargas e consagrou o restabelecimento da democracia no país, conciliando diferentes tendências políticas. O legislativo voltou a funcionar e o uso da propriedade foi condicionado ao bem-estar social. A constituição de 1946 instituiu o salário mínimo, o direito de greve e o ensino gratuito. A idade mínima para o exercício do voto baixou de 21 para 18 anos. Essa constituição foi emendada em 1961 para instituir o parlamen- tarismo, durante a crise deflagrada pela renúncia do presidente Jânio Quadros, mas a emenda foi revogada em janeiro de 1963. O governo militar instaurado em 1964 procurou legitimar o autoritarismo por meio de sucessivos atos institucionais, que desfiguraram progressiva- mente a constituição. Só em 1967, porém, ela seria formalmente substituí- da. Resultado do projeto preparado por uma comissão de juristas, convo- cados pelo presidente Castelo Branco, e alterado pelo ministro da Justiça, Carlos Medeiros Silva, a nova constituição foi aprovada pelo Congresso, convocado para esse fim pelo Ato Adicional de 7 de dezembro de 1966. A constituição de 1967 acabou com a eleição direta para presidente da república e criou, para elegê-lo, um colégio eleitoral. Com ela foram sus- pensas as garantias dos juízes e aprofundou-se a intervenção da União na economia dos estados. Novas medidas, particularmente o Ato Institucional n 5, foram alterando essa constituição até que, na crise deflagrada pela doença do presidente Costa e Silva, uma junta militar assumiu o poder e baixou, em 17 de outubro de 1969, a Emenda no 1, em substituição ao projeto que o presidente pretendia apresentar. Tratava-se, na prática, de uma nova constituição, que reforçou ainda mais o poder executivo ao instituir as medidas de emergência e o estado de emergência. A constituição de 1969 esvaziou-se com o progressivo esfacelamento do regime militar. Em 1987, o presidente José Sarney, eleito ainda pelo voto indireto, convocou a nova Assembleia Nacional Constituinte. A consti- tuição por ela projetada, promulgada em 5 de outubro de 1988, devolveu os poderes do legislativo e deu-lhe novas atribuições em matéria de política econômico-financeira, orçamento, política nuclear e política de comunica- ções. Criou também novos direitos individuais, coletivos e sociais e ampliou particularmente os direitos do trabalhador. ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda. Presidencialismo Adotado sob formas variadas em muitos países, o presidencialismo tem como base doutrinária a teoria política de separação e controle recíproco dos poderes, de Montesquieu, que pode ser resumida na sentença do autor: "O poder deve limitar o poder." Presidencialismo é o sistema de governo no qual os poderes, funções e deveres de chefe de governo e de chefe de estado se reúnem numa só pessoa e no qual o executivo, legislativo e judiciário são poderes indepen- dentes entre si que funcionam em harmonia. Eleito pelo voto direto ou por colégio eleitoral, para mandato com período determinado em lei constituci-
  • 8. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 6 onal, o presidente não se subordina ao Parlamento nem pode nele interferir. Entre suas atribuições estão a de liderar a vida política da nação, represen- tar o país interna e externamente, comandar as forças armadas, firmar tratados, encaminhar projetos de lei ao Congresso, responder pela adminis- tração e pelas decisões nos setores do executivo e escolher os ministros de estado. O sistema presidencialista de governo foi criado nos Estados Unidos pela constituição de 1787. Para limitar o poder do governo e garantir a liberdade dos cidadãos, os constituintes rejeitaram o modelo parlamentar britânico e estabeleceram a separação total do legislativo, executivo e judiciário, com um sistema de pesos e contrapesos no qual cada poder fiscaliza e contrabalança os demais, sem predomínio de nenhum deles. O presidente americano é eleito por um colégio eleitoral, para um mandato de quatro anos, com direito a concorrer uma vez à reeleição. O presidente não precisa ter maioria no Congresso, mas em todas as questões de política geral que envolvem a legislação ou gastos de verbas deve negociar com os parlamentares para fazer aprovar seus projetos. Nas eleições presidenciais americanas, o eleitor participa de todas as etapas do processo: escolhe o candidato de cada partido nas eleições primárias, elege o colégio eleitoral de cada estado e vota nos candidatos vencedores nas primárias no dia das eleições nacionais gerais. O colégio eleitoral, que escolhe o presidente, se compõe de delegados dos cinquenta estados da nação. Cada estado elege um número de delegados equivalen- te à representação que tem nas duas casas do Congresso. Parlamentares eleitos não podem ser delegados. A eleição é praticamente direta porque os delegados respeitam a vontade manifesta pelo voto popular, embora haja exemplos de maioria mais expressiva no colégio eleitoral do que no voto direto, como na eleição de Abraham Lincoln em 1860. Em outras nações, o presidencialismo divergiu em muitos aspectos do modelo americano. Nos países europeus em que a forma de governo é republicana e o sistema parlamentarista, o presidente é eleito para um mandato estabelecido por lei e ocupa a posição de chefe de estado, en- quanto o primeiro-ministro exerce a função de chefe de governo. As atribui- ções do presidente se assemelham às dos monarcas constitucionais. Na Suíça o poder executivo é exercido pelo Conselho Federal, colegiado de sete membros eleitos para um período de quatro anos pela Assembleia Federal, que a cada ano elege um deles para o exercício da presidência. Na América Latina, a tendência histórica tem sido o fortalecimento do executivo sem equilíbrio entre os poderes, o que levou com frequência muitas nações a ditaduras que prescindiam não só do legislativo e do judiciário como da própria participação popular. No Brasil, o presidencialismo estabelecido na constituição republicana de 1891 passou por mudanças profundas, ocasionadas por conflitos políti- cos, revoltas regionais civis, rebeliões militares e inquietação econômica decorrente da grave crise financeira mundial de 1929. A revolução de 1930 deu início ao "presidencialismo forte" de Getúlio Vargas, que se prolongou até 1945. Nas duas décadas seguintes, o presidencialismo pautou-se pela constituição de 1946, com voto direto e popular. A intervenção militar de 1964 interrompeu o ciclo, substituído pela presidência dos generais, que se revezaram no poder pelo voto indireto do Congresso, transformado em colégio eleitoral. Com a constituição de 1988, o presidencialismo recuperou características próximas às do sistema americano, com o fortalecimento do legislativo e do judiciário. ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a lei fundamental e suprema do Brasil, servindo de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando-se no topo da pirâmide normativa. É a sétima a reger o Brasil desde a sua Independência. Histórico Desde 1964 estava o Brasil sob o regime da ditadura militar, e desde 1967 (particularmente subjugado às alterações decorrentes dos Atos Institucionais) sob uma constituição imposta pelo governo. O sistema de exceção, em que as garantias individuais e sociais eram diminuídas (ou mesmo ignoradas), e cuja finalidade era garantir os interesses da ditadura (internalizado em conceitos como segurança nacional, restrição das garantias fundamentais, etc.) fez crescer, durante o processo de abertura política, o anseio por dotar o Brasil de uma nova Constituição, defensora dos valores democráticos. Anseio este que se tornou necessidade após o fim da ditadura militar e a redemocratização do Brasil, a partir de 1985. Ideologias manifestas na Constituição Independentemente das controvérsias de cunho político, a Constituição Federal de 1988 assegurou diversas garantias constitucionais, com o objetivo de dar maior efetividade aos direitos fundamentais, permitindo a participação do Poder Judiciário sempre que houver lesão ou ameaça de lesão a direitos. Para demonstrar a mudança que estava havendo no sistema governamental brasileiro, que saíra de um regime autoritário recentemente, a constituição de 1988 qualificou como crimes inafiançáveis a tortura e as ações armadas contra o estado democrático e a ordem constitucional, criando assim dispositivos constitucionais para bloquear golpes de quaisquer natureza. Com a nova constituição, o direito maior de um cidadão que vive em uma democracia foi conquistado: foi determinada a eleição direta para os cargos de Presidente da República, Governador de Estado (e do Distrito Federal), Prefeito, Deputado (Federal, Estadual e Distrital), Senador e Vereador. A nova Constituição também previu uma maior responsabilidade fiscal. Ela ainda ampliou os poderes do Congresso Nacional, tornando o Brasil um país mais democrático. Pela primeira vez uma Constituição brasileira define a função social da propriedade privada urbana, prevendo a existência de instrumentos urbanísticos que, interferindo no direito de propriedade (que a partir de agora não mais seria considerado inviolável), teriam por objetivo romper com a lógica da especulação imobiliária. A definição e regulamentação de tais instrumentos, porém, deu-se apenas com a promulgação do Estatuto da Cidade em 2001. Estrutura A Constituição de 1988 está dividida em 10 títulos (o preâmbulo não conta como título). As temáticas de cada título são:  Preâmbulo - introduz o texto constitucional. De acordo com a doutrina majoritária, o preâmbulo não possui força de lei.  Princípios Fundamentais - anuncia sob quais princípios será dirigida a República Federativa do Brasil.  Direitos e Garantias Individuais - elenca uma série de direitos e garantias individuais, coletivos, sociais, de nacionalidade e políticos. As garantias ali inseridas (muitas delas inexistentes em Constituições anteriores) representaram um marco na história brasileira.  Organização do Estado - define o pacto federativo, alinhavando as atribuições de cada ente da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Também define situações excepcionais de intervenção nos entes federativos, além de versar sobre administração pública e servidores públicos.  Organização dos Poderes - define a organização e atribuições de cada poder (Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário), bem como de seus agentes envolvidos. Também define os processos legislativos (inclusive para emendar a Constituição).  Defesa do Estado e das Instituições - trata do Estado de Defesa, Estado de Sítio, das Forças Armadas e das Polícias.  Tributação e Orçamento - define limitações ao poder de tributar do Estado, organiza o sistema tributário e detalha os tipos de tributos e a quem cabe cobrá-los. Trata ainda da repartição das receitas e de normas para a elaboração do orçamento público.  Ordem Econômica e Financeira - regula a atividade econômica e também eventuais intervenções do Estado na economia. Discorre ainda sobre as normas de política urbana, política agrícola e política fundiária.  Ordem Social - trata da Seguridade Social (incluindo Previdência Social), Saúde, Assistência Social, Educação, Cultura, Desporto, Meios de Comunicação Social, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente, Família, além de dar atenção especial aos seguintes segmentos: crianças, jovens, idosos e populações indígenas.  Disposições Gerais - artigos esparsos versando sobre temáticas variadas e que não foram inseridas em outros títulos em geral por tratarem de assuntos muito específicos.  Disposições Transitórias - faz a transição entre a Constituição anterior e a nova. Também estão incluídos dispositivos de duração determinada.
  • 9. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 7 Características  Rigidez - Não é facilmente alterada a Constituição exige um processo legislativo mais elaborado, consensual e solene para a elaboração de emendas constitucionais de que o processo comum exigido para todas as demais espécies normativas legais. 2. PODER CONSTITUINTE. Jean dos Santos Diniz 1 - NOÇÕES As normas constitucionais, por ocuparem o topo do ordenamento jurí- dico, são providas de elaboração mais dificultosa do que aqueles ditados pela própria ordem jurídica, que vêm de cunho ordinário. Com as noções supracitadas, podemos conceituar o Poder Constituinte como aquele poder capaz de criar, modificar ou implementar normas de força constitucional. 2 - TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE Nos Estados democráticos, a titularidade do poder constituinte perten- ce ao povo, pois o Estado decorre da soberania popular. Em razão de sua titularidade pertencer ao povo, o poder constituinte é permanente, isto é, não se esgota em um ato de seu exercício, visto que o povo não pode perder o direito de querer e de mudar à sua vontade. 3 - EXERCÍCIO DO PODER CONSTITUINTE Embora na atualidade haja um consenso teórico em afirmar ser o povo o titular do poder constituinte, o seu exercício nem sempre tem se realizado democraticamente. Assim, embora legitimamente o poder constituinte pertença sempre ao povo, temos duas formas distintas para o seu exercício: outorga e assem- bleia nacional constituinte. A outorga é o estabelecimento da Constituição pelo próprio detentor do poder, sem a participação popular. É ato unilateral do governante, que auto-limita o seu poder e impõe as regras constitucionais ao povo. A assembleia nacional constituinte é a forma típica de exercício do poder constituinte, em que o povo, seu legítimo titular, democraticamente, outorga poderes a seus representantes especialmente eleitos para a elabo- ração da Constituição. 4 - ESPÉCIES DE PODER CONSTITUINTE A doutrina costuma distinguir as seguintes espécies de poder consti- tuinte: poder constituinte originário e poder constituinte derivado este tendo como espécies o poder reformador, o decorrente e o revisor. O poder constituinte originário (também denominado genuíno, pri- mário ou de primeiro grau) é o poder de elaborar uma Constituição. Não encontra limites no direito positivo anterior, não deve obediência a nenhuma regra jurídica preexistente, Assim, podemos caracterizar o poder constituinte originário como inici- al, permanente, absoluto, soberano, ilimitado, incondicionado, permanente e inalienável O poder constituinte derivado (também denominado reformador, se- cundário, instituído, constituído, de segundo grau, de reforma) é o poder que se ramifica em três espécies: O poder reformador que abrange as prerrogativas de modificar, imple- mentar ou retirar dispositivos da Constituição. O poder Constituinte decorrente que consagra o princípio federativo de suas Unidades É a alma d a autonomia das federações na forma de sua constituição, assim, a todos os Estados, o Distrito Federal e até os Municípios este na forma de lei orgânica poderão ter suas constituições específicas em decor- rência do Poder Constituinte Originário. Por fim, o poder constituinte revisor que como exemplo de nossa pró- pria Constituição Federal, possibilita a revisão de dispositivos constitucio- nais que necessitem de reformas, porém, esta não se confunde com refor- ma em stricto senso pois, esta é de forma mais dificultosa, quorum ainda mais específico, segundo as regras que ela estabelece. É o poder de reforma, que permite a mudança da Constituição, adaptando-a a novas necessidades, sem que para tanto seja preciso recorrer ao poder constituin- te originário. É um poder derivado (porque instituído pelo poder constituinte originário), subordinado (porque se encontra limitado pelas normas estabe- lecidas pela própria Constituição, as quais não poderá contrariar, sob pena de inconstitucionalidade) e condicionado (porque o seu modo de agir deve seguir as regras previamente estabelecidas pela própria Constituição). Essas limitações ao poder constituinte derivado (ou de reforma) são comumente classificadas em três grandes grupos: limitações temporais, limitações circunstanciais e limitações materiais. As limitações temporais consistem na vedação, por determinado lap- so temporal, de alterabilidade das normas constitucionais. A Constituição insere norma proibitiva de reforma de seus dispositivos por um prazo de- terminado. Não estão presentes na nossa vigente Constituição, sendo que no Brasil só a Constituição do Império estabelecia esse tipo de limitação, visto que, em seu art. 174, determinava que tão-só após quatro anos de sua vigência poderia ser reformada. As limitações circunstanciais evitam modificações na Constituição em certas ocasiões anormais e excepcionais do país, em que possa estar ameaçada a livre manifestação do órgão reformador. Busca-se afastar eventual perturbação à liberdade e à independência dos órgãos incumbidos da reforma. A atual Constituição consagra tais limitações, ao vedar a emenda na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio (art. 60, § 1º). As limitações materiais excluem determinadas matérias ou conteúdo da possibilidade de reforma, visando a assegurar a integridade da Consti- tuição, impedindo que eventuais reformas provoquem a sua destruição ou impliquem profunda mudança de sua identidade. Tais limitações podem ser explícitas ou implícitas. As limitações materiais explícitas correspondem àquelas matérias que o constituinte definiu expressamente na Constituição como inalteráveis. O próprio poder constituinte originário faz constar na sua obra um núcleo imodificável. Tais limitações inserem-se, pois, expressamente, no texto constitucional e são conhecidas por "cláusulas pétreas". Na vigente Constituição, estão prescritas no art. 60, § 4º, segundo o qual "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; os direitos e garantias individuais". As limitações materiais implícitas são aquelas matérias que, apesar de não inseridas no texto constitucional, estão implicitamente fora do alcan- ce do poder de reforma, sob pena de implicar a ruptura da ordem constitu- cional. Isso porque, caso pudessem ser modificadas pelo poder constituinte derivado, de nada adiantaria a previsão expressa das demais limitações. São apontadas pela doutrina três importantes limitações materiais implíci- tas, a saber: (1) a titularidade do poder constituinte originário, pois uma reforma constitucional não pode mudar o titular do poder que cria o próprio poder reformador; (2) a titularidade do poder constituinte derivado, pois seria um despautério que o legislador ordinário estabelecesse novo titular de um poder derivado só da vontade do constituinte originário; e (3) o processo da própria reforma constitucional, senão poderiam restar fraudadas as limitações explícitas impostas pelo constituinte originário. O poder constituinte decorrente é aquele atribuído aos Estados- membros para se auto-organizarem mediante a elaboração de suas consti- tuições estaduais, desde que respeitadas as regras limitativas impostas pela Constituição Federal. Como se vê, também é um poder derivado, limitado e condicionado, visto que é resultante do texto constitucional. Fonte: Fonte:http://www.vemconcursos.com.br/opiniao/index.phtml? page_ordem=recentes&page_id=1502&page_print=1
  • 10. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 8 A TEORIA DO PODER CONSTITUINTE Conforme temos trabalhado até o momento, os teóricos do Direito constitucional são quase unânimes em afirmar que o constitucionalismo moderno começa a ser formado no processo que se inicia com a Magna Carta na Inglaterra em 1215. Entretanto ali não está presente a ideia de uma Assembleia Nacional Constituinte que elaborando uma Constituição dará início a uma nova realidade constitucional, fruto da vontade de um poder soberano e devendo se basear na vontade popular. Temos portanto duas realidades constitucionais que hoje parecem, lentamente, gradual- mente, se fundirem, mas que ainda são muito distintas. Embora o Brasil tenha sofrido influência do Direito estadunidense a par- tir da Constituição de 1891, que copiou diversas instituições dos Estados Unidos da América como o federalismo, o presidencialismo, o seu modelo bicameral, o modelo de suprema corte e o modelo de controle difuso de constitucionalidade, nossa tradição constitucional é construída a partir do modelo continental europeu, transformando o nosso constitucionalismo em um dos mais ricos do mundo, pois promove a construção de um processo de síntese, ainda inicial, dos dois grandes sistemas jurídicos modernos, o que pode ser expresso no nosso controle misto de constitucionalidade das leis, que infelizmente vem sofrendo ataques inconstitucionais que buscam implantar o controle concentrado único, o que é contra a democracia e logo inconstitucional. Entretanto, há algo em comum entre o modelo estadunidense e o eu- ropeu continental, não compartilhado pela Inglaterra: a existência de um poder constituinte originário, inicial, soberano e de primeiro grau capaz de romper com a ordem anterior e iniciar uma nova vida jurídica constitucional com a nova Constituição. Segundo a visão de diversos constitucionalistas, a diferenciação entre Poder Constituinte e Poder Legislativo ordinário ganhou ênfase e concreti- zação na Revolução Francesa, quando os Estados Gerais, por solicitação do Terceiro Estado, se proclamaram como Assembleia Nacional Constituin- te, sem nenhuma convocação formal. Na França revolucionária (1789) foram superadas as velhas teorias que determinavam a origem divina do poder, afirmando a partir de então que a nação, o povo (seja diretamente ou através de uma assembleia representa- tiva), era o titular da soberania, e, por isso, titular do Poder Constituinte. Entendia-se então que a Constituição deveria ser a expressão da vontade do povo nacional, a expressão da soberania popular. Ideias que podem parecer um pouco românticas ou artificiais em uma construção teórica transdisciplinar contemporânea. Podemos dizer que as dificuldades (ou impossibilidade) contemporâneas para afirmar a existência de uma (única) vontade popular, em sociedades de extrema complexidade, é bem maior hoje que no passado, mas sempre estiveram presentes no Estado moder- no. Por mais democrático que tenha sido qualquer poder constituinte vamos encontrar no complexo jogo de poder por traz da constituinte aqueles que tem a capacidade ou possibilidade de impor seus interesses com mais força do que outros. Podemos dizer que a elaboração geral da teoria do Poder Constituinte nasceu, na cultura europeia, com SIEYES, pensador e revolucionário francês do século XVIII. A concepção de soberania nacional na época assim como a distinção entre poder constituinte e poderes constituídos com poderes derivados do primeiro é contribuição do pensador revolucionário. SIEYES afirmava que objetivo ou o fim da Assembleia representativa de uma nação não pode ser outro do que aquele que ocorreria se a própria população pudesse se reunir e deliberar no mesmo lugar. Ele acreditava que não poderia haver tanta insensatez a ponto de alguém, ou um grupo, na Assembleia geral, afirmar que os que ali estão reunidos devem tratar dos assuntos particulares de uma pessoa ou de um determinado grupo. A conclusão da escola clássica francesa colocando a Constituição co- mo um certificado da vontade política do povo nacional sendo que para que isto ocorra deve ser produto de uma Assembleia Constituinte representativa da vontade deste povo, se opõe Hans Kelsen, que afirma que a Constitui- ção provém de uma norma fundamental. Importante ressaltar neste ponto que os conceitos dos diversos autores serão influenciados pela compreen- são da natureza do Poder Constituinte: seja um poder de fato ou um poder de Direito. Um outro aspecto que devemos estudar sobre o Poder Constituinte é relativo a sua amplitude. Alguns autores entendem que o poder constituinte se limita a criação originária do Direito enquanto outros compreendem que este poder constituinte é bem mais amplo incluindo uma criação derivada do Direito através da reforma do texto constitucional, adaptando-o aos processos de mudança sociocultural , e ainda o poder constituinte decorren- te, característica essencial de uma federação, quando os entes federados recebem (ou permanecem com) parcelas de soberania expressas na com- petência legislativa constitucional. Um terceiro aspecto a ser estudado, e sobre o qual também existem di- vergências, diz respeito à titularidade do Poder Constituinte. Para uma melhor compreensão desta matéria e de sua diversas com- preensões, é necessário estudar separadamente cada um destes elemen- tos. Não se pode vincular, como pretenderam alguns, o posicionamento com relação à natureza do Poder Constituinte com a sua amplitude, e mesmo com sua titularidade em determinados casos. Finalmente o aspecto mais importante de todos é o estudo dos limites ao pode constituinte tanto originário, como derivado e decorrente. OS LIMITES DO PODER CONSTITUINTE O poder constituinte derivado, ou de reforma, divide-se em dois: o po- der de emenda e o poder de revisão, enquanto o poder originário pertence a uma assembleia eleita com finalidade de elaborar a Constituição, deixan- do de existir quando cumprida sua função, sendo um poder temporário, o poder de reforma é um poder latente, que pode se manifestar a qualquer momento, desde que cumpridos os requisitos formais e observados os seus limites materiais. O poder de reforma por meio de emendas pode em geral se manifestar a qualquer tempo, sofrendo limites materiais, circunstanciais, formais e algumas vezes temporais. Este poder consiste em alterar pontualmente uma determinada matéria constitucional, adicionando, suprimindo, modifi- cando alínea(s), inciso(s), artigo(s) da Constituição. O poder de revisão em geral tem limites temporais, além dos limites circunstanciais, formais e materiais, ocorrendo, em algumas Constituições, sua manifestação periódica, como na Constituição portuguesa de 5 em 5 anos. Na nossa Constituição, houve a previsão de manifestação de poder uma única vez não podendo ocorrer de novo pois estava prevista no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A revisão é mais ampla que a emenda, pois como sugere o nome trata-se de uma revisão sistêmica do texto, respeitados os limites. No Brasil entretanto, a nossa revisão foi atípi- ca, se manifestando através de emendas. Entretanto, bem ou mal feita, o que ocorreu foi uma revisão, pois se deu, respeitados os aspectos formais processuais da revisão prevista no ADCT. Além do poder de reforma encontraremos nos estados federais (e ape- nas nos estados federais) o poder decorrente que pertence aos entes federados sejam dos estados membros no federalismo de dois níveis, sejam dos estados membros e municípios no federalismo de três níveis. Este poder também é subordinado e limitado, tendo limites expressos e devendo respeitar os princípios fundamentais e estruturantes da Constitui- ção Federal. Quanto aos limites do poder constituinte podemos dizer o seguinte: a) limites materiais: os limites materiais dizem respeito às matérias que não podem ser objeto de emenda expressos ou implícitos; b) os limites materiais implícitos dizem respeito a própria essência do poder de reforma. Mesmo que não existam limites expressos, a segurança jurídica exige que o poder de reforma não se transfor- me, por falta de limites materiais, em um poder originário. O poder de reforma pode modificar mantendo a essência da Constituição, ou seja, os princípios fundantes e estruturantes da Constituição, pois reforma não é construir outro mas modificar mantendo a estru- tura e os fundamentos; c) são portanto limites materiais implícitos o respeito aos princípios fundamentais e estruturais da constituição, que só poderão ser modificados através de outra assembleia constituinte, ou seja, através de um outro poder constituinte originário; d) o artigo 60 parágrafo 4 incisos I a IV da CF trazem os limites mate- riais expressos, dispondo que é vedada emenda tendente a abolir a forma federal, os direitos individuais e suas garantias, a separa- ção de poderes e a democracia;
  • 11. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 9 e) já estudamos a teoria da indivisibilidade dos direitos fundamentais e podemos afirmar com muita tranquilidade que não podem existir emendas que venham de alguma forma limitar os direitos individu- ais, políticos, sociais e econômicos; f) podem existir emendas sobre a separação de poderes, a democra- cia, os direitos individuais e suas garantias e o federalismo, desde que sejam para aperfeiçoar, jamais para restringir; g) como já estudado no tomo II do Curso de Direito Constitucional, a proteção ao federalismo, significa a proteção ao processo de des- centralização essencial ao nosso federalismo centrífugo; h) além dos limites materiais expressos no artigo 60 parágrafo 4 da CF 88 encontramos limites circunstanciais, que proíbem emendas ou revisão durante situações de grave comprometimento da estabi- lidade democrática como o estado de sitio, estado de defesa e in- tervenção federal; i) como afirmado acima, existem limites materiais implícitos que re- presentam a própria essência do poder constituinte derivado; j) o poder de reforma, como o nome sugere, diz respeito a alteração de elementos secundários de uma ordem jurídica, pois não é pos- sível através de emenda ou revisão alterar os princípios fundamen- tais ou estruturais de uma ordem constitucional; k) os princípios fundamentais e estruturantes são a essência da Constituição e mesmo que não haja clausula expressa que proíba emenda ou revisão, a essência não pode ser alterada; l) reforma significa alterar normas secundárias, as regras, mas, ja- mais, a estrutura, a essência, o fundamento de uma ordem jurídica; m) reforma não significa a construção de novo; n) outro limite implícito obvio diz respeito as regras constitucionais re- ferentes ao funcionamento ao poder constituinte de reforma; o) estas regras não podem ser objeto de emenda; p) as regras de funcionamento do poder constituinte derivado, o po- der de reforma, por motivos óbvios, não podem ser objeto de emenda ou revisão, pois, caso contrario estaríamos condenados a mais absoluta insegurança jurídica; q) além disto são limites ao poder de reforma, a proibição de revisão antes de cinco anos contados da promulgação da Constituição (li- mite temporal); r) a proibição do funcionamento do poder de reforma (emendas ou revisão) durante estado de defesa, de sitio ou intervenção federal constituem limites circunstanciais como já mencionado; s) os limites formais obrigam que a emenda de dê através de quorum de 3 quintos em dois turnos de votação em seção bicameral en- quanto a revisão (contrariando a lógica doutrinaria que exigia pro- cesso mais qualificado) ocorreu em seção unicameral por maioria absoluta (50% mais um de todos os representantes); t) quanto aos limites temporais a Constituição de 88 estabeleceu que a revisão ocorreria após cinco anos da promulgação da Constitui- ção, não existindo limites temporais para a reforma por meio de emendas; Esta discussão não é nova e encontramos no clássicos do Direito Constitucional nacional e estrangeira varias referencias a amplitude do poder constituinte e o poder de reforma. NELSON DE SOUZA SAMPAIO, afirmava que o poder reformador está abaixo do Poder Constituinte e jamais poderá ser ilimitado como este. Seja como se queira chamar este poder reformador, seja de Poder constituinte constituído como faz SANCHES AGESTA; poder constituinte derivado como faz PELAYO e BARACHO, ou poder constituinte instituído segundo BURDEAU, devemos encará-lo como faz PONTES de MIRANDA, como uma atividade constituidora diferida ou um poder constituinte de segundo como faz também ROSAH RUSSOMANO. A natureza do poder constituinte Alguns autores entendem que o poder constituinte originário é o mo- mento de passagem do poder ao Direito. É inegável que o poder constituin- te originário é o momento maior de ruptura da ordem constitucional, onde o poder de fato que se instala, forte o suficiente para romper com a ordem estabelecida, é capaz de construir uma nova ordem sem nenhum tipo de limite jurídico positivo na ordem com a qual está rompendo. Se entender- mos o Direito como sendo sinônimo de lei positiva, posto pelo Estado, o poder constituinte originário será apenas um poder de fato. E é justamente neste ponto que reside sua força. É claro que não reduzimos o Direito nesta perspectiva positivista já ultrapassada, que reduz o Direito à regra, trans- formando construção do Direito em uma simples aplicação da receita pronta da lei ao caso concreto. Entretanto isto será objeto de estudo mais adiante. O que nos interessa agora é entender a força do poder constituinte originá- rio como poder de fato, capaz de romper com a ordem vigente, e, portanto, um poder ilegal e inconstitucional em relação a ordem com a qual rompe, e pela qual não se limita. Esta afirmativa contém a essência da segurança que busca o constitucionalismo moderno: a Constituição na sua essência deve ser tão forte e perene que nenhum poder constituinte pode romper com seus fundamentos e estrutura, mas somente um poder social tão forte, que nem mesmo a Constituição poderá segurá-lo pois é o poder de trans- formação social da própria história. Neste recurso do Direito Constitucional ao poder social, ao poder de fato, transformador e histórico, reside sua própria segurança, contra maiorias temporárias parlamentares que queiram transformar toda a Constituição, escrevendo uma nova, procurando se legitimar no voto que elegeu os representantes. A proteção contra o autori- tarismo da maioria reside na exigência de poder social irresistível, única justificativa para a ruptura constitucional. Defensores de tese contrária procuram desenvolver mecanismos meramente representativos e consulti- vos (plebiscitos e referendos) para legitimar uma alteração radical do texto constitucional, que afete seus princípios fundamentais, criando na verdade uma nova Constituição. Estes mecanismos são verdadeiros golpes contra a segurança jurídica, que como disse, só pode ser rompida pela força social irresistível que não se expressa em meras representações, pois quinhentos não podem o que só milhões poderão. Pode-se afirmar entretanto que estes milhões podem ser ouvidos em plebiscitos, mas como proteger estes milhões da força de manipulação da propaganda na construção de uma falsa vontade popular. Por isto nada pode substituir a mobilização popular, única justificativa para rupturas constitucionais profundas. Retornando à discussão inicial, podemos dizer, ao contrário, que, se entendermos entretanto que o Direito não se resume ao direito positivo, mas que está essencialmente ligado a ideia do justo, do correto, do direito, estaremos no campo das várias correntes do pensamento do Direito natu- ral. Neste sentido o Direito é sinônimo de justo, e logo a lei positiva pode ou não conter o Direito, pois só será Direito se conter uma norma justa. O conceito do que é justo muda em cada corrente do Direito natural, mas o que há em comum nas varias teorias é a compreensão de que Direito é diferente de lei. Seguindo esta hipótese, o poder constituinte originário será um poder de Direito se representar o justo, o correto, o direito, e ao contrá- rio, será um mero poder fato, ilegítimo, contra o Direito, se não representar a ideia do justo, do correto, do direito. Não nos filiamos ao pensamento do Direito natural por considerarmos elitista, no sentido que ao se reconhecer que existe um direito justo anterior e superior ao direito produzido pelo Estado, quem será a pessoa ou pesso- as que dirão o justo. Quem terá o discurso legitimado. Se o justo está na vontade divina, quem será o interprete desta vontade. Se o justo está na razão do filósofo, qual será o filosofo que nos dirá o justo. Por este motivo entendemos que só processos democráticos dialógicos com ampla mobilização popular pode justificar uma ruptura, que sendo fato irresistível se afirma com força, mas não de forma ilimitada. O Direito não se encontra apenas no texto positivado, ou na decisão judicial, mas latente na ideia de justiça dialogicamente compartilhada em processos democráti- cos de transformação social, e será esta compreensão dialogicamente compartilhada, em uma sociedade, em um determinado momento histórico, que legitimará o Direito, sua compreensão democrática e sua transforma- ção democrática, inclusive as rupturas constitucionais. O Poder constituinte originário só será legítimo se sustentado por amplo processo democrático dialógico que ultrapasse os estreitos limites da representação parlamentar e penetre nos diversos fluxos comunicativos da complexa sociedade nacio- nal. Portanto podemos concluir que este poder de fato será também de Di- reito, se efetivamente democrático, entendendo-se democrático, como um processo dialógico amplo que envolva o debate dos mais variados interes- ses e valores da sociedade nacional. O Poder Constituinte decorrente Outro aspecto referente a amplitude do Poder Constituinte diz respeito ao Poder Constituinte decorrente, ou seja, o poder constituinte dos entes federados, no nosso caso, Estados membros e Municípios. Já estudamos
  • 12. Defensor Público de Minas Gerais Grátis no App Biblioteca dos Concursos Direito Constitucional, Financeiro e Tributário 10 no nosso livro Direito Constitucional, tomo II, da Editora Mandamentos, as características principais do Estado Federal. Naquele momento, deixamos claro que o que difere o Estado Federal de outras formas descentralizadas de organização territorial do Estado contemporâneo é a existência de um poder constituinte decorrente, ou seja, a descentralização de competências legislativas constitucionais, onde o ente federado elabora sua própria constituição e a promulga, sem que seja possível ou necessário uma inter- venção ou a aprovação desta Constituição por outra esfera de poder fede- ral. Isto caracteriza a essência da Federação, a inexistência de hierarquia entre os entes federados (União, Estado e Municípios no caso brasileiro), pois cada uma das esferas de poder federal nos três níveis brasileiros, participa da soberania, ou seja, detém parcelas de soberania, expressa na suas competências legislativa constitucional, ou seja, no exercício do poder constituinte derivado. Não estamos afirmando que os estados membros, a União e os muni- cípios são soberanos, pois soberano e o Estado Federal e a expressão unitária da soberania, ou seja, sua manifestação integral, só ocorre no Poder Constituinte Originário. O que afirmamos, é que no Estado Federal, além de uma repartição de competências legislativas ordinárias, administra- tivas e jurisdicionais, há também, e isto só ocorre no Estado Federal, uma repartição de competências legislativas constitucionais. Esta repartição de competências constitucionais implica na participação dos entes federados na soberania do Estado, que se fragmenta nas suas manifestações. Entretanto, este poder constituinte decorrente, embora represente a manifestação de parcela de soberania, não é soberano, e por este motivo deve ser um poder com limites jurídicos bem claros, limites estes que podem ser materiais, formais, temporais e circunstanciais. No caso da Constituição de 1988, esta estabelece limites materiais expressos e obvia- mente implícitos, deixando para o poder constituinte decorrente, que é temporário (assim como o originário), prever o seu funcionamento, e o funcionamento do seu próprio poder de reforma e seus limites formais, materiais, circunstanciais e temporais. O poder constituinte decorrente é segundo grau (se dos Estados membros) e terceiro grau (se dos municí- pios), subordinados a vontade do poder constituinte originário, expressa na Constituição Federal. A repartição de competências no nosso Estado federal ocorre da seguinte forma: a) o Estado federal é composto de três círculos não hierarquizados: União, Estados membros e Distrito Federal e os Municípios; b) a Constituição Federal é a manifestação integral da soberania do Estado Federal; c) a União detém competências legislativas ordinárias, administrati- vas, jurisdicionais e o poder constituinte derivado de reforma atra- vés de emendas e revisão a Constituição do Estado Federal, atra- vés do Legislativo da União; d) os Estados membros detém competência legislativas ordinárias, ju- risdicionais, administrativas e o poder constituinte decorrente, de elaborar suas próprias constituições, além é claro, do poder de re- forma de suas constituições; e) os municípios detém competências legislativas ordinárias, adminis- trativas ( não detém competências jurisdicionais) e competências legislativas constitucionais, ou seja o poder constituinte decorrente de elaborar suas constituições (chamadas de leis orgânicas) e ló- gico o poder derivado de reforma de suas constituições; f) o Distrito Federal também se tornou ente federado a partir de 1988 mas com características diferenciadas. O D.F. detém competên- cias legislativas ordinárias e administrativas, que podem ser orga- nizadas pelo seu poder constituinte decorrente (competência legis- lativa constitucional própria), e possui o seu próprio Judiciário e Ministério Público, que entretanto não poderão ser organizados por sua constituinte, mas serão organizados pela União para o Distrito Federal, por razão de segurança nacional. Detém, também, é cla- ro, o poder de reformar sua Constituição (chamada também de Lei Orgânica, o que não muda a sua natureza de poder constituinte decorrente, portanto de Constituição. Quanto aos limites do poder constituinte decorrente encontramos em vários momentos na constituição Federal e são limites materiais expressos e implícitos. Os limites expressos ocorrem todo momento que a Constitui- ção distribui competências e normatiza condutas dos entes federados. Quanto aos limites implícitos, estes são os princípios estruturantes e fun- damentais da República, que se impõem a todos os entes federados como por exemplo, a democracia, a separação de poderes, os direitos humanos, a redução das desigualdades sociais e regionais, a dignidade humana, entre outros. Alguns entendem que a Constituição Federal deve ser quase que copi- ada pelos entes federados o que no nosso entendimento é anti-federal. Se a Constituição federal expressamente não mencionou mandamentos aos entes federados, está livre o constituinte dos Estados e Municípios para dispor, desde que respeitados os princípios que estruturam e fundamentam a ordem constitucional federal. Por exemplo: se a Constituição Federal prevê o quorum de três quintos em dois turno para emenda a Constituição Federal, como norma regulamentadora do funcionamento do poder consti- tuinte derivado federal, nada impede que o Estado Membro ou o Município estabeleçam quorum diferente, desde que respeitados o princípio da rigidez constitucional que caracteriza sua supremacia em relação as leis ordinárias e complementares e respeitado o princípio da separação de poderes. A TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE Acredito que a resposta para a pergunta sobre quem deve ser o titular do poder constituinte é clara para os cidadãos. Entretanto devemos res- ponder a pergunta sobre quem é o titular deste poder nas suas várias manifestações históricas. Retornando a visão (talvez um pouco romântica) dos ´clássicos` da teo- ria constitucional, encontramos no revolucionário SIÈYES a afirmação de que ´a nação existe antes de tudo – é a origem de tudo. Sua vontade é invariavelmente legal – é a própria lei`. Uma visão idealista importante como construção do discurso do estado constitucional mas que obviamente não resiste a uma análise histórica. Podemos mesmo perceber que a construção conceitual da ideia de nação para SIÉYES se constitui numa forma de legitimar a vontade do grupo no poder que atua em nome da vontade da nação. De forma diferente, a ideia de nação como estudada no Tomo II, constitui-se em numa construção histórica recente e não algo que existe antes de tudo, mas uma criação do próprio absolutismo. Como vimos, foi com SIEYES que surge a ideia de poder constituinte, diferenciando este poder constituído, que não pode, na sua ação autônoma, atingir as leis fundamentais contidas na Constituição, criada por um poder constituinte, que, por sua vez, é produto da vontade da nação. No Direito Constitucional brasileiro um autor importante é PINTO FER- REIRA, que afirma que somente o povo tem a competência para exercer os poderes de soberania. Quando analisa os termos `Convenção Constitucio- nal´, ´Assembleia Constituinte´ e ´Convenção Nacional Constituinte´ afirma que a assembleia constituinte é o corpo representativo escolhido a fim de criar a Constituição. Existem para o autor dois tipos principais de organiza- ção do poder constituinte. Um será o modelo da convenção constitucional, que é o tipo primitivo onde existe uma assembleia eleita pelo povo para elaborar a Constituição, e não há necessidade de ratificação popular. O segundo modelo é o sistema popular direto, onde a Constituição é votada pela convenção nacional e posteriormente é submetida à aprovação popu- lar através do referendo. Para o autor, este segundo modelo está mais próximo do espírito democrático. Na história do Estado constitucional, o sujeito do poder constituinte, o seu titular, pode ser individual ou coletivo, capacitado para criar ou revisar a Constituição. Desta forma encontramos na história distorções graves da teoria democrática, onde o titular é um Rei, um ditador, uma classe, um grupo (o que óbvio está por detrás do titular individual), todos em nome do povo ou legitimados por poderes outros que o poder que efetivamente os sustenta. O discurso esconde a real fonte do poder, ou mais, o discurso constitui uma fonte do poder ao disfarçar, encobrir sua origem. Entretanto encontramos também, exemplos que poderes constituintes que de forma diferentes, em graus diferentes, expressam a vontade de parcelas expres- sivas do povo nacional. Não há dúvida que a vontade do poder constituinte deve emanar de mecanismos democráticos, que permitam que o processo de elaboração da constituição assim como de sua reforma, seja aberto a ampla participação popular, não apenas através de diálogo com os representantes eleitos, mas através de legitima pressão da sociedade civil organizada.