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FENÔMENOS DE MATERIALIZAÇÃO1
M. Quintão
(Conferência realizada na Federação Espírita
Brasileira, em 21 de abril de 1921, sobre as observações
feitas no Pará em três sessões da Exma. Sra. D. Anna
Prado).
Aos esposos Prado,
Em testemunho de
Verdade e reconhecimento.
O autor.
Meus irmãos em crença, irmãos meus em humanidade: como crentes por vos
confortardes ou curiosos sinceros por vos edificardes, a todos indistinta e fraternalmente eu
saúdo e agradeço a comparência a esta assembléia.
Antes de entrar no assunto que aqui nos congrega, permiti que, dentro da doutrina
que professamos e nos felicita – senão a todos, a muitos dentre nós – façamos ligeira
referência à data de hoje, em que a sociedade civil comemora e escrita está nos fastos da
pátria história - a conjuração mineira, que teve por epílogo a execução de Silva Xavier - o
―Tiradentes‖.
Porque o espírita, meus senhores e minhas senhoras, não é, como a muita gente
ainda se afigura, um ser indiferente e alheio aos antecedentes e conseqüentes da sociedade
que o cerca, no plano material, e só preocupado com abstrações e presumidas hipóteses da
sua vida futura.
Bem ao contrário, na comprovação da imortalidade, na certeza dos seus eternos
destinos, ele melhor compreende, nas solidárias etapas, a justeza da lei de causa e efeito,
que prevalece para os indivíduos como para as coletividades. Assim, pois, o espírita se
interessa logicamente pelos acontecimentos do seu tempo e neles pode e deve intervir de
modo benéfico, concorrendo dentro da lei maior de amor e justiça de moral e trabalho para
o progresso da família como da sociedade, da pátria como da humanidade.
1
[Fenômenos de materialização, M. Quintão, Edição: Livraria da Federação Espírita Brasileira, Avenida
Passos, 28, Rio de Janeiro – Brasil, 1921, pp. 46].
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E se a pátria representa um conjunto de espíritos afins conjugados à prova para ferir
determinadas notas no concerto da evolução planetária, esta sob a égide da divina
providência, é claro que ao espiritista incumbe estudar, meditar e colaborar na história de
sua pátria.
Mas, senhores, do ponto de vista das teorias materialistas, niilistas, negativistas,
quem foi e que poderia ter sido o chamado protomártir da Independência? Que valor se
poderia atribuir ao seu ideal?
Uma maquina animada! Um ―complexo‖ de células e tecidos, química e casual quão
efêmeramente condensado para viver um minuto, para lampejar um momento no
tumultuoso, inexpressivo cenário do mundo e...oh! irrisão - desaparecer para sempre!
E o móvel, o ideal desse martírio hoje comemorado e glorificado, que valor pode ter
à face dessas doutrinas, que lidam por fazer do homem, da criatura inteligente uma simples
expressão de forças, aliás, desconhecidas quão arbitrárias?
Viver na saudade, na memória dos pósteros... Parca, mesquinha, ridícula
compensação para quem saiba que a morte é o fim inelutável de tudo. Glória, renome,
ideal, afeições, trabalho, martírio, tudo igual a nada!
Confessemos, senhores, que no mundo em que vivemos não são, não podem ser
essas as doutrinas que criam santos e sagram heróis.
Não é com elas e por elas, ao menos com lógica, que a humanidade se tem afirmado
progressiva, no transcurso da sua história.
Demais, a característica do nosso estágio planetário, mau grado a todas as
aparências de liberdade, é o egoísmo. É por ele - e aqui se exalça a onisciência divina —
que, instrumentos da Providência, não conseguindo iludir, os seus desígnios, antes neles
colaborando, engendramos a dor, a dor que engendra o aperfeiçoamento.
Em suma: o materialismo só pode ser negativo, estéril, aniquilador de todos os
surtos de sacrifício e bondade, de todos os ideais de progresso, porque o indivíduo não tem
por horizonte mais que os limites de uma cova.
Foi certo, esse materialismo que fez a Jean Finot2
dizer ―que de todos os cimos do
pensamento francês se desprendem a tristeza e a desolação‖.
Nem outra é a filosofia que levava Schopenhauer a traduzir assim a existência: —
―trabalhar e sofrer para viver; viver para trabalhar e sofrer‖.
Vejamos, agora, o problema por outro prisma...
Sabeis, os que estudais o Espiritismo, que há uma comunicação de Napoleão3
na
qual o grande guerreiro por justificar a sua ação destruidora, diz que baixou como escolhido
do Senhor, flagelo da humanidade recalcitrante e tarda, sim, mas também a concorrer para
o seu progresso, visto como, onde quer que os soldados fincassem o coto de sua lança ali
plantavam, também, uma semente da Liberdade.
2
Progrés et Bonheur [Editora Félix Alcan, Paris, 1914. Subtítulo: philosophie, morale et science du progres et
du bonheur. Jean Finot, nascido Finkelstein, é escritor polonês (Varsóvia - 1856-1922). Nota do Revisor:
Todas as informações entre colchetes [ ] , nas notas de rodapé, são de Jorge Damas Martins].
3
Do Paiz da Luz, vol 1º [p. 83, 6ª edição FEB, 1984, Brasília DF]
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E quando o médium, depois de uma pausa maior, lhe pergunta: ―Ainda estás aí,
espírito eleito?‖ Napoleão responde: Eleito, não escolhido... E prossegue: Eleito, um só, O
Cristo, filho de Deus, a quem a missão foi dada em um sorriso; escolhidos muitos:
Alexandre, Cezar, Aníbal ou eu, a quem as tarefas foram dadas em uma ordem.‖. E
rematava: ‖Compreendes a diferença?‖.
Compreendemo-la nós pela Revelação Espírita, que elucida a genealogia espiritual
de N.S.Jesus Cristo4
.
De resto, já o previstes, Napoleão, general, citou generais missionários, baixados
providencialmente à terra; mas não é só para brandir uma espada, levando massas à
chacina, que baixam os missionários.
Eles baixam para impulsionar todas as atividades regeneradoras, para colaborar em
todos os passos do progresso humano, porque essa é a grande lei da reencarnação, das vidas
sucessivas e, num sentido mais lato, da solidariedade universal.
Vejamos, pois os espíritas, na personalidade histórica de Silva Xavier, um espírito
que veio prestar o seu concurso oportuno à evolução do nosso povo.
Ter-se-ia propiciado em resgate de faltas anteriores? Não importa sabê-lo por agora.
Ter-se-ia oferecido voluntariamente por escalar mais altas esferas da espiritualidade? De
qualquer forma, onde quer que paire o seu espírito, pois que o espírito, a mônada original é
eterna e consciente - esta a tese que nos propomos, embora pobremente, aqui sustentar -
onde quer que paire o seu espírito, repetimos, tenha ele da família espírita aqui reunida um
pensamento de paz e fraternidade, dessa paz e fraternidade, meus senhores, que não cabem
dentro das convenções sociais de calendários, mas que vibram em acordes divinos e atraem
bênçãos de todo o universo.
Isto posto, permiti que abordemos o tema da nossa palestra:
***
No desempenho deste dever de consciência e com serenidade que deve caracterizar
os escravos da Verdade, diremos com o ilustre historiador Eugène Bonnemère5
: Eu também
me ri dos fenômenos espíritas, eu também desdenhei o Espiritismo, mas o riso que eu
supunha de Voltaire era o riso do idiota, muito mais vulgar do que aquele outro.
Apóstrofe? Mas, senhores, não é nossa, é de um profundo pensador. Na sua esteira e
de outros tantos sábios e filósofos eminentes, fomos candidato ao conhecimento do
Espiritismo, há mais de vinte anos, e de sua realidade nos convencemos, não por um desses
fatos concretos de que vamos aqui tratar, mas por uma prova indireta que, para nós, bem
4
[Aqui, Revelação Espírita, é uma referência a obra O Quatro Evangelhos, de Jean Baptista Roustaing, 5ª
edição FEB, 1971, Rio de Janeiro-RJ, 1º Tomo, pp. 281-336, onde é abordado o tema: Genealogia de Jesus
(aos olhos do homens), onde se dá as explicações, em espírito e verdade, dos textos evangélicos de Mateus,
Cap. I, v. 1-17. Lucas, Cap. III, v. 23-38].
5
[Jeseph-Eugène Bonnemère (1813-1893). Ver Os Pioneiros de Espiritismo, de J. Malgras, DPL Editora, São
Paulo, 2002, p. 51. A frase citada de Bonnemère se encontra na Revue Spirite, Paris, 23º ano, Nº 4, abril de
1880, p. 133].
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jovem naquela época, já valia mais e mais eloqüentemente falava que todos os fatos
concretos.
Porque, senhores, mercê de Deus (sem ufania o dizemos) somos daqueles que,
meditando o Evangelho, compreendem o espírito desta passagem: — Tu viste, Tomé, e
creste; felizes dos que não viram e creram6
.
Sim, porque verdade é que a crença não se improvisa. Bem examinada, ela não é,
tão pouco, resultante da educação ou do meio, embora não deixe de lhe sofrer as
influências. E a prova aqui está, somos nós mesmos, os que aqui acorremos emigrados de
outros credos.
A crença é, sim, patrimônio substancial do Espírito; mas não se forma, nem se
consolida, nem se dilata arbitrária, tumultuariamente, no transcurso de uma existência
singular, fugacíssima ao embate de paixões e vicissitudes só por só humanas. A crença é
dádiva da Suprema Inteligência que a criatura conserva, desenvolve, acumula em etapas
sucessivas no mundo real da espiritualidade sem fronteiras, porque infinito como o próprio
Deus.
Daí o não crer quem quer, mas quem pode. Daí os matizes policromos das crenças
religiosas, que correspondem, à luz de superior critério e no dizer dos espíritos elevados, ao
nível moral e intelectual das épocas em que abrolham para a Terra.
Consenti vos falemos de nós, relatando a nossa conversão ao Espiritismo ainda
porque este fato tem aplicação de atualidade, precisa ser divulgado neste momento em que,
para os corifeus da ciência oficializada, parece constituir crime o procurar aliviar ou levar
por meios não oficiais a cura aos enfermos.
Ignora essa gente, no seu misoneísmo clássico, o que diz o Dr. Gustavo Geley da
mediunidade curadora...7
―La mediumnité curative mérite d’être sérieusemente étudiée. Certains sujets
semblent capables d’extérioriser partie de leur propre dynamisme vital pour reforcer le
dynamisme vital défaillant de malades. De là des cures surprenantes et qui dépassent même
peut-être, le cadre des maladies nerveuses‖8
.
E ultrapassam. Nós - afirmamo-lo à fé do nosso passado e desafiando a todos os
teoristas que nos desmintam - nós fomos desenganados da medicina oficial, dessa ciência
que presume curar e cura, mas que também pode matar sem peias nem responsabilidades
definidas.
Admirador incondicional, então, dessa ciência orgulhosa e céptica, corrosiva das
melhores energias d’alma, depois desse desengano cruel, em plena floração de mocidade
6
João, Cap..XX, v 29 [Será que os que não viram e creram possuem uma fé sem sustentação? Kardec, cheio
de bom-senso, refuta: ―Não; é exatamente o contrário: ... não viram, mas compreendem; e somente
compreendem porque raciocinaram‖. Ver Revista Espírita, julho de 1859, FEB, Brasília-DF, 1ª Ed. 2004, p.
259].
7
Do Inconsciente ao Consciente, pág. 261 [Gustave Geley (1868-1924), médico e pesquisador francês].
8 [―A mediunidade curativa merece ser estudada seriamente. Certos indivíduos parecem capazes de
exteriorizar parte de seu próprio dinamismo vital para reforçar o dinamismo vital sem energia de enfermos.
Daí as curas surpreendentes e que, talvez até, ultrapassem o quadro das doenças nervosas‖. Tradução: José
Antonio Carvalho].
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aberta a todas as esperanças da vida, não encontramos, nem poderíamos encontrar, mais
que uma solução lógica e digna - o suicídio, o aniquilamento absoluto, o nada enfim.
À mesma conclusão chegou Schopenhauer, por tudo atribuir à vontade. Era a
vontade que criava a representação; era a representação que criava o mundo: portanto,
aniquilamento da vontade, finalidade do mundo.
Mas, dizíamos, estávamos na iminência de cometer o maior dos crimes perante
Deus e perante nós mesmo. Agora de sobra o sabemos. Eis senão quando encontramos um
amigo (Antonio Gabriel Ferreira, hoje na espiritualidade) que compadecido da nossa ruína
orgânica nos aconselhou recorrêssemos a um médium...
Um médium?! Era o espanto e era o riso do idiota de que fala Bonnemère, e não
trepidamos em tachar de tal o portador ocasional da esmola divina, que haveria de trazer-
nos a salvação relativa do corpo e a cura definitiva da alma.
Sem embargo do conceito estulto, quem sofre sofre e a dor ainda é o melhor
patrimônio do espírito, neste planeta de reparação.
Diderot9
já dizia: ―Só vivemos entre dores e lágrimas‖, Mas Diderot não apreendia,
certos, os benefícios dessa dor que pule, faceta, burila a inteligência; que molga quebranta,
aniquila o orgulho e prepara a criatura para a compreensão dos seus destinos superiores.
Foi assim que, tangido pela dor, procuramos o Dr. Dias da Cruz10
(este ainda entre
nós), porque ouvíramos dizer que era espírita. E monologávamos: se nos não curar como
espírita, poderá fazê-lo como médico homeopata, posto que já houvéssemos também
recorrido ao grande Joaquim Murtinho11
. Grande médico, porque grande médium intuitivo,
de que derivava aquela precisão de diagnósticos.
Ao consultório de Dias da Cruz chegamos na impetuosidade do desespero, qual
náufrago que tenta a última tábua de salvação e lhe dissemos:
- Doutor, não sei o que tenho. Não quero exame, nem diagnóstico, que os tenho e
muitos - cada cabeça, cada sentença... O que quero é tratar-me pelo Espiritismo.
Austero, mas bondoso, o facultativo sorriu iluminadamente e respondeu:
- Meu amigo, sou médico e espírita, trato pela medicina e creio em Deus; mas, uma
vez que se quer tratar pelo Espiritismo, o que lhe cumpre é recorrer a um médium idôneo.
- Mas o senhor me fala grego: Que vem a ser ―médium‖?
- Um homem que tem a faculdade de receber as receitas dos Espíritos.
E nos indicou, então, desinteressadamente aquele benemérito e saudoso
companheiro, que também respondeu a processo da Saúde Pública - o caridoso, o modesto,
o abnegado ser que entre os homens se chamou Domingos de Barros Lima Filgueiras12
.
9
[Denis Diderot (1713-1784), filósofo e escritor francês].
10
[Francisco Menezes Dias da Cruz (1853-1937), vice-presidente da FEB na 1ª gestão de Bezerra de
Menezes, veio a substituí-lo na presidência de 1890 a 1895. Ver Grandes Espíritas do Brasil, Zêus Wantuil,
FEB, 4ª edição, 1/2002, Brasília-DF, pp. 289-294].
11
[Joaquim Duarte Murtinho (1848-1911), político brasileiro, engenheiro civil, formou-se em medicina e
especializou-se em homeopatia e foi também professor. Ver mensagem mediúnica no livro Seareiros de
Volta, Waldo Vieira, FEB, 3ª edição, 1976, pp. 116-7].
12
[Natural do Rio de Janeiro (1846-1906). Ver Grandes Espíritas do Brasil, pp. 297-314].
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Fomos procurá-lo a rua Álvaro nº. 6, levando-lhe o nosso papelucho (uma dessas tiras que
tanto incomodam o academicismo oficial).
Recordemos: Filgueiras habitava mais que modesta vivenda. À frente, um terreno
raro pontilhado de raros arbustos. Nesse terreno, ao cair do crepúsculo, premiam-se 20 ou
30 pessoas humildes, gente do povo, os coxos e estropiados do Evangelho seriam...
Eram os consulentes do taumaturgo e nós (oh! vergonha das vergonhas) colgados à
nossa cegueira moral, roídos da gafeira d’alma, que é o cepticismo, ao vermos aquele
punhado de criaturas, rotas umas, descalçadas outras, grandes, porém, todas na sua fé,
monologamos pedante:
- E é isto o Espiritismo! Triste coisa, a bruxaria...
Enfim, ali estávamos. Demos o nosso papelucho. Filguerias não aparecia aos
consulentes. Tinha dois filhos que se encarregavam de arrecadar as receitas e distribuí-las
com os medicamentos, porque também os dava a quem pedia.
Após meia hora de duvidosa expectação, ouvimos gritarem nosso nome e
recolhemos o papelucho, confessemos, envergonhados de ali nos encontrar naquela patuléa.
Mas, oh surpresa! (e vede como é grande tudo isso) é possível que às outras
inteligências e a outros corações estas coisas não abalem, mas a nós falaram
definitivamente:
Fosse o diagnóstico dos males de que sofríamos, fosse a indicação da data da
infecção que nos originara, ficamos assombrados. Todos os nossos castelos filosóficos,
todas as nossas teorias monísticas ruíram fragorosamente! Como poderia aquele homem
que não nos viu, que não nos conheceu, saber os antecedentes, precisar detalhes da nossa
vida?
Excogitamos o mistério e acabamos por concluir que devíamos conhecer esse super
homem, cujas virtudes miríficas cresciam na proporção das melhoras que
experimentávamos com as suas agüinhas13
.
Calculai, agora, o dobrado espanto quando, logrando aproximarmo-nos desse
homem, em vez de um doutor, encontramos um simples, em vez de um sábio, um bom, mas
dessa bondade que transluz e edifica, porque é essência de fé, não simulacro de fé.
E quando pretendíamos relatar-lhe a odisséia da nossa terapêutica falida,
enaltecendo-lhe os méritos de apóstolo, respondia:
- Não; está enganado, eu nada sou, nada sei, nada valho; agradeça a Deus a sua
cura...
Senhores! hoje, o tuberculoso, o cardíaco, o hepático, o sifílítico, o condenado a
vinte e tantos anos está diante de vós, para afirmar a veracidade deste fato e de muitos
outros que hão de, malgrado a filáucia, as presunções escolásticas, aos interesses
contrariados, fazer a felicidade do homem na Terra.
Temos de falar de fenômenos que vimos, ouvimos e palpamos; mas fenômenos que
aberram, por transcendentes e invulgares, de todas as teorias clássicas e correntes.
13
[Palavra depreciativa para medicamento homeopático administrado em gotas].
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Vejamos: Para a ciência oficial, o homem, biológica, anatômica e filosoficamente
considerado, não passa de um complexo celular, de uma trama de moléculas animadas e a
expressão mais alta da sua existência, o que nós chamamos faculdades da alma —
memória, discernimento, vontade, etc. - é simplesmente a soma, a totalidade de consciência
dos neurônios.
É isso o que afirma, não um ―louco‖ como nós, mas um sábio de tomo, qual Le
Dantec14
. E porque a nós não nos sobra autoridade científica para confutá-lo valha-nos a
opinião de sábios por sábios.
Lê Dantec conjetura, Geley experimenta; este, na sua obra já citada, após relatar
diversos casos de trepanação e ablação parcial do cérebro, assim conclui:
―Donc, les hypothèses matérialistes, qui faisaient de la pensée une sécrétion du
cerveau et voulaient assigner des centres aux facultés mentales, sont erronées: — ―Il n’y a
pas des centres spécieux présidant l’un à l’abstraction, l’autre aux émotions, un troisième à
la memoire, un autre à l’imagination. [un trosième à la memorie; un autre à l’imagination
repetido] Cette mythologie cérébrale est abandonée; notre activité spirituelle n’obéit pas à
des divinités locales, érigées par des savants crédules dans les différents coins de leurs
schémas cérébraux!‖.15
Mas, na verdade, e sem recorrer a grandes acrobacias mentais, o que nós
concebemos e os materialistas não explicam é como simples movimentos celulares se
transformam em pensamentos e sentimentos.
Outra coisa que, de boa fé, escapa ao raciocínio lógico é o fato de poder a simples
célula geratriz produzir a diferenciação dos tecidos, cartilagens, músculos, ossos, nervos,
vísceras e mais: a morfologia orgânica, a conjuração dos órgãos em molde específico e a
unidade de funções, como se tudo se passasse visando um fim inteligente - a vida! A vida!
E que é a vida?
O Dr. Ferraz de Macedo, médico português ilustre, ao falar da vida pós-mortem16
diz: Nunca me lembrei de que, ao analisar anatomicamente um corpo morto, lhe não podia
descobrir a vida, porque ela o tinha abandonado.
E linhas abaixo, referindo-se ao corpo abandonado à terra: - Porque parou de
trabalhar, quando continuava a ter tudo que o fazia trabalhar até então?
São problemas de alta filosofia, estes, que se não podem tratar minuciosamente nos
limites de uma palestra, nem nos sobra, repetimos, maior autoridade para fazê-lo.
14
[Félix Le Dantec (1869-1917), biologista francês].
15
[―Portanto, as hipóteses materialistas, que faziam do pensamento uma secreção do cérebro e queriam fixar
os centros às faculdades mentais, estão erradas: — ―Não há centros especiais presidindo um à abstração, outro
às emoções, um terceiro à memória, um outro à imaginação. Essa mitologia cerebral está abandonada; nossa
atividade espiritual não obedece às divindades locais erigidas pelos sábios crédulos nos diferentes cantos de
seus esquemas cerebrais!‖. Tradução: José Antonio Carvalho].
16
Do Paiz da Luz – v.II [Francisco Ferraz Macedo, pp. 74-77, edição FEB]
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Montesquieu17
, citado por Gibier18
dizia que, preferível a esgotar um assunto, era dizer dele
o suficiente para fazer pensar.
Acolhendo o conceito e por vos não molestar com muitas citações clássicas
contrárias ao materialismo, nós vos inculcamos a obra em que o Dr. Geley, com o método
de um sábio verdadeiro, reuniu todas as teorias correntes, provando com fatos da própria
ciência que a maior parte delas não passa de mero verbalismo convencional.
Assim, por exemplo, em testando a teoria da evolução, afirma e demonstra que ela
não pode recusar, antes só pressupõe a existência de um dínamo-psiquismo superior, que
condiciona os organismos e que a eles preexiste e subsiste.
Um fato só, ilustrativo do assunto - a histólise do inseto - é de molde a infirmar os
fatores clássicos da Embriologia, para justificar a evolução específica.
Há, diz Geley, um hinóptero que, saindo da terra, precisa, para garantir a espécie,
depositar o óvulo em certa lagarta. A imobilidade da lagarta é, porém, condição
indispensável ao desenvolvimento do gérmem e, então, o que se dá é o seguinte: o
hinóptero ataca a lagarta de maneira duplamente inteligente, isto é, dosando o seu veneno
―quantum satis‖ para não matar o inimigo e ferindo-o precisa, matematicamente nos centros
nervosos da locomoção.
Ora, comenta o ilustre cientista, esse inseto saiu da terra, seus antepassados não
existiram para ele, nem tempo teve de lobrigar um coetâneo de sua espécie... Como explicar
esse instinto original, se a função de espécie fosse, como querem os partidários de Darwin19
e Lammark20
, decorrente da adaptação, da experiência, da amplificação hereditária?
Mas senhores, não é a própria ciência que nos afirma que o ―complexo celular‖, que
o nosso corpo, como o dos animais e as próprias plantas são cadinhos em constante
transformação?
Por uma tal afirmativa, a só estrutura específica, anatômica, tanto quanto a eurritmia
psicológica, assume proporções de enigma indecifrável.
E se quiséssemos à luz de semelhantes postulados encarar a identidade moral do
ego, esse quid que afirma que existimos porque pensamos, sentimos, queremos, amamos?
Entretanto, meus senhores, fato é que, de todos os tempos, em todas as teogonias, na
tradição religiosa e mesmo profana de todos os povos, vamos encontrar assinalados os
fenômenos anímicos, os da manifestação das almas, hoje controlados pela ciência, mau
grado o misoneísmo da própria ciência que ora nega a priori, ora afirma com ―camouflage‖
como aconteceu com o magnetismo, travestido em hipnotismo21
e está sucedendo com o
17
[Charles-Louis de Secondat, ou simplesmente Charles de Montesquieu, senhor de La Brède, próximo a
Bordeaux (1689-1755), político, filósofo e escritor françês].
18
Analyse des Choses – cap.II, pág. 22 [Analise das Coisas, 4ª Edição FEB, 1981, Rio de Janeiro-RJ, p. 79,
nota de rodapé (1) do livro de Paul Gibier (1851-1900), cientista francês].
19
[Charles Darwin (1809-1882), renomado cientista inglês, autor da teoria da evolução das espécies]
20
[Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet, Chevalier de Lamarck (1744-1829), naturalista francês que
desenvolveu a teoria dos caracteres adquiridos].
21
[Do magnetismo travestido de hipnotismo, sugiro o texto de Allan Kardec: O Magnetismo Perante a
Academia, Revista Espírita, Janeiro de 1860, pp. 21-29, edição FEB].
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Espiritismo mascarado de alucinação, metapsiquismo, histerismo, dinamismo,
subconsciente, etc.
Ah! o misoneísmo da ciência vale bem pelo dogmatismo das religiões.
Foi ele, foi esse misoneísmo que fez o grande Arago22
dizer que nunca se chegaria a
conhecer a composição química dos astros. Mas a espectrometria desmentiu Arago...
Foi ele, que levou o grande Lavoisier23
a dizer: ―Como hão de cair pedras do céu, se
no céu não há pedras?‖ E a astro-física desmentiu Lavoisier.
Foi ele, ainda que levou Boileau24
a insultar o representante de Edison25
chamando-
o ventríloquo impostor, diante do fonógrafo.
Foi ele, e sempre ele, que lançou o ridículo sobre o grande Galvani26
, despercebido
que da rã bailarina se originaria uma das maiores conquistas do século - a aplicação da
eletricidade, também desconhecida em sua essência.
E o outro? O farisaísmo, irmão siamês daquele, hoje seu êmulo senão mentor na
guerra ao que lhe escapa da rotina interesseira e regalista?
Envenenou Sócrates27
...
Crucificou Jesus ...
Queimou Joanna d’Arc28
...
Encarcerou Galileu29
...
Matou Coligny30
...
Calcinou João Huss31
...
Excomungou Allan Kardec32
...
Mas, senhores, seria um libelo interminável. Respigai as páginas da História e vereis
quanto se há feito em nome da Religião e da Ciência, substancialmente separadas nos seus
princípios, quando uma afirma e outra nega Deus, mas virtualmente conjugadas e até
reciprocamente enamoradas, quando atingidas no que julgam seus privilégios, como se a
inteligência e a razão fossem delas patrimônio exclusivo!
Vejamos agora como essa mesma ciência exclusivista inquinada de presunção e
orgulho procura, nas malhas da própria inanidade, desobrigar-se do problema que se criou e
22
[François Jean Dominique Arago (1786-1853), físico, astrônomo e político francês].
23
[Antoine-Laurent de Lavoisier (1743-1794), francês, é considerado o pai da química moderna].
24
[Louis-Auguste Boileau (1812-1896), arquiteto francês].
25
[Thomas Alva Edison (1847-1931), americano, inventor da lâmpada].
26
[Luigi Galvani (1737-1798), anatomista italiano].
27
[Filósofo ateniense (469-399 a. C.)].
28
[1412-1431. Heroína na guerra dos cem anos e padroeira da França].
29
[Galileu-Galilei (1564-1642), físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano].
30
[Gaspard Coligny (1519-1572), almirante francês].
31
[Jan Huss (1369-1415), reformador religioso condenado pelo Concílio de Constança e queimado vivo.
Depois, reencarnou como Allan Kardec (1804-1869), o Codificador da Doutrina Espírita, como informa o
Espírito Conde J. W. Rochester no livro Herculanum, publicado pela FEB, 6ª edição, 1979, Rio de Janeiro-
RJ, tradução de M. Quintão, pp. 192 e 351].
32
[As obras de Allan Kardec foram proibidas pelo Índex - lista oficial de livros cuja leitura a Igreja
católica romana proíbe, por considerá-la nefasta e perigosa à fé e à moral – em 1º de maio de 1864,
após o lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo].
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impôs, para definir as manifestações da inteligência, por exemplo. Não podendo já atribuí-
la a quantidade nem a qualidade da massa cinzenta do cérebro, imagina fatores como o
artritismo e até à sífilis! Fatores patogênicos, nada mais.
Ride? Mas, senhores, não sou eu quem diz, é o Dr. Geley, comentando os seus
compares. Diz ele33
: ―Ainsi, tout ce qui, au point de vue intellectuel, serait, soit au dessous,
soit au dessus de la normale, serait le fait de la maladie‖. E acrescenta: ―O Dr Chabaneix34
fala de auto-intoxicação e ―surmenage‖ nos predispostos - ―Une des maladies du cerveau,
c’est l’automatisme ou l’apparation du subconscient‖35
,36
. Singular doença obtempera
Geley, que em vez de ser uma causa de perturbação e diminuição para o indivíduo, aumenta
as suas capacidades e o seu poder. Mas, se perguntássemos a Chabaneix – que vem a ser
esse subconsciente?
O Padre Florêncio Dubois, que tão galhardamente e cristãmente nos recebeu em
Belém, esparramando a sua bilis ichorosa37
pelas colunas de honra da ―Folha do Norte‖,
também nos falou da ―massa parda‖... Mas o Padre, coitado, é sempre um energúmeno e de
sobra conhecemos a sua ética – (O cristão pode obrar precisamente como homem e
despojar-se da personalidade de cristão, naquelas ações que não são próprias do homem
cristão.).
A teoria da sífilis... Senhores, não queremos privar-vos do sabor da originalidade e
assim damo-la aqui ―ipsis litteris‖ no idioma do genial autor. ―Si la syphilis, conclut
gravemente le Dr. Paschal Serph38
, fait le mal que tout les médecins sont unanimes à
reconnaître et à craindre pour l’humanité, elle lui donne, en revanche, la possibilité de
perfectionner ses moyens d’actions et compense ainsi, dans une certaine mesure, par son
action hipertrophiante cérébrale, créatrice des idées particulières géniales, ses méfaites
redoutables‖39
. Não será o caso de darmos parabéns aos sifilíticos?
Mas, admitindo, por argumentar, o valimento da teoria da morbidez para justificar
os fenômenos psicológicos, é preciso considerar que as nevroses, como a loucura, do ponto
de vista da anatomia patológica, ainda são puros enigmas para a ciência médica. E não é
dizendo simplesmente que o gênio é nevrose ou loucura, que se fará compreender o
mecanismo das produções geniais.
33
De L’inconscient au conscient, pág.112. [―Assim, tudo o que, sob o ponto de vista intelectual, estaria, seja
abaixo, seja acima da normal, seria o fato da doença‖. Tradução: José Antonio Carvalho].
34
[Paul Chabaneix (1875-1948), autor da obra: Le subconscient chez les artistes, les savants et les écrivains,
Paris, Edição J.-B. Baillière et fils, 1897].
35
[―Uma das doenças do cérebro, é o automatismo ou a aparição do subconsciente‖. Tradução: José Antonio
Carvalho].
36
Vheses do Jesuíta Caen – Ecos de Roma, do Padre Guilherme Dias, pág.35.
37
[Líquido que tem ichor ou é da natureza do ichor. Humor purulento, que escorre de certas úlceras. (Do Gr.
ikhor.)].
38
Gazete mèdicale de Paris, 12 Juillete 1916 [No original está 1016, incorretamente]..
39
[―Se a sífilis, conclui gravemente o Dr. Paschal Serph, faz o mal que todos os médicos são unânimes em
reconhecer e em temer pela humanidade, ela lhe dá, em compensação, a possibilidade de aperfeiçoar seus
meios de ações e compensa assim, em uma certa medida, por sua ação hipertrofiante cerebral, criadora das
idéias geniais particulares, seus malfeitos temíveis‖. Tradução: José Antonio Carvalho].
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Mas, senhores, se nós considerarmos o fato (e o fato é real) de um louco que, em
estado de hipnose, recobrava as suas faculdades normais? Aqui mesmo, no Rio40
,
conhecemos um homem, um amigo que esteve no Hospício como louco e era um simples
obsedado.
Restabelecido pelo Espiritismo, dele fez-se adepto fervoroso e era de ver-se como
contava o que denominava pitorescamente - ―as memórias da sua loucura‖. Eram puros
fenômenos mediúnicos, de vidência e audição, que ele não podia rechaçar por lhes ignorar a
origem e que, provado está, não se combatem a soros nem a duchas, nem a capacetes de
gelo.
Voltando a considerar com Le Dantec que o pensamento é função do corpo vivo,
como explicar o haver Walter Scott41
escrito Ivanhoé em completo delírio febril?42
E os
fatos de lucidez e clarividência?
Dentre muitos e mil mais, que se contrapõem à hipótese materialista, permitindo nos
seja citar um só, narrado pelo Sr. Roberto Bruce:
―Navegando perto da Terra Nova, absorvido em seus cálculos, ao passar pelo
camarim do capitão, julgou vê-lo sentado à mesa; mas atentando melhor, verificou que era
um estranho a olhá-lo fixa e admiradamente. Surpreso com a ocorrência, vai interrogar o
capitão e este lhe assegura que ninguém lá poderia estar. De fato, a verificação foi negativa;
mas, insistindo o oficial que o homem que vira estava escrevendo na ardósia, encontraram
nesta as palavras: ―Toquem para noroeste‖.
―A increpação de que fosse a letra do próprio capitão e feita a contra prova da
caligrafia, não só deste como de todo o pessoal de bordo, verificado que nenhum dos
presentes escrevera na ardósia, o comandante deliberou seguir o rumo indicado e três horas
depois divisava um ―iceberg‖e, junto dele, um navio ao desamparo. Transbordados dele
passageiros e equipagem, Bruce comovido reconhece entre eles o homem do camarim.
Chamado a explicar-se e solicitado a escrever na outra face da ardósia as mesmas palavras,
ficou demonstrada a perfeita identidade da grafia. E contou que, precisamente um pouco
antes de meio dia, fatigado adormecera e sonhara que estava a bordo de outro navio.
Contara o sonho ao capitão e agora o que lhe admirava era parecer-lhe tudo quanto via
muito familiar, quando, certo, ali nunca estivera‖.
Aqui, comenta judiciosamente o nosso ilustre patrício Dr. Alberto Seabra, está um
caso de desdobramento inconsciente. Ele serve, diremos nós e vós de certo já o inferistes,
para provar que o Espírito pode agir e material e psiquicamente fora do invólucro carnal.
É postulado clássico da psicologia oficial que todas as faculdades físicas dependem
de localizações cerebrais precisas e nítidas: nihil est intellectu quod non prius fuerit in
40
[Cidade do Rio de Janeiro]
41
[1771-1832, Edimburgo, Escócia]
42
ALBERTO SEABRA, O Problema do Além, pág.101 [Dr. Alberto Seabra (1872 - 1936) nasceu em S.Paulo
e publicou vários livros. Dentre eles, um intitulado "O problema do Além e do Destino", Editora São Paulo,
1910. Alberto Seabra era filiado ao Círculo Esotérico da Comunhão do Pensamento. No livro Claramente
Vivos, de Francisco Cândido Xavier e Elias Barbosa, por Espíritos Diversos (IDE, Araras-SP, 1ª edição, 1979,
p. 55), há uma comunicação do Espírito Luiz Augusto Trita relatando a atuação médica espiritual do Dr
Seabra].
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sensu... Entretanto, aqui estão, nesta obra, fundamentalmente consignadas às conclusões do
Dr. Guépin comunicadas à Academia de Ciências de Paris em 24 de março de 1917, a
saber43
:
1º que a amputação do cérebro no homem é possível, relativamente fácil e salva
certos feridos que os tratados clássicos condenam ainda a morte certa, ou, pelo
menos, a enfermidades incuráveis.
2º que esses operados demonstram, às vezes, não haverem perdido tal ou tal
região cerebral.
O celebre Dr. Laveran registra a comunicação, mais surpreendente ainda, do
presidente da Sociedade Antropológica de Sucre (Bolívia), fato ocorrido na clínica do Dr.
Nicolas Ortiz. Trata-se de um rapaz de 12 a 14 anos, falecido no pleno gozo de suas
faculdades intelectuais e cuja autópsia revelou as menínges hiperemiadas e um grande
abcesso ocupando quase todo o cerebelo, uma parte do cérebro e a protuberância.
Todos sabemos que a hemiplegia é uma lesão cerebral que se caracteriza pela
paralisia de um dos lados do corpo, o oposto ao da lesão. Pois bem, conhecemos um
jornalista de talento, o Dr. Thomaz Gomes dos Santos, filho do conselheiro desse nome, o
qual, em idade avançada, redigia o seu jornal em Vassouras e praticava com proficiência
a odontologia. Era um intelectual.
Conclusão única: nem quantidade, nem qualidade de massa encefálica para justificar
a existência da alma como epifenômeno, no dizer de Huxley44
. Melhor fora confessar
como Charles Richet45
: que importa ao fisiologista toda essa extraordinária complexidade
das células nervosas com suas dendrites, arborescências, ramificações, corpúsculos, se ele
ignora o uso destas partes?46
Não citaremos mais fatos, fatos e fatos, mesmo porque esta palestra não se adstringe
a fatos concretos e ao relatá-los, de escantilhão e sem ordem sistemática, desejamos, de
preferência, realçar a doutrina pela indução filosófica dos fatos.
Em poucas palavras: para nós, mais alto que todas as comprovações da cirurgia, da
anatomia, da psicologia, falam da imanência do ser, da sobrevivência do espírito, da
mônada consciente, desse dinamismo psíquico superior evolvendo e fazendo evolver os
organismos - mais alto para nós, repetimos - falam os fenômenos de pura intelectualidade.
E desse citaremos aquele que de longa data guardamos, como dos mais categóricos.
Eis como a ele se refere Eugène Nus47
em seu livro Choses de l´Autre Monde:
―Nossa tripeça não se embaraçava com tão pouca coisa e desafio todas as academias
literárias a formularem instantaneamente, sem preparo prévio nem reflexão alguma,
definições circunscritas a doze palavras, tão completas e por vezes tão elegantes, como as
43
De L’Inconscien, au conscient, pág.82.
44
[Thomas Henry Huxley (1825-1895), biólogo britânico].
45
[Charles Robert Richet (1850-1935), prêmio Nobel de fisiologia em 1913. Ver Charles Richet – Apóstolo
da Ciência e o Espiritismo de Samuel Nunes Magalhães, FEB, 1ª edição, Brasília-DF, 1/2007].
46
O Fenômeno Espírita, pág. 122.
47
[Destacado literato francês (1816 – 1894)].
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improvisadas pela nossa mesa, a qual concedíamos no máximo e a custo a faculdade de
formar uma palavra composta por um traço de união...
Vejamos algumas dessas definições:
Infinito - Abstração puramente ideal, acima e abaixo do que é concebido pelos
sentidos.
Espírito - Suntuosidade do pensamento. Galanteria harmoniosa das relações, das
comparações e das analogias.
Harmonia - Equilíbrio perfeito do todo com as partes e das partes entre si48
.
Mas, basta. E os ditados musicais pela mesma tripeça?
Pergunta-se: quem respondia? O subconsciente de um assistente, o conjunto de
todos eles? Mas, o mecanismo do fenômeno em si? E por que o não tentam os cépticos,
por que não experimentam com essa fraude, esse ilusionismo que alardeam tão fácil,
reproduzi-lo, efetivá-lo em igualdade de condições e ―controle‖? Ah! os explicadores de
inverossímeis com impossíveis!
Então, se um ser rústico, boçal e até anormal (é o caso da histérica de Charcot49
escrevendo mediunizada uma sentença de Platão em grego antigo) chega a tais prodígios,
então, é o caso de dizer-se que a fraude ultrapassa todas as inteligências humanas!
Venham os opugnadores, os caluniadores, os infirmadores destes fenômenos, vistam
eles batina ou empinem beca, venham todos os bazófios reproduzir essas fraudes e nos
retrataremos.
Antes de entrar em considerações de outra ordem, convém vos leia uma
comunicação mediúnica que nos foi dada para um dos confrades aqui presentes, e isto
porque se trata, no fundo, de uma tese de atualidade, qual a da mediunidade curadora em
face da ciência oficial. Essa comunicação nos foi transmitida por aquele símbolo de
ternura, de convicção inabalável e inteireza moral irredutível; por aquele homem que
sacrificou todos os louros da vida de relação em troca do bordão de peregrino excelso do
Evangelho de Jesus, fazendo dele o único fanal nos mares tempestuosos da existência
terrena... É desse companheiro, que ainda vem iterativamente levantar-nos das fraquezas
e temores humanos, que ele defrontou e venceu; é, finalmente, daquele que, dentro desta
casa e para muitos de vós presentes, bem sabeis, fez dela um templo, honrando mais que
ninguém o lema insculpido em sua fachada - Deus, Cristo e Caridade. É de Bezerra de
Menezes, que também foi médico e médico notável do seu tempo, porque sabia, porque
estudava e, sobretudo porque tinha amor e caridade. Ouçamo-lo:
―A ciência da terra é um meio e não um fim. Dada ao homem para que ele
desenvolva e apure suas faculdades intelectivas e afetivas, Deus que é a fonte de toda e
única ciência, o confunde sempre que ele, homem, renega por louco orgulho o patrimônio
divino na aplicação das leis naturais, julgando-se criatura, fator de vida, ele que não dá
vida a uma célula! Pois bem, meu amigo, fala-vos, agora, por mercê de Deus, um espírito
que foi, como ali dizem, homem de ciência, da pobre, da miséria ciência terrena. E esse
48
[Choses de l´Autre Monde, cinquième èdition, Paris, Librairie des Sciences Psychologiques et Spirites –
Infini, p. 24; Esprit, p. 36 e Harmonie, p. 34].
49
[Jean-Martin Charcot (1825-1893), médico e cientista francês].
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espírito, esse irmão vos diz a face de Deus e dos homens: - é o espírito que vivifica a
matéria‖ (A mesma conclusão chegam certos experimentadores, chega o Dr. Geley em
citação que faremos depois da leitura desta comunicação - devo declarar - tomada muito
antes de conhecermos esta obra). ―Ao encarnar-se ele, o espírito, constitui-se um foco de
energia vital condensada (é o dinamismo superior de Geley) e providencialmente
calculada para as vicissitudes da existência que elegeu. Essa energia potencial ele a pode
malbaratar no exercício do seu livre arbítrio, mas não pode renová-la para além do termo
assinalado. Se, no entanto, tem fé; se sabe atrair elementos salutares, fluidos puros (e nós
sabemos que nos fluidos residem as maiores potencias da natureza) é claro que neles
encontrará auxílio poderoso ao entretenimento da vida orgânica até aquele termo, dentro
da lei e sem deixar, por isso, de sofrer justamente as conseqüências de suas fraquezas ou
leviandades. Assim, não há revogação da lei quando a organismos exaustos nos concede o
Pai suscitar energias de empréstimo, sempre, já se vê, com visos de proveito espiritual. E
são esses os casos que o homem tonto e cego averba de miraculosos. Pobre Homem! Que
sabe ele das origens da vida?‖
E aconselha então: ―Ora, pois, com fé, pede dentro da lei e fica certo de que, nos
reservatórios do que chamam espaço, no seio infinito de Deus, só aí é que se elaboram os
agentes da vida. Tudo mais são elementos secundários, só valiosos quando santificados
pela lei de amor e progresso espiritual‖.
Agora, a citação de Geley a que acima me reporto: ―As curas ditas miraculosas são
o fruto da mesma ideoplastia orientada por sugestão ou auto sugestão, em sentido
favorável às reparações orgânicas e concentrando por algum tempo, com esse fim, todo o
poder do dinamismo vital‖.
―Nos seres inferiores, a força desse dinamismo (para nós potencial do perispírito)
di-lo ainda o mesmo autor, em sua plenitude funcional chega ao ponto de reparar
membros mutilados, porque a função cerebral pouco ou quase nada utiliza da força vital‖.
Mas, a hora já vai adiantada e precisamos entrar na apreciação dos fenômenos por
nós assistidos e constituintes do objetivo da nossa reunião. Não seremos longo porque,
certo, muitos de entre vós conhecem desses fenômenos pelo trato intelectual. Nós mesmo
os conhecíamos através de uma plêiade inumerável de sábios de reputação mundial, que
deles hão tratado em obras que correm mundo e se encontram vazadas em quase todos os
idiomas cultos.
Convém, contudo, assinalar que, para certo grupo de observadores, o fenômeno de
materialização não passa de exteriorização da alma, ou seja, de forças mal conhecidas. É
o duplo fluídico do médium que se exterioriza, sem que por tal se possa provar a
sobrevivência do ser consciente, depois da morte.
Aqui, vem de molde uma pergunta: - Se a nossa alma pode, qual borboleta, deixar o
seu casulo e criar fora dele, mecânica e inteligentemente, um organismo com todas as
aparências de realidade, não há razão de ordem filosófica que impeça a conclusão de que
essa mesma alma sobreviva ao corpo. E a conclusão se reforça ainda na circunstância
unanimemente verificada, de que, basta exteriorizar–se para que se mostre mais
perspícua, mais atilada, porque desperta o tal subconsciente, que não é mais nem menos
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que o despertar do seu passado, das suas energias intrínsecas, entorpecidas no estado de
co-materialidade.
Entretanto, acentue-se também que o grupo maior dos pesquisadores, dos que
proclamam a imanência do espírito independente da matéria orgânica, esse filia-se ao
Espiritismo, seguindo todas as tradições e teogonias do passado.
A grande verdade é, pois que o nosso espírito mais do que comumente supomos,
vive fora deste ergástulo temporário e putrescível, e vive mais fora que dentro, porque é
fora do corpo que ele se supre das energias físicas e morais para levar por diante a sua
precária existência terrena.
No sono, por exemplo. E daí o velho anexim: ―O travesseiro é bom conselheiro‖.
Quanta gente, em sonho, registra casos admiráveis de previsão e premonição? Nós
mesmos temos, em família, um caso positivo, desses que a ciência jamais explicaria com
as suas teorias clássicas.
Portanto, nosso espírito se exterioriza, vive fora do corpo, viaja, passeia, visita, se
manifesta e (aqui incide a verdadeira significação do fato, a ilação superior) - vive ―pós-
mortem‖, vivo depois que deixamos o cárcere, como a borboleta irisada que deixa o seu
casulo e adejante paira na atmosfera luminosa. É isto que um certo número de sábios
relutantes não quer aceitar. Aliás, Haeckel50
dizia: ―Se me provarem que o espírito vive,
atua, pensa e se manifesta independente da matéria, serei espiritista‖.
Ora, o que a Revelação ensina e demonstra é que o espírito tem corpo... Menos
material, mais ou menos sutil que o nosso, mas, de alguma sorte, material. Nem é
possível admitir no Universo o vácuo absoluto. ―Carro d’alma‖ de Pitágoras, ―Od‖ de
Reichenbach, ―Matéria sutil‖ de Descartes, ―Corpo angélico‖ de Santo Agostinho, ou
―Astral‖ dos ocultistas, que importa o nome? Fosse uma hipótese e perguntaríamos: e o
éter dos metapsíquicos e a afinidade dos químicos já foram vistos, tocados pelos nossos
sentidos comuns?
Pois bem: poder-se-á comprovar a sobrevivência do eu consciente após a morte?
Isso é o que se procura induzir, e bem, nesta obra de crítica filosófica e de ciência algo
experimental do Dr. Gustavo Geley. Diz ele e dizem outros pesquisadores do fenômeno
de materialização que, partindo do corpo do médium, o seu duplo que fica ligado por um
cordão fluídico, às vezes por duplo cordão, presumindo-se que assim se estabeleça a
corrente de energia entre o médium e o fantasma, que ele denomina ―electoplasma‖. Ora,
não vimos esse cordão, nem simples nem duplo, mas vimos dois fantasmas ao mesmo
tempo, perfeita, caracteristicamente diferençados
Vamos, porém, por partes. A teoria espiritista simplifica de modo admirável estas
coisas. Assim é que os desencarnados dizem e disseram a Allan kardec que os espíritos
apropriam, assimilam do médium a força, o fluido vital inerente à matéria deste e pela
ação da sua vontade, combinando-o, absorvendo-o por assim dizer no seu perispírito,
plasmam, condensam o fantasma, que começa a insinuar-se qual nebulosa.
50
[Ernst Heinrich Philipp August Haeckel (1834-1919), naturalista alemão].
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Os Fatos
Posto fosse nosso companheiro de viagem, não tivemos a bordo ensejo de nos
aproximar do Sr. Eurípedes Prado, o marido da médium. Não o conhecíamos. Ao
chegarmos a Belém, ficamos surpreendidos ao ler seu nome na lista dos passageiros.
Houvemos, pois, de recorrer ao nosso distinto confrade Carlos Sousa, digno presidente da
União Espírita Paraense, para alcançar daquele uma sessão de materializações. Não o
solicitávamos por nós, mas principalmente para podermos trazer ao Rio de Janeiro, qual o
fazemos aqui, a prova testemunhal daqueles fenômenos que tantas conversões haviam
produzido, inclusive a do Dr. Matta Bacelar, médico reputadíssimo e ancião justamente
estimado quão venerado na sociedade paraense, o qual não teve a mínima duvida em abrir
mão dos preconceitos científicos, para declarar-se adepto do Espiritismo, atestando
―coram populo‖ a veracidade dos fatos.
Acolhido com extrema gentileza o nosso desejo, no dia, ou antes em noite aprazada,
possuído de natural curiosidade dirigimo-nos à casa do maestro Bosio, no bairro, de
―Baptista Campos‖ onde se dão habitualmente aquelas sessões. A companha, a assistência
que lá encontramos reunida, pode dizer-se, do ponto de vista mundano, era a mais seleta.
Pessoas de nome, de ilustração, de conceito e reputação social. De escantilhão
memorando: Drs. Matta Bacelar e Pereira de Barros, médicos; Dr. Nogueira de Faria,
juiz; Dr. Penna Costa, promotor público; Dr. A. Moris, advogado; Appolinário Moreira,
diretor da Recebedoria do Estado; o maestro Bosio, A. Lucullo, inspetor federal de
seguros, Carlos B. Sousa, Adalberto de Macedo e outros. Entre as senhoras, além da
Exma. D. Anna Prado - o médium - a família Lucullo e uma filha do Dr. Bacellar.
A primeira sessão realizou-se à plena luz. Nela obtivemos a escrita direta, o
transporte de objetos, a manipulação de flores em parafina, esta com luz graduada.
Um céptico já nos objetou, quando relatávamos os fatos, se no assoalho não haveria
algum alçapão... Fútil, a objeção. A sala é pavimentada a cimento. E as paredes? – lisas
como a alma do interlocutor. Não podia haver alçapão... As sessões se realizam nos
baixos da casa – o que chamamos aqui um porão habitável – mas suficientemente amplo.
O maestro Bosio, que foi céptico renitente, tem gosto pelos fenômenos e a nada se poupa
a fim de lhes dar toda a nitidez, de modo a convencerem o maior número.
A sessão fez-se, primeiro, em torno de uma mesa grande e comum, de jantar. D.
Anna Prado - o médium - é uma senhora austera, mãe exemplar e esposa dedicada.
Católica por educação e tradição de família, hostil, de começo aos preliminares do seu
desenvolvimento mediúnico, só condescendeu em aceitá-los e auxiliá-los a instâncias do
marido. Ciosa da sua reputação e precavida da maledicência ignara e fácil, não é sem
escrúpulo que transige na demonstração das suas preciosas faculdades, fora do círculo das
suas relações.
Em torno à mesa, assentamo-nos todos, mas repare bem nos detalhes, disto fazemos
questão.
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Aqui está (mostrando) um desenho, um esboço do cenário, pelo qual os meus
ouvintes mais exigentes poderão fazer idéia do local.*
A sala tem apenas três portas de
comunicação, duas para a frente e uma para os fundos da casa, e portas das quais o
maestro Bosio nos oferecera as chaves. Precaução inútil, todavia. Porque o ambiente
estava iluminado bastante para que ali não se pudesse insinuar alguém que não fosse
imediatamente visto. Demais, que interesse teria aquela gente em enganar-nos e enganar-
se a si mesma? Não nos lembramos que houvesse outros móveis além da mesa e cadeiras
de que nos utilizávamos. Lembramo-nos, sim, que, ao fazer essa observação,
mentalmente, consideramos: - retiraram tudo para que se não diga que há qualquer
artifício oculto...
À cabeceira da mesa o médium, nós à direita e à nossa frente o Dr. Pereira de
Barros, que conosco rubricou o papel em que obtivemos a escrita direta.
à nossa direita ficou o Dr. Bacellar. Pediram colocássemos o papel debaixo da mesa
e perto o lápis. Fizemo-lo, junto, porém, dos nossos pés, de modo a poder, assim,
controlar o fenômeno, pelo menos sentir se alguém - embora fechada a sala e
perfeitamente unidas as nossas cadeiras - se insinuava debaixo da mesa.
Enquanto esperávamos o médium, mãos visíveis, conversando - e todos
conversavam sobre assuntos variados - apenas se interrompia dizendo: - Ele está pedindo
menos impaciência, que pensem noutra coisa, etc., até que deu o sinal - ―pronto‖.
Como atrás dissemos, a sala estava suficientemente iluminada, todos víamos, o
médium não se achava em transe.
Mas dizem os pirrônicos sistemáticos: ―porque embaixo e não em cima da mesa?‖
Respondemos: embaixo, por mais escuro, e mais escuro, porque a luz - dizem os espíritos
- tem ação dissolvente sobre os fluidos combinados dos perispíritos. Que há nisso de
extraordinário? São leis e leis que mal começamos a lobrigar. Aqui, na terra, ninguém
ilude as leis naturais: assim, por exemplo, ninguém, revela a plena luz uma chapa
fotográfica.
Mas (mostrando), aqui está o papel que eis de examinar. Da parte que ficou para
cima, escreveram: ―Sofram com coragem as injurias do padre‖. E no verso, isto é, na
parte voltada para o chão: ―Coragem meus irmãos, mais sofreu Jesus‖.
O padre, ao qual já nos referimos, é o famigerado pitorra Florêncio, padre francês
adstrito a Abadia, como lá dizem, de Nazareth.
Homem inteligente, mas sem escrúpulos, porque lhe franquearam a primeira coluna
de um órgão da imprensa, dela fez pelourinho para denegrir pessoas e coisas espíritas,
com grande gáudio da sua ―claque‖ estulta e fanática. Esse padre recebeu-nos - natural
que o fizesse - a ponta de faca. Deu-nos de mascate, intrujão, idiota para baixo, só porque,
a pedido de distinto amigo, simpático à doutrina - o Dr. Penna Costa, respondêramos a
uma ―interview‖ do ―Estado do Pará‖, evidenciando a vida e o programa desta casa. Com
isso angariou ele uma polêmica lamentável por só vasada em terreno pessoal, com o Dr.
Penna Costa e polêmica que degenerou em processo por injurias e calúnias, tais os mimos
que se trocaram.
*
Vide, págs seguintes (croquis da sala).
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De nossa parte, sem procurar revidar ao padre, quisemos aproveitar o ensejo para
doutrinar; e, quando mais acesa ia a contenda, ao lado de artigos rubros e escandalosos,
tresandando fel e lodo, inserimos o que escrevemos no ―Reformador‖ intitulado ―Calma e
coerência‖, a propósito da pastoral do Arcebispo contra espíritas e protestantes, e cujo
fecho é o preceito do Perdoai não sete, mas setenta vezes sete51
. Esta nossa atitude, não
de passividade incondicional, mas de coragem cristã, na vera acepção da humildade, não
foi, infelizmente, ao que parece, compreendida pela maioria de nossos confrades
paraenses e daí o sermos nessa mesma folha averbado de místico, quando unicamente
fomos racionalista do Evangelho. Não, certo, desse Evangelho por aí pregado ao sabor de
todos os esculcas de pequenas igrejas, mas do Evangelho em espírito e verdade, tal como
o inculcam os espíritos elevados, ou sejam os mensageiros de Jesus. Ao ―Estado do Pará‖
poderia convir que escorchássemos o padre. Era o escândalo. Mas ao ―Estado do Pará‖
não conviria que doutrinássemos Espiritismo, escandalizando a consciência dos seus
leitores católicos...
Mas, senhores, fechemos este longo parênteses. Como vos dizia, a entidade invisível
escrevera e assinara – João. Para o fazer na face do papel assente no solo, teria de o virar.
Isto não se deu; o caderno almaço estava no mesmo lugar e posição em que o
colocáramos, mantendo sobre uma das bordas a nossa botina. Desta, da sua pressão,
podereis ver aqui os vestígios. Aqui temos, pois, o fenômeno da ―escrita direta‖,
porquanto o ―médium‖ mantinha, às vistas de todos, as mãos sobre a mesa e nem ele, nem
ninguém poderia praticar uma intervenção direta.
Em seguida, ―João‖, pela voz do médium, pediu-nos a mim e ao Dr. Pereira de
Barros, assentado de fronte de mim, que conservássemos na palma da mão um lenço e
levássemos a mão para baixo da mesa. Assim praticando, não tardou sentíssemos um leve
contato de mão, subindo do pé direito, puxando a calça, tamborilando no joelho e, por
fim, arrecadando sutilmente o lenço.
Foi-se-me o lenço, disse, olhando para o Dr. Pereira Barros. O meu ainda aqui está,
respondeu ele. É preciso esperar, obtemperou o ―médium‖. Decorridos minutos, o doutor
acusa a retirada do seu lenço e quase simultaneamente acusamos a restituição do nosso.
Antes de qualquer consideração, antes mesmo de retirarmos a mão sob a mesa, o lenço do
doutor cai à frente dele, projetando como do teto e do ângulo da sala que ficava atrás de
nós. Os lenços estavam (ao nosso modo de ver52
) artisticamente enovelados, semelhando
uma flor ou uma fruta, como queiram, mas de qualquer forma, inteligentemente
manipulados.
Se quisermos atribuir estes fenômenos de transporte e efeitos ditos físicos, a forças
desconhecidas, ao subliminal e quejandas hipóteses mais ou menos abstrusas e
rebarbativas, teremos de infirmar as próprias leis da física, segundo as quais força alguma
atua que não seja em linha reta. Ora, neste caso, forçoso é convir que essa força não atuou
em linha reta, antes, no mecanismo do fenômeno, operou de modo complexo, descreveu
51
[Mt. 18:21-22].
52
[No original o texto está truncado: (o nosso idel-o ver). Optamos, pelo sentido, escrever (ao nosso modo de
ver)].
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muitas figuras geométricas. Apreendendo um lenço aqui, outro ali, depois de os amarrar
inteligente, artisticamente, devolve-os quase de jato, um por debaixo da mesa, com
requintes de delicadeza, outro de cima, bruscamente projetado!
Retirada, em seguida, a mesa, foram trazidos dois baldes comuns contendo um cera
de carnaúba quente e outro água fria. Em torno desses baldes fechamos um circulo, ou
antes, uma elipse de cadeiras. De propósito citamos a cera derretida, liquefeita, porque a
sua temperatura, qual a tomamos, tateando o vasilhame, não a suportaria impunemente a
nossa epiderme53
.
No Pará, contaram-nos que, para responder a uns tantos censores e conjecturistas do
fenômeno, o maestro Bosio expôs um modelo de pé e reptou os incrédulos a produzirem
coisa igual mediante premio de 5:000$000. Sempre houve, ao que parece, uns três
simplórios que o tentaram, queimando-se inutilmente e mais gravemente um deles, que
sofria de eczema ou varizes, se bem nos lembramos do relato. Mas, ainda assim, admitida
a possibilidade de moldagem, graças à aplicação de qualquer substância refratária ao
calor, sobre a epiderme, nem por isso estaria removido o maior óbice – a retirada do pé ou
da mão sem quebra do molde.54
Ainda para esse trabalho não se extinguiu, apenas se graduou a luz da sala, cujas
portas permaneciam fechadas. Dentro em pouco, sem vermos qualquer sombra ou
fantasma, ouvimos o marulhar d’água, como se alguém a agitasse, no balde. Depois,
pediram-nos que estendêssemos a mão e recebemos emocionado esta flor delicadíssima,
ainda quente, e em cujas pétalas podereis distinguir as impressões digitais do
manipulador.
O fato de nos ser entregue ainda quente (e bem quente) é um desmentido a quantos,
mesmo no Pará, dizem que tais artefatos são adrede preparados e artificiosamente
conduzidos ao recinto das experiências. Entretanto, estávamos todos nos entrevendo e
fiscalizando ali. Ninguém se moveu dos seus lugares. E como se aqueceria aquela prenda,
tão frágil, antes que se não quebrasse nas vicissitudes de um suposto esconderijo?
Da probidade, da idoneidade moral dos circunstantes não falaremos. Não falaremos
da estultícia dessa presunção de que pessoas de critério reconhecido, sem interesse
material qualquer e com sacrifício mesmo de tempo e comodidades se reúnam pelo só
prazer de se mistificarem, mistificando os seus semelhantes. São valores de apreciação
com os quais não contamos nesta tese, tanto sabemos que, para uma certa classe de gente,
a integridade alheia só pode coexistir com a sua forma de ver as coisas. Compreendemos,
de sobejo, aquela zona lúcida de que nos fala o Dr. Gibier55
, fora da qual o indivíduo
nada vê, nada sente, nada sabe.
Acusando-se fatigado o médium, levantamos a sessão.
Emprazado para a prova segunda, a de materialização propriamente dita, a ela
comparecemos disposto, mais que nunca, à observação quanto possível rigorosa. Assim,
53
Calculamos 70 ou 80 centigrados.
54
E dizer-se que o inefável Dubois atribui tais fenômenos ao concurso de tubos fosforescentes!
55
Analyse des choses [Ver Apêndice sobre o significado de zona lúcida segundo Paul Gibier].
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novo exame na sala, na mesma sala; minuciosa investigação da gaiola de ferro, da câmara
escura, da disposição das cadeiras, da lâmpada elétrica, das portas, de tudo enfim.
A assistência variou de algumas pessoas, cresceu de numero, mas lá estavam as de
maior destaque, que haviam assistido a primeira.
Pedem-nos que examinemos a gaiola na qual fica encerrado o médium. Essa gaiola
é um quadrado de ferro, cujos varões tocamos um a um, experimentando-lhes a firmeza
de conjunto e a integridade singular. As colunas angulares sejam os quatro pés da gaiola,
assentam sobre um estrado de madeira inteiriço, ao qual, por dispositivo especial, ficam
solidamente parafusados, pelo sistema de rosca. Perguntaram-nos se queríamos lacrar as
porcas. Dispensamos essa precaução inútil, uma vez que a sessão se faria com luz
graduada e nós mesmo manejáramos a chave inglesa. Externamente, qualquer tentativa
para desaparafusar a gaiola seria de todos percebida. Internamente, o ―médium‖ jamais
poderia manejar a chave inglesa. E que o pudesse, para sair, houvera de suspender a
gaiola e o biombo dentro do qual ia ficar.
Não foi, confessamos, sem certa magoa que vimos aquela senhora respeitável, de
fisionomia austera quão benevolente, trajando um costume azul escuro, entrar para aquela
prisão, na qual havia uma cadeira, em que ela se assentou, meio de lado e debruçando-se
no respaldo, tal como se vê nesta fotografia56
.
Sobre a gaiola, conduzida a um canto da sala57
colocamos o biombo — uma barraca
de pano escuro, tendo na parte frontal uma cortina. O ―médium‖ ficou, destarte,
duplamente enclausurado e, sala fechada, mal concebíamos como suportava aquela
temperatura só compensada por um ventilador fronteiro a câmara escura.
Preparado o gabinete, assentamo-nos em semicírculo e começou o fenômeno do
transe mediúnico, tal como o descrevem Crookes, Gibier, Aksakoff, Geley e tantos
outros. O ―médium‖ ora gemia em surdina, ora respirava alto e todos ouvíamos esses
haustos e gemidos até que serenou.
Aqui, revela ponderar que a hipnose não é espontânea. Ela se opera por
magnetização do Espírito desencarnado que superintende os fenômenos — neste caso,
―João‖, que foi tio carnal da ―médium‖ nesta sua existência terrena. ―João‖ portanto, o
fantasma, adormeceu o médium, que caiu em transe, como em linguagem técnica se diz.
Entrementes, parecia haver-se estabelecido certa afinidade psíquica entre nós e o
―médium‖, como que nossos pensamentos e sentimentos mais recônditos eram por ele
devassados. Assim, advertia: ―é preciso ter menos impaciência‖; ―mais atenção da
esquerda‖; ―João diz que devem atenuar a rotação do ventilador, etc.‖ Depois, a cortina
do biombo foi suspensa. Houve, por conseguinte, ação mecânica.
Mas, é preciso dizê-lo, tudo isso se dá com luz atenuada, luz cujo dispositivo é este:
ao fundo da sala, uma lâmpada elétrica pendente do teto, interceptada por um pano verde.
Assim, velada a parte da sala em que transcorrem os fenômenos, a luz da lâmpada se
esbate, do outro lado, na parede e, correndo por ela de alto a baixo, reflete-se no ambiente
56
Esta e outras fotografias, bem como as luvas e flores de parafina, acham-se na sala da Federação, para os
que quiserem examiná-las.
57
Veja-se o desenho já citado.
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tanto quanto necessário para que todos se divulguem. Dir-se-ia, para vos dar uma idéia,
uma penumbra de cinematógrafo, suficiente para se divisarem fisionomias, objetos,
movimentos quaisquer.
A ansiedade de auditório era grande, profundo o silêncio, quando alguém exclamou:
— Ei-lo, o fantasma, a desenhar-se no canto da câmara escura, à direita. Não o vê? Não
víamos... Olhe agora, ali, no outro canto junto à parede.
De fato, no ponto indicado, à nossa frente, oscilava como que um lençol, uma massa
branca que se foi condensando e resvalando cosida à parede - não havia três metros de
distância da câmara ao lugar em que me encontrava - chegando ao ponto em que estavam
os dois baldes, já de nós conhecidos e mais uma garrafa com água raz, destinada a
temperar a cera para a confecção dos moldes e flores.
O fantasma, sempre mais nítido, insinua-se bem perto, estaca defronte do balde.
Fixamo-lo a vontade: era um homem moreno, orçando pelos seus 40 anos, trazendo à
cabeça um capacete branco. Pelas mangas largas de amplo roupão também branco, saíam
as mãos trigueiras e grandes. Os pés não lhos divisamos.*
Chegou, cortejou, palpou os baldes, ergueu com a mão direita o que continha a cera
quente e com a esquerda, elevando a garrafa de água raz a altura do rosto, como que
dosou o ingrediente. Depois, arriando o balde, como para confirmar o seu feito, arrastou-o
no chão, produzindo o ruído característico, natural. Os seus gestos e movimentos eram
perfeitos, naturais, humaníssimos, como se ali estivesse criatura humana. Isso posto,
afastou-se e conservou-se a um canto da câmara escura, enquanto do outro canto surgia
uma menina de seus treze anos, que dá o nome de Annita.
Assim, tivemos uma dupla manifestação. Visíveis ao mesmo tempo, ―João‖ - um
homem e ―Anita‖ uma quase criança, enquanto ouvíamos iterativamente o médium
suspirar na câmara escura! E note-se, na assistência ninguém havia que pudesse fingir de
criança...
Annita caminhou graciosa para o balde e em breve nos entregou esta delicada flor
(mostrando) que tem o caule virado. Regressando ―Annita‖ à câmara, pelo mesmo trajeto,
antes que se esvaecesse, ―João‖ diz como para o médium - ―Vou operar‖. E aproxima-se e
opera. Vemo-lo abaixar-se e alternadamente mergulhar a mão num e noutro balde. O que
não vimos - e isto dizemos para que considerem que não fantasiamos nem exageramos -
foi o desmaterializar da mão para sacar a luva, pois neste comenos João voltou-se para a
parede e o processo foi rapidíssimo, quase instantâneo. O ―médium‖, lá do gabinete,
mandou que estendêssemos a outra mão (na direita conservávamos a flor) e... aqui está o
molde de ―João‖.*
Certo, já compreendestes, Senhores, a correlação do fenômeno; ―Annita‖ veio,
manipulou e nos entregou esta flor; ―João‖, em seguida, modela a sua mão desta forma,
isto é, juntando o polegar ao indicador, como a significar que é dele a oferta da dita flor!
Agora é o caso de perguntar a todos os físicos e químicos: como é possível tirar-se a
mão de um molde assim talhado, sem o quebrar? Ah! senhores, já houve um sabichão
*
Clichê do fantasma (Gravura).
*
Molde da mão, (gravuras).
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imaginoso, um cérebro fecundo na sua caturrice de ―espírito forte‖, que aventou a
hipótese de umas luvas de borracha cheias de água fria. Então, esvaziada a luva...
Somente o genial contraditor se esqueceu de que a borracha não só não resistiria à
temperatura da cera, como, principalmente, que estes moldes cheios de gesso dão um
órgão anatômico perfeito, a ponto de apresentarem sinais ou defeitos, que os defuntos
tinham em carne e osso.
Não nos detenhamos, contudo, em refutar puerilidades. Aqui tendes a prova
documental do fenômeno e vamos resumir porque a hora vai célere e adiantada.
Em seguida, do gabinete, diz o ―médium‖ que procurássemos reconhecer a entidade
que ia materializar-se... E para logo toma vulto uma linda criatura. Era uma moça esbelta,
loura cabeleira solta, trazendo a tiracolo, sobre as vestes alvas, uma faixa azulada. (Note-
se que o ―médium‖ é moreno, tipo acentuadamente nortista, de cabelos pretos e, por sinal,
rigorosamente penteados) Caminhou até bem perto de nós, que lhe vimos os traços
fisionômicos bem nítidos, o brilho da linda e basta cabeleira.
Depois de nos olhar e de cumprimentar a assistência, em graciosa curvatura,
afastou-se até ao centro da sala, parecendo indecisa... Aí ouvimos todos, não o ―médium‖,
mas ―João‖ dizer: - abram alas. Interessante, senhores, a voz do além túmulo; a
articulação das sílabas é perfeita, porém não tem o timbre nasal, pastoso, da voz humana.
É um som metálico, por dar uma idéia, visto que não encontro nada que lhe corresponda
exatamente.
Ao ―abram alas‖, de ―João‖, rompeu-se o círculo das cadeiras em dado ponto e foi
quando novamente, ouvimos a ordem de ―João‖, incisa e rápida - ―Vá por minha conta‖.
E logo a visão, que antes parecia pouco segura do seu corpo, caminhou resoluta até
junto e sob a lâmpada, percorrendo a sala em todo o seu comprimento. Um assistente58
que, por dispositivo da colocação primitiva, lhe ficara mais próximo nessa surtida, disse-
nos depois: ‖Eu vi até os cabelos dos braços e as veias da pele, quando ―ela‖ estacionou
sob a lâmpada‖. Ao regressar vimos o seu andar naturalíssimo, o passo cadenciado e, por
curto o vestido, as botas de atacar, de cano alto e cor marrom claro.
Esta circunstância é digna de nota especial, pois que, em regra, as descrições e
observações clássicas dizem que os fantasmas deslizam e dificilmente se lhes distinguem
as extremidades inferiores. Nós vimos os sapatos e até os cordões dos mesmos!
O que, seja dito, não conseguimos ver nitidamente, nos fantasmas, foram os olhos,
que eles - ao que parece - procuram resguardar. A propósito, disse-nos o Sr. Eurípedes
Prado que ―João‖ chegara mesmo a solicitar que desistissem de o fixar com insistência,
sem contudo, arrazoar o motivo de tal solicitação. Será que o fluido magnético humano
focalizado e projetado em feixes, exerça ação dissolvente, como a luz artificial, sobre o
perispírito condensado do manifestante? É uma pergunta que não ficará sem resposta
oportuna e ninguém se admire desta ou de outras obscuridades, em se tratando de leis que
mal começamos a entrever e estudar.
―João‖ ainda veio a nós e apertou-nos a mão, tendo antes recomendado, pela voz do
médium, que não fizéssemos qualquer pressão, para que ele médium não se magoasse.
58
Adalberto Macedo, funcionário do British Bank, em Recife.
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Disto, não há concluir que o fantasma seja o duplo mediúnico, porém que a ele está
substancialmente ligado, vivendo, por assim dizer, da vida orgânica do ―médium‖.
Em seguida a essa materialização, tivemos a de um sacerdote encanecido e austero.
Caminhou vagaroso ao centro da sala e aí esteve parado, imóvel, cerca de cinco minutos.
Devido ao hábito negro, apenas lhe pudemos divisar o rosto, as mãos, a cabeça
encanecida, coroa aberta. Com o mesmo passo lento e grave recuou e, inclinando a fronte
como em respeitoso cumprimento, desapareceu na câmara.
Ato contínuo, diz o médium: ―João está pedindo que toquem piano‖. O maestro
Bosio dá suas ordens para cima e em breve ouvimos as harmonias de uma valsa lenta. E
―João‖ cadencia os passos, dança graciosamente59
e canta em surdina, acompanhando o
piano dolente. Maravilhoso!
Terminada a valsa, ainda falou, na sua voz metálica: - Olhe o Dubois. Depois,
alegando fadiga do médium, iniciou as despedidas a todos, cortejando e acenando com as
mãos, graciosa, naturalmente. Por fim genuflectindo, solene, ergueu os braços ao alto, no
gesto expressivo de quem dá graças a Deus. E, rápido, desmaterializou-se, deixando-nos
n’alma embevecida uma dulcíssima impressão de reconhecimento e saudade.
Ainda ouvimos a impressão dos seus dedos a estalidarem delicadamente na face do
médium, por despertá-lo. A voz de ―pronto‖, aclarado intensamente o ambiente, puxamos
do relógio. A sessão durara 2 ½ horas.
O ―médium‖, retirado o biombo, patenteava-se exausto, mas calmo, acusando
apenas entorpecimento das pernas. Desaparafuzada a gaiola, acercando-se solícito o
venerando Dr. Bacellar, ousamos perguntar-lhe se verificava qualquer anormalidade
fisiológica, ao que ele nos respondeu:
— Nada, apenas uma ligeira depressão do pulso.
De fato, dentro de dez minutos, a Exma. D. Anna Prado gesticulava e conversava
naturalmente. Devo ainda confessar que, em nenhum dos assistentes, notei impressão de
alarma ou constrangimento; bem ao contrário, todos se manifestavam prazerosos, como
se houvessem assistido a uma das cenas consuetudinárias da vida. Tudo natural,
naturalíssimo.
59
[Allan Kardec comenta sobre um Espírito de um indígena peruano que se comunicava com o Sr e Sra Nezt
- membros da Sociedade -, e que realizava efeitos de ordem física ―dançando constantemente, isto é, fazendo
dançar a mesa, que marca o ritmo perfeitamente reconhecido de uma polca, de uma mazurca, de uma
quadrilha, de uma valsa em dois ou três tempos, etc.‖. Ver Revista Espírita (FEB), Fevereiro de 1860, pp. 65-
6].
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Legenda:
1 - Portas fechadas
2 - Portas fechadas
3 - Lâmpada elétrica comum
4 - Tela de pano verde, resguardado da luz
5 - Câmara escura dentro da qual ficou o médium engaiolado
6 - Balde d´água fria
7 - Balde com parafina a 70 graus
8 - Eurípedes Prado
9 - O conferencista
10 - Dr. Nogueira Faria
11 - Dr. Matta Bacellar
12 - Dr. Pereira de Barros
13 - Dr. Penna Costa
14 - Ventilador
 - Cadeira
___ - Trajeto do fantasma de uma moça não reconhecido
- . - - Trajeto do fantasma de um padre
>>> - Trajeto do fantasma de João
- - - - Trajeto do fantasma de Annita
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Fotografia obtida no dia 30 de janeiro às 9 horas da manhã.
Reconhece-se francamente a fisionomia do espírito de João.
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***
Neste ponto, senhores, não posso nem devo omitir, um fato que me diz respeito
pessoalmente, visto que, mais que as próprias materializações, ele fala da sobrevivência
da alma. No dia subseqüente a essa extraordinária sessão, a Exma. D.Anna Prado nos fez
ciente que ao começo da mesma ―João‖ lhe dissera achar-se ali presente, uma menina
morena, de 4 a 5 anos, cabelos caídos a altura dos ombros, a qual vinha para ser
materializada, porém que ele, ―João‖, não podia produzir a materialização porque a
menina estava com a ―camisola vermelha‖.
Era a nossa filhinha Maria das Dores (Chicha), desencarnada nesta capital a cerca de
14 anos60
. A cor da camisola (precisamente da que vestia quando faleceu) não era, certo,
motivo de impedimento à materialização, sabido que os espíritos tomam as vestes que
lhes praz, em geral brancas. Era, porém, essa cor de camisola, pela terceira vez, a
característica da identidade desse espírito por tantos títulos querido.
Da primeira vez, na Pensão Vegetariana, nesta capital, aos 22 de janeiro do ano pp.
(dia do natalício da Chicha) almoçávamos despreocupado quando acercando-se de nós o
caro confrade e ―vidente‖ Pereira da Silva61
, interroga:
- Quem é uma menina assim, assim, que te acompanha?
E nós, incrédulo: - Qual menina, qual nada...
- Olha, articulou sentencioso, veste uma camisola desta cor... e tomava entre os
dedos os cordões vermelhos de uma cortina próxima...
A segunda prova fez-se agora na Bahia, no salão da União Espírita, após uma
conferência ali realizada. Quando, depois da prece, comovido, mal procurávamos
disfarçar a nossa emoção, aproxima-se de nós o Sr. F. , também vidente, e ...
- O senhor tem alguma filha desencarnada? Eu a vi, ainda agora, pairando por traz
do senhor, morena, assim... e com uma camisola vermelha.
Chegamos ao Pará, a ninguém comunicamos tais incidentes, ninguém sabia que
perdemos há 14 anos uma filha e vamos ouvir que ―ela‖ estivera presente àquela
extraordinária sessão, só não se materializando pelo fato de trazer uma camisola
vermelha!62
60
[Ver a história detalhada do caso Maria das Dores (Chicha), inclusive sua reencarnação como Maria da
Glória (Lula) no livro Cinzas do Meu Cinzeiro, de Manoel Quintão, edição da Livraria da Federação Espírita
do Paraná, Curitiba-PR, o prefácio de Carlos Imbassahy está datado de 1952, Cap. XI: De onde não se
espera..., pp. 69-75)].
61
[Frederico Pereira da Silva Junior (≈1858-1914), médium durante 34 anos no Grupo Ismael (FEB).
Aparelho escolhido por Ismael para receber a palavra póstuma de Allan Kardec que ―forneceu as suas
instruções aos espiritistas da capital brasileira, exortando-os ao estudo, à caridade e a unificação‖. Ver Brasil,
Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, Espírito Humberto de Campos, médium Francisco Cândido Xavier,
10ª edição FEB, 1974, Rio de Janeiro-RJ, Cap. XXVIII, p. 218].
62
[Sabemos de outra manifestação desse Espírito, agora pela psicofonia de Chico Xavier, em 13 de outubro
de 1938, como narra o próprio Quintão:
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Meus senhores, basta. Confessemos que só coincidência não pode abranger tantas
maravilhas. E essa prova era para nós a maior, então, porque suficiente para nos encher o
coração de piedade por todos os gratuitos inimigos da nossa causa, por aqueles mesmos
que, em gestos brutais, sem conhecer-nos, tentavam expor-nos à risota do vulgacho
ignorante.
Demos graças a Deus.
--------
A terceira e última sessão, deu-se na véspera de nosso regresso.
Indo à casa do maestro Bosio fazer as despedidas, lá encontramos o Sr. Eurípedes e
sua senhora. Sendo-nos dito que os fenômenos mais se intensificavam a plena
escuridade, assim o preferimos, incondicionalmente.
De fato, nessa sessão obtivemos mais um lenço atado (este de ourela azul); o
fantasma tirou-nos o sapato do pé esquerdo, calçando-o no Presidente da União Espírita
Paraense, nosso prezado confrade Carlos B. Sousa. E sendo menor que o nosso o sapato
deste, colocou-o junto do nosso pé. Ao do nosso pé esquerdo, deu ele no cordão um nó
tão complicado, que levamos no hotel mais de meia hora por desatá-lo. E tudo isso era
feito com celeridade pasmosa, quase instantânea.
Tirou-nos a gravata, levou dela o alfinete, pregando-o ao casaco de uma senhora,
abraçou-nos repetida e demoradamente, apertou a nossa mão, tocou levemente a nossa
face.
Alguém se lembrou da campainha. Trouxeram-na e colocamo-la entre os pés,
calcando as bordas com força, no intuito de ver se ele a arrebataria com violência ou se a
desmaterializaria. Nem uma nem outra coisa. Como se lesse o nosso desígnio, ―João‖
suscitou-nos um leve prurido na perna e enquanto a levantávamos para atender a
―comichão‖, a campanhia tilintou sobre as nossas cabeças. Compreendemos que o
espírito agiria intencionalmente para burlar o nosso intento. Nessa sessão, o contato do
fantasma foi mais sensível, a materialização seria, quiçá, mais completa, porém só
poderíamos senti-la pelo tato.
―Às 20 horas, todos a postos, pressurosos, reunimos-nos em casa do José [Xavier], ao lado da cabana
do ―Chico‖. É uma sessão íntima de graça a Deus pela viagem feliz e é também o nosso cartão de visita aos
Protetores da outra Cabana de Luz, onde tantas luzes temos já recolhido. Historiemos agora mais esta:
―Feita a prece inicial, Emmanuel toma o médium (Ainda não ouvíramos Francisco Xavier em transe
sonambúlico e o que nos ocorre aqui consignar, a propósito, é que de quantas manifestações idênticas temos
observado, esta é a que mais se aproxima das do médium Frederico Junior, que transmitiu as célebres obras de
Bittencourt Sampaio) e, em termos sóbrios nos dá as boas vindas, concitando-nos ao cultivo do Evangelho. A
seguir, Maria da Glória, (Lula), nossa filha, vem falar à minha mulher [D. Alzira] em linguagem familiar,
típica e entremeada de episódios domésticos, íntimos, só de nós conhecidos. Minha mulher se comove,
chora... Aquela linguagem é bálsamo para o coração materno‖. Ver Romaria da Graça, FEB, Rio de Janeiro-
RJ, 1939, opúsculo de distribuição gratuita., p. 8].
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Como não ignorais, conhecem-se três formas de materialização, das quais nos fala o
Dr. Geley nesta obra - a luminosa, a vaporosa e a de aparência carnal, específica.63
Nós vimos os fantasmas sob a forma vaporosa, mas bastante condensada para
distinguir-lhes as fisionomias, as estaturas, os gestos e caracteres físicos outros, como
cabelos, unhas, etc. O contato da pele nos deixou a impressão natural, como se
houvéssemos tocado a mão de um homem, apenas um tanto umidecida.
Dessa mão (mostrando-a bem), a mesma que nos tocou, sem que
experimentássemos a mínima sensação anormal, tendes o respectivo molde.64
E mais
estes dois, em formatos diversos, oferecidos à Federação pelos confrades paraenses e
obtidos em outras sessões, não por nós presenciadas, mas nem por isso, menos dignas do
vosso acatamento e atenção. Enfim, ides vê-los, que só para isso os trouxe, a falarem mais
alto e solenemente do que o nosso testemunho pessoal, em prol da verdade que
propugnamos, a mercê de Deus, há tantos anos.
* * *
Muita gente lastima que estes fenômenos deveras transcendentes não se
multipliquem, não se vulgarizem, no pressuposto de que eles convenceriam a todo o
mundo. Entretanto, bem outra é a ilação a tirar: diante das provas mais categóricas, há os
irredutíveis de boa e de má fé. Há os que negam ―a priori‖, por comodismo, por inércia
intelectual - espíritos levianos para os quais o problema da vida é uma equação fisiológica
= e há os que combatem por interesse sistemático. Defendendo prerrogativas e regalias de
casta, coisa alguma os levaria a capitular. Empalhados, embiocados, no - impossível -
constituem a grande categoria dos que o vulgo chama - os piores cegos - os que não
querem ver.
Mas, senhores, um dos grandes ensinamentos da filosofia espírita é o de que tudo
vem a seu tempo e providencialmente. Se o nosso cardeal se lembrasse de reproduzir
hoje, ali na Urca ou em S. Bento, o auto-de-fé realizado em Barcelona em 1861, o feito
não passaria de um anacronismo pueril e ridículo, como ridículos e pueris são os apodos
que, dos seus pupiltos adamascados, lançam à doutrina e aos seus adeptos, sacerdotes
mais ou menos, solertes e almiscarados.
Mas, admitindo que as materializações se generalizassem, que estes fenômenos
supranormais se intensificassem, que sucederia? Por um lado, incidiriam na vulgaridade
balofa das mesas falantes, a breve trecho no indiferentismo; e por outro lado, se
adaptariam - o que é pior - ao feiticismo inconseqüente.
Não, mil vezes não. A Providência é um fato e se a nós compete, principalmente,
nos colocarmos em condições de bem aproveitar as esmolas que do alto nos chegam, aos
nossos Guias, aos Espíritos superiores é que compete encaminhar a evolução da
humanidade. Ora, em tese falando, o que se evidencia é que a nossa humanidade não está
63
Esta última foi obtida posteriormente pelo nosso confrade Fred Figner, na aparição de sua Rachel. Veja-se o
livro-Trabalho dos Mortos, do Dr. Nogueira Faria, a sair do prelo.
64
Clichê da mão
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preparada para a messe opima que a seara fecunda do Espiritismo lhe oferta. A prova,
tendê-la em que, se tais fenômenos hão constituído elementos de convicção a uma plêiade
de sábios ilustres, despreconcebidos de orgulho e prejuízos de escola, para outros não
passam os mesmos fenômenos de farsa ou de ilusão. Demais, fenômenos supranormais,
transcendentes, eles dependem de um médium e só podem verificar com eficiência dentro
de leis que só moralmente se justificam - o intuito de saber, mas saber, para repartir,
amando e progredindo. Fora isso, não.
E justo é que assim seja, e natural também, porque uma ciência não o é tal pela só
observação dos fenômenos que oferece aos sentidos corporais. Ela o é, precisamente,
quando da observação dos fatos conjuga, relaciona, determina as leis que regem os fatos.
Não é observando céus estrelados que se faz ciência astronômica; não é agrupando
números a esmo que se pratica a matemática.
Pois bem, senhores, nos fenômenos espíritas, é preciso que haja da parte dos
observadores o ―criterium‖ superior, que corresponde aos desígnios da Providência, à Lei
Moral absoluta, no dizer dos espíritos elevados. Porque, o Espiritismo é a ciência da vida,
não no que ela tem de transitório e perecível, mas de eterno e imutável.
Ser espírita, portanto, não é crer na imortalidade da alma, somente; não é, tão pouco,
ver, tocar, sentir e falar com os espíritos, pois tudo isto é velho quanto o mundo que
habitamos.
Ser espírita é assimilar, dos ensinamentos doutrinários compendiados, como destes
fatos hoje concludentes, inconcussos, o cabedal intelectual e moral necessário à reforma
desta humanidade que se dissolve e aniquila das próprias paixões, do seu materialismo
estrábico, da sua impenitência no erro.
Ser espírita é começar desde logo a reforma de si mesmo, é renunciar, na frase do
Cristo, ao ―homem velho‖65
e segui-lo66
a Ele o Cristo, como quem diz – ―o meu reino
não é deste mundo‖67
.
Ser espírita é constituir elemento novo para a sociedade de amanhã e então, não
tendo já por fanal efêmero os interesses de uma classe, de uma sociedade, de um país ou
de uma raça, saber, mas saber em consciência, absolutamente, que é um elemento
indestrutível, inteligente, volitivo e progressivamente autônomo para promover a sua
integração no seio de Deus, isto é, conhecendo a verdadeira ciência, a ciência divina,
universal em Deus.
É para isso, e tão somente para isso, que o Espiritismo baixa à terra em modalidades
novas, revelando, ou antes, suscitando aos homens verdades, velhas e ampliando outras
que o divino Mestre definiu naquele ―Consolador‖68
, naquele ―Espírito de Verdade‖69
,
que ensinaria todas as coisas e ficaria eternamente conosco.
65
[Paulo de Tarso: Ef. 4,22; Rm. 6,6 e Cl. 3,9].
66
[Jesus – Mt. 10, 38 e 16, 24; Lc. 9,23 e 14,27].
67
[Jo. 18,36].
68
[Consolador: Jo. 14:16, 26; 15:26; 16:7].
69
[Espírito de Verdade: Jo. 14:17; 15:26; 16:13.].
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Eternamente conosco! Senhores, acolhamos o convite que nos chega clangorosa ou
harmoniosamente, a toques de reunir para o ―Dia do Julgamento‖, que é o exame da
consciência para o surto incoercível da reparação.
Lázaros da Fé, paralíticos da Razão, ovelhas tresmalhadas do aprisco de Jesus, que é
o Caminho, Verdade e Vida, façamos desse convite à preocupação máxima da nossa
existência, certos de que ela não se vai finar amanhã no crepúsculo de um túmulo, mas
via alcandorar-se no infinito, prefulgir, irradiar no seio eterno de Deus.
Nem de outro modo pensando eu vos falaria aqui, neste templo, que o é, o
tabernáculo de muitas graças hauridas na compreensão do lema insculpido em sua
fachada — Deus, Cristo e Caridade.
FIM
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APÊNDICE
ZONA LÚCIDA
Spinoza diz que devemos encarar as coisas sob um caráter de eternidade. Irei mais
longe: sustento ser conveniente que nos habituemos a considerar tudo em relação com o
espaço e o tempo, com a imensidade e a eternidade. Quão minúsculos nos apareceriam
grandes acontecimentos e altas situações, se os sujeitássemos ao cálculo desta regra de
proporção? Mas, é esta uma operação que não está ao alcance de toda gente; non licet
omnibus...
Outra condição que importa também não desprezar é a de curar-se o homem desse
orgulho que acompanha inevitavelmente uma má educação científica e uma instrução
especializada, incompleta, como são tão freqüentes em nossos dias. Pessoas muito
esclarecidas em um pontinho especial dos conhecimentos humanos julgam poder decidir
arbitrariamente sobre todas as coisas e repelem sistematicamente toda novidade que lhe
choque as idéias, quase sempre por este único motivo – que em geral não confessam – que
se aquilo fosse verdade, elas não podiam ignorar! Por minha parte, encontrei
freqüentemente esse gênero de bazófia entre homens cuja instrução e estudos deveriam
preservá-los dessa deplorável enfermidade moral, se não tivessem sido especialistas,
escravos da sua especialidade. É sinal de inferioridade relativa uma pessoa julgar-se
superior!
Enfim, o número de inteligências que sofrem de lacunas é maior do que se julga
geralmente. Do mesmo modo que determinados indivíduos são totalmente refratários ao
estudo da música, das matemáticas, etc., a outros muitos estão interditas certas
investigações do pensamento. Uns, que se distinguiram nesta ou naquela classe de
ocupações: na medicina ou na mercearia, na literatura ou na arte de fabricar panos, segundo
toda a probabilidade, teriam lastimosamente falhado se houvessem escolhido — como
outros tantos que abarrotam o mundo — uma carreira situada fora do que chamarei a zona
lúcida, à semelhança da ação dos refletores que, durante a noite, transmitem a luz a uma
zona de feixes luminosos, fora dos quais só há sombra e incerteza.
Coisas existem que não estão ao alcance da concepção de certas inteligências: estão
fora de sua zona lúcida.
É inútil insistir mais: algum crítico mal disposto poderia reconhecer-se nestas
observações e acusar-me, em represália, de haver escolhido um assunto fora da minha
própria zona. Queiram os deuses preservar-me de semelhante infelicidade!...
(Análises das Coisas, FEB, 1981, 4ª Edição, Rio de Janeiro-RJ, pp. 38-9).

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FENÕMENOS DE MATERIALIZAÇÃO MANUEL QUINTÃO

  • 1. ______________________________________________________________________________________ 1 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. FENÔMENOS DE MATERIALIZAÇÃO1 M. Quintão (Conferência realizada na Federação Espírita Brasileira, em 21 de abril de 1921, sobre as observações feitas no Pará em três sessões da Exma. Sra. D. Anna Prado). Aos esposos Prado, Em testemunho de Verdade e reconhecimento. O autor. Meus irmãos em crença, irmãos meus em humanidade: como crentes por vos confortardes ou curiosos sinceros por vos edificardes, a todos indistinta e fraternalmente eu saúdo e agradeço a comparência a esta assembléia. Antes de entrar no assunto que aqui nos congrega, permiti que, dentro da doutrina que professamos e nos felicita – senão a todos, a muitos dentre nós – façamos ligeira referência à data de hoje, em que a sociedade civil comemora e escrita está nos fastos da pátria história - a conjuração mineira, que teve por epílogo a execução de Silva Xavier - o ―Tiradentes‖. Porque o espírita, meus senhores e minhas senhoras, não é, como a muita gente ainda se afigura, um ser indiferente e alheio aos antecedentes e conseqüentes da sociedade que o cerca, no plano material, e só preocupado com abstrações e presumidas hipóteses da sua vida futura. Bem ao contrário, na comprovação da imortalidade, na certeza dos seus eternos destinos, ele melhor compreende, nas solidárias etapas, a justeza da lei de causa e efeito, que prevalece para os indivíduos como para as coletividades. Assim, pois, o espírita se interessa logicamente pelos acontecimentos do seu tempo e neles pode e deve intervir de modo benéfico, concorrendo dentro da lei maior de amor e justiça de moral e trabalho para o progresso da família como da sociedade, da pátria como da humanidade. 1 [Fenômenos de materialização, M. Quintão, Edição: Livraria da Federação Espírita Brasileira, Avenida Passos, 28, Rio de Janeiro – Brasil, 1921, pp. 46].
  • 2. ______________________________________________________________________________________ 2 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. E se a pátria representa um conjunto de espíritos afins conjugados à prova para ferir determinadas notas no concerto da evolução planetária, esta sob a égide da divina providência, é claro que ao espiritista incumbe estudar, meditar e colaborar na história de sua pátria. Mas, senhores, do ponto de vista das teorias materialistas, niilistas, negativistas, quem foi e que poderia ter sido o chamado protomártir da Independência? Que valor se poderia atribuir ao seu ideal? Uma maquina animada! Um ―complexo‖ de células e tecidos, química e casual quão efêmeramente condensado para viver um minuto, para lampejar um momento no tumultuoso, inexpressivo cenário do mundo e...oh! irrisão - desaparecer para sempre! E o móvel, o ideal desse martírio hoje comemorado e glorificado, que valor pode ter à face dessas doutrinas, que lidam por fazer do homem, da criatura inteligente uma simples expressão de forças, aliás, desconhecidas quão arbitrárias? Viver na saudade, na memória dos pósteros... Parca, mesquinha, ridícula compensação para quem saiba que a morte é o fim inelutável de tudo. Glória, renome, ideal, afeições, trabalho, martírio, tudo igual a nada! Confessemos, senhores, que no mundo em que vivemos não são, não podem ser essas as doutrinas que criam santos e sagram heróis. Não é com elas e por elas, ao menos com lógica, que a humanidade se tem afirmado progressiva, no transcurso da sua história. Demais, a característica do nosso estágio planetário, mau grado a todas as aparências de liberdade, é o egoísmo. É por ele - e aqui se exalça a onisciência divina — que, instrumentos da Providência, não conseguindo iludir, os seus desígnios, antes neles colaborando, engendramos a dor, a dor que engendra o aperfeiçoamento. Em suma: o materialismo só pode ser negativo, estéril, aniquilador de todos os surtos de sacrifício e bondade, de todos os ideais de progresso, porque o indivíduo não tem por horizonte mais que os limites de uma cova. Foi certo, esse materialismo que fez a Jean Finot2 dizer ―que de todos os cimos do pensamento francês se desprendem a tristeza e a desolação‖. Nem outra é a filosofia que levava Schopenhauer a traduzir assim a existência: — ―trabalhar e sofrer para viver; viver para trabalhar e sofrer‖. Vejamos, agora, o problema por outro prisma... Sabeis, os que estudais o Espiritismo, que há uma comunicação de Napoleão3 na qual o grande guerreiro por justificar a sua ação destruidora, diz que baixou como escolhido do Senhor, flagelo da humanidade recalcitrante e tarda, sim, mas também a concorrer para o seu progresso, visto como, onde quer que os soldados fincassem o coto de sua lança ali plantavam, também, uma semente da Liberdade. 2 Progrés et Bonheur [Editora Félix Alcan, Paris, 1914. Subtítulo: philosophie, morale et science du progres et du bonheur. Jean Finot, nascido Finkelstein, é escritor polonês (Varsóvia - 1856-1922). Nota do Revisor: Todas as informações entre colchetes [ ] , nas notas de rodapé, são de Jorge Damas Martins]. 3 Do Paiz da Luz, vol 1º [p. 83, 6ª edição FEB, 1984, Brasília DF]
  • 3. ______________________________________________________________________________________ 3 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. E quando o médium, depois de uma pausa maior, lhe pergunta: ―Ainda estás aí, espírito eleito?‖ Napoleão responde: Eleito, não escolhido... E prossegue: Eleito, um só, O Cristo, filho de Deus, a quem a missão foi dada em um sorriso; escolhidos muitos: Alexandre, Cezar, Aníbal ou eu, a quem as tarefas foram dadas em uma ordem.‖. E rematava: ‖Compreendes a diferença?‖. Compreendemo-la nós pela Revelação Espírita, que elucida a genealogia espiritual de N.S.Jesus Cristo4 . De resto, já o previstes, Napoleão, general, citou generais missionários, baixados providencialmente à terra; mas não é só para brandir uma espada, levando massas à chacina, que baixam os missionários. Eles baixam para impulsionar todas as atividades regeneradoras, para colaborar em todos os passos do progresso humano, porque essa é a grande lei da reencarnação, das vidas sucessivas e, num sentido mais lato, da solidariedade universal. Vejamos, pois os espíritas, na personalidade histórica de Silva Xavier, um espírito que veio prestar o seu concurso oportuno à evolução do nosso povo. Ter-se-ia propiciado em resgate de faltas anteriores? Não importa sabê-lo por agora. Ter-se-ia oferecido voluntariamente por escalar mais altas esferas da espiritualidade? De qualquer forma, onde quer que paire o seu espírito, pois que o espírito, a mônada original é eterna e consciente - esta a tese que nos propomos, embora pobremente, aqui sustentar - onde quer que paire o seu espírito, repetimos, tenha ele da família espírita aqui reunida um pensamento de paz e fraternidade, dessa paz e fraternidade, meus senhores, que não cabem dentro das convenções sociais de calendários, mas que vibram em acordes divinos e atraem bênçãos de todo o universo. Isto posto, permiti que abordemos o tema da nossa palestra: *** No desempenho deste dever de consciência e com serenidade que deve caracterizar os escravos da Verdade, diremos com o ilustre historiador Eugène Bonnemère5 : Eu também me ri dos fenômenos espíritas, eu também desdenhei o Espiritismo, mas o riso que eu supunha de Voltaire era o riso do idiota, muito mais vulgar do que aquele outro. Apóstrofe? Mas, senhores, não é nossa, é de um profundo pensador. Na sua esteira e de outros tantos sábios e filósofos eminentes, fomos candidato ao conhecimento do Espiritismo, há mais de vinte anos, e de sua realidade nos convencemos, não por um desses fatos concretos de que vamos aqui tratar, mas por uma prova indireta que, para nós, bem 4 [Aqui, Revelação Espírita, é uma referência a obra O Quatro Evangelhos, de Jean Baptista Roustaing, 5ª edição FEB, 1971, Rio de Janeiro-RJ, 1º Tomo, pp. 281-336, onde é abordado o tema: Genealogia de Jesus (aos olhos do homens), onde se dá as explicações, em espírito e verdade, dos textos evangélicos de Mateus, Cap. I, v. 1-17. Lucas, Cap. III, v. 23-38]. 5 [Jeseph-Eugène Bonnemère (1813-1893). Ver Os Pioneiros de Espiritismo, de J. Malgras, DPL Editora, São Paulo, 2002, p. 51. A frase citada de Bonnemère se encontra na Revue Spirite, Paris, 23º ano, Nº 4, abril de 1880, p. 133].
  • 4. ______________________________________________________________________________________ 4 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. jovem naquela época, já valia mais e mais eloqüentemente falava que todos os fatos concretos. Porque, senhores, mercê de Deus (sem ufania o dizemos) somos daqueles que, meditando o Evangelho, compreendem o espírito desta passagem: — Tu viste, Tomé, e creste; felizes dos que não viram e creram6 . Sim, porque verdade é que a crença não se improvisa. Bem examinada, ela não é, tão pouco, resultante da educação ou do meio, embora não deixe de lhe sofrer as influências. E a prova aqui está, somos nós mesmos, os que aqui acorremos emigrados de outros credos. A crença é, sim, patrimônio substancial do Espírito; mas não se forma, nem se consolida, nem se dilata arbitrária, tumultuariamente, no transcurso de uma existência singular, fugacíssima ao embate de paixões e vicissitudes só por só humanas. A crença é dádiva da Suprema Inteligência que a criatura conserva, desenvolve, acumula em etapas sucessivas no mundo real da espiritualidade sem fronteiras, porque infinito como o próprio Deus. Daí o não crer quem quer, mas quem pode. Daí os matizes policromos das crenças religiosas, que correspondem, à luz de superior critério e no dizer dos espíritos elevados, ao nível moral e intelectual das épocas em que abrolham para a Terra. Consenti vos falemos de nós, relatando a nossa conversão ao Espiritismo ainda porque este fato tem aplicação de atualidade, precisa ser divulgado neste momento em que, para os corifeus da ciência oficializada, parece constituir crime o procurar aliviar ou levar por meios não oficiais a cura aos enfermos. Ignora essa gente, no seu misoneísmo clássico, o que diz o Dr. Gustavo Geley da mediunidade curadora...7 ―La mediumnité curative mérite d’être sérieusemente étudiée. Certains sujets semblent capables d’extérioriser partie de leur propre dynamisme vital pour reforcer le dynamisme vital défaillant de malades. De là des cures surprenantes et qui dépassent même peut-être, le cadre des maladies nerveuses‖8 . E ultrapassam. Nós - afirmamo-lo à fé do nosso passado e desafiando a todos os teoristas que nos desmintam - nós fomos desenganados da medicina oficial, dessa ciência que presume curar e cura, mas que também pode matar sem peias nem responsabilidades definidas. Admirador incondicional, então, dessa ciência orgulhosa e céptica, corrosiva das melhores energias d’alma, depois desse desengano cruel, em plena floração de mocidade 6 João, Cap..XX, v 29 [Será que os que não viram e creram possuem uma fé sem sustentação? Kardec, cheio de bom-senso, refuta: ―Não; é exatamente o contrário: ... não viram, mas compreendem; e somente compreendem porque raciocinaram‖. Ver Revista Espírita, julho de 1859, FEB, Brasília-DF, 1ª Ed. 2004, p. 259]. 7 Do Inconsciente ao Consciente, pág. 261 [Gustave Geley (1868-1924), médico e pesquisador francês]. 8 [―A mediunidade curativa merece ser estudada seriamente. Certos indivíduos parecem capazes de exteriorizar parte de seu próprio dinamismo vital para reforçar o dinamismo vital sem energia de enfermos. Daí as curas surpreendentes e que, talvez até, ultrapassem o quadro das doenças nervosas‖. Tradução: José Antonio Carvalho].
  • 5. ______________________________________________________________________________________ 5 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. aberta a todas as esperanças da vida, não encontramos, nem poderíamos encontrar, mais que uma solução lógica e digna - o suicídio, o aniquilamento absoluto, o nada enfim. À mesma conclusão chegou Schopenhauer, por tudo atribuir à vontade. Era a vontade que criava a representação; era a representação que criava o mundo: portanto, aniquilamento da vontade, finalidade do mundo. Mas, dizíamos, estávamos na iminência de cometer o maior dos crimes perante Deus e perante nós mesmo. Agora de sobra o sabemos. Eis senão quando encontramos um amigo (Antonio Gabriel Ferreira, hoje na espiritualidade) que compadecido da nossa ruína orgânica nos aconselhou recorrêssemos a um médium... Um médium?! Era o espanto e era o riso do idiota de que fala Bonnemère, e não trepidamos em tachar de tal o portador ocasional da esmola divina, que haveria de trazer- nos a salvação relativa do corpo e a cura definitiva da alma. Sem embargo do conceito estulto, quem sofre sofre e a dor ainda é o melhor patrimônio do espírito, neste planeta de reparação. Diderot9 já dizia: ―Só vivemos entre dores e lágrimas‖, Mas Diderot não apreendia, certos, os benefícios dessa dor que pule, faceta, burila a inteligência; que molga quebranta, aniquila o orgulho e prepara a criatura para a compreensão dos seus destinos superiores. Foi assim que, tangido pela dor, procuramos o Dr. Dias da Cruz10 (este ainda entre nós), porque ouvíramos dizer que era espírita. E monologávamos: se nos não curar como espírita, poderá fazê-lo como médico homeopata, posto que já houvéssemos também recorrido ao grande Joaquim Murtinho11 . Grande médico, porque grande médium intuitivo, de que derivava aquela precisão de diagnósticos. Ao consultório de Dias da Cruz chegamos na impetuosidade do desespero, qual náufrago que tenta a última tábua de salvação e lhe dissemos: - Doutor, não sei o que tenho. Não quero exame, nem diagnóstico, que os tenho e muitos - cada cabeça, cada sentença... O que quero é tratar-me pelo Espiritismo. Austero, mas bondoso, o facultativo sorriu iluminadamente e respondeu: - Meu amigo, sou médico e espírita, trato pela medicina e creio em Deus; mas, uma vez que se quer tratar pelo Espiritismo, o que lhe cumpre é recorrer a um médium idôneo. - Mas o senhor me fala grego: Que vem a ser ―médium‖? - Um homem que tem a faculdade de receber as receitas dos Espíritos. E nos indicou, então, desinteressadamente aquele benemérito e saudoso companheiro, que também respondeu a processo da Saúde Pública - o caridoso, o modesto, o abnegado ser que entre os homens se chamou Domingos de Barros Lima Filgueiras12 . 9 [Denis Diderot (1713-1784), filósofo e escritor francês]. 10 [Francisco Menezes Dias da Cruz (1853-1937), vice-presidente da FEB na 1ª gestão de Bezerra de Menezes, veio a substituí-lo na presidência de 1890 a 1895. Ver Grandes Espíritas do Brasil, Zêus Wantuil, FEB, 4ª edição, 1/2002, Brasília-DF, pp. 289-294]. 11 [Joaquim Duarte Murtinho (1848-1911), político brasileiro, engenheiro civil, formou-se em medicina e especializou-se em homeopatia e foi também professor. Ver mensagem mediúnica no livro Seareiros de Volta, Waldo Vieira, FEB, 3ª edição, 1976, pp. 116-7]. 12 [Natural do Rio de Janeiro (1846-1906). Ver Grandes Espíritas do Brasil, pp. 297-314].
  • 6. ______________________________________________________________________________________ 6 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Fomos procurá-lo a rua Álvaro nº. 6, levando-lhe o nosso papelucho (uma dessas tiras que tanto incomodam o academicismo oficial). Recordemos: Filgueiras habitava mais que modesta vivenda. À frente, um terreno raro pontilhado de raros arbustos. Nesse terreno, ao cair do crepúsculo, premiam-se 20 ou 30 pessoas humildes, gente do povo, os coxos e estropiados do Evangelho seriam... Eram os consulentes do taumaturgo e nós (oh! vergonha das vergonhas) colgados à nossa cegueira moral, roídos da gafeira d’alma, que é o cepticismo, ao vermos aquele punhado de criaturas, rotas umas, descalçadas outras, grandes, porém, todas na sua fé, monologamos pedante: - E é isto o Espiritismo! Triste coisa, a bruxaria... Enfim, ali estávamos. Demos o nosso papelucho. Filguerias não aparecia aos consulentes. Tinha dois filhos que se encarregavam de arrecadar as receitas e distribuí-las com os medicamentos, porque também os dava a quem pedia. Após meia hora de duvidosa expectação, ouvimos gritarem nosso nome e recolhemos o papelucho, confessemos, envergonhados de ali nos encontrar naquela patuléa. Mas, oh surpresa! (e vede como é grande tudo isso) é possível que às outras inteligências e a outros corações estas coisas não abalem, mas a nós falaram definitivamente: Fosse o diagnóstico dos males de que sofríamos, fosse a indicação da data da infecção que nos originara, ficamos assombrados. Todos os nossos castelos filosóficos, todas as nossas teorias monísticas ruíram fragorosamente! Como poderia aquele homem que não nos viu, que não nos conheceu, saber os antecedentes, precisar detalhes da nossa vida? Excogitamos o mistério e acabamos por concluir que devíamos conhecer esse super homem, cujas virtudes miríficas cresciam na proporção das melhoras que experimentávamos com as suas agüinhas13 . Calculai, agora, o dobrado espanto quando, logrando aproximarmo-nos desse homem, em vez de um doutor, encontramos um simples, em vez de um sábio, um bom, mas dessa bondade que transluz e edifica, porque é essência de fé, não simulacro de fé. E quando pretendíamos relatar-lhe a odisséia da nossa terapêutica falida, enaltecendo-lhe os méritos de apóstolo, respondia: - Não; está enganado, eu nada sou, nada sei, nada valho; agradeça a Deus a sua cura... Senhores! hoje, o tuberculoso, o cardíaco, o hepático, o sifílítico, o condenado a vinte e tantos anos está diante de vós, para afirmar a veracidade deste fato e de muitos outros que hão de, malgrado a filáucia, as presunções escolásticas, aos interesses contrariados, fazer a felicidade do homem na Terra. Temos de falar de fenômenos que vimos, ouvimos e palpamos; mas fenômenos que aberram, por transcendentes e invulgares, de todas as teorias clássicas e correntes. 13 [Palavra depreciativa para medicamento homeopático administrado em gotas].
  • 7. ______________________________________________________________________________________ 7 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. * * * Vejamos: Para a ciência oficial, o homem, biológica, anatômica e filosoficamente considerado, não passa de um complexo celular, de uma trama de moléculas animadas e a expressão mais alta da sua existência, o que nós chamamos faculdades da alma — memória, discernimento, vontade, etc. - é simplesmente a soma, a totalidade de consciência dos neurônios. É isso o que afirma, não um ―louco‖ como nós, mas um sábio de tomo, qual Le Dantec14 . E porque a nós não nos sobra autoridade científica para confutá-lo valha-nos a opinião de sábios por sábios. Lê Dantec conjetura, Geley experimenta; este, na sua obra já citada, após relatar diversos casos de trepanação e ablação parcial do cérebro, assim conclui: ―Donc, les hypothèses matérialistes, qui faisaient de la pensée une sécrétion du cerveau et voulaient assigner des centres aux facultés mentales, sont erronées: — ―Il n’y a pas des centres spécieux présidant l’un à l’abstraction, l’autre aux émotions, un troisième à la memoire, un autre à l’imagination. [un trosième à la memorie; un autre à l’imagination repetido] Cette mythologie cérébrale est abandonée; notre activité spirituelle n’obéit pas à des divinités locales, érigées par des savants crédules dans les différents coins de leurs schémas cérébraux!‖.15 Mas, na verdade, e sem recorrer a grandes acrobacias mentais, o que nós concebemos e os materialistas não explicam é como simples movimentos celulares se transformam em pensamentos e sentimentos. Outra coisa que, de boa fé, escapa ao raciocínio lógico é o fato de poder a simples célula geratriz produzir a diferenciação dos tecidos, cartilagens, músculos, ossos, nervos, vísceras e mais: a morfologia orgânica, a conjuração dos órgãos em molde específico e a unidade de funções, como se tudo se passasse visando um fim inteligente - a vida! A vida! E que é a vida? O Dr. Ferraz de Macedo, médico português ilustre, ao falar da vida pós-mortem16 diz: Nunca me lembrei de que, ao analisar anatomicamente um corpo morto, lhe não podia descobrir a vida, porque ela o tinha abandonado. E linhas abaixo, referindo-se ao corpo abandonado à terra: - Porque parou de trabalhar, quando continuava a ter tudo que o fazia trabalhar até então? São problemas de alta filosofia, estes, que se não podem tratar minuciosamente nos limites de uma palestra, nem nos sobra, repetimos, maior autoridade para fazê-lo. 14 [Félix Le Dantec (1869-1917), biologista francês]. 15 [―Portanto, as hipóteses materialistas, que faziam do pensamento uma secreção do cérebro e queriam fixar os centros às faculdades mentais, estão erradas: — ―Não há centros especiais presidindo um à abstração, outro às emoções, um terceiro à memória, um outro à imaginação. Essa mitologia cerebral está abandonada; nossa atividade espiritual não obedece às divindades locais erigidas pelos sábios crédulos nos diferentes cantos de seus esquemas cerebrais!‖. Tradução: José Antonio Carvalho]. 16 Do Paiz da Luz – v.II [Francisco Ferraz Macedo, pp. 74-77, edição FEB]
  • 8. ______________________________________________________________________________________ 8 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Montesquieu17 , citado por Gibier18 dizia que, preferível a esgotar um assunto, era dizer dele o suficiente para fazer pensar. Acolhendo o conceito e por vos não molestar com muitas citações clássicas contrárias ao materialismo, nós vos inculcamos a obra em que o Dr. Geley, com o método de um sábio verdadeiro, reuniu todas as teorias correntes, provando com fatos da própria ciência que a maior parte delas não passa de mero verbalismo convencional. Assim, por exemplo, em testando a teoria da evolução, afirma e demonstra que ela não pode recusar, antes só pressupõe a existência de um dínamo-psiquismo superior, que condiciona os organismos e que a eles preexiste e subsiste. Um fato só, ilustrativo do assunto - a histólise do inseto - é de molde a infirmar os fatores clássicos da Embriologia, para justificar a evolução específica. Há, diz Geley, um hinóptero que, saindo da terra, precisa, para garantir a espécie, depositar o óvulo em certa lagarta. A imobilidade da lagarta é, porém, condição indispensável ao desenvolvimento do gérmem e, então, o que se dá é o seguinte: o hinóptero ataca a lagarta de maneira duplamente inteligente, isto é, dosando o seu veneno ―quantum satis‖ para não matar o inimigo e ferindo-o precisa, matematicamente nos centros nervosos da locomoção. Ora, comenta o ilustre cientista, esse inseto saiu da terra, seus antepassados não existiram para ele, nem tempo teve de lobrigar um coetâneo de sua espécie... Como explicar esse instinto original, se a função de espécie fosse, como querem os partidários de Darwin19 e Lammark20 , decorrente da adaptação, da experiência, da amplificação hereditária? Mas senhores, não é a própria ciência que nos afirma que o ―complexo celular‖, que o nosso corpo, como o dos animais e as próprias plantas são cadinhos em constante transformação? Por uma tal afirmativa, a só estrutura específica, anatômica, tanto quanto a eurritmia psicológica, assume proporções de enigma indecifrável. E se quiséssemos à luz de semelhantes postulados encarar a identidade moral do ego, esse quid que afirma que existimos porque pensamos, sentimos, queremos, amamos? Entretanto, meus senhores, fato é que, de todos os tempos, em todas as teogonias, na tradição religiosa e mesmo profana de todos os povos, vamos encontrar assinalados os fenômenos anímicos, os da manifestação das almas, hoje controlados pela ciência, mau grado o misoneísmo da própria ciência que ora nega a priori, ora afirma com ―camouflage‖ como aconteceu com o magnetismo, travestido em hipnotismo21 e está sucedendo com o 17 [Charles-Louis de Secondat, ou simplesmente Charles de Montesquieu, senhor de La Brède, próximo a Bordeaux (1689-1755), político, filósofo e escritor françês]. 18 Analyse des Choses – cap.II, pág. 22 [Analise das Coisas, 4ª Edição FEB, 1981, Rio de Janeiro-RJ, p. 79, nota de rodapé (1) do livro de Paul Gibier (1851-1900), cientista francês]. 19 [Charles Darwin (1809-1882), renomado cientista inglês, autor da teoria da evolução das espécies] 20 [Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet, Chevalier de Lamarck (1744-1829), naturalista francês que desenvolveu a teoria dos caracteres adquiridos]. 21 [Do magnetismo travestido de hipnotismo, sugiro o texto de Allan Kardec: O Magnetismo Perante a Academia, Revista Espírita, Janeiro de 1860, pp. 21-29, edição FEB].
  • 9. ______________________________________________________________________________________ 9 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Espiritismo mascarado de alucinação, metapsiquismo, histerismo, dinamismo, subconsciente, etc. Ah! o misoneísmo da ciência vale bem pelo dogmatismo das religiões. Foi ele, foi esse misoneísmo que fez o grande Arago22 dizer que nunca se chegaria a conhecer a composição química dos astros. Mas a espectrometria desmentiu Arago... Foi ele, que levou o grande Lavoisier23 a dizer: ―Como hão de cair pedras do céu, se no céu não há pedras?‖ E a astro-física desmentiu Lavoisier. Foi ele, ainda que levou Boileau24 a insultar o representante de Edison25 chamando- o ventríloquo impostor, diante do fonógrafo. Foi ele, e sempre ele, que lançou o ridículo sobre o grande Galvani26 , despercebido que da rã bailarina se originaria uma das maiores conquistas do século - a aplicação da eletricidade, também desconhecida em sua essência. E o outro? O farisaísmo, irmão siamês daquele, hoje seu êmulo senão mentor na guerra ao que lhe escapa da rotina interesseira e regalista? Envenenou Sócrates27 ... Crucificou Jesus ... Queimou Joanna d’Arc28 ... Encarcerou Galileu29 ... Matou Coligny30 ... Calcinou João Huss31 ... Excomungou Allan Kardec32 ... Mas, senhores, seria um libelo interminável. Respigai as páginas da História e vereis quanto se há feito em nome da Religião e da Ciência, substancialmente separadas nos seus princípios, quando uma afirma e outra nega Deus, mas virtualmente conjugadas e até reciprocamente enamoradas, quando atingidas no que julgam seus privilégios, como se a inteligência e a razão fossem delas patrimônio exclusivo! Vejamos agora como essa mesma ciência exclusivista inquinada de presunção e orgulho procura, nas malhas da própria inanidade, desobrigar-se do problema que se criou e 22 [François Jean Dominique Arago (1786-1853), físico, astrônomo e político francês]. 23 [Antoine-Laurent de Lavoisier (1743-1794), francês, é considerado o pai da química moderna]. 24 [Louis-Auguste Boileau (1812-1896), arquiteto francês]. 25 [Thomas Alva Edison (1847-1931), americano, inventor da lâmpada]. 26 [Luigi Galvani (1737-1798), anatomista italiano]. 27 [Filósofo ateniense (469-399 a. C.)]. 28 [1412-1431. Heroína na guerra dos cem anos e padroeira da França]. 29 [Galileu-Galilei (1564-1642), físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano]. 30 [Gaspard Coligny (1519-1572), almirante francês]. 31 [Jan Huss (1369-1415), reformador religioso condenado pelo Concílio de Constança e queimado vivo. Depois, reencarnou como Allan Kardec (1804-1869), o Codificador da Doutrina Espírita, como informa o Espírito Conde J. W. Rochester no livro Herculanum, publicado pela FEB, 6ª edição, 1979, Rio de Janeiro- RJ, tradução de M. Quintão, pp. 192 e 351]. 32 [As obras de Allan Kardec foram proibidas pelo Índex - lista oficial de livros cuja leitura a Igreja católica romana proíbe, por considerá-la nefasta e perigosa à fé e à moral – em 1º de maio de 1864, após o lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo].
  • 10. ______________________________________________________________________________________ 10 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. impôs, para definir as manifestações da inteligência, por exemplo. Não podendo já atribuí- la a quantidade nem a qualidade da massa cinzenta do cérebro, imagina fatores como o artritismo e até à sífilis! Fatores patogênicos, nada mais. Ride? Mas, senhores, não sou eu quem diz, é o Dr. Geley, comentando os seus compares. Diz ele33 : ―Ainsi, tout ce qui, au point de vue intellectuel, serait, soit au dessous, soit au dessus de la normale, serait le fait de la maladie‖. E acrescenta: ―O Dr Chabaneix34 fala de auto-intoxicação e ―surmenage‖ nos predispostos - ―Une des maladies du cerveau, c’est l’automatisme ou l’apparation du subconscient‖35 ,36 . Singular doença obtempera Geley, que em vez de ser uma causa de perturbação e diminuição para o indivíduo, aumenta as suas capacidades e o seu poder. Mas, se perguntássemos a Chabaneix – que vem a ser esse subconsciente? O Padre Florêncio Dubois, que tão galhardamente e cristãmente nos recebeu em Belém, esparramando a sua bilis ichorosa37 pelas colunas de honra da ―Folha do Norte‖, também nos falou da ―massa parda‖... Mas o Padre, coitado, é sempre um energúmeno e de sobra conhecemos a sua ética – (O cristão pode obrar precisamente como homem e despojar-se da personalidade de cristão, naquelas ações que não são próprias do homem cristão.). A teoria da sífilis... Senhores, não queremos privar-vos do sabor da originalidade e assim damo-la aqui ―ipsis litteris‖ no idioma do genial autor. ―Si la syphilis, conclut gravemente le Dr. Paschal Serph38 , fait le mal que tout les médecins sont unanimes à reconnaître et à craindre pour l’humanité, elle lui donne, en revanche, la possibilité de perfectionner ses moyens d’actions et compense ainsi, dans une certaine mesure, par son action hipertrophiante cérébrale, créatrice des idées particulières géniales, ses méfaites redoutables‖39 . Não será o caso de darmos parabéns aos sifilíticos? Mas, admitindo, por argumentar, o valimento da teoria da morbidez para justificar os fenômenos psicológicos, é preciso considerar que as nevroses, como a loucura, do ponto de vista da anatomia patológica, ainda são puros enigmas para a ciência médica. E não é dizendo simplesmente que o gênio é nevrose ou loucura, que se fará compreender o mecanismo das produções geniais. 33 De L’inconscient au conscient, pág.112. [―Assim, tudo o que, sob o ponto de vista intelectual, estaria, seja abaixo, seja acima da normal, seria o fato da doença‖. Tradução: José Antonio Carvalho]. 34 [Paul Chabaneix (1875-1948), autor da obra: Le subconscient chez les artistes, les savants et les écrivains, Paris, Edição J.-B. Baillière et fils, 1897]. 35 [―Uma das doenças do cérebro, é o automatismo ou a aparição do subconsciente‖. Tradução: José Antonio Carvalho]. 36 Vheses do Jesuíta Caen – Ecos de Roma, do Padre Guilherme Dias, pág.35. 37 [Líquido que tem ichor ou é da natureza do ichor. Humor purulento, que escorre de certas úlceras. (Do Gr. ikhor.)]. 38 Gazete mèdicale de Paris, 12 Juillete 1916 [No original está 1016, incorretamente].. 39 [―Se a sífilis, conclui gravemente o Dr. Paschal Serph, faz o mal que todos os médicos são unânimes em reconhecer e em temer pela humanidade, ela lhe dá, em compensação, a possibilidade de aperfeiçoar seus meios de ações e compensa assim, em uma certa medida, por sua ação hipertrofiante cerebral, criadora das idéias geniais particulares, seus malfeitos temíveis‖. Tradução: José Antonio Carvalho].
  • 11. ______________________________________________________________________________________ 11 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Mas, senhores, se nós considerarmos o fato (e o fato é real) de um louco que, em estado de hipnose, recobrava as suas faculdades normais? Aqui mesmo, no Rio40 , conhecemos um homem, um amigo que esteve no Hospício como louco e era um simples obsedado. Restabelecido pelo Espiritismo, dele fez-se adepto fervoroso e era de ver-se como contava o que denominava pitorescamente - ―as memórias da sua loucura‖. Eram puros fenômenos mediúnicos, de vidência e audição, que ele não podia rechaçar por lhes ignorar a origem e que, provado está, não se combatem a soros nem a duchas, nem a capacetes de gelo. Voltando a considerar com Le Dantec que o pensamento é função do corpo vivo, como explicar o haver Walter Scott41 escrito Ivanhoé em completo delírio febril?42 E os fatos de lucidez e clarividência? Dentre muitos e mil mais, que se contrapõem à hipótese materialista, permitindo nos seja citar um só, narrado pelo Sr. Roberto Bruce: ―Navegando perto da Terra Nova, absorvido em seus cálculos, ao passar pelo camarim do capitão, julgou vê-lo sentado à mesa; mas atentando melhor, verificou que era um estranho a olhá-lo fixa e admiradamente. Surpreso com a ocorrência, vai interrogar o capitão e este lhe assegura que ninguém lá poderia estar. De fato, a verificação foi negativa; mas, insistindo o oficial que o homem que vira estava escrevendo na ardósia, encontraram nesta as palavras: ―Toquem para noroeste‖. ―A increpação de que fosse a letra do próprio capitão e feita a contra prova da caligrafia, não só deste como de todo o pessoal de bordo, verificado que nenhum dos presentes escrevera na ardósia, o comandante deliberou seguir o rumo indicado e três horas depois divisava um ―iceberg‖e, junto dele, um navio ao desamparo. Transbordados dele passageiros e equipagem, Bruce comovido reconhece entre eles o homem do camarim. Chamado a explicar-se e solicitado a escrever na outra face da ardósia as mesmas palavras, ficou demonstrada a perfeita identidade da grafia. E contou que, precisamente um pouco antes de meio dia, fatigado adormecera e sonhara que estava a bordo de outro navio. Contara o sonho ao capitão e agora o que lhe admirava era parecer-lhe tudo quanto via muito familiar, quando, certo, ali nunca estivera‖. Aqui, comenta judiciosamente o nosso ilustre patrício Dr. Alberto Seabra, está um caso de desdobramento inconsciente. Ele serve, diremos nós e vós de certo já o inferistes, para provar que o Espírito pode agir e material e psiquicamente fora do invólucro carnal. É postulado clássico da psicologia oficial que todas as faculdades físicas dependem de localizações cerebrais precisas e nítidas: nihil est intellectu quod non prius fuerit in 40 [Cidade do Rio de Janeiro] 41 [1771-1832, Edimburgo, Escócia] 42 ALBERTO SEABRA, O Problema do Além, pág.101 [Dr. Alberto Seabra (1872 - 1936) nasceu em S.Paulo e publicou vários livros. Dentre eles, um intitulado "O problema do Além e do Destino", Editora São Paulo, 1910. Alberto Seabra era filiado ao Círculo Esotérico da Comunhão do Pensamento. No livro Claramente Vivos, de Francisco Cândido Xavier e Elias Barbosa, por Espíritos Diversos (IDE, Araras-SP, 1ª edição, 1979, p. 55), há uma comunicação do Espírito Luiz Augusto Trita relatando a atuação médica espiritual do Dr Seabra].
  • 12. ______________________________________________________________________________________ 12 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. sensu... Entretanto, aqui estão, nesta obra, fundamentalmente consignadas às conclusões do Dr. Guépin comunicadas à Academia de Ciências de Paris em 24 de março de 1917, a saber43 : 1º que a amputação do cérebro no homem é possível, relativamente fácil e salva certos feridos que os tratados clássicos condenam ainda a morte certa, ou, pelo menos, a enfermidades incuráveis. 2º que esses operados demonstram, às vezes, não haverem perdido tal ou tal região cerebral. O celebre Dr. Laveran registra a comunicação, mais surpreendente ainda, do presidente da Sociedade Antropológica de Sucre (Bolívia), fato ocorrido na clínica do Dr. Nicolas Ortiz. Trata-se de um rapaz de 12 a 14 anos, falecido no pleno gozo de suas faculdades intelectuais e cuja autópsia revelou as menínges hiperemiadas e um grande abcesso ocupando quase todo o cerebelo, uma parte do cérebro e a protuberância. Todos sabemos que a hemiplegia é uma lesão cerebral que se caracteriza pela paralisia de um dos lados do corpo, o oposto ao da lesão. Pois bem, conhecemos um jornalista de talento, o Dr. Thomaz Gomes dos Santos, filho do conselheiro desse nome, o qual, em idade avançada, redigia o seu jornal em Vassouras e praticava com proficiência a odontologia. Era um intelectual. Conclusão única: nem quantidade, nem qualidade de massa encefálica para justificar a existência da alma como epifenômeno, no dizer de Huxley44 . Melhor fora confessar como Charles Richet45 : que importa ao fisiologista toda essa extraordinária complexidade das células nervosas com suas dendrites, arborescências, ramificações, corpúsculos, se ele ignora o uso destas partes?46 Não citaremos mais fatos, fatos e fatos, mesmo porque esta palestra não se adstringe a fatos concretos e ao relatá-los, de escantilhão e sem ordem sistemática, desejamos, de preferência, realçar a doutrina pela indução filosófica dos fatos. Em poucas palavras: para nós, mais alto que todas as comprovações da cirurgia, da anatomia, da psicologia, falam da imanência do ser, da sobrevivência do espírito, da mônada consciente, desse dinamismo psíquico superior evolvendo e fazendo evolver os organismos - mais alto para nós, repetimos - falam os fenômenos de pura intelectualidade. E desse citaremos aquele que de longa data guardamos, como dos mais categóricos. Eis como a ele se refere Eugène Nus47 em seu livro Choses de l´Autre Monde: ―Nossa tripeça não se embaraçava com tão pouca coisa e desafio todas as academias literárias a formularem instantaneamente, sem preparo prévio nem reflexão alguma, definições circunscritas a doze palavras, tão completas e por vezes tão elegantes, como as 43 De L’Inconscien, au conscient, pág.82. 44 [Thomas Henry Huxley (1825-1895), biólogo britânico]. 45 [Charles Robert Richet (1850-1935), prêmio Nobel de fisiologia em 1913. Ver Charles Richet – Apóstolo da Ciência e o Espiritismo de Samuel Nunes Magalhães, FEB, 1ª edição, Brasília-DF, 1/2007]. 46 O Fenômeno Espírita, pág. 122. 47 [Destacado literato francês (1816 – 1894)].
  • 13. ______________________________________________________________________________________ 13 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. improvisadas pela nossa mesa, a qual concedíamos no máximo e a custo a faculdade de formar uma palavra composta por um traço de união... Vejamos algumas dessas definições: Infinito - Abstração puramente ideal, acima e abaixo do que é concebido pelos sentidos. Espírito - Suntuosidade do pensamento. Galanteria harmoniosa das relações, das comparações e das analogias. Harmonia - Equilíbrio perfeito do todo com as partes e das partes entre si48 . Mas, basta. E os ditados musicais pela mesma tripeça? Pergunta-se: quem respondia? O subconsciente de um assistente, o conjunto de todos eles? Mas, o mecanismo do fenômeno em si? E por que o não tentam os cépticos, por que não experimentam com essa fraude, esse ilusionismo que alardeam tão fácil, reproduzi-lo, efetivá-lo em igualdade de condições e ―controle‖? Ah! os explicadores de inverossímeis com impossíveis! Então, se um ser rústico, boçal e até anormal (é o caso da histérica de Charcot49 escrevendo mediunizada uma sentença de Platão em grego antigo) chega a tais prodígios, então, é o caso de dizer-se que a fraude ultrapassa todas as inteligências humanas! Venham os opugnadores, os caluniadores, os infirmadores destes fenômenos, vistam eles batina ou empinem beca, venham todos os bazófios reproduzir essas fraudes e nos retrataremos. Antes de entrar em considerações de outra ordem, convém vos leia uma comunicação mediúnica que nos foi dada para um dos confrades aqui presentes, e isto porque se trata, no fundo, de uma tese de atualidade, qual a da mediunidade curadora em face da ciência oficial. Essa comunicação nos foi transmitida por aquele símbolo de ternura, de convicção inabalável e inteireza moral irredutível; por aquele homem que sacrificou todos os louros da vida de relação em troca do bordão de peregrino excelso do Evangelho de Jesus, fazendo dele o único fanal nos mares tempestuosos da existência terrena... É desse companheiro, que ainda vem iterativamente levantar-nos das fraquezas e temores humanos, que ele defrontou e venceu; é, finalmente, daquele que, dentro desta casa e para muitos de vós presentes, bem sabeis, fez dela um templo, honrando mais que ninguém o lema insculpido em sua fachada - Deus, Cristo e Caridade. É de Bezerra de Menezes, que também foi médico e médico notável do seu tempo, porque sabia, porque estudava e, sobretudo porque tinha amor e caridade. Ouçamo-lo: ―A ciência da terra é um meio e não um fim. Dada ao homem para que ele desenvolva e apure suas faculdades intelectivas e afetivas, Deus que é a fonte de toda e única ciência, o confunde sempre que ele, homem, renega por louco orgulho o patrimônio divino na aplicação das leis naturais, julgando-se criatura, fator de vida, ele que não dá vida a uma célula! Pois bem, meu amigo, fala-vos, agora, por mercê de Deus, um espírito que foi, como ali dizem, homem de ciência, da pobre, da miséria ciência terrena. E esse 48 [Choses de l´Autre Monde, cinquième èdition, Paris, Librairie des Sciences Psychologiques et Spirites – Infini, p. 24; Esprit, p. 36 e Harmonie, p. 34]. 49 [Jean-Martin Charcot (1825-1893), médico e cientista francês].
  • 14. ______________________________________________________________________________________ 14 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. espírito, esse irmão vos diz a face de Deus e dos homens: - é o espírito que vivifica a matéria‖ (A mesma conclusão chegam certos experimentadores, chega o Dr. Geley em citação que faremos depois da leitura desta comunicação - devo declarar - tomada muito antes de conhecermos esta obra). ―Ao encarnar-se ele, o espírito, constitui-se um foco de energia vital condensada (é o dinamismo superior de Geley) e providencialmente calculada para as vicissitudes da existência que elegeu. Essa energia potencial ele a pode malbaratar no exercício do seu livre arbítrio, mas não pode renová-la para além do termo assinalado. Se, no entanto, tem fé; se sabe atrair elementos salutares, fluidos puros (e nós sabemos que nos fluidos residem as maiores potencias da natureza) é claro que neles encontrará auxílio poderoso ao entretenimento da vida orgânica até aquele termo, dentro da lei e sem deixar, por isso, de sofrer justamente as conseqüências de suas fraquezas ou leviandades. Assim, não há revogação da lei quando a organismos exaustos nos concede o Pai suscitar energias de empréstimo, sempre, já se vê, com visos de proveito espiritual. E são esses os casos que o homem tonto e cego averba de miraculosos. Pobre Homem! Que sabe ele das origens da vida?‖ E aconselha então: ―Ora, pois, com fé, pede dentro da lei e fica certo de que, nos reservatórios do que chamam espaço, no seio infinito de Deus, só aí é que se elaboram os agentes da vida. Tudo mais são elementos secundários, só valiosos quando santificados pela lei de amor e progresso espiritual‖. Agora, a citação de Geley a que acima me reporto: ―As curas ditas miraculosas são o fruto da mesma ideoplastia orientada por sugestão ou auto sugestão, em sentido favorável às reparações orgânicas e concentrando por algum tempo, com esse fim, todo o poder do dinamismo vital‖. ―Nos seres inferiores, a força desse dinamismo (para nós potencial do perispírito) di-lo ainda o mesmo autor, em sua plenitude funcional chega ao ponto de reparar membros mutilados, porque a função cerebral pouco ou quase nada utiliza da força vital‖. Mas, a hora já vai adiantada e precisamos entrar na apreciação dos fenômenos por nós assistidos e constituintes do objetivo da nossa reunião. Não seremos longo porque, certo, muitos de entre vós conhecem desses fenômenos pelo trato intelectual. Nós mesmo os conhecíamos através de uma plêiade inumerável de sábios de reputação mundial, que deles hão tratado em obras que correm mundo e se encontram vazadas em quase todos os idiomas cultos. Convém, contudo, assinalar que, para certo grupo de observadores, o fenômeno de materialização não passa de exteriorização da alma, ou seja, de forças mal conhecidas. É o duplo fluídico do médium que se exterioriza, sem que por tal se possa provar a sobrevivência do ser consciente, depois da morte. Aqui, vem de molde uma pergunta: - Se a nossa alma pode, qual borboleta, deixar o seu casulo e criar fora dele, mecânica e inteligentemente, um organismo com todas as aparências de realidade, não há razão de ordem filosófica que impeça a conclusão de que essa mesma alma sobreviva ao corpo. E a conclusão se reforça ainda na circunstância unanimemente verificada, de que, basta exteriorizar–se para que se mostre mais perspícua, mais atilada, porque desperta o tal subconsciente, que não é mais nem menos
  • 15. ______________________________________________________________________________________ 15 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. que o despertar do seu passado, das suas energias intrínsecas, entorpecidas no estado de co-materialidade. Entretanto, acentue-se também que o grupo maior dos pesquisadores, dos que proclamam a imanência do espírito independente da matéria orgânica, esse filia-se ao Espiritismo, seguindo todas as tradições e teogonias do passado. A grande verdade é, pois que o nosso espírito mais do que comumente supomos, vive fora deste ergástulo temporário e putrescível, e vive mais fora que dentro, porque é fora do corpo que ele se supre das energias físicas e morais para levar por diante a sua precária existência terrena. No sono, por exemplo. E daí o velho anexim: ―O travesseiro é bom conselheiro‖. Quanta gente, em sonho, registra casos admiráveis de previsão e premonição? Nós mesmos temos, em família, um caso positivo, desses que a ciência jamais explicaria com as suas teorias clássicas. Portanto, nosso espírito se exterioriza, vive fora do corpo, viaja, passeia, visita, se manifesta e (aqui incide a verdadeira significação do fato, a ilação superior) - vive ―pós- mortem‖, vivo depois que deixamos o cárcere, como a borboleta irisada que deixa o seu casulo e adejante paira na atmosfera luminosa. É isto que um certo número de sábios relutantes não quer aceitar. Aliás, Haeckel50 dizia: ―Se me provarem que o espírito vive, atua, pensa e se manifesta independente da matéria, serei espiritista‖. Ora, o que a Revelação ensina e demonstra é que o espírito tem corpo... Menos material, mais ou menos sutil que o nosso, mas, de alguma sorte, material. Nem é possível admitir no Universo o vácuo absoluto. ―Carro d’alma‖ de Pitágoras, ―Od‖ de Reichenbach, ―Matéria sutil‖ de Descartes, ―Corpo angélico‖ de Santo Agostinho, ou ―Astral‖ dos ocultistas, que importa o nome? Fosse uma hipótese e perguntaríamos: e o éter dos metapsíquicos e a afinidade dos químicos já foram vistos, tocados pelos nossos sentidos comuns? Pois bem: poder-se-á comprovar a sobrevivência do eu consciente após a morte? Isso é o que se procura induzir, e bem, nesta obra de crítica filosófica e de ciência algo experimental do Dr. Gustavo Geley. Diz ele e dizem outros pesquisadores do fenômeno de materialização que, partindo do corpo do médium, o seu duplo que fica ligado por um cordão fluídico, às vezes por duplo cordão, presumindo-se que assim se estabeleça a corrente de energia entre o médium e o fantasma, que ele denomina ―electoplasma‖. Ora, não vimos esse cordão, nem simples nem duplo, mas vimos dois fantasmas ao mesmo tempo, perfeita, caracteristicamente diferençados Vamos, porém, por partes. A teoria espiritista simplifica de modo admirável estas coisas. Assim é que os desencarnados dizem e disseram a Allan kardec que os espíritos apropriam, assimilam do médium a força, o fluido vital inerente à matéria deste e pela ação da sua vontade, combinando-o, absorvendo-o por assim dizer no seu perispírito, plasmam, condensam o fantasma, que começa a insinuar-se qual nebulosa. 50 [Ernst Heinrich Philipp August Haeckel (1834-1919), naturalista alemão].
  • 16. ______________________________________________________________________________________ 16 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Os Fatos Posto fosse nosso companheiro de viagem, não tivemos a bordo ensejo de nos aproximar do Sr. Eurípedes Prado, o marido da médium. Não o conhecíamos. Ao chegarmos a Belém, ficamos surpreendidos ao ler seu nome na lista dos passageiros. Houvemos, pois, de recorrer ao nosso distinto confrade Carlos Sousa, digno presidente da União Espírita Paraense, para alcançar daquele uma sessão de materializações. Não o solicitávamos por nós, mas principalmente para podermos trazer ao Rio de Janeiro, qual o fazemos aqui, a prova testemunhal daqueles fenômenos que tantas conversões haviam produzido, inclusive a do Dr. Matta Bacelar, médico reputadíssimo e ancião justamente estimado quão venerado na sociedade paraense, o qual não teve a mínima duvida em abrir mão dos preconceitos científicos, para declarar-se adepto do Espiritismo, atestando ―coram populo‖ a veracidade dos fatos. Acolhido com extrema gentileza o nosso desejo, no dia, ou antes em noite aprazada, possuído de natural curiosidade dirigimo-nos à casa do maestro Bosio, no bairro, de ―Baptista Campos‖ onde se dão habitualmente aquelas sessões. A companha, a assistência que lá encontramos reunida, pode dizer-se, do ponto de vista mundano, era a mais seleta. Pessoas de nome, de ilustração, de conceito e reputação social. De escantilhão memorando: Drs. Matta Bacelar e Pereira de Barros, médicos; Dr. Nogueira de Faria, juiz; Dr. Penna Costa, promotor público; Dr. A. Moris, advogado; Appolinário Moreira, diretor da Recebedoria do Estado; o maestro Bosio, A. Lucullo, inspetor federal de seguros, Carlos B. Sousa, Adalberto de Macedo e outros. Entre as senhoras, além da Exma. D. Anna Prado - o médium - a família Lucullo e uma filha do Dr. Bacellar. A primeira sessão realizou-se à plena luz. Nela obtivemos a escrita direta, o transporte de objetos, a manipulação de flores em parafina, esta com luz graduada. Um céptico já nos objetou, quando relatávamos os fatos, se no assoalho não haveria algum alçapão... Fútil, a objeção. A sala é pavimentada a cimento. E as paredes? – lisas como a alma do interlocutor. Não podia haver alçapão... As sessões se realizam nos baixos da casa – o que chamamos aqui um porão habitável – mas suficientemente amplo. O maestro Bosio, que foi céptico renitente, tem gosto pelos fenômenos e a nada se poupa a fim de lhes dar toda a nitidez, de modo a convencerem o maior número. A sessão fez-se, primeiro, em torno de uma mesa grande e comum, de jantar. D. Anna Prado - o médium - é uma senhora austera, mãe exemplar e esposa dedicada. Católica por educação e tradição de família, hostil, de começo aos preliminares do seu desenvolvimento mediúnico, só condescendeu em aceitá-los e auxiliá-los a instâncias do marido. Ciosa da sua reputação e precavida da maledicência ignara e fácil, não é sem escrúpulo que transige na demonstração das suas preciosas faculdades, fora do círculo das suas relações. Em torno à mesa, assentamo-nos todos, mas repare bem nos detalhes, disto fazemos questão.
  • 17. ______________________________________________________________________________________ 17 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Aqui está (mostrando) um desenho, um esboço do cenário, pelo qual os meus ouvintes mais exigentes poderão fazer idéia do local.* A sala tem apenas três portas de comunicação, duas para a frente e uma para os fundos da casa, e portas das quais o maestro Bosio nos oferecera as chaves. Precaução inútil, todavia. Porque o ambiente estava iluminado bastante para que ali não se pudesse insinuar alguém que não fosse imediatamente visto. Demais, que interesse teria aquela gente em enganar-nos e enganar- se a si mesma? Não nos lembramos que houvesse outros móveis além da mesa e cadeiras de que nos utilizávamos. Lembramo-nos, sim, que, ao fazer essa observação, mentalmente, consideramos: - retiraram tudo para que se não diga que há qualquer artifício oculto... À cabeceira da mesa o médium, nós à direita e à nossa frente o Dr. Pereira de Barros, que conosco rubricou o papel em que obtivemos a escrita direta. à nossa direita ficou o Dr. Bacellar. Pediram colocássemos o papel debaixo da mesa e perto o lápis. Fizemo-lo, junto, porém, dos nossos pés, de modo a poder, assim, controlar o fenômeno, pelo menos sentir se alguém - embora fechada a sala e perfeitamente unidas as nossas cadeiras - se insinuava debaixo da mesa. Enquanto esperávamos o médium, mãos visíveis, conversando - e todos conversavam sobre assuntos variados - apenas se interrompia dizendo: - Ele está pedindo menos impaciência, que pensem noutra coisa, etc., até que deu o sinal - ―pronto‖. Como atrás dissemos, a sala estava suficientemente iluminada, todos víamos, o médium não se achava em transe. Mas dizem os pirrônicos sistemáticos: ―porque embaixo e não em cima da mesa?‖ Respondemos: embaixo, por mais escuro, e mais escuro, porque a luz - dizem os espíritos - tem ação dissolvente sobre os fluidos combinados dos perispíritos. Que há nisso de extraordinário? São leis e leis que mal começamos a lobrigar. Aqui, na terra, ninguém ilude as leis naturais: assim, por exemplo, ninguém, revela a plena luz uma chapa fotográfica. Mas (mostrando), aqui está o papel que eis de examinar. Da parte que ficou para cima, escreveram: ―Sofram com coragem as injurias do padre‖. E no verso, isto é, na parte voltada para o chão: ―Coragem meus irmãos, mais sofreu Jesus‖. O padre, ao qual já nos referimos, é o famigerado pitorra Florêncio, padre francês adstrito a Abadia, como lá dizem, de Nazareth. Homem inteligente, mas sem escrúpulos, porque lhe franquearam a primeira coluna de um órgão da imprensa, dela fez pelourinho para denegrir pessoas e coisas espíritas, com grande gáudio da sua ―claque‖ estulta e fanática. Esse padre recebeu-nos - natural que o fizesse - a ponta de faca. Deu-nos de mascate, intrujão, idiota para baixo, só porque, a pedido de distinto amigo, simpático à doutrina - o Dr. Penna Costa, respondêramos a uma ―interview‖ do ―Estado do Pará‖, evidenciando a vida e o programa desta casa. Com isso angariou ele uma polêmica lamentável por só vasada em terreno pessoal, com o Dr. Penna Costa e polêmica que degenerou em processo por injurias e calúnias, tais os mimos que se trocaram. * Vide, págs seguintes (croquis da sala).
  • 18. ______________________________________________________________________________________ 18 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. De nossa parte, sem procurar revidar ao padre, quisemos aproveitar o ensejo para doutrinar; e, quando mais acesa ia a contenda, ao lado de artigos rubros e escandalosos, tresandando fel e lodo, inserimos o que escrevemos no ―Reformador‖ intitulado ―Calma e coerência‖, a propósito da pastoral do Arcebispo contra espíritas e protestantes, e cujo fecho é o preceito do Perdoai não sete, mas setenta vezes sete51 . Esta nossa atitude, não de passividade incondicional, mas de coragem cristã, na vera acepção da humildade, não foi, infelizmente, ao que parece, compreendida pela maioria de nossos confrades paraenses e daí o sermos nessa mesma folha averbado de místico, quando unicamente fomos racionalista do Evangelho. Não, certo, desse Evangelho por aí pregado ao sabor de todos os esculcas de pequenas igrejas, mas do Evangelho em espírito e verdade, tal como o inculcam os espíritos elevados, ou sejam os mensageiros de Jesus. Ao ―Estado do Pará‖ poderia convir que escorchássemos o padre. Era o escândalo. Mas ao ―Estado do Pará‖ não conviria que doutrinássemos Espiritismo, escandalizando a consciência dos seus leitores católicos... Mas, senhores, fechemos este longo parênteses. Como vos dizia, a entidade invisível escrevera e assinara – João. Para o fazer na face do papel assente no solo, teria de o virar. Isto não se deu; o caderno almaço estava no mesmo lugar e posição em que o colocáramos, mantendo sobre uma das bordas a nossa botina. Desta, da sua pressão, podereis ver aqui os vestígios. Aqui temos, pois, o fenômeno da ―escrita direta‖, porquanto o ―médium‖ mantinha, às vistas de todos, as mãos sobre a mesa e nem ele, nem ninguém poderia praticar uma intervenção direta. Em seguida, ―João‖, pela voz do médium, pediu-nos a mim e ao Dr. Pereira de Barros, assentado de fronte de mim, que conservássemos na palma da mão um lenço e levássemos a mão para baixo da mesa. Assim praticando, não tardou sentíssemos um leve contato de mão, subindo do pé direito, puxando a calça, tamborilando no joelho e, por fim, arrecadando sutilmente o lenço. Foi-se-me o lenço, disse, olhando para o Dr. Pereira Barros. O meu ainda aqui está, respondeu ele. É preciso esperar, obtemperou o ―médium‖. Decorridos minutos, o doutor acusa a retirada do seu lenço e quase simultaneamente acusamos a restituição do nosso. Antes de qualquer consideração, antes mesmo de retirarmos a mão sob a mesa, o lenço do doutor cai à frente dele, projetando como do teto e do ângulo da sala que ficava atrás de nós. Os lenços estavam (ao nosso modo de ver52 ) artisticamente enovelados, semelhando uma flor ou uma fruta, como queiram, mas de qualquer forma, inteligentemente manipulados. Se quisermos atribuir estes fenômenos de transporte e efeitos ditos físicos, a forças desconhecidas, ao subliminal e quejandas hipóteses mais ou menos abstrusas e rebarbativas, teremos de infirmar as próprias leis da física, segundo as quais força alguma atua que não seja em linha reta. Ora, neste caso, forçoso é convir que essa força não atuou em linha reta, antes, no mecanismo do fenômeno, operou de modo complexo, descreveu 51 [Mt. 18:21-22]. 52 [No original o texto está truncado: (o nosso idel-o ver). Optamos, pelo sentido, escrever (ao nosso modo de ver)].
  • 19. ______________________________________________________________________________________ 19 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. muitas figuras geométricas. Apreendendo um lenço aqui, outro ali, depois de os amarrar inteligente, artisticamente, devolve-os quase de jato, um por debaixo da mesa, com requintes de delicadeza, outro de cima, bruscamente projetado! Retirada, em seguida, a mesa, foram trazidos dois baldes comuns contendo um cera de carnaúba quente e outro água fria. Em torno desses baldes fechamos um circulo, ou antes, uma elipse de cadeiras. De propósito citamos a cera derretida, liquefeita, porque a sua temperatura, qual a tomamos, tateando o vasilhame, não a suportaria impunemente a nossa epiderme53 . No Pará, contaram-nos que, para responder a uns tantos censores e conjecturistas do fenômeno, o maestro Bosio expôs um modelo de pé e reptou os incrédulos a produzirem coisa igual mediante premio de 5:000$000. Sempre houve, ao que parece, uns três simplórios que o tentaram, queimando-se inutilmente e mais gravemente um deles, que sofria de eczema ou varizes, se bem nos lembramos do relato. Mas, ainda assim, admitida a possibilidade de moldagem, graças à aplicação de qualquer substância refratária ao calor, sobre a epiderme, nem por isso estaria removido o maior óbice – a retirada do pé ou da mão sem quebra do molde.54 Ainda para esse trabalho não se extinguiu, apenas se graduou a luz da sala, cujas portas permaneciam fechadas. Dentro em pouco, sem vermos qualquer sombra ou fantasma, ouvimos o marulhar d’água, como se alguém a agitasse, no balde. Depois, pediram-nos que estendêssemos a mão e recebemos emocionado esta flor delicadíssima, ainda quente, e em cujas pétalas podereis distinguir as impressões digitais do manipulador. O fato de nos ser entregue ainda quente (e bem quente) é um desmentido a quantos, mesmo no Pará, dizem que tais artefatos são adrede preparados e artificiosamente conduzidos ao recinto das experiências. Entretanto, estávamos todos nos entrevendo e fiscalizando ali. Ninguém se moveu dos seus lugares. E como se aqueceria aquela prenda, tão frágil, antes que se não quebrasse nas vicissitudes de um suposto esconderijo? Da probidade, da idoneidade moral dos circunstantes não falaremos. Não falaremos da estultícia dessa presunção de que pessoas de critério reconhecido, sem interesse material qualquer e com sacrifício mesmo de tempo e comodidades se reúnam pelo só prazer de se mistificarem, mistificando os seus semelhantes. São valores de apreciação com os quais não contamos nesta tese, tanto sabemos que, para uma certa classe de gente, a integridade alheia só pode coexistir com a sua forma de ver as coisas. Compreendemos, de sobejo, aquela zona lúcida de que nos fala o Dr. Gibier55 , fora da qual o indivíduo nada vê, nada sente, nada sabe. Acusando-se fatigado o médium, levantamos a sessão. Emprazado para a prova segunda, a de materialização propriamente dita, a ela comparecemos disposto, mais que nunca, à observação quanto possível rigorosa. Assim, 53 Calculamos 70 ou 80 centigrados. 54 E dizer-se que o inefável Dubois atribui tais fenômenos ao concurso de tubos fosforescentes! 55 Analyse des choses [Ver Apêndice sobre o significado de zona lúcida segundo Paul Gibier].
  • 20. ______________________________________________________________________________________ 20 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. novo exame na sala, na mesma sala; minuciosa investigação da gaiola de ferro, da câmara escura, da disposição das cadeiras, da lâmpada elétrica, das portas, de tudo enfim. A assistência variou de algumas pessoas, cresceu de numero, mas lá estavam as de maior destaque, que haviam assistido a primeira. Pedem-nos que examinemos a gaiola na qual fica encerrado o médium. Essa gaiola é um quadrado de ferro, cujos varões tocamos um a um, experimentando-lhes a firmeza de conjunto e a integridade singular. As colunas angulares sejam os quatro pés da gaiola, assentam sobre um estrado de madeira inteiriço, ao qual, por dispositivo especial, ficam solidamente parafusados, pelo sistema de rosca. Perguntaram-nos se queríamos lacrar as porcas. Dispensamos essa precaução inútil, uma vez que a sessão se faria com luz graduada e nós mesmo manejáramos a chave inglesa. Externamente, qualquer tentativa para desaparafusar a gaiola seria de todos percebida. Internamente, o ―médium‖ jamais poderia manejar a chave inglesa. E que o pudesse, para sair, houvera de suspender a gaiola e o biombo dentro do qual ia ficar. Não foi, confessamos, sem certa magoa que vimos aquela senhora respeitável, de fisionomia austera quão benevolente, trajando um costume azul escuro, entrar para aquela prisão, na qual havia uma cadeira, em que ela se assentou, meio de lado e debruçando-se no respaldo, tal como se vê nesta fotografia56 . Sobre a gaiola, conduzida a um canto da sala57 colocamos o biombo — uma barraca de pano escuro, tendo na parte frontal uma cortina. O ―médium‖ ficou, destarte, duplamente enclausurado e, sala fechada, mal concebíamos como suportava aquela temperatura só compensada por um ventilador fronteiro a câmara escura. Preparado o gabinete, assentamo-nos em semicírculo e começou o fenômeno do transe mediúnico, tal como o descrevem Crookes, Gibier, Aksakoff, Geley e tantos outros. O ―médium‖ ora gemia em surdina, ora respirava alto e todos ouvíamos esses haustos e gemidos até que serenou. Aqui, revela ponderar que a hipnose não é espontânea. Ela se opera por magnetização do Espírito desencarnado que superintende os fenômenos — neste caso, ―João‖, que foi tio carnal da ―médium‖ nesta sua existência terrena. ―João‖ portanto, o fantasma, adormeceu o médium, que caiu em transe, como em linguagem técnica se diz. Entrementes, parecia haver-se estabelecido certa afinidade psíquica entre nós e o ―médium‖, como que nossos pensamentos e sentimentos mais recônditos eram por ele devassados. Assim, advertia: ―é preciso ter menos impaciência‖; ―mais atenção da esquerda‖; ―João diz que devem atenuar a rotação do ventilador, etc.‖ Depois, a cortina do biombo foi suspensa. Houve, por conseguinte, ação mecânica. Mas, é preciso dizê-lo, tudo isso se dá com luz atenuada, luz cujo dispositivo é este: ao fundo da sala, uma lâmpada elétrica pendente do teto, interceptada por um pano verde. Assim, velada a parte da sala em que transcorrem os fenômenos, a luz da lâmpada se esbate, do outro lado, na parede e, correndo por ela de alto a baixo, reflete-se no ambiente 56 Esta e outras fotografias, bem como as luvas e flores de parafina, acham-se na sala da Federação, para os que quiserem examiná-las. 57 Veja-se o desenho já citado.
  • 21. ______________________________________________________________________________________ 21 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. tanto quanto necessário para que todos se divulguem. Dir-se-ia, para vos dar uma idéia, uma penumbra de cinematógrafo, suficiente para se divisarem fisionomias, objetos, movimentos quaisquer. A ansiedade de auditório era grande, profundo o silêncio, quando alguém exclamou: — Ei-lo, o fantasma, a desenhar-se no canto da câmara escura, à direita. Não o vê? Não víamos... Olhe agora, ali, no outro canto junto à parede. De fato, no ponto indicado, à nossa frente, oscilava como que um lençol, uma massa branca que se foi condensando e resvalando cosida à parede - não havia três metros de distância da câmara ao lugar em que me encontrava - chegando ao ponto em que estavam os dois baldes, já de nós conhecidos e mais uma garrafa com água raz, destinada a temperar a cera para a confecção dos moldes e flores. O fantasma, sempre mais nítido, insinua-se bem perto, estaca defronte do balde. Fixamo-lo a vontade: era um homem moreno, orçando pelos seus 40 anos, trazendo à cabeça um capacete branco. Pelas mangas largas de amplo roupão também branco, saíam as mãos trigueiras e grandes. Os pés não lhos divisamos.* Chegou, cortejou, palpou os baldes, ergueu com a mão direita o que continha a cera quente e com a esquerda, elevando a garrafa de água raz a altura do rosto, como que dosou o ingrediente. Depois, arriando o balde, como para confirmar o seu feito, arrastou-o no chão, produzindo o ruído característico, natural. Os seus gestos e movimentos eram perfeitos, naturais, humaníssimos, como se ali estivesse criatura humana. Isso posto, afastou-se e conservou-se a um canto da câmara escura, enquanto do outro canto surgia uma menina de seus treze anos, que dá o nome de Annita. Assim, tivemos uma dupla manifestação. Visíveis ao mesmo tempo, ―João‖ - um homem e ―Anita‖ uma quase criança, enquanto ouvíamos iterativamente o médium suspirar na câmara escura! E note-se, na assistência ninguém havia que pudesse fingir de criança... Annita caminhou graciosa para o balde e em breve nos entregou esta delicada flor (mostrando) que tem o caule virado. Regressando ―Annita‖ à câmara, pelo mesmo trajeto, antes que se esvaecesse, ―João‖ diz como para o médium - ―Vou operar‖. E aproxima-se e opera. Vemo-lo abaixar-se e alternadamente mergulhar a mão num e noutro balde. O que não vimos - e isto dizemos para que considerem que não fantasiamos nem exageramos - foi o desmaterializar da mão para sacar a luva, pois neste comenos João voltou-se para a parede e o processo foi rapidíssimo, quase instantâneo. O ―médium‖, lá do gabinete, mandou que estendêssemos a outra mão (na direita conservávamos a flor) e... aqui está o molde de ―João‖.* Certo, já compreendestes, Senhores, a correlação do fenômeno; ―Annita‖ veio, manipulou e nos entregou esta flor; ―João‖, em seguida, modela a sua mão desta forma, isto é, juntando o polegar ao indicador, como a significar que é dele a oferta da dita flor! Agora é o caso de perguntar a todos os físicos e químicos: como é possível tirar-se a mão de um molde assim talhado, sem o quebrar? Ah! senhores, já houve um sabichão * Clichê do fantasma (Gravura). * Molde da mão, (gravuras).
  • 22. ______________________________________________________________________________________ 22 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. imaginoso, um cérebro fecundo na sua caturrice de ―espírito forte‖, que aventou a hipótese de umas luvas de borracha cheias de água fria. Então, esvaziada a luva... Somente o genial contraditor se esqueceu de que a borracha não só não resistiria à temperatura da cera, como, principalmente, que estes moldes cheios de gesso dão um órgão anatômico perfeito, a ponto de apresentarem sinais ou defeitos, que os defuntos tinham em carne e osso. Não nos detenhamos, contudo, em refutar puerilidades. Aqui tendes a prova documental do fenômeno e vamos resumir porque a hora vai célere e adiantada. Em seguida, do gabinete, diz o ―médium‖ que procurássemos reconhecer a entidade que ia materializar-se... E para logo toma vulto uma linda criatura. Era uma moça esbelta, loura cabeleira solta, trazendo a tiracolo, sobre as vestes alvas, uma faixa azulada. (Note- se que o ―médium‖ é moreno, tipo acentuadamente nortista, de cabelos pretos e, por sinal, rigorosamente penteados) Caminhou até bem perto de nós, que lhe vimos os traços fisionômicos bem nítidos, o brilho da linda e basta cabeleira. Depois de nos olhar e de cumprimentar a assistência, em graciosa curvatura, afastou-se até ao centro da sala, parecendo indecisa... Aí ouvimos todos, não o ―médium‖, mas ―João‖ dizer: - abram alas. Interessante, senhores, a voz do além túmulo; a articulação das sílabas é perfeita, porém não tem o timbre nasal, pastoso, da voz humana. É um som metálico, por dar uma idéia, visto que não encontro nada que lhe corresponda exatamente. Ao ―abram alas‖, de ―João‖, rompeu-se o círculo das cadeiras em dado ponto e foi quando novamente, ouvimos a ordem de ―João‖, incisa e rápida - ―Vá por minha conta‖. E logo a visão, que antes parecia pouco segura do seu corpo, caminhou resoluta até junto e sob a lâmpada, percorrendo a sala em todo o seu comprimento. Um assistente58 que, por dispositivo da colocação primitiva, lhe ficara mais próximo nessa surtida, disse- nos depois: ‖Eu vi até os cabelos dos braços e as veias da pele, quando ―ela‖ estacionou sob a lâmpada‖. Ao regressar vimos o seu andar naturalíssimo, o passo cadenciado e, por curto o vestido, as botas de atacar, de cano alto e cor marrom claro. Esta circunstância é digna de nota especial, pois que, em regra, as descrições e observações clássicas dizem que os fantasmas deslizam e dificilmente se lhes distinguem as extremidades inferiores. Nós vimos os sapatos e até os cordões dos mesmos! O que, seja dito, não conseguimos ver nitidamente, nos fantasmas, foram os olhos, que eles - ao que parece - procuram resguardar. A propósito, disse-nos o Sr. Eurípedes Prado que ―João‖ chegara mesmo a solicitar que desistissem de o fixar com insistência, sem contudo, arrazoar o motivo de tal solicitação. Será que o fluido magnético humano focalizado e projetado em feixes, exerça ação dissolvente, como a luz artificial, sobre o perispírito condensado do manifestante? É uma pergunta que não ficará sem resposta oportuna e ninguém se admire desta ou de outras obscuridades, em se tratando de leis que mal começamos a entrever e estudar. ―João‖ ainda veio a nós e apertou-nos a mão, tendo antes recomendado, pela voz do médium, que não fizéssemos qualquer pressão, para que ele médium não se magoasse. 58 Adalberto Macedo, funcionário do British Bank, em Recife.
  • 23. ______________________________________________________________________________________ 23 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Disto, não há concluir que o fantasma seja o duplo mediúnico, porém que a ele está substancialmente ligado, vivendo, por assim dizer, da vida orgânica do ―médium‖. Em seguida a essa materialização, tivemos a de um sacerdote encanecido e austero. Caminhou vagaroso ao centro da sala e aí esteve parado, imóvel, cerca de cinco minutos. Devido ao hábito negro, apenas lhe pudemos divisar o rosto, as mãos, a cabeça encanecida, coroa aberta. Com o mesmo passo lento e grave recuou e, inclinando a fronte como em respeitoso cumprimento, desapareceu na câmara. Ato contínuo, diz o médium: ―João está pedindo que toquem piano‖. O maestro Bosio dá suas ordens para cima e em breve ouvimos as harmonias de uma valsa lenta. E ―João‖ cadencia os passos, dança graciosamente59 e canta em surdina, acompanhando o piano dolente. Maravilhoso! Terminada a valsa, ainda falou, na sua voz metálica: - Olhe o Dubois. Depois, alegando fadiga do médium, iniciou as despedidas a todos, cortejando e acenando com as mãos, graciosa, naturalmente. Por fim genuflectindo, solene, ergueu os braços ao alto, no gesto expressivo de quem dá graças a Deus. E, rápido, desmaterializou-se, deixando-nos n’alma embevecida uma dulcíssima impressão de reconhecimento e saudade. Ainda ouvimos a impressão dos seus dedos a estalidarem delicadamente na face do médium, por despertá-lo. A voz de ―pronto‖, aclarado intensamente o ambiente, puxamos do relógio. A sessão durara 2 ½ horas. O ―médium‖, retirado o biombo, patenteava-se exausto, mas calmo, acusando apenas entorpecimento das pernas. Desaparafuzada a gaiola, acercando-se solícito o venerando Dr. Bacellar, ousamos perguntar-lhe se verificava qualquer anormalidade fisiológica, ao que ele nos respondeu: — Nada, apenas uma ligeira depressão do pulso. De fato, dentro de dez minutos, a Exma. D. Anna Prado gesticulava e conversava naturalmente. Devo ainda confessar que, em nenhum dos assistentes, notei impressão de alarma ou constrangimento; bem ao contrário, todos se manifestavam prazerosos, como se houvessem assistido a uma das cenas consuetudinárias da vida. Tudo natural, naturalíssimo. 59 [Allan Kardec comenta sobre um Espírito de um indígena peruano que se comunicava com o Sr e Sra Nezt - membros da Sociedade -, e que realizava efeitos de ordem física ―dançando constantemente, isto é, fazendo dançar a mesa, que marca o ritmo perfeitamente reconhecido de uma polca, de uma mazurca, de uma quadrilha, de uma valsa em dois ou três tempos, etc.‖. Ver Revista Espírita (FEB), Fevereiro de 1860, pp. 65- 6].
  • 24. ______________________________________________________________________________________ 24 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html.
  • 25. ______________________________________________________________________________________ 25 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Legenda: 1 - Portas fechadas 2 - Portas fechadas 3 - Lâmpada elétrica comum 4 - Tela de pano verde, resguardado da luz 5 - Câmara escura dentro da qual ficou o médium engaiolado 6 - Balde d´água fria 7 - Balde com parafina a 70 graus 8 - Eurípedes Prado 9 - O conferencista 10 - Dr. Nogueira Faria 11 - Dr. Matta Bacellar 12 - Dr. Pereira de Barros 13 - Dr. Penna Costa 14 - Ventilador  - Cadeira ___ - Trajeto do fantasma de uma moça não reconhecido - . - - Trajeto do fantasma de um padre >>> - Trajeto do fantasma de João - - - - Trajeto do fantasma de Annita
  • 26. ______________________________________________________________________________________ 26 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Fotografia obtida no dia 30 de janeiro às 9 horas da manhã. Reconhece-se francamente a fisionomia do espírito de João.
  • 27. ______________________________________________________________________________________ 27 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html.
  • 28. ______________________________________________________________________________________ 28 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html.
  • 29. ______________________________________________________________________________________ 29 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. *** Neste ponto, senhores, não posso nem devo omitir, um fato que me diz respeito pessoalmente, visto que, mais que as próprias materializações, ele fala da sobrevivência da alma. No dia subseqüente a essa extraordinária sessão, a Exma. D.Anna Prado nos fez ciente que ao começo da mesma ―João‖ lhe dissera achar-se ali presente, uma menina morena, de 4 a 5 anos, cabelos caídos a altura dos ombros, a qual vinha para ser materializada, porém que ele, ―João‖, não podia produzir a materialização porque a menina estava com a ―camisola vermelha‖. Era a nossa filhinha Maria das Dores (Chicha), desencarnada nesta capital a cerca de 14 anos60 . A cor da camisola (precisamente da que vestia quando faleceu) não era, certo, motivo de impedimento à materialização, sabido que os espíritos tomam as vestes que lhes praz, em geral brancas. Era, porém, essa cor de camisola, pela terceira vez, a característica da identidade desse espírito por tantos títulos querido. Da primeira vez, na Pensão Vegetariana, nesta capital, aos 22 de janeiro do ano pp. (dia do natalício da Chicha) almoçávamos despreocupado quando acercando-se de nós o caro confrade e ―vidente‖ Pereira da Silva61 , interroga: - Quem é uma menina assim, assim, que te acompanha? E nós, incrédulo: - Qual menina, qual nada... - Olha, articulou sentencioso, veste uma camisola desta cor... e tomava entre os dedos os cordões vermelhos de uma cortina próxima... A segunda prova fez-se agora na Bahia, no salão da União Espírita, após uma conferência ali realizada. Quando, depois da prece, comovido, mal procurávamos disfarçar a nossa emoção, aproxima-se de nós o Sr. F. , também vidente, e ... - O senhor tem alguma filha desencarnada? Eu a vi, ainda agora, pairando por traz do senhor, morena, assim... e com uma camisola vermelha. Chegamos ao Pará, a ninguém comunicamos tais incidentes, ninguém sabia que perdemos há 14 anos uma filha e vamos ouvir que ―ela‖ estivera presente àquela extraordinária sessão, só não se materializando pelo fato de trazer uma camisola vermelha!62 60 [Ver a história detalhada do caso Maria das Dores (Chicha), inclusive sua reencarnação como Maria da Glória (Lula) no livro Cinzas do Meu Cinzeiro, de Manoel Quintão, edição da Livraria da Federação Espírita do Paraná, Curitiba-PR, o prefácio de Carlos Imbassahy está datado de 1952, Cap. XI: De onde não se espera..., pp. 69-75)]. 61 [Frederico Pereira da Silva Junior (≈1858-1914), médium durante 34 anos no Grupo Ismael (FEB). Aparelho escolhido por Ismael para receber a palavra póstuma de Allan Kardec que ―forneceu as suas instruções aos espiritistas da capital brasileira, exortando-os ao estudo, à caridade e a unificação‖. Ver Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, Espírito Humberto de Campos, médium Francisco Cândido Xavier, 10ª edição FEB, 1974, Rio de Janeiro-RJ, Cap. XXVIII, p. 218]. 62 [Sabemos de outra manifestação desse Espírito, agora pela psicofonia de Chico Xavier, em 13 de outubro de 1938, como narra o próprio Quintão:
  • 30. ______________________________________________________________________________________ 30 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Meus senhores, basta. Confessemos que só coincidência não pode abranger tantas maravilhas. E essa prova era para nós a maior, então, porque suficiente para nos encher o coração de piedade por todos os gratuitos inimigos da nossa causa, por aqueles mesmos que, em gestos brutais, sem conhecer-nos, tentavam expor-nos à risota do vulgacho ignorante. Demos graças a Deus. -------- A terceira e última sessão, deu-se na véspera de nosso regresso. Indo à casa do maestro Bosio fazer as despedidas, lá encontramos o Sr. Eurípedes e sua senhora. Sendo-nos dito que os fenômenos mais se intensificavam a plena escuridade, assim o preferimos, incondicionalmente. De fato, nessa sessão obtivemos mais um lenço atado (este de ourela azul); o fantasma tirou-nos o sapato do pé esquerdo, calçando-o no Presidente da União Espírita Paraense, nosso prezado confrade Carlos B. Sousa. E sendo menor que o nosso o sapato deste, colocou-o junto do nosso pé. Ao do nosso pé esquerdo, deu ele no cordão um nó tão complicado, que levamos no hotel mais de meia hora por desatá-lo. E tudo isso era feito com celeridade pasmosa, quase instantânea. Tirou-nos a gravata, levou dela o alfinete, pregando-o ao casaco de uma senhora, abraçou-nos repetida e demoradamente, apertou a nossa mão, tocou levemente a nossa face. Alguém se lembrou da campainha. Trouxeram-na e colocamo-la entre os pés, calcando as bordas com força, no intuito de ver se ele a arrebataria com violência ou se a desmaterializaria. Nem uma nem outra coisa. Como se lesse o nosso desígnio, ―João‖ suscitou-nos um leve prurido na perna e enquanto a levantávamos para atender a ―comichão‖, a campanhia tilintou sobre as nossas cabeças. Compreendemos que o espírito agiria intencionalmente para burlar o nosso intento. Nessa sessão, o contato do fantasma foi mais sensível, a materialização seria, quiçá, mais completa, porém só poderíamos senti-la pelo tato. ―Às 20 horas, todos a postos, pressurosos, reunimos-nos em casa do José [Xavier], ao lado da cabana do ―Chico‖. É uma sessão íntima de graça a Deus pela viagem feliz e é também o nosso cartão de visita aos Protetores da outra Cabana de Luz, onde tantas luzes temos já recolhido. Historiemos agora mais esta: ―Feita a prece inicial, Emmanuel toma o médium (Ainda não ouvíramos Francisco Xavier em transe sonambúlico e o que nos ocorre aqui consignar, a propósito, é que de quantas manifestações idênticas temos observado, esta é a que mais se aproxima das do médium Frederico Junior, que transmitiu as célebres obras de Bittencourt Sampaio) e, em termos sóbrios nos dá as boas vindas, concitando-nos ao cultivo do Evangelho. A seguir, Maria da Glória, (Lula), nossa filha, vem falar à minha mulher [D. Alzira] em linguagem familiar, típica e entremeada de episódios domésticos, íntimos, só de nós conhecidos. Minha mulher se comove, chora... Aquela linguagem é bálsamo para o coração materno‖. Ver Romaria da Graça, FEB, Rio de Janeiro- RJ, 1939, opúsculo de distribuição gratuita., p. 8].
  • 31. ______________________________________________________________________________________ 31 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Como não ignorais, conhecem-se três formas de materialização, das quais nos fala o Dr. Geley nesta obra - a luminosa, a vaporosa e a de aparência carnal, específica.63 Nós vimos os fantasmas sob a forma vaporosa, mas bastante condensada para distinguir-lhes as fisionomias, as estaturas, os gestos e caracteres físicos outros, como cabelos, unhas, etc. O contato da pele nos deixou a impressão natural, como se houvéssemos tocado a mão de um homem, apenas um tanto umidecida. Dessa mão (mostrando-a bem), a mesma que nos tocou, sem que experimentássemos a mínima sensação anormal, tendes o respectivo molde.64 E mais estes dois, em formatos diversos, oferecidos à Federação pelos confrades paraenses e obtidos em outras sessões, não por nós presenciadas, mas nem por isso, menos dignas do vosso acatamento e atenção. Enfim, ides vê-los, que só para isso os trouxe, a falarem mais alto e solenemente do que o nosso testemunho pessoal, em prol da verdade que propugnamos, a mercê de Deus, há tantos anos. * * * Muita gente lastima que estes fenômenos deveras transcendentes não se multipliquem, não se vulgarizem, no pressuposto de que eles convenceriam a todo o mundo. Entretanto, bem outra é a ilação a tirar: diante das provas mais categóricas, há os irredutíveis de boa e de má fé. Há os que negam ―a priori‖, por comodismo, por inércia intelectual - espíritos levianos para os quais o problema da vida é uma equação fisiológica = e há os que combatem por interesse sistemático. Defendendo prerrogativas e regalias de casta, coisa alguma os levaria a capitular. Empalhados, embiocados, no - impossível - constituem a grande categoria dos que o vulgo chama - os piores cegos - os que não querem ver. Mas, senhores, um dos grandes ensinamentos da filosofia espírita é o de que tudo vem a seu tempo e providencialmente. Se o nosso cardeal se lembrasse de reproduzir hoje, ali na Urca ou em S. Bento, o auto-de-fé realizado em Barcelona em 1861, o feito não passaria de um anacronismo pueril e ridículo, como ridículos e pueris são os apodos que, dos seus pupiltos adamascados, lançam à doutrina e aos seus adeptos, sacerdotes mais ou menos, solertes e almiscarados. Mas, admitindo que as materializações se generalizassem, que estes fenômenos supranormais se intensificassem, que sucederia? Por um lado, incidiriam na vulgaridade balofa das mesas falantes, a breve trecho no indiferentismo; e por outro lado, se adaptariam - o que é pior - ao feiticismo inconseqüente. Não, mil vezes não. A Providência é um fato e se a nós compete, principalmente, nos colocarmos em condições de bem aproveitar as esmolas que do alto nos chegam, aos nossos Guias, aos Espíritos superiores é que compete encaminhar a evolução da humanidade. Ora, em tese falando, o que se evidencia é que a nossa humanidade não está 63 Esta última foi obtida posteriormente pelo nosso confrade Fred Figner, na aparição de sua Rachel. Veja-se o livro-Trabalho dos Mortos, do Dr. Nogueira Faria, a sair do prelo. 64 Clichê da mão
  • 32. ______________________________________________________________________________________ 32 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. preparada para a messe opima que a seara fecunda do Espiritismo lhe oferta. A prova, tendê-la em que, se tais fenômenos hão constituído elementos de convicção a uma plêiade de sábios ilustres, despreconcebidos de orgulho e prejuízos de escola, para outros não passam os mesmos fenômenos de farsa ou de ilusão. Demais, fenômenos supranormais, transcendentes, eles dependem de um médium e só podem verificar com eficiência dentro de leis que só moralmente se justificam - o intuito de saber, mas saber, para repartir, amando e progredindo. Fora isso, não. E justo é que assim seja, e natural também, porque uma ciência não o é tal pela só observação dos fenômenos que oferece aos sentidos corporais. Ela o é, precisamente, quando da observação dos fatos conjuga, relaciona, determina as leis que regem os fatos. Não é observando céus estrelados que se faz ciência astronômica; não é agrupando números a esmo que se pratica a matemática. Pois bem, senhores, nos fenômenos espíritas, é preciso que haja da parte dos observadores o ―criterium‖ superior, que corresponde aos desígnios da Providência, à Lei Moral absoluta, no dizer dos espíritos elevados. Porque, o Espiritismo é a ciência da vida, não no que ela tem de transitório e perecível, mas de eterno e imutável. Ser espírita, portanto, não é crer na imortalidade da alma, somente; não é, tão pouco, ver, tocar, sentir e falar com os espíritos, pois tudo isto é velho quanto o mundo que habitamos. Ser espírita é assimilar, dos ensinamentos doutrinários compendiados, como destes fatos hoje concludentes, inconcussos, o cabedal intelectual e moral necessário à reforma desta humanidade que se dissolve e aniquila das próprias paixões, do seu materialismo estrábico, da sua impenitência no erro. Ser espírita é começar desde logo a reforma de si mesmo, é renunciar, na frase do Cristo, ao ―homem velho‖65 e segui-lo66 a Ele o Cristo, como quem diz – ―o meu reino não é deste mundo‖67 . Ser espírita é constituir elemento novo para a sociedade de amanhã e então, não tendo já por fanal efêmero os interesses de uma classe, de uma sociedade, de um país ou de uma raça, saber, mas saber em consciência, absolutamente, que é um elemento indestrutível, inteligente, volitivo e progressivamente autônomo para promover a sua integração no seio de Deus, isto é, conhecendo a verdadeira ciência, a ciência divina, universal em Deus. É para isso, e tão somente para isso, que o Espiritismo baixa à terra em modalidades novas, revelando, ou antes, suscitando aos homens verdades, velhas e ampliando outras que o divino Mestre definiu naquele ―Consolador‖68 , naquele ―Espírito de Verdade‖69 , que ensinaria todas as coisas e ficaria eternamente conosco. 65 [Paulo de Tarso: Ef. 4,22; Rm. 6,6 e Cl. 3,9]. 66 [Jesus – Mt. 10, 38 e 16, 24; Lc. 9,23 e 14,27]. 67 [Jo. 18,36]. 68 [Consolador: Jo. 14:16, 26; 15:26; 16:7]. 69 [Espírito de Verdade: Jo. 14:17; 15:26; 16:13.].
  • 33. ______________________________________________________________________________________ 33 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. Eternamente conosco! Senhores, acolhamos o convite que nos chega clangorosa ou harmoniosamente, a toques de reunir para o ―Dia do Julgamento‖, que é o exame da consciência para o surto incoercível da reparação. Lázaros da Fé, paralíticos da Razão, ovelhas tresmalhadas do aprisco de Jesus, que é o Caminho, Verdade e Vida, façamos desse convite à preocupação máxima da nossa existência, certos de que ela não se vai finar amanhã no crepúsculo de um túmulo, mas via alcandorar-se no infinito, prefulgir, irradiar no seio eterno de Deus. Nem de outro modo pensando eu vos falaria aqui, neste templo, que o é, o tabernáculo de muitas graças hauridas na compreensão do lema insculpido em sua fachada — Deus, Cristo e Caridade. FIM
  • 34. ______________________________________________________________________________________ 34 LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO _______________________________________________________________ ACERVO DE BIBLIOTECA VIRTUAL http://www.lihpe.net/artigos/index.html. APÊNDICE ZONA LÚCIDA Spinoza diz que devemos encarar as coisas sob um caráter de eternidade. Irei mais longe: sustento ser conveniente que nos habituemos a considerar tudo em relação com o espaço e o tempo, com a imensidade e a eternidade. Quão minúsculos nos apareceriam grandes acontecimentos e altas situações, se os sujeitássemos ao cálculo desta regra de proporção? Mas, é esta uma operação que não está ao alcance de toda gente; non licet omnibus... Outra condição que importa também não desprezar é a de curar-se o homem desse orgulho que acompanha inevitavelmente uma má educação científica e uma instrução especializada, incompleta, como são tão freqüentes em nossos dias. Pessoas muito esclarecidas em um pontinho especial dos conhecimentos humanos julgam poder decidir arbitrariamente sobre todas as coisas e repelem sistematicamente toda novidade que lhe choque as idéias, quase sempre por este único motivo – que em geral não confessam – que se aquilo fosse verdade, elas não podiam ignorar! Por minha parte, encontrei freqüentemente esse gênero de bazófia entre homens cuja instrução e estudos deveriam preservá-los dessa deplorável enfermidade moral, se não tivessem sido especialistas, escravos da sua especialidade. É sinal de inferioridade relativa uma pessoa julgar-se superior! Enfim, o número de inteligências que sofrem de lacunas é maior do que se julga geralmente. Do mesmo modo que determinados indivíduos são totalmente refratários ao estudo da música, das matemáticas, etc., a outros muitos estão interditas certas investigações do pensamento. Uns, que se distinguiram nesta ou naquela classe de ocupações: na medicina ou na mercearia, na literatura ou na arte de fabricar panos, segundo toda a probabilidade, teriam lastimosamente falhado se houvessem escolhido — como outros tantos que abarrotam o mundo — uma carreira situada fora do que chamarei a zona lúcida, à semelhança da ação dos refletores que, durante a noite, transmitem a luz a uma zona de feixes luminosos, fora dos quais só há sombra e incerteza. Coisas existem que não estão ao alcance da concepção de certas inteligências: estão fora de sua zona lúcida. É inútil insistir mais: algum crítico mal disposto poderia reconhecer-se nestas observações e acusar-me, em represália, de haver escolhido um assunto fora da minha própria zona. Queiram os deuses preservar-me de semelhante infelicidade!... (Análises das Coisas, FEB, 1981, 4ª Edição, Rio de Janeiro-RJ, pp. 38-9).