O documento descreve a vida em uma fazenda no sertão pernambucano no passado. Uma jovem chamada Vilante se apaixonou por um visitante rico chamado João Alves, que pediu sua mão em casamento. Eles tiveram que esperar um ano para se casar. Quando João Alves retornou para o casamento, houve uma grande festa na fazenda com música e dança. Vilante viveu até os oitenta anos na fazenda.
Christian jacq juiz do egito - volume iii - a justiça do vizir (242 pg)
Livro adriana
1. Naquele pequeno povoado nascido à margem do rio Pajeú, sob uma nesga do céu
mais azulado do Brasil, onde tudo era princípio, simplicidade, moral serena e cristã, havia
uma “Casa Grande” habitada por uma anciã cega, rodeada de alguns escravos, resto de
sua riqueza, currais prendendo bezerros à espera das vacas para desleitar, galinhas,
porcos, perus, cabras, ovelhas, gato, cachorro – o velho leão que guardava aquela
herdade – tudo formando um mundo, apesar de solitário, pleno de bondade.
Resguardavam a casa algumas plantas pois no sertão o ardor do sol, no verão, faz
com que se plante árvores cujas frondes, adornados de lindos galhos folhudos, sobreiem
e refresquem, proporcionando bem estar e alegria.
Nos arredores moravam os descendentes daquela anciã que que teve a sua
“mocidade romântica e feliz” segundo contava às suas bisnetas.
Quando jovem esperava em sonhos o “seu príncipe encantado” imaginando-o belo,
sadio, um perfeito cavalheiro e, enquanto sonhava, costurava peças do seu enxoval, pois
naquele as jovens tinham certeza de que se casariam.
Certo dia, chegou ele de Minas Gerais a fim de comprar gado naquela zona
sertaneja, jovem rico, robusto e bonito. Chamava-se João Alves e vinha trazido pelo
destino para escolher a sua eleita, valiosa jóia no escrínio mais rico de uma família.
(Presume-se que os Alves eram descendentes de estrangeiros; notava-se isto pelo porte,
estatura e maneira de falar).
Hospedou-se na “Casa Grande” solar conhecido e hospitaleiro.
Naquela época era vedado às jovens apresentarem-se aos visitantes.
Contentavam-se, porém, em espiá-los pelo buraco da fechadura ou de algum aberto,
cautelosamente, na parede, visto serem de taipa aqueles casarões de quatro salões e
muitos quartos.
A hora das refeições o chefe de família, único que exercia autoridade em tudo e
quem resolvia todos os problemas da casa, chamava-se a esposa e apresentava-a ao
visitante, bem como as suas filhas e dizia-lhes o nome e a idade de cada uma delas.
Juntamente com a sua genitora serviam a mesa e depois se recolhiam para nunca mais
alegra as vistas do visitante. Este, se desejava algo, expunha seus sentimentos e
pretensões ao chefe, que decidia da sorte do pretendente e da pretendida.
Foi assim que o nosso herói descobriu o tesouro dele retirando a jóia que lhe
prendeu o coração. João Alves pediu em casamento a mais jovem das irmãs, de nome
Vilante, e ficou acertado que daquele dia a um ano voltaria para realizar o casamento.
Partiu João Alves, cheio de saudades e esperanças, conduzindo a boiada que
comprara no sertão pernambucano.
Vilante, também saudosíssima, continuou a preparar o enxoval, plena de sonhos
de um futuro risonho e feliz. Foi todo feito à mão; não existiam naquele tempo, as
máquinas de costura e se já haviam noutros lugares, não chegaram àquele povoado. As
peças de fina cambraia, linho e esguião eram artisticamente trabalhadas com rendas e
bicos de almofadas.
Não houve correspondência entre os noivos; a distância era demasiado grande
para ser percorrida por um mensageiro e mesmo, a noiva não sabia ler nem escrever.
Naquele tempo não se permitia o aprendizado das letras às moças para que não
escrevessem aos namorados. A palavra dada era o único documento.
Completado um ano, o noivo chegou com a sua comitiva composta de um padre,
convidados, filarmônica para o ato religioso na Capelinha simples, adornada de flores.
Porque não existia cartório ou ato civil não se realizou e o preparo dos papéis se tornava
difícil, em lugares longínquos.
A festa durou alguns dias. Houve quadrilhas, chotes, polcas e valsas ao som da
sanfona.
Interessante é que não usavam mesa nem cadeiras; espalhavam no chão grandes
couros curtidos, cobriram com alvas toalhas, onde se sentavam para saborear os
2. gostosos pratos daquela época e do aluá, bebida feita de milho fermentado com rapadura.
Vilante faleceu com idade avançada, oitenta anos depois, na ocasião em que se
celebravam as festas de São Sebastião e por tamanha coincidência a filarmônica que
viera de Afogados da Ingazeira para os festejos, acompanhou o seu enterro. De modo
que a romântica anciã teve música no casamento e na morte.