O artigo discute dois casos de desvio de fundos: um homem que desviou 90 milhões de euros do BPN e está em prisão domiciliar após devolver parte do dinheiro, e um funcionário público que desviou 600 euros e cometeu suicídio depois de ser exposto publicamente. O autor critica a discrepância no tratamento dos dois casos e a aparente impunidade do homem que desviou uma quantia muito maior.
Um desviou € 600 e matou-se. Outro roubou 90 milhões e setá na maior
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Um desviou 600 euros e matou-se. Outro roubou 90
milhões e está na maior
Tiago Mesquita (www.expresso.pt)
ontem às 8:00
Fiquei estupefacto, para não escrever o que proferi na altura em alto e bom som, com uma notícia avançada aqui no
Expresso:
"Carlos Marques, o principal arguido de um dos processos saídos do caso BPN, devolveu mais de €16 milhões, que
tinha recebido de forma fraudulenta. O dinheiro encontrava-se em contas na Suíça, segundo avança o site da SIC" "...
"No total, com os juros incluídos, o empresário terá obtido um financiamento fraudulento do BPN de mais de €90 milhões,
ainda de acordo com a SIC." "O arguido deverá passar para prisão domiciliária no final desta semana, tendo em conta a
colaboração com as autoridades."
Pelo meio tivemos umas garantias falsas, contas no BES, transacções para aqui e para ali, compras e vendas de
terrenos em Angola (esse país politicamente impoluto como se anda a descobrir) e sei mais lá o quê. Nada de especial.
Pergunto:
Este senhor Carlos, pessoa idónea que devemos respeitar enquanto cidadão, um individuo que através de trabalho árduo
amealhou em pouco tempo vários prémios do euromilhões que após algumas voltinhas pelo mundo obscuro das
finanças, foi "estacionando" com carinho em várias garagens suíças, um individuo que ajudou a levar ao charco um
banco que os portugueses estão a pagar vai assim, sem mais nem menos, para casa? Como? "Colaborou"?
Desculpem? Será que li bem?
Há pessoas encarceradas que assim permanecem indefinidamente, algumas sem acusação, sem direito a nada, sem que
ninguém os PROTEJA, alguns porque roubaram meia dúzia de tostões para aguentarem mais um dia e este senhor, um
burlão de milhões, vai para o quentinho do lar à espera de destino porque, veja-se bem, se dignou a devolver 16 milhões
dos 90 milhões que roubou? ROUBOU! Mas era suposto agradecermos-lhe a bondade do acto? Chamem já o Malato e
vamos fazer-lhe um "Especial Carlos Marques" no Coliseu... E que tal erguer-lhe uma estátua, não? Ele e Oliveira
e Costa, os dois abraçados, a fazerem um manguito de bronze ao Fernando Pessoa ali no Chiado - era bonito.
Recentemente, em Coimbra, Nuno - um funcionário das bilheteiras dos serviços municipalizados, desviou alegadamente
600€ das contas camarárias. O mesmo funcionário parece ter-se prontificado a restituir a "fortuna" que havia desviado.
Politiquices rascas e a denúncia de um vereador socialista de nome Carlos Cidade,guerrinhas de faca e alguidar, levaram
este caso directamente para a capa dos jornais mal terminou a reunião de câmara onde este confrontou o Presidente.
Resultado: o funcionário chegou a casa no dia seguinte, fechou-se na garagem, meteu uma corda no pescoço e matou-
se. Finito. Com apenas 35 anos e sem se despedir da mulher e do filho, Nuno pôs termo à vida.
As diferenças entre estes dois casos são simples. A primeira é óbvia: são 90 milhões de euros do Carlos menos 600
euros do Nuno, enfim..."é fazer as contas". A segunda tem a ver com o facto de uma pessoa ter ou não vergonha na
cara, coisa que não abunda neste país. Nuno, que infelizmente já não está entre nós para dizer a vergonha que sentiu, e
que fez com que pusesse termo a própria vida. Já o senhor Carlos Marques, novo colaborador da justiça portuguesa, um
verdadeiro justiceiro, um altruísta, estará certamente instalado no seu "Palacete da Quinta da Casa Branca, em
Carnaxide, avaliado em €5 milhões", que certamente terá, não uma, mas várias garagens.
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