Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdf
Astrologia Diplomatica de 2004 a 2014
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Astrologia Diplomática:
minhas previsões de dez anos atrás para dez anos à frente
Paulo Roberto de Almeida
Todo ano eu faço as minhas “previsões imprevidentes” , a exemplo dos
melhores videntes, astrólogos, adivinhadores, chutadores, voyeurs (ops!) da atualidade,
desses que andam pelos jornais, ou nos programas populares anunciando catástrofes
(eventualmente benesses também), mortes de artistas e de políticos, alguma melhora
aqui, outra piora acolá, para a satisfação de alguns, o desespero de outros, e o
divertimento democrático de todos os que se deixam levar pelo besteirol anual.
À diferença, porém, das previsões “normais” – quero dizer, essas que costumam
dar certo – as minhas são feitas justamente para não acertar, pois elas apostam na
natural capacidade dos seres humanos de sempre desmentir aquilo que de melhor
podemos esperar deles, ou seja, sensatez, equilíbrio, sentido da medida, desejo de fazer
o bem, não mentir, não gastar demais o dinheiro dos outros, enfim, essas coisas que
acontecem invariavelmente, a despeito do otimismo dos astrólogos, dos videntes, dos
adivinhadores, etc.
As minhas previsões não: elas têm isso de certo que só funcionam se derem
errado, ou seja, se eu não acertar uma só, no que eu terei sucesso total.
Fazem dez anos que eu persigo os desacertos, mas devo dizer que nisso sou
ajudado enormemente pelo governo dos companheiros: eles sempre se esforçam para
desmentir as nossas previsões mais prosaicas, as mais sensatas, as medidas mais
adequadas para consertar este país no plano econômico, no campo político, e sobretudo
no plano ético. Eles nunca falham os companheiros: sempre erram, e com isso me
ajudam a acertar as minhas previsões ao contrário.
Como já se passaram dez anos de desacertos corretos, vou revisar as previsões
de cada um dos dez anos passados, fazer o balanço de meus desacertos (espero sucesso
total, triunfo pleno nos enganos) e, para persistir nesse hábito malsão, preparar novas
para 2015, com a ajuda dos companheiros, obviamente. Conto com eles para me ajudar
a não acertar nenhuma das novas previsões, ou seja, para errar completamente, no que
eu terei sucesso pleno nas minhas novas previsões imprevidentes.
Antes de começar, porém, um novo exercício, vou postar aqui a primeira da
série, que ainda não tinha todo o arcabouço epistemológico e a profundidade conceitual
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das “previsões imprevidentes”, que começaram um pouco mais adiante, como vocês
terão a oportunidade de conhecer, se ainda não o fizeram.
Esta que vai abaixo não passa de uma mera astrologia diplomática, isto é, uma
mal concebida trapaça internacionalista, que não deveria dar certo em qualquer
hipótese. E não é que eu acertei todas? Os mesmos problemas se eternizam no plano
internacional, o que prova que se o mundo gira, os problemas sempre ficam onde estão,
se é que eles não ficam piores.
Esta astrologia foi feita no início de 2004, e deveria valer para os doze meses
seguintes apenas.
Mas, como vocês que trabalham nas relações internacionais já perceberam,
certas coisas se eternizam e se mantêm intocáveis. Por isso acho que o meu exercício de
astrologia serve igualmente para agora e para os dez anos seguintes.
A conferir.
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 22 de dezembro de 2014
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Astrologia diplomática
Especulações sobre a política internacional em 2004 (e além)
Paulo Roberto de Almeida
Brasília: 11 de janeiro de 2004
Todo final ou todo começo de ano é a mesma história: os jornais e revistas
trazem aquelas previsões dos astrólogos para o começo do próximo ano, e tome
promessa de catástrofes, mortes, assassinatos, traições, acidentes terríveis e outras
pragas anunciadas previamente. O problema, atualmente, é que esses “astrólogos de
carteirinha” já não se contentam mais com o menu habitual dos ricos e famosos, dos
artistas de Hollywood (ou de novela) e um ou outro político. Não: eles já deixaram a
seara das catástrofes naturais, dos acidentes de avião e das mortes das vedetes, para
enveredar pelos arcanos da alta política e da política econômica oficial. Eles se
profissionalizaram e se especializaram, como convém a toda economia moderna
funcionando a plena carga da divisão social do trabalho (Durkheim que me perdoe, mas
os astrólogos contribuem para reduzir o grau de “anomia” social).
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Deve ter gente que coleciona as previsões mais picantes para conferir até o final
do ano, mas confesso que eu sempre perco os recortes no meio do caminho. Quando a
pilha geológica dos meus materiais “para ler depois” deixa o pré-cambriano de janeiro
para o jurássico de maio a memória enfraquece; quando chega então no pleistoceno de
novembro, já não há jeito de encontrar mais nada: tudo está soterrado e será descartado
na próxima mudança.
Por isso, desta vez resolvi fazer diferente: vou criar minhas próprias previsões,
num terreno que é o meu, obviamente, pois que eu não tenho permissão do sindicato dos
astrólogos para invadir sua reserva de mercado e fazer previsões estapafúrdias sobre os
temas que lhes são caros. Vou ficar na minha própria selva, que é muito mais
complicada do que o mundo de Hollywood e dos cenários de novelas, e vou fazer mais:
vou deixar minha lista postada na minha página (www.pralmeida.org) o ano inteiro, mas
sem qualquer garantia de satisfação ou seu dinheiro de volta. Fica valendo apenas como
exercício de imaginação criadora, num mundo que se repete a cada ano.
Aqui está, portanto, minha astrologia diplomática para o ano de 2004 (e além),
com a ressalva de que eu não consultei as entranhas de nenhum animal, não tracei
mapas astrais de nenhum líder da política mundial, não segui o curso zodiacal de países
ou organizações. Tudo é resultado da mais pura e anárquica especulação, sem
compromisso de cumprimento. Como se trata da primeira tentativa, a margem de erro
supera 60%, mas prometo melhorar o grau de acerto antes do Brasil ingressar no
Conselho de Segurança, o que deve me dar uns vinte anos de aperfeiçoamento. Sem
mais delongas, eis minha lista:
ONU:
Enfrentará uma nova crise financeira em 2004 e não terá recursos para mais de
duas missões e meia de paz e é só. Convocará uma conferência de chefes de Estado para
discutir o problema da fome e das epidemias que atingem os países mais pobres: todos
prometerão ajudar e o mundo continuará igual ao que sempre foi. Haverá discussões
(intermináveis) sobre a reforma da Carta e a ampliação do Conselho de Segurança, sem
conclusões firmes, porém. Aprovará um sem número de resoluções para resolver os
mais variados problemas da humanidade: metade delas terá os Estados Unidos como
único opositor (por vezes acompanhados de Israel e do Reino Unido). O Brasil abrirá o
debate anual na Assembleia Geral, com um discurso no qual defenderá o
multilateralismo.
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Império:
Aprofundará o seu comportamento imperial, mas com algumas sutilezas, em um
ano eleitoral. Continuará a não ligar para o mundo, mas fará de conta que está realmente
interessado na paz e na cooperação internacionais. Continuará caçando terroristas
durante o ano e alternando os alarmes amarelo e laranja. Vai legalizar imigrantes
ilegais, mas um número ainda maior de candidatos passará a demandar fronteiras muito
mais vigiadas. Algumas centenas de brasileiros serão deportados, gentilmente, e outros
milhares continuarão tentando entrar, de forma pouco gentil. O presidente republicano
será reeleito, ou então tomará seu lugar um candidato democrata. O Congresso
confirmará que deseja a Alca mas que não pretende fazer nenhum esforço para abrir
suas fronteiras agrícolas ou desmantelar os protecionismos setoriais. Aumentará a
exportação de enlatados de Hollywood e a importação de cérebros do resto do mundo.
Europa:
Continuará tendo problemas de formação de maiorias para decidir a introdução
do décimo-quinto tratado de reforço de uma união cada vez mais estreita entre seus
povos, desta vez em número de 45 (contando as minorias), o que deve dar algo como 82
traduções cruzadas na Comissão, inclusive do grego para o finlandês e do sueco para o
esloveno. Suas famílias continuarão não fazendo filhos, e por isso recorrerão aos
imigrantes para manter a oferta de mão-de-obra barata. Continuarão enchendo a
paciência do resto do mundo para que este reconheça exclusividade de apelações de
origem (em queijos, bebidas e outras especialidades) que eles mesmos exportaram para
o resto do mundo, com os seus emigrantes, cem anos atrás. Continuarão a manter vacas
com contas em banco, porcos com talão de cheques e agricultores com cartões de
crédito da própria Comissão, esperando que agricultores do Terceiro Mundo se
contentem com algumas migalhas que vão jogar pela janela. Ainda assim, será um
ótimo lugar para se fazer turismo cultural e gastronômico.
África:
Terá cessado duas guerras, mas começado outras três, com combatentes cada
vez mais jovens (alguns empunharão a AK-47 com uma mão e a mamadeira com a
outra). A entrada de recursos públicos para combater a Aids será compensada pela
exportação de capitais privatizados para aumentar contas nos bancos off shore.
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Continuará fornecendo candidatos à imigração nos países europeus. Trapaceiros
nigerianos continuarão enviando milhões de mensagens eletrônicas para confirmar que
o tio ex-presidente ou o ministro da construção desejam lhe transferir 25% do seu
patrimônio desde que você consinta em lhes passar o número de sua conta em banco:
será a contribuição africana para resolver em parte o problema da má distribuição de
renda no mundo.
Brasil:
Apesar da reforma ministerial, a imprensa continuará especulando sobre a
entrada de novos ministros na equipe de assessores do presidente. Também se discutirá
muito o crescimento da economia, o aumento da oferta de empregos, a reforma
trabalhista, a política e a crise das universidades, a redução dos impostos e o aumento
das prestações sociais, bem como dos investimentos do governo em obras de
infraestrutura. Haverá troca-troca partidário logo depois das eleições municipais e nova
mudança de regras para as eleições de 2006. A próxima novela do horário nobre se
espelhará na vida política do País, o que fará, pela primeira vez na história, decrescer o
nível de audiência desse tipo de programa. Os discursos ainda serão superiores ao
número de medidas-provisórias, com previsão de equilíbrio em 2005. Continuará em
seu esforço para ingressar no Conselho de Segurança e para liderar a América do Sul,
com progressos sensíveis nas duas frentes.
Mercosul:
A união aduaneira se reforçará, mas antes haverá um curto estágio de cinco anos
por um espaço de preferências tarifárias e mais três numa zona de livre comércio. Sua
expansão recomendará reuniões de cúpula de dois dias, para dar tempo a todos os
discursos, mas a Secretária Administrativa comprará um avião próprio para seguir todas
as reuniões de todos os subgrupos técnicos do mercado comum (em preparação). O
grupo de educação começará a redação de um manual de portunhol e a própria
Secretária Administrativa de um Mercosur for beginners ou de um Idiot’s Guide to
Mercosur.
Antiglobalizadores:
Continuarão com suas ruidosas reuniões, mas cada vez mais globalizadas e mais
capitalizadas. Com isso conseguirão prolongar a vida útil do Fórum de Davos, que já
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vinha cansando empresários e acadêmicos. Também estimularão o turismo alternativo,
as edições alternativas e os discursos alternativos, criando uma pujante economia de
iniciativas antiglobalização que conseguirá, finalmente, salvar o capitalismo de sua
atual fase de estagnação econômica e de baixo crescimento. Serão lançados derivativos
financeiros do Fórum Social Mundial, para os que desejam aplicações alternativas, com
dinheiro não contaminado pelo desejo de lucro e pelo vício da exploração do homem
pelo homem. Serão os únicos fluxos financeiros a recolher a Tobin Tax, num esquema
administrado pela ONU, que vai reverter em benefício de organizações alternativas do
Terceiro Mundo, isto é, para eles mesmos.
Comércio internacional:
Continuará sendo uma guerra por outros meios, ou continuará tendo mais a ver
com a política do que com a economia. As vantagens comparativas ricardianas terão
uma nova interpretação, patrocinada pela Comissão Europeia e pelo Congresso
americano, que tentarão modificar simultaneamente todos os livros textos de economia.
Seus autores se refugiarão numa ilha deserta, reproduzindo a simulação do Robinson
Crusoé que figura nesses livros textos, como exemplo de economia fechada e sem
trocas. A despeito disso, as trocas se farão cada vez mais entre multinacionais, que serão
em sua maioria ocidentais intercambiando produtos chineses. Indianos também vão
começar a exportar uma parte de sua mão-de-obra para a Rússia, que padece de
demografia declinante. Haverá dumping de ministros socialdemocratas, numa primeira
antecipação da aplicação da cláusula social em escala universal.
Meio Ambiente:
Cada vez mais protegido, por discursos, de dirigentes políticos, e na prática, por
barcos e aviões armados de radares e mísseis das organizações não-governamentais
mais agressivas. Povos indígenas, por sua vez, contarão com dirigíveis não-poluentes
para supervisionar suas explorações minerais e agrícolas (sustentáveis). Técnicas de
clonagem ressuscitarão espécies desaparecidas, mas as ONGs ecológicas alertarão para
os desequilíbrios para o meio ambiente do século 21, não acostumado com predadores
do passado. Desaparecerá a agricultura tradicional e os supermercados serão divididos
em seções de transgênicos e de orgânicos, com filas separadas nos caixas para evitar
contaminação recíproca.
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Direitos Humanos:
Serão inclusivos, com os aspectos psicológicos contemplados em nova
convenção da ONU. Animais clonados também serão incluídos na categoria. O direito à
democracia derrubará o último ditador asiático, mas uma ilha do Caribe continuará
resistindo aos ditames do Império. Todos os habitantes do planeta terão direito a uma
renda mínima, cujo programa será universalizado graças aos esforços de um senador
brasileiro, e a ONU supervisionará sua aplicação até o ano de 2075, quando se espera
que o último pobre poderá adquirir uma bicicleta chinesa movida a hidrogênio.
Astrólogos diplomáticos:
Serão uma categoria reconhecida e cada vez mais disseminada, antes mesmo da
formalização da profissão de “internacionalista”. Terão seu próprio sindicato e sua
colônia de férias e farão congressos anuais para trocar previsões sobre os países em que
vivem. O mundo será muito mais divertido e feliz com eles, pois eles poderão abolir
completamente as guerras e as epidemias de suas previsões, aproveitando para abater o
preço dos manufaturados e para elevar os das commodities. Ou não?
A conferir no começo de 2005.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília: 1177, 11 de janeiro de 2004
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diplomatica-minhas-previsoes.html) e disseminado no Facebook.